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EDITORIAL

Este número da Revista Estudos Feministas sai em plenas eleições para a presidência, para os governos estaduais e para os legislativos federal e estaduais. Este poderia ser um momento privilegiado para se discutir as políticas de igualdade de gênero e de raça e de luta contra os preconceitos e as discriminações por orientação sexual, etárias, de classe, entre outras, e o quanto candidatas e candidatos têm encampado essas lutas, não apenas em suas campanhas, mas, no caso daquelas e daqueles que buscam a reeleição, no cotidiano de suas práticas parlamentares ou executivas. É também um momento para se refletir sobre a baixa representação feminina no legislativo e no executivo brasileiros, apesar da política de cotas partidárias em vigor desde 1995. Estudos têm mostrado que, por não terem sido acompanhadas de mudanças mais significativas no sistema eleitoral brasileiro e na própria cultura política e eleitoral do país, as cotas mínimas para candidatas mulheres estabelecidas pela legislação em vigor não só foram cumpridas apenas parcialmente pelos partidos, como também tiveram um impacto menor do que o esperado em relação ao número e à proporção de mulheres eleitas. O campo feminista tem sistematicamente denunciado as contradições e os limites dos processos eleitorais no Brasil e da própria democracia representativa no que diz respeito à construção de uma sociedade efetivamente democrática e igualitária. Saudamos todas as iniciativas que chamam hoje ao debate sobre a importância de candidaturas comprometidas com políticas de igualdade de gênero e com plataformas políticas feministas.

Ao sair este segundo número de 2006, o coletivo de editoras da REF honra seu compromisso, assumido desde 2004, de publicar três números por ano. Além disso, a REF foi uma das revistas selecionadas para publicação no SciELO Social Science English Edition, um projeto que disponibiliza gratuitamente textos em inglês publicados em revistas científicas em Ciências Sociais na América Latina. Inicialmente o site inclui trinta revistas dos seguintes países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai. Em seu primeiro número, a edição da REF na SciELO Social Science conta com seis artigos publicados entre os anos de 2004 e 2005. O site pode ser acionado no seguinte endereço: http://socialsciences.scielo.org/.

Outra boa notícia para o campo dos estudos feministas e de gênero no Brasil é a reedição do Programa Mulher e Ciência, promovido pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), pelo Ministério da Educação (MEC), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM). O programa inclui o 2º Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero e o 2º Edital de Pesquisa no Campo de Estudos de Gênero, Mulheres e Feminismos. Consideramos que essa é uma iniciativa importante de divulgação, estímulo, fortalecimento e democratização dessa área de estudos através de financiamento público. Mais informações sobre o Programa podem ser obtidas no site do CNPq (www.cnpq.br) e no endereço www.igualdadedegenero.cnpq.br.

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Aproveitando a oportunidade proporcionada pelas eleições, publicamos neste número dois artigos que discutem questões de participação das mulheres e candidaturas femininas em processos eleitorais brasileiros.

O artigo de Claudia Maria Finamore e João Eduardo Coin de Carvalho, "Mulheres candidatas: relações entre gênero, mídia e discurso", discute a influência da mídia na escolha de eleitores e eleitoras e a posição destes/as nas leituras e interpretações das mensagens midiáticas. Mesmo relativizando o poder da mídia, os/as autores/as apontam para uma tendência desta em desqualificar a participação das mulheres na vida pública, discurso que encontra ressonância nas formas com que as mulheres são representadas nos discursos sociais hegemônicos e que de certa forma reproduz essas formas.

O artigo "Diferenças regionais e o êxito relativo de mulheres em eleições municipais no Brasil", de Luis Felipe Miguel e Cristina Monteiro de Queiroz, parte de uma questão: por que, nas eleições locais brasileiras, as mulheres apresentam um desempenho melhor nas regiões economicamente menos desenvolvidas? Rejeitando as explicações usuais, que associam as candidatas dessas regiões a partidos de direita, que estabelecem como causa a defasagem educacional – que as beneficiaria –, ou a uma presença maior das mulheres no eleitorado, o autor e a autora buscam uma compreensão mais complexa do fenômeno. A partir dos dados analisados, é feita também uma reflexão a respeito das limitações da legislação brasileira sobre as cotas eleitorais para mulheres.

Além desses artigos, publicamos neste número o artigo "O corpo e a carne: uma leitura das obras Vida de Santo Domingo de Silos e Vida de Santa Oria a partir da categoria gênero", de Andréia Cristina Lopes Frazão da Silva. No artigo são discutidos os significados de duas palavras espanholas medievais – cuerpo e carne – em textos hagiográficos escritos por Gonzalo de Berceo na primeira metade do século XIII. A partir da perspectiva pós-estruturalista, a autora discute, procurando ambigüidades e conflitos, como a categoria gênero é articulada às concepções de Berceo sobre o corpo e a carne.

Em "Violência doméstica e Juizados Especiais Criminais: análise a partir do feminismo e do garantismo", Carmen Hein de Campos e Salo de Carvalho analisam a Lei 9.099/95 a partir de dois discursos considerados marginais no campo do direito penal: o feminismo jurídico e o garantismo penal. É feita uma análise crítica da Lei, levando em consideração a vítima no momento do crime e o autor do fato durante o processo penal, concluindo pela ineficácia da Lei em ambas as perspectivas.

O artigo "Enfermagem e genética: uma crítica feminista rumo ao trabalho em equipes transdisciplinares", de Gwen A. Anderson, Rita Black Monsen e Mary Varney Rorty, traduzido pela primeira vez em português, é uma referência nos estudos da área. As autoras discutem, no contexto de crescimento da informação genética no cuidado em saúde, a liderança ainda restrita nessa área dos profissionais em enfermagem, apesar de, segundo as autoras, serem o maior grupo profissional prestando cuidados de saúde. A partir de elementos de crítica feminista que buscam situar as relações sociais e os obstáculos culturais para a integração da genética na área da enfermagem, é formulado um modelo alternativo, transdisciplinar e holístico.

Neste número, publicamos o Dossiê "Conjugalidades e parentalidades de gays, lésbicas e transgêneros no Brasil", organizado por Ana Paula Uziel, Luiz Mello e Miriam Grossi. Enfocando um tema central na luta pelos direitos sexuais no país, o Dossiê traz cinco artigos sobre questões de cidadania sexual e acesso à instituição do casamento independentemente da orientação sexual; o vazio jurídico relativo aos direitos conjugais e parentais de gays e lésbicas no Brasil; a luta dos direitos de gays, lésbicas e transgêneros e contra a homofobia; a conjugalidade envolvendo travestis; e lesbianidade e famílias homoparentais femininas na periferia de São Paulo, com artigos de Roberto Arriada Lorea, Luiz Mello, Luiz Mott, Larissa Pelúcio e Camila Pinheiro Medeiros.

Como em outros números da REF, a seção de Resenhas busca divulgar publicações recentes nacionais e internacionais no campo dos estudos feministas e de gênero. Neste número, além das resenhas de livros, publicamos uma resenha sobre o filme O segredo de Brokeback Mountain. As temáticas abordadas nos títulos resenhados são as seguintes: homoerotismo; família e trabalho no Brasil contemporâneo; dicotomias e polaridades de gênero; Carmen da Silva e o feminismo na imprensa brasileira; corpo, sexualidade, gênero e desvio; introdução à leitura de Judith Butler; memórias feministas; gênero e autoficção; e as mulheres e o silêncio da história.

Mais uma vez agradecemos pelo apoio fundamental que a REF tem recebido, tanto de parte de órgãos e instituições financiadoras quanto de autoras/es, pareceristas, equipe de produção e co-editoras.

Sônia Weidner Maluf

Cristina Scheibe Wolff

Simone Pereira Schmidt

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2006
  • Data do Fascículo
    Set 2006
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