Atividade neutralizante anti-herpesvírus bovino tipos 1 (BHV-1) e 5 (BHV-5) no soro de bovinos imunizados com vacinas contra o BHV-1

Neutralizing activity to bovine herpesvirus types 1 (BHV-1) and 5 (BHV-5) in sera of cattle immunized with vaccines against BHV-1

ATIVIDADE NEUTRALIZANTE ANTI-HERPESVÍRUS BOVINO TIPOS 1 (BHV-1) E 5 (BHV-5) NO SORO DE BOVINOS IMUNIZADOS COM VACINAS CONTRA O BHV-1¹

NEUTRALIZING ACTIVITY TO BOVINE HERPESVIRUS TYPES 1 (BHV-1) AND 5 (BHV-5) IN SERA OF CATTLE IMMUNIZED WITH VACCINES AGAINST BHV-1

Fernanda Silveira Flores Vogel² Eduardo Furtado Flores³ Rudi Weiblen⁴ Cíntia Farias Kunrath⁵

- NOTA -

RESUMO

Bezerros foram imunizados com duas vacinas contra o herpesvírus bovino tipo 1 (BHV-1; vacina A, n=28; B, n=28) ou com uma vacina contendo antígenos do BHV-1 e BHV-5 (n=32) e a atividade neutralizante sérica antiBHV-1 e BHV-5 foi testada após três doses vacinais. Todos os animais (n=88) produziram anticorpos com atividade neutralizante antiBHV-1 (títulos médios geométricos [GMT] de 13,1; 14,8 e 34,3 para as vacinas A, B e C, respectivamente) e 82 animais (93,2%) desenvolveram atividade neutralizante antiBHV-5 (GMTs: 10,6; 11,5 e 29,8, respectivamente). Nos três grupos vacinais, os títulos médios antiBHV-1 não diferiram dos títulos antiBHV-5. No entanto, comparando-se os títulos médios entre as vacinas, os títulos neutralizantes para o BHV-1 e BHV-5 foram superiores nos animais do grupo C (p<0,01 ). Esse grupo também apresentou a maior proporção de reagentes ao BHV-5 (96,9%; contra 85,7% da vacina A e 92,9% da vacina B). Esses resultados demonstram que a vacina C induziu títulos neutralizantes superiores contra os dois vírus e que anticorpos induzidos por antígenos do BHV-1 (vacinas A e B) possuem atividade neutralizante relevante também contra o BHV-5.

Palavras-chave: herpesvírus bovino tipo 1, BHV-1, BHV-5, vacinas, neutralização cruzada.

SUMMARY

Calves were immunized with two vaccines against bovine herspevirus type 1 (BHV-1; vaccine A, n=28; B, n=28) or with a vaccine containing BHV-1 and BHV-5 antigens (vaccine C, n=32) and the serum neutralizing activity against BHV-1 and BHV-5 was measured after three vaccine administrations. Neutralizing activity to BHV-1 was detected in sera of 100% (n=88) of the animals (geometric mean titers [GMT] of 13.1; 14.8 and 34.3 for vaccines A, B and C, respectively) whereas 82 sera (93.2%) reacted to BHV-5 (GMTs: 10.6; 11.5 and 29.8). In all three groups, the mean BHV-1 titers did not differ from BHV-5 titers. However, comparison among the vaccines demonstrated that the mean titers to BHV-1 and BHV-5 were higher in animals receiving vaccine C (p<0.01). This vaccine also induced a higher proportion of reagents to BHV-5 (96.9%; against 85.7% for vaccine A and 92.9% for vaccine B). These results demonstrate that vaccine C induced higher neutralizing antibody titers against both viruses; and that antibodies induced by BHV-1 antigens (vaccines A and B) cross-reacted and displayed relevant neutralizing activity against BHV-5.

Key words: bovine herpesvirus type 1, BHV-1, BHV-5, vaccine, cross-neutralization.

O herpesvírus bovino tipo 5 (BHV-5) é um alfaherpesvírus, previamente classificado como um subtipo do herpesvírus bovino tipo 1 (BHV-1). Surtos de meningo-encefalite pelo BHV-5 têm sido descritos com freqüência, principalmente no Brasil (WEIBLEN et al., 1989; SALVADOR et al., 1998) e Argentina (ODEON et al., 1998). Em contraste, a infecção respiratória e genital pelo BHV-1 possui distribuição mundial (KAHRS, 1977). O BHV-1 e BHV-5 são muito semelhantes antigenicamente entre si e apresentam uma extensa reatividade sorológica cruzada (BRATANICH et al., 1991; TEIXEIRA et al., 1998). A ampla distribuição da infecção pelo BHV-1, além do uso de vacinação em larga escala, tem sido utilizada para explicar a baixa ocorrência da infecção pelo BHV-5 na Europa e América do Norte (ELY et al., 1996; CASCIO et al., 1999). Reforçando essa hipótese, a infecção pelo BHV-5 tem sido descrita principalmente em países onde a prevalência do BHV-1 é relativamente baixa e que não utilizam vacinação em grande escala. No Brasil, vários estudos indicam a presença dos dois vírus na população bovina (WEIBLEN et al., 1989; ROEHE et al., 1998; TEIXEIRA et al., 1998).

Considerando a similaridade antigênica e a reatividade sorológica cruzada, este trabalho foi realizado para determinar a atividade neutralizante antiBHV-5, conferida por três vacinas contendo antígenos do BHV-1. Para isso, bovinos soronegativos foram divididos em três grupos e imunizados três vezes (5m , via intramuscular; dias 0, 30 e 180) com vacinas que continham antígenos do BHV-1 (vacina A e B) ou com uma vacina contendo antígenos do BHV-1 e BHV-5 (vacina C). Um grupo (n=10) serviu de controle não-vacinado. O soro coletado no dia 210 foi testado pela técnica de soro-neutralização frente ao BHV-1 e BHV-5 (BRATANICH et al., 1992).

Nos três grupos vacinais, os títulos médios geométricos (GMT) antiBHV-1 não diferiram dos títulos antiBHV-5. Em 53 animais (60,2%), os títulos individuais (BHV-1 versus BHV-5) não diferiram entre si (títulos iguais ou diferença de duas vezes). Alguns animais dos três grupos não apresentaram atividade neutralizante antiBHV-5 (grupo A=4; B=2; C=1)(Tabela 1). Esses animais possuíam títulos baixos (£ 16) contra o BHV-1. Os títulos neutralizantes médios antiBHV-1 e BHV-5 foram superiores (p<0,01) nos animais imunizados com a vacina C. A vacina C também resultou no maior número de reagentes contra o BHV-5 (31 ou 96,9%; contra 24 ou 85,7% da vacina A e 26 ou 92,9% da vacina B). Dentre os animais imunizados apenas com antígenos do BHV-1 (grupos A e B), seis (10,7%) não apresentaram resposta sorológica antiBHV-5, contra apenas um animal (1/32 ou 3,1%) do grupo C (BHV-1/BHV-5) que não soroconverteu ao BHV-5. A resposta sorológica de maior magnitude contra o BHV-1, e BHV-5, nos animais do grupo C, pode ser atribuída, em grande parte, à utilização de adjuvante oleoso, enquanto a presença de antígenos do BHV-5 provavelmente foi a responsável pela maior proporção de animais reagentes a esse vírus nesse grupo.

Os resultados obtidos corroboram estudos anteriores que demonstraram a extensa reatividade sorológica entre o BHV-1 e BHV-5 (BRATANICH et al., 1991; TEIXEIRA et al., 1998). Além da reatividade sorológica in vitro, a possibilidade de proteção cruzada in vivo tem sido demonstrada com a vacinação e/ou infecção com o BHV-1 seguida de desafio com o BHV-5 (CASCIO et al., 1999; BELTRÃO et al., 2000). Embora os resultados do presente estudo não permitam inferências sobre proteção cruzada, eles demonstram que os títulos neutralizantes antiBHV-5 induzidos na maioria dos animais imunizados com o BHV-1 (vacinas A e B) foram comparáveis aos títulos tipo-específicos (antiBHV-1). No entanto, experimentos envolvendo vacinação e desafio são necessários para determinar se a resposta neutralizante antiBHV-5, desenvolvida por animais imunizados com o BHV-1, é suficiente para proteger os animais da doença neurológica, além de reduzir a replicação e a disseminação do vírus. Nas condições desse estudo, a inclusão de antígenos do BHV-5, na vacina C, resultou no aumento do número de animais reagentes e com títulos superiores contra o BHV-5. Por isso, não obstante a similaridade antigênica e reatividade sorológica cruzada entre BHV-1 e BHV-5, a inclusão de antígenos do BHV-5 em vacinas a serem utilizadas em regiões onde os dois vírus circulam, parece ser desejável para ampliar o grau e espectro da resposta imunológica contra esse vírus.

Ciência Rural, v. 32, n. 5, 2002.

²Médico Veterinário, Aluno de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Medicina Veterinária, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

³Médico Veterinário, MSc., PhD., Professor Adjunto do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva (DMVP), Centro de Ciências Rurais e do Departamento de Microbiologia e Parasitologia, UFSM. Bolsista do CNPq (520758/96-0). 97105-900, Santa Maria, RS. Fone/fax: [phone]. E mail: [e-mail]. Autor para correspondência.

⁴Médico Veterinário, MSc., PhD., Professor Titular do DMVP, e do Departamento de Microbiologia e Parasitologia, UFSM. Bolsista do CNPq (520161/97-1).

⁵Estudante do Curso de Medicina Veterinária, UFSM.

Recebido para publicação em 03.08.01. Aprovado em 07.11.01

• BRATANICH, A.C., SARDI, S.I., SMITSAART, E.N., et al Comparative studies of BHV-1 variants by in vivo in vitro tests. J Vet Med B, v.38, p. 41-48, 1991.
• BELTRÃO, N., FLORES, E.F., WEIBLEN, R., et al Infecção e enfermidade neurológica pelo herpesvírus bovino tipo 5 (BHV-5): coelhos como modelo experimental. Pesq Vet Bras, v.20, n.4, p.144-150, 2000.
• CASCIO, K.E., BELKNAP E.B., SCHULTHEISS P.C., et al Encephalitis induced by bovine herpesvirus 5 and protection by prior vaccination or infection with bovine herpesvirus 1. J Vet Diagn Invest, v.11, p.134-139, 1999.
• KAHRS, R.F. Infectious bovine rhinotracheitis: A review and update. J Am Vet Med Assoc, v.171, n.10, p.1055-1064, 1977.
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• ODEON, A. Experiencias del grupo de sanidad animal del INTA-Balcarce referente a las infecciones causadas por el virus de la diarrea viral bovina (BVDV) y herpesvirus bovino (BHV). In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE HERPESVÍRUS BOVINO & VÍRUS DA DIARRÉIA VIRAL BOVINA, 1998, Santa Maria, RS. Anais... Santa Maria : Pallotti, 1998. p.59.
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• SALVADOR S.C., LEMOS R.A.A., RIET-CORREA F., et al Meningoencephalitis in cattle caused by bovine herpesvirus-5 in Mato Grosso do Sul and São Paulo. Pesq Vet Bras, v.18, p.76-83, 1998.
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• WEIBLEN, R., BARROS, C.S.L., CANABARRO, T.F., et al Bovine meningoencephalitis from IBR virus. Vet Rec, v.124, p.66-67, 1989.

¹

Trabalho realizado com suporte financeiro do CNPq, MCT, CAPES e Finep (PRONEX em Virologia Veterinária, 215-96).

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  03 Nov 2003
• Data do Fascículo
  Out 2002

Histórico

• Recebido
  03 Ago 2001
• Aceito
  07 Nov 2001