RESUMO
Objetivo:
avaliar a Teoria do Final de Vida Pacífico, seguindo um quadro de avaliação de teorias de enfermagem.
Método:
reflexão desenvolvida por meio da investigação da Teoria do Final de Vida Pacífico e sua aplicação na prática de enfermagem em Cuidados Paliativos, utilizando o quadro de análise e avaliação proposto por Jacqueline Fawcett. A análise envolveu um exame imparcial e detalhado da teoria, incluindo escopo, contexto e conteúdo da Teoria; e a avaliação baseou-se nos critérios de significância, consistência interna, parcimônia, testabilidade, adequação empírica e adequação pragmática.
Resultados:
quanto ao escopo, é considerada uma teoria de médio alcance e preditiva, tem seu contexto baseado na Teoria do Conforto de Katharine Kocalba. No conteúdo apresenta conceitos definidos, bem delimitados e inter-relacionados. Tem significância ao definir, explicitamente, os conceitos do metaparadigma; tem consistência interna ao dar uma definição para cada conceito e utilizá-los sem apresentar contradição, é parcimoniosa podendo ser utilizada por enfermeiros direcionada aos pacientes em fase terminal.
Conclusão:
destaca-se a importância da teoria e sua aplicação na atuação de enfermeiros voltada ao cuidado de indivíduos em final de vida e seus familiares, visto que apresenta conceitos e proposições condizentes com àquelas propostas pelos Cuidados Paliativos.
DESCRITORES:
Enfermagem; Doente terminal; Cuidados paliativos; Teoria de enfermagem; Avaliação de teoria
RESUMEN
Objetivo:
evaluar la Teoría Final de Vida Pacífica, siguiendo un cuadro de evaluación de teorías de enfermería.
Método:
reflexión desarrollada por medio de la investigación de la Teoría Final de Vida Pacífica y su aplicación en la práctica de enfermería en Cuidados Paliativos, utilizando el cuadro de análisis y evaluación propuesto por Jacqueline Fawcett. El análisis implicó un examen imparcial y detallado de la teoría, incluyendo Alcance, Contexto y Contenido de la Teoría; y la evaluación se basó en los criterios de significancia, consistencia interna, parsimonia, testabilidad, adecuación empírica y adecuación pragmática.
Resultados:
en cuanto al ámbito, es considerada una teoría de medio alcance y predictiva, tiene su contexto basado en la Teoría del Confort de Katharine Kocalba. En el contenido presenta conceptos definidos, bien delimitados e interrelacionados. Tiene significancia al definir, explícitamente, los conceptos del meta-paradigma; tiene consistencia interna al dar una definición para cada concepto y utilizarlos sin presentar contradicción, es parsimoniosa pudiendo ser utilizada por enfermeros dirigida a los pacientes en fase terminal.
Conclusión:
se destaca la importancia de la teoría y su aplicación en la actuación de enfermeros orientada al cuidado de individuos en final de vida y sus familiares, ya que presenta conceptos y proposiciones que concuerdan con aquellas propuestas por los Cuidados Paliativos.
DESCRIPTORES:
Enfermería; Enfermo terminal; Cuidados paliativos; Teoría de enfermería; Evaluación de la teoria
ABSTRACT
Objective:
To assess the Peaceful End of Life Theory according to an assessment framework of nursing theories.
Method:
Reflection developed through the investigation of the Peaceful End of Life Theory and its application in Palliative Care nursing practice, using the analysis and assessment framework proposed by Jacqueline Fawcett. The analysis involved an impartial and detailed investigation of the theory, including the scope, context and content of the theory; and the assessment was based on the criteria of significance, internal consistency, parsimony, testability, empirical adequacy and pragmatic adequacy.
Results:
What the scope is considered, this is considered a medium-range and predictive theory. Its context is based on Katharine Kocalba’s Comfort Theory. In the content, it presents defined, well-outlined and interrelated concepts. Its significance derives from its explicit definition of the concepts of the metaparadigm; its internal consistency from the definition it provides for each concept and its use of the concepts without contradiction. It is parsimonious because nurses can use it for care to end-of-life patients.
Conclusion:
The importance of the theory is highlighted, as well as its application in the activities of nurses focused on care to end-of-life individuals and their relatives, as it presents concepts and propositions in line with what Palliative Care proposes.
DESCRIPTORS:
Nursing; Terminally ill; Palliative care; Nursing theory; Assessment of theory
INTRODUÇÃO
Na era da biotecnologia uma modalidade de atendimento às pessoas que estão morrendo deve revelar um cuidado de Enfermagem que integre conhecimento científico, respeito aos princípios da bioética e sensibilidade humana diante do sofrimento. O conhecimento técnico é tão essencial quanto a competência humana para cuidar de um paciente na finitude de sua vida.11 Fernandes MA, Evangelista CB, Platel ICS, Agra Glenda, Lopes MS, Rodrigues FA. Percepção dos enfermeiros sobre o significado dos cuidados paliativos em pacientes com câncer terminal. Ciênc Saúde Coletiva. 2013; 18(9):2589-96.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) evidenciam que estamos na contramão deste entendimento: em países desenvolvidos e em desenvolvimento, pessoas estão vivendo e morrendo sozinhas e cheias de medo, com suas dores e sintomas físicos não controlados e as demandas psicossociais e espirituais não atendidas. Diante dessa realidade, surge a necessidade da promoção de cuidados paliativos. Vale destacar que dos 58 milhões de mortes por ano no mundo, 34 milhões são por doenças crônico-degenerativas incapacitantes e incuráveis. O Brasil assiste a um milhão de óbitos por ano, dos quais 650 mil deles por doenças crônicas. Cerca de 70% dessas mortes ocorrem em hospitais, grande maioria em unidades de terapia intensiva.22 World Health Organization [Internet]. Global Atlas of Palliative Care at the End of Life. London, 2014 [cited 2016 Dec 18]. Available from: http://www.who.int/nmh/Global_Atlas_of_Palliative_Care.pdf
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Os Cuidados Paliativos, como uma filosofia, não rejeitam o progresso da biotecnologia. Ao contrário, utiliza-se das mais avançadas propostas da farmacologia para o controle de sintomas, constituindo uma resposta ativa aos problemas decorrentes de uma doença incurável e/ou terminal. Também combina harmonicamente a ciência com o humanismo, assim, torna-se essencial ao profissional perceber as demandas de seu paciente, assim como conhecer as possibilidades de intervenção, farmacológicas ou não.33 Burlá C, Py L. Palliative care: science and protection at the end of life. Cad Saúde Pública [Internet]. 2014 Jun [cited 2017 Feb 09]; 30(6):1139-41. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2014000601139&lng=en
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Mesmo primando pela abordagem interdisciplinar, o enfermeiro é parte essencial da equipe paliativista. Ele se configura como o primeiro elo na tríade equipe multidisciplinar, paciente e família.44 Ferreira MAL, Pereira AMNA, Martins JCA, Barbieri-Figueiredo MC. Palliative care and nursing in dissertations and theses in Portugal: a bibliometric study. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016 Apr [cited 2017 Feb 11]; 50(2):317-23. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342016000200317&lng=en
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Além das diversas competências, na atualidade, exige-se que os enfermeiros dominem a prática baseada em evidência, sendo esta muito desejada no cuidado de saúde contemporâneo. Por outro lado, pouca atenção tem sido prestada ao valor da prática de enfermagem baseada na teoria ou na relação entre a teoria e a pesquisa.55 Hanna DR. A proposal for certification in nursing theory. Aquichán [Internet]. 2016 Jan [cited 2017 Feb 08]; 16(1):7-14. Available from: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1657-59972016000100002&lng=en
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Nesse sentido, buscou-se um arcabouço teórico de enfermagem que sustentasse a filosofia paliativista a qual se propõe a proteger a vida em sua plenitude, mesmo em situações limítrofes, possibilitando que o doente usufrua a possibilidade de bem-estar na medida em que experiencia o processo de terminalidade. Logo, destacou-se a Teoria do Final de Vida Pacífico (Theory of the Peaceful End of Life) que propõe o alívio dos medos e ansiedade, reais e/ou percebidos, para o paciente e sua família.66 Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75.
Dessa forma, o enfermeiro poderia criar um final de vida mais tranquilo e não simplesmente completar as tarefas do cotidiano hospitalar junto ao paciente. Esta teoria, criada em 1998 por Cornelia Ruland e Shirley Moore, ambas enfermeiras, permite que o profissional de enfermagem conheça a complexidade do cuidar de um doente terminal e como pode contribuir para o fim de vida tranquilo.66 Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75.
É inegável a importância da Teoria do Final de Vida Pacífico para subsidiar a prática do enfermeiro à luz dos cuidados paliativos. Ressalta-se ainda a importância de promover a Teoria em virtude da escassez de trabalhos acerca da temática no cenário nacional.
Este estudo tem como objetivo avaliar a Teoria do Final de Vida Pacífico, seguindo um quadro de avaliação de teorias de enfermagem. Assim, o julgamento da mencionada teoria justifica-se pela produção de um comentário descritivo, analítico e crítico, a fim de ampliar a compreensão da teoria, induzir ao aperfeiçoamento de seus conceitos e disseminar suas proposições para a comunidade científica.
MÉTODO
Trata-se de uma reflexão desenvolvida por meio da investigação da Teoria do Final de Vida Pacífico e sua aplicação na prática de enfermagem em cuidados paliativos, utilizando, para tanto, o manuscrito original da teoria, outros textos de suas autoras, além de artigos que a utilizaram como referencial teórico.
Para o alcance do objetivo do estudo, foi utilizado o quadro de análise e avaliação das teorias de enfermagem. Ele enfatiza as características mais importantes de grandes teorias e as teorias de médio alcance e é apropriado para o nível de abstração desses dois tipos de teorias de enfermagem.
A análise do estudo seguiu o modelo atualizado proposto por Fawcett.77 Fawcett J. Contemporary nursing knowledge: Analysis and Evaluation of Nursing Models and Theories. 3ª ed. Philadelphia (US): F.A. Davis Company; 2013. O quadro foi publicado pela primeira vez há muitos anos e desde então passou por refinamento repetido. Este aperfeiçoamento foi motivado pela insatisfação com outros quadros, principalmente por causa de seu fracasso em distinguir, entre modelos conceituais, grandes teorias e teorias de médio alcance. A versão atual do quadro reflete uma maior compreensão da relação de modelos conceituais e teorias de enfermagem considerando o metaparadigma, filosofias, e indicadores empíricos.
Tal análise envolve um exame imparcial e detalhado da teoria, incluindo escopo, contexto e conteúdo da Teoria. Já a avaliação requer julgamentos a serem feitos na medida em que uma teoria satisfaça certos critérios, ou seja, a avaliação baseia-se nos resultados da análise, bem como na revisão de críticas publicadas anteriormente, relatórios de pesquisa e relatos de aplicações práticas. Estes critérios são: significância, consistência interna, parcimônia, testabilidade, adequação empírica e adequação pragmática.
RESULTADOS E REFLEXÃO
O primeiro passo na análise é classificar a Teoria quanto ao seu escopo. As grandes teorias são amplas em escopo e substantivamente não específicas; seus conceitos e proposições são relativamente abstratos. Teorias de médio alcance, em contraste, são mais circunscritas e substantivamente específicas. Além disso, as teorias de médio alcance são classificadas como descritivas, explicativas ou preditivas.77 Fawcett J. Contemporary nursing knowledge: Analysis and Evaluation of Nursing Models and Theories. 3ª ed. Philadelphia (US): F.A. Davis Company; 2013.
A Teoria do Final de Vida Pacífico tem como escopo “melhorar a qualidade de vida e atingir um fim de vida pacífico em pacientes terminais, relacionado com as intervenções de enfermagem e resultados específicos para este grupo de doentes”.66 Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75.:171 Diante disso, pode ser considerada uma teoria de médio alcance e preditiva.
Com relação ao contexto, este abrange a identificação de reivindicações filosóficas em que a Teoria se baseia. A Teoria do Final de Vida Pacífico baseia-se na Teoria do Conforto de Kocalba. Conforto é a experiência holística imediata de ter necessidades atendidas em quatro contextos de experiência (físico, psicoespiritual, social e ambiental).88 Ponte KMA, Silva LF, Aragão AEA, Guedes MVC, Zagonel IPS. Clinical nursing care to comfort women with acute myocardial infarction. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2014 Mar [cited 2017 Feb 09]; 23(1):56-64. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000100056&lng=pt
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Na Teoria do Conforto, o enfermeiro realiza ações para aumentar o nível de conforto do paciente com resultado esperado positivo, enquanto na Teoria do final de vida paífico o enfermeiro ajuda o paciente/família a alcançar uma morte pacífica.
O Conteúdo de uma teoria é articulado por meio de conceitos e proposições da teoria. Os conceitos de uma teoria são palavras ou grupos de palavras que expressam uma imagem mental de algum fenômeno. Eles representam o vocabulário especial de uma teoria. Além disso, os conceitos dão sentido ao que pode ser imaginado ou observado por meio dos sentidos.
A Teoria é sustentada pelos seguintes conceitos: não estar com dor (evitar que o paciente experimente sofrimento ou desconforto, pois a dor é considerada uma experiência desagradável em sua totalidade, seja ela emocional ou sensorial); experiência de conforto (o alívio do desconforto, o relaxamento e a satisfação fazem parte de uma vida boa e prazerosa, proporcionando o bem-estar do paciente); experiência de dignidade/respeito (o paciente em fase terminal é um ser humano com autonomia e merecedor de respeito, devem-se considerar suas vontades, sem descartar seu direito de defesa, mesmo que este esteja dependente); estar em paz (é proporcionar maior tranquilidade nos aspectos físicos, psicológicos e espirituais); e proximidade com pessoas importantes/pessoas que se preocupam (permitir que os pacientes terminais tenham maior proximidade com seus familiares, amigos e/ou pessoas que o cuidam).
A expressão gráfica dos conceitos adotados pela Teoria do Final de Vida Pacífico são apresentados na figura 1:
Ainda sobre o conteúdo da Teoria, é importante evidenciar as proposições não-relacionais, que descrevem conceitos e sua definição constitutiva. A Teoria do Final de Vida Pacífico não define o conceito de dor, uma vez que tem sido bem descrita na literatura, entretanto, traz a descrição informada pela taxonomia da Associação Internacional para o Estudo da Dor. A experiência de conforto foi explicada como tudo o que torna a vida fácil ou agradável. A experiência da dignidade foi definida como noção de valor e é um atributo importante para um doente terminal, que envolve ser reconhecido e respeitado como um igual e não ser exposto a qualquer coisa que viole a integridade e os valores do paciente. Estar em paz envolve a sensação de calma, harmonia e contentamento, não ser incomodado por ansiedade, nervosismo, preocupações e medo. Proximidade com outros significativos é o sentimento de conexão com outros seres humanos que se importam.
As proposições relacionais correspondem às associações ou ligações entre dois ou mais conceitos e exprimi-se na Teoria da seguinte maneira: „as experiências do paciente de não estar com dor, conforto, dignidade e respeito, estar em paz; a proximidade com outros significativos ou pessoas que se importam contribuem para um fim de vida pacífico”.66 Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75. Considerando que estes cinco conceitos constituem os indicadores de resultados da Teoria, as intervenções de enfermagem que contribuem para esse fim são os seus prescritores.
A avaliação de uma teoria, segundo Fawcett,77 Fawcett J. Contemporary nursing knowledge: Analysis and Evaluation of Nursing Models and Theories. 3ª ed. Philadelphia (US): F.A. Davis Company; 2013. vai além de sua análise. Nesta, leva-se em consideração apenas a obra, já a avaliação permite inferências e o julgamento de materiais que se basearam na teoria.
O primeiro passo na avaliação centra-se na significância que requer justificação da importância da teoria para a disciplina de enfermagem, sendo atendido quando as origens metaparadigmáticas e autores de enfermagem influentes são explícitos. Com relação aos conceitos do metaparadigma, estes foram inicialmente identificados por Fawcett em 1978 e denominados unidades centrais de enfermagem, quais sejam: pessoa (atualizado posteriormente para ser humano), meio ambiente, saúde e enfermagem. Tais conceitos são inerentes à prática da enfermagem, que é o cuidado em toda sua complexidade.77 Fawcett J. Contemporary nursing knowledge: Analysis and Evaluation of Nursing Models and Theories. 3ª ed. Philadelphia (US): F.A. Davis Company; 2013.
De acordo com a teoria de Ruland e Moore,66 Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75. pessoa é definido como: ser único, cujos acontecimentos e sentimentos no processo do final da vida são pessoais e individuais em cada ser vivo; enfermagem: tem o papel de proporcionar o melhor cuidado possível para o paciente terminal por meio de tecnologias e medidas de bem-estar com a finalidade de melhorar a qualidade de vida e alcançar uma morte tranquila; saúde: é a busca em minimizar a dor e o desconforto sofrido pelo paciente terminal; e, meio ambiente: é o espaço que proporciona o melhor estado de harmonia e calma, com a aproximação da família e pessoas queridas para dar-lhe uma atenção efetiva. Aplicando-se o critério de significância à teoria de Ruland e Moore, observa-se que os conceitos de metaparadigma (ser humano, ambiente, saúde, enfermagem) estão explícitos, conforme demonstrado anteriormente.
Para as teóricas, não existe uma teoria particular de enfermagem que influenciou diretamente o desenvolvimento de seu trabalho. Entretanto, são citados vários autores de teorias de médio alcance que surgiram na literatura e que desenvolveram trabalhos cada vez mais aplicáveis e com testabilidade em situações clínicas. Exemplos dessas teorias são: a Teoria da Incerteza na Doença de Mishel,99 Lenz ER. Role of middle range theory for research and practice. In: Proceedings of the Sixth Rosemary Ellis Scholar's Retreat. Nursing Science: Implications for the 21st Century. Cleveland (US): Case Western Reserve University; 1996. a Teoria da Promoção a Saúde de Pender1010 Mishel MH. Reconceptualization of the uncertainty in illness theory. Image: J Nurs Scholarship. 1990; 22:256-62. e a Teoria dos Sintomas Desagradáveis de Lenz.1111 Pender NJ. Health promotion in nursing. 2nd ed. Norwalk (US):Appleton & Lange; 1987.
O critério de consistência interna exige que os conceitos da Teoria apresentem clareza semântica, atendida quando uma definição constitutiva é dada para cada conceito, e coerência semântica, quando o mesmo termo e a mesma definição são utilizados para cada conceito em todas as discussões do autor sobre a Teoria, sendo todos estes cumpridos pela Teoria.
Além disso, apresenta consistência estrutural, ou seja, os conceitos utilizados na Teoria do Final de Vida Pacífico estão inter-relacionados, o que proporciona uma visão única para a prática da enfermagem, não havendo contradições evidentes nas proposições relacionais.
O critério de parcimônia é cumprido quando as declarações esclarecem em vez de obscurecer os fenômenos de interesse. Este critério requer que uma teoria se afirme da maneira mais econômica possível sem simplificar demais os fenômenos de interesse. Isto significa que, quanto menos os conceitos e proposições necessitem de explicações complexas sobre os fenômenos de interesse, melhor.
A Teoria pode ser caracterizada como parcimoniosa visto que apresenta apenas cinco conceitos e estes estão bem relacionados. Além disso, podem ser usados com facilidade por enfermeiros e alunos de enfermagem, ao prestar cuidado a pacientes de diversas religiões, sejam elas de cultura ocidental ou não ocidental. Estudo sobre cuidado holístico de pacientes budistas criou um guia prático para promover uma morte pacífica sintetizado a partir da Teoria do Final de Vida Pacífico.1212 Kongsuwan WL, Chaipetch O, Matchim Y. Thai buddhist families' perspective of a peaceful death in ICUs. Nurs Crit Care. 2012 May-Jun; 17(3):151-9.
A testabilidade é considerada como a principal característica de uma teoria cientificamente útil. As teorias de médio alcance cumprem com o critério de testabilidade quando os instrumentos específicos ou protocolos têm sido desenvolvidos para observar os conceitos da teoria e técnicas estatísticas disponíveis para medir as afirmações feitas pelas proposições.
Sobre este quesito, a Teoria influencia as diversas intervenções de enfermagem e é amplamente utilizada em hospitais e serviços de cuidados paliativos no mundo inteiro, a exemplo de Viena, em que os doentes podem fazer as refeições quando querem e estas são mantidas por mais tempo ou até quando lhes convém; se estão dormindo, não são despertados (a menos que solicitado); os quartos compartilhados podem ser divididos por cortinas, garantindo paz e privacidade; sala de estar disponível para pacientes e familiares; área exclusiva para o uso de cigarro ou qualquer outro produto que pode ser fumado, assim como banhos calmantes, aromaterapia, massagens relaxantes e música também são oferecidos.1313 Strebl M. Respekt und empathie: theory of peaceful end of life und ihre umsetzung am beispiel der palliativstation St. Raphael. ProCare. 2013; 18(6-7):1-3.
Nos Estados Unidos,1414 Wholihan D. Seeing the light: end-of-life experiences - visions, energy surges, and other death bed phenomena. Nurs Clinic North America. 2016; 51(3):489-500. os enfermeiros são estimulados a identificar aspectos holísticos durante o cuidado do paciente terminal e fenômenos do leito de morte, que incluem visões, sonhos, alucinações e surtos de energia pré-mórbidos. As últimas horas da vida são sagradas e os enfermeiros devem permanecer abertos a experiências que não são facilmente explicadas dentro de um modelo médico tradicional. Como os cuidadores mais consistentes, os enfermeiros avaliam, reconhecem e validam essas experiências para ajudar os pacientes a encontrar significado, conforto e um fim de vida pacífico.
Na Tailândia, membros da família participam ativamente na promoção de uma morte pacífica para seus entes queridos. Para as enfermeiras tailandesas, uma morte pacífica consiste na paz de espírito e não apresentar sinais e sintomas de sofrimento. A morte pacífica ocorre também quando os membros da família declaram a aceitação da morte ou da eventual morte. A aplicação da Teoria incentivou os enfermeiros a estar com, e fornecer cuidados paliativos para pacientes terminais e famílias.1212 Kongsuwan WL, Chaipetch O, Matchim Y. Thai buddhist families' perspective of a peaceful death in ICUs. Nurs Crit Care. 2012 May-Jun; 17(3):151-9.
No Brasil, entretanto, não foram encontrados artigos que utilizassem a Teoria no período investigado. Contudo, não se pode inferir que a Teoria do Final de Vida Pacífico é desvalorizada nos espaços acadêmicos e profissionais brasileiros. A escassez da produção científica nacional sobre as teorias da enfermagem é uma realidade, apenas 4,6% das publicações em periódicos da área utilizaram alguma teoria de enfermagem. Destarte, urge a maior disseminação da teoria a fim de subsidiar pesquisas no âmbito nacional.1515 Porto AR, Thofehrn MB, Dal Pai D, Amestoy SC, Joner LR, Palma JS. Nursing theories and models that enhance professional practice. Rev Pesq: Cuidado é Fundamental Online [Internet]. 2013 Dec [cited 2017 Feb 11]; 5(Spe):155-61. Available from: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/1720
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O critério de adequação empírica requer que as afirmações feitas pela teoria sejam congruentes com provas empíricas, ou seja, à medida que uma teoria satisfaz o critério de adequação empírica é determinada por meio de uma revisão sistemática dos resultados de todos os estudos que têm sido orientados pela teoria.
Como pode ser esperado para uma teoria recente, nem todas as declarações têm suporte empírico. Portanto, esta Teoria requer testes para afirmar sua validade empírica, determinando se todas as declarações são indispensáveis ou se declarações adicionais são necessárias para permitir que doentes terminais experimentem um fim pacífico da vida.
A adequação pragmática requer que a teoria seja baseada em ações socialmente significativas, conduzindo a resultados favoráveis, que incluem: redução das complicações, melhoria nas condições de saúde e aumento da satisfação com as ações baseadas na teoria por parte de todos os que participam.
Especialmente em instituições estabelecidas, a exemplo do Centro Paliativista St. Raphael,1313 Strebl M. Respekt und empathie: theory of peaceful end of life und ihre umsetzung am beispiel der palliativstation St. Raphael. ProCare. 2013; 18(6-7):1-3. a teoria da Ruland e Moore tem tido grande ênfase e cada vez mais as políticas e diretrizes para lidar com pacientes terminais estão ligadas à teoria. Ressalta-se o valor de disseminar os conceitos da Teoria na orientação de pacientes e familiares para que possam tornar a realidade de ter uma doença fatal mais amena ao permitir o caminhar conjunto de equipe de saúde, paciente e família. Destaca-se ainda a possibilidade de contribuir para o encontro da estabilidade do cuidado no lar mediante escuta ativa, diálogo aberto e atitudes humanizadas, fatores que permitem ao enfermeiro uma assistência em consonância com os desejos e necessidades do paciente.1616 Wakiuchi J, Salimena AMO, Sales CA. Being cared by a family member: the existential feelings of cancer patients. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2015 Jun [cited 2017 May 14]; 24(2):381-9. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072015000200381&lng=en
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Assim, a Teoria tem bom alcance em ambientes paliativos e seus cinco conceitos cobrem muitas áreas importantes na ação paliativa.
Contudo, tem como limitação não apresentar testabilidade no Brasil, comprovado pela incipiência de estudos utilizando a temática. Portanto, torna-se relevante a realização de novas pesquisas acerca da teoria na prática clínica do enfermeiro em serviços de cuidados paliativos.
CONCLUSÃO
Este estudo consistiu na avaliação da Teoria do Final de Vida Pacífico sob a ótica de Fawcett. Quanto ao “escopo”, é considerada uma teoria de médio alcance e preditiva. Tem seu “contexto” baseado na teoria do Conforto de Kocalba. No conteúdo apresenta conceitos definidos, bem delimitados e inter-relacionados.
A Teoria tem significância ao definir explicitamente os conceitos do metaparadigma; tem consistência interna ao dar uma definição para cada conceito e utilizá-los sem apresentar contradição, é parcimoniosa podendo ser utilizada por enfermeiros direcionada aos pacientes em final de vida e seus familiares, visto que apresenta conceitos e proposições condizentes com àquelas propostas pelos cuidados paliativos.
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Trabalho desenvolvido na disciplina Análise Crítica de Teorias de Enfermagem do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, doutorado, do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal da Paraíba. Estudo financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
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Estudo financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
REFERÊNCIAS
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1Fernandes MA, Evangelista CB, Platel ICS, Agra Glenda, Lopes MS, Rodrigues FA. Percepção dos enfermeiros sobre o significado dos cuidados paliativos em pacientes com câncer terminal. Ciênc Saúde Coletiva. 2013; 18(9):2589-96.
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2World Health Organization [Internet]. Global Atlas of Palliative Care at the End of Life. London, 2014 [cited 2016 Dec 18]. Available from: http://www.who.int/nmh/Global_Atlas_of_Palliative_Care.pdf
» http://www.who.int/nmh/Global_Atlas_of_Palliative_Care.pdf -
3Burlá C, Py L. Palliative care: science and protection at the end of life. Cad Saúde Pública [Internet]. 2014 Jun [cited 2017 Feb 09]; 30(6):1139-41. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2014000601139&lng=en
» http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2014000601139&lng=en -
4Ferreira MAL, Pereira AMNA, Martins JCA, Barbieri-Figueiredo MC. Palliative care and nursing in dissertations and theses in Portugal: a bibliometric study. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016 Apr [cited 2017 Feb 11]; 50(2):317-23. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342016000200317&lng=en
» http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342016000200317&lng=en -
5Hanna DR. A proposal for certification in nursing theory. Aquichán [Internet]. 2016 Jan [cited 2017 Feb 08]; 16(1):7-14. Available from: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1657-59972016000100002&lng=en
» http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1657-59972016000100002&lng=en -
6Ruland CM, Moore SM. Theory construction based on standards of care: A proposed theory of the peaceful end of life. Nurs Outlook. 1998; 46:169-75.
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7Fawcett J. Contemporary nursing knowledge: Analysis and Evaluation of Nursing Models and Theories. 3ª ed. Philadelphia (US): F.A. Davis Company; 2013.
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8Ponte KMA, Silva LF, Aragão AEA, Guedes MVC, Zagonel IPS. Clinical nursing care to comfort women with acute myocardial infarction. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2014 Mar [cited 2017 Feb 09]; 23(1):56-64. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072014000100056&lng=pt
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9Lenz ER. Role of middle range theory for research and practice. In: Proceedings of the Sixth Rosemary Ellis Scholar's Retreat. Nursing Science: Implications for the 21st Century. Cleveland (US): Case Western Reserve University; 1996.
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10Mishel MH. Reconceptualization of the uncertainty in illness theory. Image: J Nurs Scholarship. 1990; 22:256-62.
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11Pender NJ. Health promotion in nursing. 2nd ed. Norwalk (US):Appleton & Lange; 1987.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
2017
Histórico
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Recebido
31 Mar 2017 -
Aceito
09 Ago 2017