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A comunicação do enfermeiro cirúrgico na orientação do paciente: a influência cultural<a name=volta></a>

Communication of nurses in surgical units in the orientation of patients: cultural influence

La comunicación del enfermero quirúrgico en la orientación del paciente: la influencia cultural

Resumos

Este estudo teve como objetivo descrever a influência da cultura na interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação do paciente. Sob o enfoque metodológico da etnografia, os autores descrevem as características da interação verbal relacionadas com o conhecimento, as crenças, os valores, os padrões e a organização do trabalho, no contexto cultural.

comunicação, orientação; enfermagem cirúrgica; cultura


The aim of this study was to describe the influence of culture on the verbal interactions of the surgical nurse in the orientation of patients. On the basis of ethnography, authors describe the characteristics of the verbal interaction related to knowledge, beliefs, values, pattterns and work organization, in the cultural context.

communication; orientation; surgical nursing; culture


Este estudio tubo como objetivo describir la influencia de la cultura en la interacción verbal del enfermero quirúrgico en la orientación del paciente. Utilizando la etnografía como enfoque metodológico, los autores describen las características de la interacción verbal relacionadas con el conocimiento, las creencias, los valores, los patrones y la organización del trabajo, en el contexto cultural.

comunicación; orientación; enfermeria quirúrgica; cultura


ARTIGOS ORIGINAIS

A comunicação do enfermeiro cirúrgico na orientação do paciente: a influência cultural1 1 Trabalho apresentado no 5º Simpósio Brasileiro de Comunicação em Enfermagem.(SIBRACEn), 1996

Communication of nurses in surgical units in the orientation of patients: cultural influence

La comunicación del enfermero quirúrgico en la orientación del paciente: la influencia cultural

Márcia Maria Fontão ZagoI; Lisete Diniz Ribas CasagrandeII

IEnfermeira. Professor Doutor junto ao Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - USP

IIPedagoga. Professor Doutor junto ao Departamento de Educação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP

RESUMO

Este estudo teve como objetivo descrever a influência da cultura na interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação do paciente. Sob o enfoque metodológico da etnografia, os autores descrevem as características da interação verbal relacionadas com o conhecimento, as crenças, os valores, os padrões e a organização do trabalho, no contexto cultural.

Unitermos: comunicação, orientação, enfermagem cirúrgica, cultura

ABSTRACT

The aim of this study was to describe the influence of culture on the verbal interactions of the surgical nurse in the orientation of patients. On the basis of ethnography, authors describe the characteristics of the verbal interaction related to knowledge, beliefs, values, pattterns and work organization, in the cultural context.

Key words: communication, orientation, surgical nursing, culture

RESUMEN

Este estudio tubo como objetivo describir la influencia de la cultura en la interacción verbal del enfermero quirúrgico en la orientación del paciente. Utilizando la etnografía como enfoque metodológico, los autores describen las características de la interacción verbal relacionadas con el conocimiento, las creencias, los valores, los patrones y la organización del trabajo, en el contexto cultural.

Términos claves: comunicación, orientación, enfermeria quirúrgica, cultura

INTRODUÇÃO

A comunicação é essencial para o relacionamento enfermeiro/paciente. Pela comunicação, o enfermeiro pode identificar os significados que o paciente atribui à doença, à hospitalização e ao tratamento cirúrgico.

O ensino do paciente cirúrgico, compreendido como o processo de desenvolvimento de habilidades com as quais ele pode ter favorecida a sua reabilitação à cirurgia, como agente ativo, é parte do processo de educação à saúde. Entretanto, o ensino pelo enfermeiro e a aprendizagem do paciente são atividades que dependem da comunicação desenvolvida por ambos os agentes.

Preocupadas com a influência cultural na comunicação do enfermeiro, no processo de ensino do paciente cirúrgico, este estudo teve como objetivo: "descrever a influência da cultura na interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação do paciente".

A INTERSECÇÃO ENTRE COMUNICAÇÃO E ENSINO DE PACIENTE

Segundo BARTLET1 a educação de paciente é uma experiência de aprendizagem planejada, utilizando-se uma combinação de métodos como o ensino, o aconselhamento, a comunicação, que influenciam a modificação de comportamentos cognitivos, psicomotores e afetivos. Com o conhecimento desenvolvido, o paciente pode alterar o seu comportamento de saúde.

REDMAN11 considera o ensino de pacientes como um processo interativo entre o enfermeiro e o paciente. O enfermeiro centra-se em atividades que promovem o ensino e avaliam as aprendizagens que ocorrem. Para a autora, o ensino de paciente é essencialmente um processo de comunicação verbal e não-verbal, pelo qual o enfermeiro identifica e supre as necessidades de aprendizagem do paciente.

Há vários autores que descrevem a intersecção entre a comunicação e a atividade educativa do enfermeiro. STEFANELLI14 descreve-a através de três premissas: "o enfermeiro deve ser um comunicador por excelência"; "o enfermeiro é educador e a educação é, sobretudo,comunicação" e "o enfermeiro é agente de mudanças de comportamentos nos aspectos de saúde" (p.21).

Assim, o modo como o enfermeiro comunica-se com o paciente será fundamental para o planejamento e efetivação do ensino. Consideramos que os elementos da comunicação, como o contexto, os canais, a mensagem, o conteúdo, o efeito da resposta no receptor, são, também, essenciais para o ensino e a aprendizagem.

O REFERENCIAL TEÓRICO: A CULTURA INFLUENCIANDO A COMUNICAÇÃO E O ENSINO DO PACIENTE

A atividade educativa do enfermeiro cirúrgico tem a sua origem na década de 40. Em vários estudos, os enfermeiros perceberam que as complicações pós-operatórias poderiam ser minimizadas ou evitadas pelo processso educativo do paciente, durante o período perioperatório7,10. Atualmente, é creditada ao ensino de paciente a minimização da ansiedade e das complicações pós-operatórias, como também, a participação ativa do paciente na sua reabilitação4,5.

Os enfermeiros cirúrgicos são influenciados pela cultura da profissão. Desde a década de 70, esses profissionais têm sido formados e convivido com a valorização da orientação do paciente, pela literatura nacional e internacional.

A cultura de um grupo é composta de: conhecimento (idéias), crença (aceitação de uma proposição como verdadeira), valores (sentimentos que incentivam o comportamento humano), normas (regras que indicam o modo de agir) e símbolos (realidades valorativas). Esses elementos podem ser compreendidos através dos traços culturais (componentes significativos no comportamento cultural), do padrão cultural (comportamento generalizado) e da configuração cultural (estrutura de referência)6,10.

As idéias, abstrações e comportamentos comuns de um grupo social constituem a essência da cultura. A vida social, em qualquer agrupamento humano, ordena-se através do costume, e esses costumes possuem significado para os membros do grupo. Deste modo, a vida social é ordenada por meio de símbolos. Os sistemas simbólicos são modelos de representações e são orientações para a prática coletiva. Esses sistemas simbólicos determinam a cultura6,9,16. Considerando os enfermeiros cirúrgicos como uma subcultura da Enfermagem, esses profissionais têm uma cultura própria que fundamenta as diversas atividades realizadas no cotidiano; entre elas, o foco dessa investigação: a interação verbal do enfermeiro na orientação do paciente.

O CAMINHAR METODOLÓGICO

Esse estudo foi fundamentado na abordagem etnográfica. Consistiu no estudo de caso de um grupo de enfermeiros cirúrgicos que atuam em enfermarias cirúrgicas de um hospital universitário. Cerca de 11 enfermeiros participaram do estudo como informantes.

Os dados foram coletados no decorrer de doze meses de convivência do pesquisador no campo. Utilizamos a observação participante e a entrevista semi-estruturada, como métodos de coleta de dados, seguindo os conceitos de BOGDAN & BIKLEN2.

Os dados foram transcritos no computador e organizados com o auxílio do software "The Ethnograph"13,16.

A análise dos dados iniciou com a procura de termos de significado, dentre as transcrições das observações e entrevistas. O agrupamento destes termos originaram categorias de significado. Identificamos 5 categorias que foram, posteriormente, validadas pelos informantes.

Do aprofundamento dessas categorias, desvelamos a descrição da influência cultural na interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação do paciente.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A- O contexto cultural

Os onze enfermeiros que paticiparam do estudo eram todos do sexo feminino; suas idades variavam de 28 a 49 anos e todos possuiam mais de 8 anos de serviço na unidade.

A organização do trabalho segue o modelo funcional, através de rotinas. Nas normas de serviço, a atividade educativa com o paciente é função de todos os enfermeiros, independentemente do cargo ocupado. Esses aspectos formam o contexto cultural em estudo. Entre os informantes, a atividade educativa com o paciente é denominada "orientação rotineira".

Segundo o enfermeiro mais antigo da unidade, a orientação de pacientes surgiu como uma norma do serviço, com o objetivo de promover a interação, e portanto, a interação do enfermeiro com o paciente, em diferentes etapas da internação:

"A preocupação com a orientação começou pela falta de aproximação do enfermeiro com o doente... para se garantir que o enfermeiro tivesse um contato com o doente pelo menos na internação... A partir daí, o enfermeiro tem que orientar o paciente pelo menos na internação. E foi uma coisa da instituição. E na questão da alta, surgiu pra garantir que se evitasse acidentes com o paciente. No encaminhamento cirúrgico também..."

Neste mesmo contexto, não há nenhum preparo do enfermeiro, no serviço, para realizar a atividade:

"A gente tenta conversar e mostrar para o enfermeiro que isso é importante, mas, não há nada específico! Quando eu vou orientar um paciente, eu chamo o enfermeiro para ver como eu faço. A gente aprende no dia-a-dia".

B- As categorias de significado

As categorias que serão abaixo descritas, nos fornecem a forma de pensar, analisar e sintetizar a prática da comunicação na orientação dos pacientes.

b.1. A concepção da interação verbal na orientação, pelo enfermeiro

A primeira categoria de significado expressa a natureza da interação. Para alguns ela é caracterizada por sua rotinização, repetição e generalidade, o que pode ser entendido nas seguintes falas:

"Essa que nós fazemos, fazemos todos os dias, é mais simples, é mais um be-a-bá. Essa eu tenho experiência..."

"Olha, a orientação rotineira é bem dentro do esquema mesmo, a gente fala..."

Em outras falas, a orientação é expressa como sendo um mínimo, superficial. O sentido dessa superficialidade parece referir-se à quantidade e qualidade do conteúdo das informações. Também tem o significado de reforço:

"Então, eu chego e falo para a paciente: olha, você vai fazer uma cirurgia, assim, assim; e explicar, né, o mínimo possível."

"É alguma coisa, por cima. Em relação a marcapasso, por exemplo, eu oriento: oh, não pode fazer força..."

"A gente reforça esse tipo de orientação que já vem do médico: evita gordura, isso não faz bem para ninguém, etc e tal."

b.2. O modo de fornecer as mensagens

O modo como os enfermeiros desenvolvem a interação verbal caracteriza-se, essencialmente, pela utilização da linguagem verbal-oral. Para designar a ação educativa são utilizados os verbos fazer, falar, conversar, explicar e mostrar. Mesmo quando os enfermeiros expressam a ação com os verbos explicar e mostrar, estão se referindo a explicar e mostrar com as palavras:

"O que é orientar? É eu chegar e falar pro doente o que ele vai fazer!

"Esse jeito? Você chega para o paciente, explica... porque vai fazer colostomia ... Então, você fala ..."

"Eu falo o que vão fazer. Nem sempre eles entendem. Então, é melhor ficar só nisso."

Nas observações, detectamos que esse modo de falar pode ocorrer de modo autoritário ou afetivo. O autoritarismo do enfermeiro está implícito no diálogo observado entre enfermeiro (ENF) e paciente (PAC), durante a orientação no pós-operatório. A sigla NC refere-se à nota de campo:

ENF: Senhor X, o senhor almoçou hoje?

PAC: Um pouco... ( com a voz muito baixa)

ENF: Fala alto! Não almoçou bem ?

PAC: Estou sem apetite!

ENF: Precisa comer! (depois de alguns minutos) Senhor X, vou ver o seu corte.

ENF: O corte está direitinho. O senhor já andou hoje?

NC: E sem esperar a resposta continuou:

ENF: O senhor precisa andar! (com voz forte) Se andar o intestino vai funcionar, o senhor vai comer pela boca e logo sara.

NC: Cobriu o paciente com o lençol. Olhou para o paciente e:

ENF: Tem tido tosse? Não segura a tosse não! Precisa tossir sempre que tiver vontade para não dar pneumonia.

NC: O paciente manteve-se quieto e rígido no leito.

Um enfermeiro justificou o seu jeito autoritário de falar:

"Tem paciente que fica muito na sala de televisão. De vez em quando eu vou lá e dou umas broncas: oh, você tem que dormir porque é importante. Não pode ficar até muito tarde, amanhã cedo você vai pra cirurgia!"

Contrapondo-se ao modo autoritário, houve momentos em que o enfermeiro procurou desenvolver um diálogo mais afetivo com o paciente:

ENF: ...a senhora vai melhorar, a senhora vai ver!

PAC: Ontem eu não estava boa não, não sei porque?

ENF: Mas hoje a senhora está melhor!

NC: Enquanto falava com a voz pausada e com afeto, a enfermeira segurava a mão da paciente.

Quando os enfermeiros descrevem o seu modo de orientar, usam expressões que dão idéia de redução, diminuição, possivelmente na tentativa de amenizar a gravidade ou o impacto das suas palavras sobre o paciente:

"A gente passa em plantão: o paciente não está aceitando! Aí, outro vai lá e conversa outra vez com ele, né. Se continuar não aceitando, aí, vai falando, vai falando, todo dia alguém fala alguma coisinha pra ele."

b.3. O conteúdo das mensagens

Para cada momento do perioperatório, os enfermeiros abordam um conteúdo específico de orientação. Entretanto, o conteúdo referente à orientação da alta é repetida para todos os pacientes de alta; o mesmo acontecendo com os conteúdos da orientação do pré e pós-operatório:

"Orientar um paciente cirúrgico, depende... Quando ele vai pra cirurgia, eu vou orientar desde tricotomia, colher contra-prova, quanto ao jejum, quando ele vai descer, quanto tempo ele vai demorar lá embaixo, o que vai acontecer lá embaixo... Depois vai para a recuperação, depois ele vai subir..."

"O paciente quando chega, eu falo: olha, o senhor vai ter que... ficar de repouso. Senão falo assim: oh, o senhor não... hoje o senhor não pode tomar líquido, não pode comer nada por isso, por isso, por isso... Vai ter que ficar com soro até amanhã."

"Na alta, a orientação é... eu ficou muito preocupada com as cartinhas, a retirada de pontos, a data do retorno... A gente abre o cartão e lê para eles e, inclusive, para avisar onde é que está escrito...

b.4. A avaliação da interação verbal-oral na orientação, pelo enfermeiro

As falas dos informantes descrevem a interação verbal -oral na orientação como sendo falha, deficiente:

"Eu acho assim, a orientação, nossa aqui, eu acho que ela é um pouco falha, tá. Você faz aquela orientação assim, sabe: a senhora vai pra cirurgia, vai passar numa sala de pré-anestesia, o anestesista vem aqui..."

Para explicar essa percepção, os enfermeiros relacionam várias dificuldades: a falta de compromisso do enfermeiro com a atividade, a falta de reconhecimento da atividade pela instituição, falta de entrosamento do enfermeiro com o médico, a falta de comunicação entre os enfermeiros, a falta de conhecimentos da doença, da cirurgia e suas consequências para o paciente:

"Ninguém pegou pra ele; assumiu a responsabilidade por essa atividade; tomou a frente".

"Mas, também, se ele não fizer... também... eu acho que não vai acontecer nada."

"A dificuldade... você tem que conversar com o médico primeiro para ver o que ele realmente vai fazer. Vai que você dá uma orientação errada, também, já pensou?"

"Eu acho que no caso aí, seria mais, ter um relacionamento melhor entre nós,entre os enfermeiros... falta entrosamento! Acho que tinha que ter um entrosamento melhor ou ter mais diálogos".

"Eu acho que, eu tenho alguma dificuldade em orientar certos tipos de pacientes, porque, eu às vezes não sei o que, como orientar, como vai ser feito, em certos tipos de cirurgia. A gente vê tantas!"

b.5. Os efeitos da interação verbal para o paciente

Para os enfermeiros, a interação verbal fornece segurança para o paciente:

"O paciente já vai ciente do que vai acontecer. Eu acho que ele fica muito mais tranqüilo, muito mais tranqüilo...

"Ah... ele fica mais, mais calmo, mais tranqüilo, eu acho! Confia mais, ele vai falar: ah, já que a enfermeira falou isso, já que o médico falou isso, o auxiliar veio e falou... Então, eu acho que ele tem mais segurança.

C- Discussão

Emergiram vários elementos culturais dos dados que influenciam a interação verbal-oral dos enfermeiros com os pacientes, na orientação.

O primeiros a ser discutido refere-se a origem da orientação no serviço. Está explícito que a atividade surgiu como uma norma para suprir a falta de relacionamento do enfermeiro com o paciente, nos diferentes momentos cirúrgicos. Além disso, o treinamento dos enfermeiros recém-ingressados na unidade, ocorre no dia-a-dia, copiando o que os mais antigos fazem. Como os informantes estão atuando no serviço há um período prolongado, tanto a orientação como a comunicação tornaram-se normas.

No modelo funcional de organização de trabalho, as normas transformam-se em rotinas e, consequentemente, a atividade transformou-se em "orientação rotineira". Analogamente, podemos considerar a "ïnteração verbal-oral rotineira".

Essa norma determina padrões culturais na interação. Entre as várias características da interação verbal, na orientação rotineira, a sua natureza repetitiva e a falta de ligação entre o fazer e o pensar, surgiram em muitas falas: "é um be-a-bá, é dentro do esquema, é o mínimo possível, por cima, é um reforço, sempre igual, eu faço assim, direitinho, é um hábito".

Por ser rotineira, o enfermeiro a executa seguindo um padrão de comunicação vertical, sem procurar desenvolver uma comunicação empática com o paciente. No seu modo de orientar, a interação consiste em "falando, explicando, mostrando". Os verbos utilizados expõe que a interação acontece apenas através da exposição oral, reduzindo o ato didático à exposição oral. Esse é um aspecto já abordado em outros estudos3,12.

Observamos que não há preocupação dos enfermeiros quanto à utilização de palavras próprias do contexto cultural do paciente. Palavras como "tricotomia, Centro Cirúrgico, refeitório, sonda, maca", que são da linguagem do profissional e não do paciente, são utilizadas com freqüência, o que nos permite afirmar que nem sempre são apreendidas pelo paciente.

Sendo rotineira, fragmentada e repetitiva, os conteúdos da orientação, em qualquer momento do período perioperatório, são "falados" segundo o conhecimento que o enfermeiro possui, ou seja, os procedimentos de rotina cirúrgica. A utilização de jargões e a falta de conhecimento dos profissionais quanto aos aspectos fisiológicos e patológicos, são considerados barreiras para a interação e o ensino de pacientes3,8,12. Esses aspectos, constituem-se em padrões culturais da interação e orientação.

Além desses elementos, emergiram dos dados algumas crenças. Os informantes têm uma percepção de que a comunicação na orientação rotineira "é falha, é deficiente, deveria estar melhor". Essa percepção avaliativa, no entanto, não são fundamentadas em nenhum processo formal de avaliação da atividade; ela é intuitiva. A avaliação é intuída das dificuldades dos enfermeiros, resultantes de causas externas e internas aos profissionais. Mesmo intuindo que a orientação rotineira "é falha", o enfermeiro utiliza-se da valorização e do conhecimento de que "a orientação é importante", para mantê-la sem transformação.

Como a orientação, a interação verbal-oral, do modo como é realizada, é valorizada pelos profissionais. A manutenção da execução da orientação rotineira e da interação verbal-oral é importante por vários motivos. Esses motivos não seguem um padrão mas variam segundo atitudes individuais dos profissionais. Assim, para alguns, a orientação rotineira é importante pois "é função do enfermeiro, vai de iniciativa nossa aqui, é uma postura nossa, ... uma coisa interna de cada um".

Por outro lado, para os enfermeiros a interação verbal-oral tem efeitos benéficos sobre o paciente. Esse significado consiste em uma crença derivada da experiência e do conhecimento adquirido nos anos de trabalho, pois não há nenhuma avaliação formal do real efeito dessa atividade. Os efeitos da orientação, na concepção dos enfermeiros, podem ser sintetizados na expressão: "ela atinge o psicológico do paciente". O enfermeiro pressupõe que mesmo sendo rotineira, fragmentada, repetitiva e falha, a orientação: "tranquiliza, dá segurança, o paciente colabora e fica bem psicológicamente". Desse modo, a orientação rotineira permite que o enfermeiro assuma uma atitude protetora, paternalista para com o paciente3.

A postura corporal, em algumas observações, refletiam a autoridade do profissional para com o paciente. O mesmo pode-se dizer do seu tom de voz. Esse comportamento representa o "poder"do profissional sobre o paciente e para com a atividade.

Os aspectos acima relatados, considerados dentro do enfoque pedagógico, refletem a influência do modelo comportamental de ensino4,11.

Frente aos aspectos da comunicação descritos neste estudo, consideramos que a interação verbal-oral desenvolvida na orientação do paciente, pelo enfermeiro, é inadequada e, consequentemente, a perspectiva educativa do processo é questionável. Esta afirmação está fundamentada nos resultados obtidos em outros estudos, que identificaram as mesmas características desse tipo de interação verbal3,4,12,15.

ZAGO16 estudando este mesmo grupo de enfermeiros, conceituou a orientação rotineira como uma ação ritualizada. Como ritual, a orientação tem funções sociais, psicológicas e protetoras, que são importantes para o enfermeiro. Entretanto, para o paciente, agente passivo do processo, a interação e a orientação não contribuem para o desenvolvimento das habilidades necessárias para a sua participação no tratamento e recuperação, como pressupõe o ensino.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse estudo fornece a descrição da interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação do paciente. Pelas características e elementos culturais ressaltados, consideramos-a uma ação padronizada e compreendida dentro do sistema de conhecimento e crenças dos enfermeiros cirúrgicos, incorporados durante os seus anos de trabalho no contexto social, ou seja, por sua cultura. Sendo a comunicação um dos mais importantes elementos para a efetividade do processo de educativo, consideramos que ela é inefetiva.

A interação verbal do enfermeiro cirúrgico, na orientação rotineira é um símbolo com significados específicos que, apesar das deficiências, contribui para a sua valorização, entre os enfermeiros cirúrgicos. É considerada importante e mantida pelo contexto cultural.

É importante salientar que a enfermagem cirúrgica, na sua origem, acompanhou o conhecimento médico-cirúrgico e, consequentemente, a sua prática seguiu pressupostos prescritivos e do modelo médico16. Essa prática, influenciada pela cultura do grupo, parece persistir nos dias atuais, entre os informantes desse estudo.

Segundo HELMAN6, nenhuma cultura é estática; mudanças podem acontecer. Neste contexto cultural, a educação continuada dos profissionais é um processo que pode transformar a cultura existente, mantendo a valorização da atividade educativa do paciente, porém, trazendo novas perspectivas à comunicação do enfermeiro e ao ensino de paciente.

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  • 1
    Trabalho apresentado no 5º Simpósio Brasileiro de Comunicação em Enfermagem.(SIBRACEn), 1996
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Nov 2005
    • Data do Fascículo
      Out 1997
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