EDITORIAL
Produção científica da enfermagem brasileira: a busca pelo impacto internacional
Maria Helena Palucci Marziale
Editor da Revista Latino-Americana de Enfermagem, Professor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem, e-mail: marziale@eerp.usp.br
A ciência pode ser considerada um mundo de idéias em movimento - o processo para a produção do conhecimento - e busca descobrir a unidade existente nas diferentes facetas da experiência do homem com o seu meio. A tecnologia, por sua vez, reflete e molda o sistema de valores e estende nossas habilidades para mudar o mundo, sendo uma força poderosa no desenvolvimento da civilização e própria de cada cultura(1). As tecnologias estreitaram sua ligação com a ciência, tornando difícil, em alguns campos, separar uma da outra. Como a tecnologia afeta o sistema social e cultural mais diretamente do que a pesquisa científica, as implicações imediatas de seus sucessos e fracassos refletem diretamente na atividade humana(2).
Assim, o desenvolvimento científico tornou-se um fator crucial para o bem-estar social a tal ponto que a distinção entre povo rico e pobre é hoje feita pela capacidade de criar ou não o conhecimento científico e sem instituições adequadas de educação superior em ciência e tecnologia e em pesquisa, com uma massa crítica de cientistas experientes, nenhum país pode ter assegurado um desenvolvimento real(3).
O avanço explosivo do conhecimento está marginalizando os povos que não dispõem de uma infra-estrutura de pesquisa associada à formação de recursos humanos de alto nível e a uma educação científica universal. A análise da situação do Brasil mostra a necessidade da expansão da base de pesquisa acadêmica e da inovação tecnológica e é destacada a urgência na mudança do sistema de ensino fundamental, médio e superior, passando de informativo para formativo, como meio de capacitação do homem para o mercado de trabalho, altamente dependente de um aprender contínuo(1).
O processo de produção do conhecimento no Brasil sempre esteve ligada ao crescimento da pós-graduação(4-9). O país busca, principalmente por meio dos cursos de pós-graduação, consolidar sua base científica e formar recursos humanos capacitados para solucionar problemas regionais e nacionais. Um objetivo importante do sistema de formação é habilitar pesquisadores que possam cumprir tais objetivos. Esses produtores de conhecimento deverão ter domínio do estado de conhecimento na área que atuam, capacidade de originar questões coerentes e atualizadas com domínio metodológico para testá-las. Com a estruturação de linhas de pesquisa autóctones, tornam-se multiplicadores na formação de novos pesquisadores e a produção originada deve ser referendada por avaliadores externos do contexto nacional e internacional(10).
Considerando a produção científica de impacto internacional no período de 1992 a 2001 em recente publicação da Science foi divulgado que o Brasil ocupa o 19º lugar no ranking quando considerado o fator de impacto da produção indexada no Institute for Scientific Information - ISI (11).
No entanto, a capacidade de inovação tecnológica no Brasil precisa se expandir para que se possa não só atender às necessidades imediatas da população com tecnologias apropriadas, como também produzir bens e serviços que impulsionem o desenvolvimento econômico(1).
O produto e o processo da atividade científica são dependentes da comunicação eficaz e as revistas especializadas são importantes veículos de divulgação do conhecimento científico. Tradicionalmente os descobrimentos científicos ganharão reconhecimento e credibilidade em função de sua publicação em revistas científicas de prestígio.
O prestígio da revista está relacionado à qualidade de arbitragem (revistas que apresentam) crítico processo de avaliação por pares (peer-review); a qualidade dos artigos publicados (rigor e originalidade dos artigos) e a visibilidade da publicação (conseguida pelas indexações nas bases de dados e pelo fator de impacto)(12).
O fator de impacto começou a ser considerado como instrumento de avaliação das revistas científicas a partir da década de 60, por Eugene Garfield, então diretor do ISI, como forma de classificar e avaliar as revistas incluídas na base. Só as revistas indexadas no ISI são consideradas para o calculo do fator de impacto que é feito dividindo-se o número de vezes em que os artigos de uma revista são citados em um determinado ano, em revistas indexadas pelo ISI, pelo número de trabalhos publicados pela revista nos dois anos anteriores(13).
A comunidade científica brasileira vem sendo altamente influenciada pelo fator de impacto das revistas onde ela publica os seus trabalhos. O fator de impacto, Science Citation Index (SCI), da base de dados do Institute for Scientific Information (ISI) divulgado pelo Journal Citation Reports (JCR),passou a ser utilizado pela maioria dos pesquisadores, instituições de ensino e pesquisa e agências financiadoras de pesquisa e pós-graduação, particularmente pela Capes e pelo CNPq(14).
O ISI tem a missão básica de oferecer cobertura às pesquisas mais importantes realizadas a nível mundial. A base de dados indexa aproximadamente, 16 mil periódicos em mais de 160 áreas de conhecimento.
Dentre estes estão 31 revistas de Enfermagem, rigorosamente selecionadas(13). Segundo uma pesquisa realizada por enfermeiras espanholas apenas 0,44% das revistas científicas indexadas no ISI é da área da Enfermagem, sendo a maioria delas de origem Angloxasônica e Norte Americana(15), e nenhuma revista de enfermagem da América Latina conseguiu ainda ser indexada na referida base de dados. Assim constata-se que a produção cientifica da Enfermagem tem pouca visibilidade internacional.
As revistas de Enfermagem indexadas no ISI(16), e seus respectivos fatores de impacto são: BIRTH-ISS PERINAT C (1.709); ADV NURS SCI (1.625); NURS OUTLOOK (1.169); NURS RES (1.129); CANCER NURS (1.101); RES NURS HEALTH (1.069); J ADV NURS (0.998); J MIDWIFERY WOM HEAL (0.890); J NURS SCHOLARSHIP (0.886); J SCHOOL HEALTH (0.868); J NURS ADMIN (0.855); NURS SCI QUART (0.815); J CLIN NURS (0.653); J PROF NURS (0.616); NURS EDUC TODAY (0.598); INT J NURS STUD (0.582); MIDWIFERY (0.523); NURS ETHICS (0.516); WESTERN J NURS RES (0.510); PUBLIC HEALTH NURS (0.505); APPL NURS RES (0.483); J PERINAT NEONAT NUR (0.467); J NURS EDUC 0.439 ; ARCH PSYCHIAT NURS (0.403); J NURS CARE QUAL (0.340); PERSPECT PSYCHIATR C (0.333) ; NURS CLIN N AM (0.281); GERIATR NURS 0.243; CIN-COMPUT INFORM NU (0.217); AM J NURS (0.193); NURS HIST REV (0.045).
Diante do atual contexto e considerando-se que a divulgação dos resultados das pesquisas é apenas uma das etapas do processo da produção do conhecimento, estratégias devem ser implementadas na área da Enfermagem no Brasil voltadas a formação de recursos humanos, a produção das pesquisas e a divulgação das produções. Faz se necessário modernizar o processo de formação dos enfermeiros; incentivar os jovens criativos envolvendo-os nas atividades de pesquisa e extensão; estimular os alunos a integrar os grupos de pesquisa das universidades com um objetivo comum, visando atender às demandas da sociedade; aos pesquisadores cabe a responsabilidade de encaminhar seus manuscritos a revistas arbitradas, referendado outras publicações nacionais da área publicadas em revistas brasileiras e aos editores de revistas cabe a adoção de esforços para melhoria da qualidade editorial e a indexação em bases de dados nacionais e internacionais. Esses podem ser considerados os desafios da Enfermagem contemporânea.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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6. Barreira IA. Pesquisa em enfermagem no Brasil e sua posição em agência federal de fomento. Rev Latino-am Enfermagem 1993 janeiro; 1(1):51-7.
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9. Leite JL, Trezza MCS, Santos RM, Mendes IAC, Felli VEA. Os projetos de pesquisa em enfermagem no CNPq: seu percurso, suas temáticas, suas aderências. Rev Bras Enfermagem 2001; 54(1):81-97.
10. UNESCO [homepage on the Internet]. Paris: Unesco; [update 2005 June; cited 2005 June 6]. Primary and Second Education: Age-specific enrolment ratios by gender 1960/61-1995/96; [about 2 screens]. Available from: http://www.unesco.org
11. Paraje G, Sadana R, Karam G. Increasing international gaps in health - related publications. Science 2005 May; 308(13):959-60.
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15. Coura JR, Willcox L de CB. Fator de Impacto, Produção Científica e Qualidade das Revistas Médicas Brasileiras. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 2003 abril; 98(3):293-7.
16. International Scientific Information. [homepage on the internet]. Stanford: ISI. [update 2005; cited 2003 June 6]. Ranking is based on your journal and sort selections; [about 1 screen]. Available from: http://www.isinet.com
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Jul 2005 -
Data do Fascículo
Jun 2005