Resumo
Objetivo
Descrever o processo de construção de um aplicativo móvel para o apoio à Profilaxia Pós-Exposição ao HIV e analisar como os profissionais de saúde respondem aos atributos de sua usabilidade.
Métodos
Estudo de produção tecnológica, construído em quatro fases, entre 2016 e 2018: composição do conteúdo central do app; reunião de um conjunto de ferramentas para o protótipo; testagem do protótipo; teste dos atributos de usabilidade por meio do método empírico. O aplicativo PEPtec foi construído baseado nas diretrizes nacional e internacional para profilaxia pós-exposição ao HIV. As respostas dos profissionais de saúde acerca dos atributos de usabilidade (facilidade, utilidade, interface e uso do app) foram analisadas por meio de um questionário semiestruturado aplicado em 28 profissionais dos serviços de atendimento às pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis de uma Coordenadoria de Saúde do município de São Paulo (SP), Brasil.
Resultados
O aplicativo foi disponibilizado para os sistemas operacionais Android e iOS. Foi personalizado para o celular do profissional de saúde para apoio na tomada de decisão na indicação da Profilaxia Pós-Exposição ao HIV. Sobre a interface do aplicativo, os profissionais consideraram que as cores e os ícones eram agradáveis e de fácil identificação. Na análise da usabilidade, os profissionais relataram facilidade no seu uso, ganharam habilidades e conseguiram navegar por todas as telas.
Conclusão
O aplicativo móvel responde aos interesses desses profissionais no desfecho da indicação à Profilaxia Pós-Exposição ao HIV por meio desta ferramenta tecnológica.
Aplicativos móveis; Profilaxia pós-exposição; HIV; Desenvolvimento tecnológico
Resumen
Objetivo
Describir el proceso de elaboración de una aplicación móvil para el apoyo a la profilaxis post-exposición al VIH y analizar cómo responden los profesionales de la salud a los atributos de usabilidad.
Métodos
Estudio de producción tecnológica, elaborado en cuatro fases entre 2016 y 2018: composición del contenido central de la app, reunión del conjunto de herramientas para el prototipo, prueba del prototipo, prueba de los atributos de usabilidad mediante el método empírico. La aplicación PEPtec fue elaborada con base en las directrices nacionales e internacionales para la profilaxis post-exposición al VIH. Las respuestas de los profesionales de la salud acerca de los atributos de usabilidad (facilidad, utilidad, interfaz y uso de la app) fueron analizadas mediante un cuestionario semiestructurado aplicado a 28 profesionales de los servicios de atención a personas con Infecciones de Transmisión Sexual de una Coordinación de Salud del municipio de São Paulo, estado de São Paulo, Brasil.
Resultados
La aplicación fue ofrecida para los sistemas operativos Android e iOS. Se personalizó para los celulares de los profesionales de la salud para apoyar la toma de decisiones sobre la indicación de la profilaxis post-exposición al VIH. Respecto a la interfaz de la aplicación, los profesionales consideraron que los colores e íconos eran agradables y de fácil identificación. En el análisis de usabilidad, los profesionales relataron la facilidad de uso, adquirieron habilidades y pudieron navegar por todas las pantallas.
Conclusión
La aplicación móvil responde a los intereses de estos profesionales en los eventos de indicación de profilaxis post-exposición al VIH mediante esta herramienta tecnológica.
Aplicaciones móviles; Profilaxis posterior a la exposición; VIH; Desarrollo tecnológico
Abstract
Objective
To describe the process of building a mobile application to support HIV Post-Exposure Prophylaxis and analyze how healthcare professionals respond to the attributes of its usability.
Methods
A technological production study, built in four phases, between 2016 and 2018: composition of the app’s central content; gathering a set of tools for the prototype; prototype testing; testing usability attributes using the empirical method. The PEPtec application was built based on national and international guidelines for post-exposure prophylaxis for HIV. Healthcare professionals’ responses about usability attributes (ease, utility, interface and use of the app) were analyzed using a semi-structured questionnaire applied to 28 professionals from the services for people with Sexually Transmitted Infections of a Health Coordination of the municipality of São Paulo (SP), Brazil.
Results
The application was made available for Android and iOS. It was personalized for healthcare professionals’ cell phones to support decision-making in the indication of HIV Post-Exposure Prophylaxis. Regarding the application interface, the professionals considered that the colors and icons were pleasant and easy to identify. In the usability analysis, professionals reported ease of use, gained skills and were able to navigate through all screens.
Conclusion
The mobile application responds to the interests of these professionals in the outcome of indication for Post-Exposure HIV Prophylaxis through this technological tool.
Mobile applications; Post-exposure prophylaxis; HIV; Technological development
Introdução
A Profilaxia Pós-Exposição (PEP) é uma medida de prevenção contra o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e pode reduzir a taxa de nova infecção após a exposição. Consiste no uso diário, durante 28 dias, de doses oral de antirretrovirais, indicados para serem iniciados, preferencialmente em 2 horas e, no máximo, até 72 horas após a exposição ao vírus. Deve ser considerado como atendimento de urgência.(11. Word Health Organization (WHO). World Health Organization Guidelines on postexposure prophylaxis for HIV: recommendations for a public health approach. Geneva: WHO; 2015.,22. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Pós-Exposição (PEP) de risco à infecção pelo HIV, IST e Hepatites Virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2018.)
No Brasil, essa prática vem sendo indicada desde 2010. O relatório de monitoramento clínico do HIV mostra que, no país, houve aumento nas dispensações de antirretrovirais para PEP ao longo dos anos, passando de 17.630, em 2010, para 87.251, em 2017, e para 107.345, em 2018.(33. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Relatório de monitoramento clínico do HIV 2019. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019.) Infere-se, a partir desses dados, que a população está tendo acesso ao conhecimento sobre a importância de se buscarem os serviços de saúde após possível exposição ao HIV.
Um apoio que tem sido desenvolvido para promover a ampliação da estratégia de prevenção advém dos aplicativos móveis (app) construídos para a área da saúde.(44. Tibes CM, Dias JD, Mascarenhas SH. Aplicativos móveis desenvolvidos para a área da saúde no Brasil: revisão integrativa da literatura. Rev Min Enferm. 2014;18(2):471-8.) Definem-se como programas de computador ou softwares instalados em dispositivos eletrônicos móveis, como os celulares Android ou iPhone (iOS), com multiplicidade de funções.(55. Centro Latino-americano e do Caribe. Biblioteca Virtual em Saúde. Descritores em ciências da saúde. [citado 2020 Dez 8]. Disponível em: http://decs2016.bvsalud.org/cgi-bin/wxis1660.exe/decsserver/
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)
O uso adequado dessa tecnologia pode levar a inovadoras formas de melhoria para saúde, e seu potencial é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).(66. World Health Organization (WHO). mHealth: New horizons for health through mobile technologies. Geneva: WHO; 2011.) Este órgão reconhece que o uso de app é uma estratégia complementar para o fortalecimento dos cuidados de saúde, ressaltando, porém, a importância da avaliação e do monitoramento desses recursos.(66. World Health Organization (WHO). mHealth: New horizons for health through mobile technologies. Geneva: WHO; 2011.)Os downloads dos app voltados para essa área são significativos. Dados da Food and Drug Administration, dos Estados Unidos, previa até 2018 que 50% dos americanos teriam feito download em seus smartphones, incluindo os profissionais de saúde.(77. Department of Health and Human Services Food and Drug Administration (FDA). Transforming FDA’s Approach to Digital Health. FDA; 2018 [cited 2019 Sep 10]. Available from: https://www.fda.gov/news-events/speeches-fda-officials/transforming-fdas-approach-digital-health-04262018
https://www.fda.gov/news-events/speeches...
)
Estudos indicam a necessidade de análise dos apps quanto à sua usabilidade, ou seja, que sejam testados antes de serem disponibilizados nas lojas virtuais. Devem ser construídos para ter seu uso facilitado para os profissionais da saúde que realizam uma tarefa específica e importante.(88. Barbosa BJ, Silva AP, Mota TJ, Nichiata LY. Análise do conteúdo central dos aplicativos sobre HIV para smartphones. J Health Inf. 2019;11(1):13-20.
9. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.-1010. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.) Os desenvolvedores têm repensado o quesito qualidade dos conteúdos centrais dos apps, indicando que devem ser testados na fase de protótipo ou nas versões iniciais. Pesquisas de usabilidade têm ganhado destaque na produção do conhecimento sobre o uso de apps.(88. Barbosa BJ, Silva AP, Mota TJ, Nichiata LY. Análise do conteúdo central dos aplicativos sobre HIV para smartphones. J Health Inf. 2019;11(1):13-20.
9. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.
10. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.
11. Morland LA, Niehaus J, Taft C, Marx BP, Menez U, Mackintosh MA. Using a mobile application in the management of anger problems among veterans: a pilot study. Mil Med. 2016;181(9):990-5.-1212. Narváez S, Tobar AM, López DM, Blobel B. Human-centered design of an m-health app for the prevention of burnout syndrome. Stud Health Technol Inform. 2017;228(4):215-9.)
Os objetivos do presente estudo foram descrever o processo de construção de um aplicativo móvel para o apoio a PEP e analisar como os profissionais de saúde respondem aos atributos de sua usabilidade.
Métodos
Trata-se de um estudo de produção tecnológica destinada à construção de um app para o apoio a PEP. É parte do projeto “Protótipo de Dispositivo móvel para o apoio a PEP ao HIV”, que obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) e da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, conforme Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) 38350614.3.0000.5392.
Foi realizado com o apoio da Coordenadoria de Saúde Sudeste do município de São Paulo,(1313. Prefeitura do Município de São Paulo. São Paulo lança aplicativo sobre PEP para profissionais de saúde. São Paulo: Prefeitura do Município de São Paulo; 2016.) participando em todas as quatro fases: composição do conteúdo central do app; reunião do conjunto de ferramentas para o protótipo; testagem do protótipo e teste dos atributos de usabilidade do app.
Na primeira fase, realizada entre os anos de 2015 e 2016, foram reunidos os conteúdos contidos de diretrizes municipal, nacional e internacional sobre a PEP. A segunda fase, realizada entre 2016 a 2017, deu-se com a participação da equipe da empresa Poli Júnior da Escola Politécnica da USP, a qual desenhou o protótipo. Foi utilizada a ferramenta Ionic Framework, que permite desenvolver um app híbrido para dispositivos móveis, recorrendo à linguagem Angular JS, que simplifica seu desenvolvimento e ajuda a produzir um app com visual agradável, o qual utiliza conhecimentos sobre HyperText Markup Language (HTML), Cascading Style Sheet (CSS) e Javascript.(1414. Ionicframework. Estrutura iônica. [cited 2020 Oct 16]. Available from: https://ionicframework.com/docs
https://ionicframework.com/docs...
)Na terceira fase, realizou-se uma oficina com gestores e profissionais da saúde, da qual participaram seis profissionais da saúde (dois enfermeiros, um médico infectologista e interlocutor do programa de Doenças Sexualmente Transmissíveis e HIV/AIDS da Secretaria Municipal de Saúde, um assistente social, um psicólogo e um dentista), com a finalidade de apresentar e testar o protótipo do app. O grupo teve por responsabilidade analisar o conteúdo sobre a PEP e a necessidade de adequação da interface do app, no sentido de ser amigável à navegação. Como resultado, houve indicação de inclusão de conteúdos sobre os efeitos adversos possíveis na administração dos antirretrovirais. Não houve sugestões de adequação do desenho do app e formas de navegação. Na quarta fase, participaram dois pesquisadores que, de forma independente, realizaram entrevistas com os profissionais de serviços de saúde nos meses de dezembro de 2017 a fevereiro de 2018. Os pesquisadores foram aos locais de trabalho, apresentaram o protótipo aos profissionais de saúde e o segmento para a efetuação da testagem para analisar a usabilidade. Nessa fase, 28 profissionais de saúde que atuavam nas unidades da rede especializada dos serviços de atendimento às pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis participaram das entrevistas, como amostragem de conveniência.
Na análise dos atributos de usabilidade, utilizou-se a recomendação da Norma Brasileira da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e da International Organization for Standardization (ISO)/International Electrotechnical Commission (IEC) 25062:2011,(1515. Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). ABNT NBR ISO/IEC 25062:2011. Engenharia de Software - Requisitos e avaliação de qualidade de produto de software (SQuaRe) - Formato comum da Indústria (FCI) para relatórios de teste de usabilidade. Brasília (DF): ABNT; 2011.) que sugere a constituição de uma amostra mínima de oito participantes na etapa da testagem desses atributos. Foram inclusos profissionais de saúde de nível superior que aceitaram participar do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido. Foram excluídos os profissionais de saúde de nível médio e do serviço administrativo. Este critério tem por base os protocolos que demandam profissionais de nível superior com competência para a indicação de PEP, em particular enfermeiros.(1616. Conselho Regional de Enfermagem (COREN). Câmara Técnica. Parecer COREN-SP 033/2019. Ementa: Prescrição de medicamentos por abordagem sindrômica para Prevenção Pré-exposição (PrEP), Prevenção Pós-Exposição (PEP) e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) pelo enfermeiro. São Paulo: COREN; 2019)
O questionário da entrevista foi estruturado, dividido em três momentos, utilizando-se, por inspiração, o estudo de Valentim.(1717. Valentim NM, Rabelo J, Silva W, Coutinho W, Mota A, Conte T. Avaliando a qualidade de um app web móvel através de um teste de usabilidade: um relato de experiência. In: XVIII Simpósio Brasileiro de Qualidade de Software. 2014. [citado 2020 Out 16]. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/276276294_Avaliando_a_Experiencia_do_Usuario_e_a_Usabilidade_de_um_Aplicativo_Web_Movel_um_relato_de_experiencia
https://www.researchgate.net/publication...
) Fez-se a análise da usabilidade dos apps mensurando os princípios sobre a eficiência percebida pelo usuário, além da percepção das funções acessíveis, de forma simples e intuitiva, principalmente por haver pretensão de atingir um conteúdo de extrema importância. Foram analisados nos atributos: facilidade, utilidade, interface e o uso do app na profissão.
No primeiro momento, os participantes preencheram o questionário sobre a experiência com a ferramenta tecnológica em saúde, o conhecimento acerca da utilização de apps móveis em saúde e a frequência no uso de material de apoio para tomada de decisão. Na sequência, foi perguntado se conheciam o PEPtec. Diante de resposta negativa, foi explicado e apresentado o app, convidando-o a fazer o download. No segundo momento, o profissional consultou o dispositivo para responder às perguntas sobre a vivência a respeito da indicação de PEP. As respostas dessa interação foram registradas pelo pesquisador, identificando se o profissional teve sucesso (fácil) concluindo sem problemas a tarefa na primeira tentativa; sucesso (difícil) concluindo a tarefa, porém com dificuldades ou insucesso, caso não tenha conseguido completar a tarefa ou desistiu. No último momento, o profissional respondeu ao questionário a respeito dos atributos de usabilidade. Utilizou-se escala do tipo Likert, contendo as opções de resposta: concordo totalmente, concordo amplamente, concordo parcialmente, discordo totalmente, discordo amplamente e discordo totalmente. O profissional foi orientado a assinalar uma única resposta. Os três momentos dessa análise foram armazenados e processados em planilhas Microsoft Excel® 2013.
Optou-se por apresentar os resultados do teste de usabilidade, agregando as opções de resposta “concordo” e “discordo”, dado que a distribuição nas variantes mostrou muita dispersão, dificultando a análise.
Resultados
O PEPtec foi personalizado para o celular dos profissionais de saúde. A primeira versão foi disponibilizada para download, gratuitamente, desde 23 de março de 2016, nos sistemas operacionais Android e iOS. Uma segunda versão foi implementada em 2018 para atualização, tendo como base a publicação do Protocolo Clínico de Diretrizes para PEP. O app auxiliou na avaliação dos riscos a que os usuários estavam expostos ao HIV, de forma a apoiar a tomada de decisão dos profissionais de saúde sobre as recomendações da PEP. A figura 1 exibe a página inicial do app.
Ao selecionar “Home”, uma breve explicação sobre o que era a PEP, sua história e a informação sobre sua indicação, bem como comentários gerais sobre a importância da adesão, podiam ser acessados.
A opção “Recomendações PEP para adultos” era o principal foco do app. Foi criada a partir de um algoritmo de decisão, tendo por base a escolha de respostas pelo profissional de saúde em consulta com o usuário sobre as possíveis exposições ao HIV, a qual o direcionava para as seguintes opções: sexo consensual desprotegido; acidente ocupacional e violência sexual. A opção “Tempo decorrido desde a exposição” - menor ou maior do que 72 horas -, levava a questões subsequentes: violência sexual, acidente ocupacional e violência sexual. A depender do tempo de exposição, era indicada a PEP.
O ícone “PEP criança e adolescente” apresentava as indicações das medicações para uma possível infecção pelo HIV e informações sobre outras infecções. A opção “PEP grávidas” apresentava um alerta sobre algumas contraindicações do uso de antirretrovirais durante a gravidez e a interrupção da amamentação. Havia ainda o recurso “Meus atendimentos” que fornecia uma estatística dos atendimentos. O app consolidava esses atendimentos em porcentagem, para que o profissional visualizasse que perfil de pacientes que procuraram a PEP. Ele, porém, não armazenava informação pessoal dos pacientes, e o profissional podia removê-la no ícone “Reset estatística”.
Ainda nessa tela, era possível visualizar os “Locais de atendimento” com o recurso de Google Map, que indicava a localização em que o usuário se encontrava e os serviços de atendimento a PEP no município de São Paulo (SP). Nos outros municípios e estados do Brasil, redirecionava-se para o link do Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS. Havia, ainda, um ícone indicando “Dúvidas gerais”, que abordava soluções para possíveis dúvidas sobre a PEP. No ícone “O HIV”, existia uma descrição sobre a infecção. O ícone “Fontes” apresentava as principais bibliografias.
Dos 28 profissionais que participaram da análise da usabilidade do app, a maioria era do sexo feminino (78,6%), predominantemente enfermeiros (53,5%), possuía experiências com tecnologia (28,5%) e o usava com frequência em todos os dias da semana (25,0%). Sobre o uso de app relacionados à saúde, mais da metade (60,7%) acessava material disponibilizado na internet como apoio à tomada de decisão (53,5%), conforme observado na tabela 1.
Distribuição dos profissionais de saúde, de acordo com as características sociodemográficas e experiência em uso de tecnologias
Na avaliação do sucesso na indicação da PEP por meio do PEPtec, a maioria dos profissionais obteve sucesso nas etapas (fácil). Todos conseguiram acessar o app e fazer pesquisa direcionada para o perfil violência sexual em menos de 72 horas (100%). As maiores dificuldades surgiram quando foi necessária a busca dos serviços de saúde, devido à indisponibilidade de conexão de internet, de acordo com a tabela 2.
Sobre os atributos de usabilidade do app dos profissionais analisados no estudo, não houve respostas muito diferentes na classificação da escala Likert e, por isso, optou-se pela decisão das opções mais expressivas (concordo e discordo). Todos concordaram a respeito da facilidade de uso do PEPtec. Nos atributos utilidade, interface e uso na prática profissional, a maioria dos profissionais concordou que o app é fácil de usar, é útil, tem uma interface amigável e apoia a prática dos profissionais, tendo mais de 90% de respostas positivas para o uso do app, conforme tabela 3.
Discussão
A chegada dos smartphones permitiram que os celulares ultrapassassem o tradicional uso para ligações telefônicas. Atualmente, são considerados um computador de bolso, por trazerem para as mãos dos usuários comodidades, em qualquer horário. Dentre as diversas funções, pode-se destacar a possibilidade de esses aparelhos oferecerem download de apps, que vão desde entretenimento a suporte de apoio ao profissional de saúde.
No desenvolvimento do protótipo PEPtec, uma das fases foi a análise dos atributos de usabilidade do app. A primeira análise demonstrou que os enfermeiros foram os profissionais que mais responderam à pesquisa.
Há estudos brasileiros(99. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.,1010. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.)que abordam apps específicos para esse profissional. Um exemplo é o Oncoaudit,(99. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.) elaborado para auxiliar na consulta de quimioterápicos, como ferramenta de auditoria em enfermagem de contas hospitalares. Ele foi avaliado por enfermeiros auditores seguindo o questionário System Usability Scale, evidenciando que o app segue as necessidades dos usuários. Profissionais de informática também o avaliaram seguindo o método das heurísticas de Nielsen para os quesitos de usabilidade, ao quais sugestões foram implementadas.(99. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.)
O app Cuidar Tech(1010. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.) foi desenvolvido para auxiliar o enfermeiro na avaliação e classificação de risco dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Sua usabilidade foi avaliada pela equipe de desenvolvimento seguindo as heurísticas de Nielsen, sendo posteriormente validado por enfermeiros como funcional, confiável, adequado e eficiente.(1010. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.)
O WHO Algorithm(1818. Bilal S, Nelson E, Meisner L, Alam M, Amin SA, Ashenafi Y, et al. Evaluation of standard and mobile health-supported clinical diagnostic tools for assessing dehydration in patients with diarrhea in rural Bangladesh. Am J Trop Med Hyg. 2018;99(1):171-9.) foi produzido para auxiliar o enfermeiro na avaliação do nível de desidratação em crianças e adultos. O enfermeiro se mostra um profissional que muito utiliza apps de apoio ao seu trabalho.(88. Barbosa BJ, Silva AP, Mota TJ, Nichiata LY. Análise do conteúdo central dos aplicativos sobre HIV para smartphones. J Health Inf. 2019;11(1):13-20.
9. Grossi LM, Pisa IT, Marin HF. Oncoaudit: desenvolvimento e avaliação de aplicativos para enfermeiros auditores. Acta Paul Enferm. 2014;27(2):179-85.
10. Vêscovi SJ, Primo CC, Sant’Anna HC, Bringuete ME, Rohr RV, Prado TN, et al. Aplicativo móvel para avaliação dos pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2017;30(6):607-13.-1111. Morland LA, Niehaus J, Taft C, Marx BP, Menez U, Mackintosh MA. Using a mobile application in the management of anger problems among veterans: a pilot study. Mil Med. 2016;181(9):990-5.)
O PEPtec foi construído para auxiliar na avaliação dos riscos em que os usuários estejam expostos ao HIV para o apoio na tomada de decisão com base nos apontamentos sobre a PEP. Pode ser utilizado por qualquer profissional que trabalha em pronto-socorro, ambulatório de especialidade, Unidade Básica de Saúde, hospital ou maternidade. No entanto, é importante enfatizar que é permitido ao enfermeiro, segundo a Lei do Exercício Profissional de Enfermagem, integrante da equipe de saúde, prescrever os medicamentos previstos nos protocolos, desde que essa conduta esteja estabelecida em protocolos, normas e rotinas da instituição, e o profissional se sinta, tecnicamente, apto para sua execução. Esse é um profissional estratégico na perspectiva da ampliação da indicação da PEP.(1717. Valentim NM, Rabelo J, Silva W, Coutinho W, Mota A, Conte T. Avaliando a qualidade de um app web móvel através de um teste de usabilidade: um relato de experiência. In: XVIII Simpósio Brasileiro de Qualidade de Software. 2014. [citado 2020 Out 16]. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/276276294_Avaliando_a_Experiencia_do_Usuario_e_a_Usabilidade_de_um_Aplicativo_Web_Movel_um_relato_de_experiencia
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)
No estudo, foi possível perceber que 71,3% dos profissionais possuem experiências com ferramenta tecnológica na área profissional, e 85,6% utilizam recursos disponibilizados na internet como apoio na tomada de decisão. Essa vivência com a era tecnológica pode gerar um conhecimento sobre a utilização de apps, tornando esses profissionais mais seletivos e criteriosos nas plataformas virtuais, sobretudo aqueles que agregam conhecimento à profissão.
Nos passos de navegação no PEPtec, identificou-se que alguns dos profissionais tiveram dificuldades quando era necessário indicar uma unidade de saúde fora do município de São Paulo, pois o profissional foi direcionado a um site, fora do app, e necessitou de acesso à internet. Essa dificuldade pode estar associada ao fato de as unidades de saúde não possuírem acesso à internet sem fios ou o profissional não dispunha de dados móveis em seu celular no momento da análise.
O acesso à internet nas instituições de saúde brasileiras é de 91%, sendo 83% na esfera pública e 99% na rede privada. Dessas, 98% das unidades estão situadas nas capitais e 89% no interior. Contudo, há discrepância quanto à qualidade da conexão à internet.(1919. Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGIB). TIC Saúde. Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos estabelecimentos de saúde brasileiros 2018. 6ª ed rev. São Paulo: CGIB; 2018 [citado 2020 Out 16]. Disponível em: https://cetic.br/media/docs/publicacoes/2/15303120191017-tic_saude_2018_livro_eletronico.pdf
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)
A maioria dos profissionais teve facilidade no manuseio do app, porque, após download, seu uso off-line foi possível. O envolvimento desses profissionais com o uso do app permite obter dados relevantes de forma eficaz e segura. Dessa maneira, podem ser sugeridas soluções para minimizarem as dificuldades vivenciadas durante sua prática profissional,(2020. MCCulloh RJ, Fouquet SD, Herigon J, Biondi EA, Kennedy B, Kerns E, et al. Development and implementation of a mobile device-based pediatric electronic decision support tool as part of a national practice standardization project. J Am Med Inform Assoc. 2018;25(9):1175-82.)corroborando a iniciativa de ferramentas como o PEPtec no auxílio à tomada de decisão.
Na análise dos atributos de usabilidade do PEPtec, os profissionais relataram facilidade em seu uso. Estudo de avaliação do app PedsGuide(2020. MCCulloh RJ, Fouquet SD, Herigon J, Biondi EA, Kennedy B, Kerns E, et al. Development and implementation of a mobile device-based pediatric electronic decision support tool as part of a national practice standardization project. J Am Med Inform Assoc. 2018;25(9):1175-82.) desenvolvido para o apoio na tomada de decisão do cuidar em pediatria foi similar, mostrando a importância de um app de fácil uso e com funções integradas no cuidar. Outra semelhança foi no estudo de validação do app BPH,(2121. Choo MS, Seong JJ, Cho SY, Yoo C, Jeong CW, Ku JH, et al. Development of decision support formulas for the prediction of bladder outlet obstruction and prostatic surgery in patients with lower urinary tract symptom/benign prostatic hyperplasia: part i, development of the formula and its internal validation. Int Neurourol J. 2017;21(Suppl 1):S55-65.) construído para apoio na decisão de cirurgia de próstata, ao ser mencionada a relevância de uma ferramenta tecnológica de fácil uso e com opção de calculadora de probabilidade que auxilia na indicação cirúrgica.
Sobre a interface do PEPtec, os profissionais consideraram que as cores e os ícones eram agradáveis, conseguiram visualizar todas as informações no app e reconheceram que as imagens e os ícones eram de fácil identificação. No estudo que avaliou a experiência de usabilidade de um aplicativo móvel,(1818. Bilal S, Nelson E, Meisner L, Alam M, Amin SA, Ashenafi Y, et al. Evaluation of standard and mobile health-supported clinical diagnostic tools for assessing dehydration in patients with diarrhea in rural Bangladesh. Am J Trop Med Hyg. 2018;99(1):171-9.)houve diferenças das respostas encontradas em comparação com o presente estudo, pois, durante a avaliação dos atributos de usabilidade que analisaram o app Swarm, notaram-se dificuldades enfrentadas pelos usuários em reconhecer ou visualizar ícones no dispositivo, resultando na desistência deles para realizarem algumas atividades. As dificuldades enfrentadas foram direcionadas ao desenvolvedor da tecnologia, para realização de melhorias, que ressaltaram que tais discordâncias não se relacionam com a visibilidade técnica da resolução do produto analisado.(1818. Bilal S, Nelson E, Meisner L, Alam M, Amin SA, Ashenafi Y, et al. Evaluation of standard and mobile health-supported clinical diagnostic tools for assessing dehydration in patients with diarrhea in rural Bangladesh. Am J Trop Med Hyg. 2018;99(1):171-9.) Em nenhum momento, houve desistência dos profissionais deste estudo, mas duas melhorias no PEPtec foram indicadas: uma para atualizações das medicações sobre a PEP e a outra para adicionar um gerador de QR-code, que permitirá acessar um novo app que está em fase de desenvolvimento.
Quanto à utilidade do app, a maior parte dos profissionais respondeu que é eficaz e pode melhorar a prática profissional. A literatura já demonstrou que o uso de app apoia a prática profissional: o Malnutrition Management(2222. Nyumbeka D, Wesson J.. Using mobile computing to support malnutrition management in South Africa. Proceedings of the Southern African Institute for Computer Scientist and Information Technologists Annual Conference; 2014 [cited 2020 Oct 16]. p. 325-60. Available from: https://www.semanticscholar.org/paper/Using-Mobile-Computing-to-Support-Malnutrition-in-Nyumbeka-Wesson/53332ce81f171b1745e8201708f628b69ef92b59
https://www.semanticscholar.org/paper/Us...
,23) auxilia na gestão do controle da desnutrição em crianças menores de e anos, e o MicroGuide ajuda na navegação das informações sobre os antibióticos.(2424. Panesar P, Jones A, Aldous A, Kranzer K, Halpin E, Fifer H, et al. Attitudes and behaviours to antimicrobial prescribing following introduction of a smartphone App. Plos One. 2016;11(4):1-9.) No entanto, no presente estudo, alguns dos profissionais não concordam com o uso desse recurso tecnológico em sua prática profissional.
O PEPtec não tem a intenção de substituir o conhecimento técnico-científico do profissional de saúde. O app é uma estratégia para o apoio ao profissional na tomada de decisão, em particular o enfermeiro, diante de pacientes expostos ao HIV. Pode contribuir com a melhoria das práticas desse profissional e dos demais membros das equipes para o enfretamento da epidemia do HIV/AIDS e colaborar para a redução da transmissão dessa infecção. A análise sobre a usabilidade é uma condição para o aprimoramento dos apps.
O estudo apresentou como limitação o longo período de construção e de análise dos atributos de usabilidade do app. Apps móveis podem tornar-se obsoletos rapidamente, à medida que novos conhecimentos são criados e novas tecnologias são desenvolvidas, exigindo um esforço de atualização e aprimoramento constante. Apesar dessa limitação, os resultados da presente pesquisa podem trazer novas contribuições para o estudo desta temática.
Conclusão
A construção do aplicativo PEPtec foi realizada em quatro fases e representa uma inovação tecnológica desenvolvida no Brasil por ser o primeiro dispositivo móvel de apoio ao profissional de saúde na tomada de decisão durante a indicação a PEP. A análise das respostas sobre os atributos de usabilidade da primeira versão do PEPtec demonstrou que há facilidade, utilidade, interface e uso na prática profissional, e o aplicativo responde, portanto, aos interesses no desfecho da indicação da PEP.
Agradecimentos
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq pelo financiamento desse estudo (Projeto Universal - Processo No. 424852/2016-0).
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Nov 2021 -
Data do Fascículo
2021
Histórico
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Recebido
22 Fev 2020 -
Aceito
9 Dez 2020