Open-access Qualidade de vida de mulheres portadoras do HIV

Resumos

Objetivo  Analisar a qualidade de vida de mulheres portadoras do HIV.

Métodos  Estudo transversal que incluiu 40 mulheres selecionadas por amostra não-probabilística. O instrumento de pesquisa foi o questionário WHOQOL-HIV bref, considerando-se os seis domínios do instrumento e os aspectos sociodemográficos e clínicos. Para análise dos dados foi realizado o teste de Kolmogorov-Smirnov para a normalidade das distribuições de médias amostrais e os testes Mann-Whitney e Kruskal-Wallis para analisar a diferença entre as médias ou medianas dos escores de qualidade de vida. O coeficiente de Spearman foi utilizado para possíveis correlações.

Resultados  Segundo o questionário, o domínio Espiritualidade (média = 59,5) apresentou maior escore e o domínio Meio Ambiente (média = 52,1) o menor escore obtido. A média da idade foi de 41 anos, 97,5% declararam ser heterossexuais, 80,0% utilizavam tratamento antirretroviral.

Conclusão  A espiritualidade foi o domínio com melhor desempenho, seguido do domínio Físico. Os menores escores médios foram observados nos domínios Meio Ambiente e Relações Sociais.

HIV; Infecções por HIV; Qualidade de vida; Questionários; Mulheres


Objective  Analyze the quality of life of HIV seropositive women.

Methods  Cross-sectional study including 40 women selected through non-probabilistic sampling. The questionnaire WHOQOL-HIV bref was the research instrument employed, considering the six domains of the instrument and socio-demographic and clinical aspects. Data analysis was performed using the Kolmogorov-Smirnov test to analyze the normality of sampling average distributions, and the Mann-Whitney and Kruskal-Wallis tests to analyze the difference between averages or medians of the scores for quality of life. The Spearman coefficient was used for potential correlations.

Results  According to the questionnaire, the Spirituality domain (average=59.5) reported the highest score, while the Environment domain (average=52.1) scored lowest. The average age was 41 years old; 97.5% declared themselves to be heterosexual; and 80.0% used antiretroviral treatment.

Conclusion  Spirituality was the best-performing domain, followed by the Physical domain. The lowest average scores were observed for the Environment and Social Relations domains.

HIV; HIV infections; Quality of life; Questionnaires; Women


Introdução

O número de indivíduos vivendo com HIV é crescente, o que se deve, entre outros fatores, à diminuição da taxa de mortalidade, consequente, sobretudo à introdução da política de acesso universal a terapia antirretroviral.(1)

A situação epidemiológica indicava que, até o final de 2013,(1) 35 milhões de pessoas viviam com o HIV/AIDS no mundo, e dessas, 15,9 milhões eram mulheres. Apesar da razão entre homem e mulher ter diminuído em alguns países, as mulheres representam 50% de todos os adultos vivendo com HIV.(2)

Com isso, em países onde o acesso a terapia antiretroviral é uma realidade, a percepção sobre a doença foi alterada de fatal para uma condição crônica de saúde.(3) O número de pessoas que recebem terapia antiretroviral na América Latina e no Caribe aumentou de 210.000, em 2003, para 795.000 em 2013, representando 56% das pessoas que precisam de tratamento e 44% de todas as pessoas com HIV.(4)

Conviver com o Vírus da Imunodeficiência Humana representa, muitas vezes, a necessidade de lidar com sintomas depressivos, com o estigma e discriminação da doença, além da necessidade de apoio social.(5) Concomitante, tem-se os efeitos adversos do regime terapêutico, além de enfrentamentos contra o preconceito percebidos pelos indivíduos com HIV.(6) Todos esses aspectos ressaltam a importância da avaliação da qualidade de vida.(7)

A revelação do diagnóstico da infecção pelo HIV, provoca alteração na vida da mulher, como abandono de emprego, demissão, restrição das atividades no lar, abnegação de atividades agradáveis devido a manifestações da doença. A possibilidade de perdas relacionadas ao comprometimento físico associadas com a dificuldade de conviver com uma doença crônica, que ainda agrega estigma e discriminação, podem desencadear isolamento e solidão.(8)

O papel social exercido por homens e mulheres e a desigualdade existente repercute, de forma negativa, na qualidade de vida de mulheres vivendo com HIV. Pesquisas com diferentes populações revelam o comprometimento da qualidade de vida quando comparada a dos homens.(9,10)

A qualidade do acesso ao tratamento também influencia a qualidade de vida.(11) As mulheres portadoras de HIV apresentam escores médios mais altos de sintomas depressivos e menor qualidade de vida do que mulheres não infectadas.(12)

O objetivo deste estudo é analisar a qualidade de vida de mulheres portadoras do HIV.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal realizado em serviço ambulatorial especializado situado no interior do estado de São Paulo, região sudeste do Brasil.

A amostra não-probabilística do estudo foi constituída por 40 mulheres portadoras de HIV com consulta previamente agendada no período de janeiro a julho de 2011, que atenderam aos critérios de inclusão: ter idade igual ou superior a 18 anos, ter ciência da sua infecção pelo HIV/AIDS por no mínimo seis meses e realizar acompanhamento clínico ambulatorial no local de estudo. Como critérios de exclusão foram: gravidez, período puerperal e/ou apresentar doença psiquiátrica.

A coleta de dados foi realizada pelos pesquisadores, em sala privativa, por meio de entrevista individual com duração média de 15 a 20 minutos.

Os instrumentos utilizados foram: questionário sociodemográfico e clínico e instrumento WHOQOL-HIV bref, elaborado pela OMS, traduzido e validado na língua portuguesa. Trata-se de um instrumento de qualidade de vida para indivíduos com HIV/AIDS, cuja versão abreviada reúne 31 questões distribuídas em seis domínios: Físico, Psicológico, Nível de Independência, Relações Sociais, Meio Ambiente e Espiritualidade.(13) Cada domínio pode ser pontuado de 0 (pior QV) a 100 (melhor QV).(14)

Os dados foram inseridos em planilha do MicrosoftOfficeExcel®for Windows 2007 e analisados por meio do programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 18.0. Foi realizado o teste de Kolmogorov-Smirnov para avaliar a normalidade das distribuições de médias amostrais. Foi utilizada a sintaxe para calcular os escores de cada item do instrumento, oferecida pelo Grupo de Pesquisa em Qualidade de Vida no Brasil, versão em português.(14) Os testes Mann-Whitney e Kruskal-Wallis foram empregados para analisar diferença entre as médias ou medianas dos escores de qualidade de vida. O coeficiente de Spearman foi utilizado para analisar possíveis correlações.

O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

Foram incluídas 40 mulheres com idade entre 22 a 69 anos, com média de 41 anos e maioria (57,5%) na faixa etária entre 30 e 50 anos. Referente ao relacionamento 22 (55,0%) estavam em um relacionamento e 18 (45,0%) referiram não estar em um relacionamento. Quanto à escolaridade, considerou-se anos completos de estudo, predominando até oito anos em 25(62,5%) participantes. Sobre o vínculo empregatício e renda, 22(55,0%) não possuíam vínculo e 27(67,5%) tinham renda mensal de um a três salários mínimos.

Quanto ao tempo de diagnóstico de HIV 50,0% (19) tinham até cinco anos de diagnóstico e 28,9% (11) apresentavam mais de 11 anos. Na avaliação da contagem de linfócitos T CD4+, identificou-se predomínio da faixa acima de 350 células/mm3 em 26(65,0%) mulheres, e apenas 5 (12,5%) tinham resultado abaixo de 200 células/mm3. Sobre a carga viral, 22(55,0%) pacientes apresentaram contagem indetectável.

No que tange à fase clínica da infecção/doença, 24(60,0%) entrevistadas foram classificadas como caso de AIDS, 9(23,7%) como HIV assintomático, e 5(13,1%) HIV sintomático.

Quanto ao uso de terapia antiretroviral, a maioria, 32(80,0%) das participantes utilizavam-na, sendo que o tempo de uso variou de nove meses a 13 anos e seis meses, com média de sete anos.

Quanto aos domínios que compõem o WHOQOL-HIV bref, o que apresentou menor escore médio foi Meio Ambiente (52,1), sendo a pontuação mais elevada no domínio Espiritualidade (59,5) (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição dos escores dos domínios do WHOQOL-HIV bref

Natabela 2observamos maior escore no domínio espiritualidade entre as mulheres que estão em um relacionamento estável (62,36), que se declararam bissexual (72,00), sem parceria sexual (64,31) e com renda entre 1 e 3 salários mínimos (62,07).

Tabela 2
Variáveis sociodemográficas e domínios

As mulheres com níveis de linfócitos T CD4+ >350 cel/mm3, obtiveram escores no domínio espiritualidade maiores quando comparadas àquelas com nível de T CD4+ <200 cel/mm3 (Tabela 3). Em relação a detecção de carga viral observou-se que as pessoas com menor carga viral, apresentavam melhor avaliação de qualidade de vida nos domínios físico e espiritualidade quando comparados com indivíduos cujas cargas virais estavam mais elevadas. Quanto à TARV identificou-se que as usuárias dessa terapêutica obtiveram melhores escores no domínio nível de independência.

Tabela 3
Variáveis sociodemográficas e domínios.

Discussão

Como limitação dos resultados deste estudo, destaca-se o desenho transversal e a utilização de amostra não-probabilística em um único serviço de saúde, o que restringe a generalização dos dados.

Quanto à qualidade de vida, detectou-se que o domínio que apresentou melhor desempenho foi o da Espiritualidade, o qual avalia questões como perdão e culpa, preocupação sobre o futuro, morte e o morrer.

Estar em um relacionamento, foi percebido como melhor escore para o domínio nível de independência e espiritualidade.

O uso de terapia antiretroviral apontou melhor escore no domínio espiritualidade. Outro estudo relatou melhor qualidade de vida também nos domínios físico, psicológico, nível de independência e espiritualidade.(15)

O domínio Físico obteve o segundo melhor escore de qualidade de vida. Esse domínio avalia questões como dor e desconforto, energia e fadiga, sono e descanso e sintomas da infecção.(13) Houve diferença em relação à quantificação de carga viral e o domínio físico, sendo que quanto menor a carga viral, maior o escore do domínio Físico.

Os escores estabelecidos no domínio Relações Sociais, avaliam os relacionamentos pessoais, apoio social e atividade sexual, obteve o segundo pior desempenho. Neste estudo, os menores escores observados para este domínio foram estar em um relacionamento, estar empregada, bissexualidade declarada e não ter parceiro sexual.

Ao domínio Meio Ambiente foi atribuído o menor escore. Esse domínio avalia a segurança física, situação financeira, o ambiente físico em relação à poluição, ruído, trânsito, clima e condições de lugar onde se vive. Contudo, constatou-se diferença entre os escores do domínio meio ambiente em relação à carga viral identificando-se que quanto menor a carga viral melhor a avaliação em todos os domínios, e quando os valores de CD4 estão acima de 350 células/mm3 melhor o escore no domínio espiritualidade. Diferentemente do estudo que relata para aqueles com contagem de CD4 ≥ 350 células/mm3 melhores níveis de qualidade de vida nos domínios físico, psicológico e nível de independência.(15)

Conclusão

A Espiritualidade foi o domínio com melhor desempenho, seguido do domínio Físico. Os menores escores médios foram observados nos domínios Meio Ambiente e Relações Sociais.

Referências

  • 1 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). The GAP report [Internet]. Geneva: UNAIDS, 2014. [cited 2014 Oct 12]. Available from: http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/UNAIDS_Gap_report_en.pdf.
    » http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/UNAIDS_Gap_report_en.pdf
  • 2 World Health Organization (WHO). Department of HIV/AIDS. Global Update on HIV treatment 2013: results, impact and opportunities. WHO report in partnership with UNICEF and UNAIDS [Internet].. Geneva: World Health Organization; 2013. [cited 2015 Jan 22]. Available from: http://www.who.int/hiv/pub/progressreports/update2013/en.
    » http://www.who.int/hiv/pub/progressreports/update2013/en
  • 3 Campos LN, César CC, Guimarães MD. Quality of life among hiv-infected patients in Brazil after initiation of treatment. Clinics. 2009; 64(9):867-75.
  • 4 Pan American Health Organization (PAHO). Antiretroviral Treatment in the Spotlight: A Public Health Analysis in Latin America and the Caribbean 2013. Washington, DC: PAHO; 2013.
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  • 6 Guimarães MD, Rocha GM, Campos LN, Freitas FM, Gualberto FA, Teixeira RA, et al. Difficulties reported by hiv-infected patients using antiretroviral therapy in Brazil. Clinics. 2008; 63(2):165-72.
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  • 8 Logie C, Gadalla TM. Meta-analysis of health and demographic correlates of stigma towards people living with HIV. AIDS Care. 2009; 21(6):742-53.
  • 9 Zimpel RR, Fleck, M P. Quality of life in HIV-positive Brazilians: application and validation of the WHOQOL-HIV, Brazilian version. AIDS Care. 2007; 19(7):923-30.
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  • 12 Brody LR, Stokes LR, Dale SK, Kelso GA, Cruise RC, et al. Gender roles and mental health in women with risk for HIV. Psychol Women Q. 2014; 38(3):311-26.
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    » http://cdn.intechopen.com/pdfs-wm/22273.pdf
  • 14 Pedroso B, Pilatti LA, Francisco AC, Santos CB. Quality of life assessment in people with HIV: analysis of the WHOQOL-HIV syntax. AIDS Care. 2010; 22(3):361-72.
  • 15 Akinboro AO, Akinyemi SO, Olaitan PB, Raji AA, Popoola AA, Awoyemi OR, Ayodele OE. Quality of life of Nigerians living with human immunodeficiency virus. Pan Afr Med J. 2014;18:234.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    July-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2015
  • Aceito
    9 Abr 2015
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