Open-access Fatores relacionados ao desenvolvimento de hipotermia no período intra-operatório

Resumos

A pesquisa teve como objetivo analisar os fatores relacionados às alterações da temperatura corporal do paciente submetido à cirurgia eletiva no período intra-operatório. Para tal, realizou-se estudo correlacional, prospectivo, em um hospital filantrópico. Foi elaborado um instrumento e submetido à validação aparente e de conteúdo, o qual foi utilizado para a coleta de dados de 70 pacientes. A temperatura e umidade da sala de operação, a temperatura corporal do paciente em diferentes momentos foram as variáveis mensuradas. Na regressão linear multivariada, as variáveis tipo de anestesia, duração da anestesia, índice de massa corporal e a temperatura da sala de operação estavam diretamente relacionadas à temperatura corporal média dos sujeitos investigados. Compete ao enfermeiro o planejamento e implementação de intervenções efetivas que contribuam para minimizar custos e principalmente reduzir as complicações associadas à hipotermia.

hipotermia; enfermagem perioperatória; pesquisa


This study aimed to assess factors associated to body temperature changes intraoperatively in patients undergoing elective surgery. A prospective study including 70 patients was carried out in a charity hospital. A data collection instrument was developed and its face and content validity was established. The variables measured were operating room temperature and humidity and patient body temperature at different times. In the multivariate linear regression, the variables type of anesthesia, duration of anesthesia, body mass index, and operating room temperature were directly associated to mean body temperature. Nurses are responsible for planning and implementing effective interventions that can contribute to minimize costs and most importantly reduce hypothermia complications.

hypothermia; perioperative nursing; research


La investigación tuvo como objetivo analizar los factores relacionados a las alteraciones de la temperatura corporal del paciente sometido a cirugía electiva en el período intraoperatorio. Para esto, se realizó un estudio de correlación, prospectivo, en un hospital filantrópico. Fue elaborado un instrumento y sometido a validación aparente y de contenido, el cual fue utilizado para recolectar datos de 70 pacientes. La temperatura y humedad de la sala de operación y la temperatura corporal del paciente, en diferentes momentos, fueron las variables mensuradas. En la regresión linear multivariada, las variables: tipo de anestesia, duración de la anestesia, índice de masa corporal y temperatura de la sala de operación estaban directamente relacionadas a la temperatura corporal promedio de los sujetos investigados. Es el enfermero quien debe planificar e implementar intervenciones efectivas que contribuyan para minimizar los costos y principalmente reducir las complicaciones asociadas a la hipotermia.

hipotermia; enfermería perioperatoria; investigación


ARTIGO ORIGINAL

Fatores relacionados ao desenvolvimento de hipotermia no período intra-operatório1

Vanessa de Brito PovedaI; Cristina Maria GalvãoII; Claudia Benedita dos SantosIII

IEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Docente das Faculdades Integradas Teresa D'Avila, Brasil

IIEnfermeira, Professor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil, e-mail: crisgalv@eerp.usp.br

IIIEstatística, Professor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil, e-mail: cbsantos@eerp.usp.br

RESUMO

A pesquisa teve como objetivo analisar os fatores relacionados às alterações da temperatura corporal do paciente submetido à cirurgia eletiva no período intra-operatório. Para tal, realizou-se estudo correlacional, prospectivo, em um hospital filantrópico. Foi elaborado um instrumento e submetido à validação aparente e de conteúdo, o qual foi utilizado para a coleta de dados de 70 pacientes. A temperatura e umidade da sala de operação, a temperatura corporal do paciente em diferentes momentos foram as variáveis mensuradas. Na regressão linear multivariada, as variáveis tipo de anestesia, duração da anestesia, índice de massa corporal e a temperatura da sala de operação estavam diretamente relacionadas à temperatura corporal média dos sujeitos investigados. Compete ao enfermeiro o planejamento e implementação de intervenções efetivas que contribuam para minimizar custos e principalmente reduzir as complicações associadas à hipotermia.

Descritores: hipotermia; enfermagem perioperatória; pesquisa

INTRODUÇÃO

A hipotermia é evento comum e acomete acima de 70% dos pacientes submetidos ao procedimento anestésico-cirúrgico, podendo acarretar complicações relevantes(1). Esse evento ocorre principalmente devido à ação de anestésicos na termorregulação e à diminuição do metabolismo do paciente(2).

Outro fator importante consiste na exposição do paciente ao ambiente frio da sala de operação (SO), cuja temperatura varia de 18 a 23ºC. Essa temperatura mantém a equipe confortável, a qual utiliza os componentes da paramentação cirúrgica e, além do conforto, ressalta-se que um ambiente frio evita a proliferação de microrganismos, porém, o paciente freqüentemente está desnudo e será submetido a diversas situações que acarretam perda de calor como o uso de solução de antissepsia fria, exposição de grande área de pele, abertura da cavidade torácica ou abdominal, infusão de soluções frias, inalação de gazes anestésicos frios(3).

Dentre as complicações relacionadas ao desenvolvimento da hipotermia ressalta-se alteração no metabolismo de fármacos, alteração no metabolismo de proteínas, que pode comprometer a cicatrização, variações nos níveis séricos de potássio, calafrios e aumento da demanda metabólica no pós-operatório, vasoconstrição periférica e redução da tensão de oxigênio subcutâneo e inibição das reações enzimáticas da cascata de coagulação e anormalidades da coagulação, e da função plaquetária, aumentando, conseqüentemente, a perda de sangue no intra-operatório e a necessidade de transfusão no pós-operatório. Além dessas complicações somam-se outras como arritmias cardíacas e isquemia, disfunções orgânicas, aumentando o período de hospitalização, aumento da mortalidade, aumento da infecção do sítio cirúrgico, úlceras por pressão e da estadia na sala de recuperação pós-anestésica (SRPA). Salienta-se, também, o desconforto térmico que reduz a satisfação do paciente ao vivenciar o procedimento anestésico-cirúrgico(1,4-5) .

Ressalta-se, ainda, que o aumento da estadia na SRPA, além de estar associado às complicações advindas da hipotermia, acarreta o aumento dos custos finais da estadia hospitalar do paciente, não somente quanto ao cuidado intensivo a ser dispensado a ele como, também, a necessidade de transfusões, administração de medicações adicionais, exames laboratoriais, dentre outros itens(6).

Frente ao exposto, pode-se afirmar que a manutenção da normotermia do paciente durante o período perioperatório pode acarretar, principalmente, a diminuição do sangramento intra-operatório, da infecção do sítio cirúrgico e da permanência na sala de recuperação anestésica, melhor conforto térmico e, conseqüentemente, maior satisfação do paciente bem como redução dos custos hospitalares; entretanto, consiste em desafio que o enfermeiro deve enfrentar uma vez que, fundamentados na prática profissional, pode-se inferir que, na realidade nacional, há pouco investimento direcionado à manutenção da temperatura corporal do paciente no período intra-operatório. Atrelado a essa questão, há escassez de publicações nacionais orientadas para a compreensão da hipotermia bem como para os métodos eficazes para a prevenção e o tratamento dessa complicação, justificando a necessidade do desenvolvimento de pesquisas que ofereçam subsídios para elucidar a problemática e contribuam para a melhoria da enfermagem perioperatória(7).

Reconhecendo, portanto, a hipotermia como algo deletério ao paciente cirúrgico, o presente estudo tem como objetivo analisar os fatores relacionados às alterações da temperatura corporal do paciente submetido à cirurgia eletiva no período intra-operatório.

METODOLOGIA

A abordagem metodológica quantitativa foi adotada para o desenvolvimento do estudo, que tem delineamento de pesquisa não experimental, tipo correlacional, prospectivo.

Um hospital filantrópico com 109 leitos, situado no interior do Estado de São Paulo, foi o local selecionado para o desenvolvimento da pesquisa.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo e o hospital selecionado autorizou o seu desenvolvimento, e todos os sujeitos participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, após orientações oferecidas pelo pesquisador.

Em relação aos critérios de inclusão na amostra, delimitou-se: paciente com idade igual ou superior a 18 anos, submetido à cirurgia eletiva, com duração da anestesia de, no mínimo, uma hora e excluiu-se aqueles com temperatura corporal igual ou superior a 38ºC, ou com temperatura corporal abaixo de 36ºC, na chegada na SO.

Um instrumento para a coleta de dados foi elaborado e submetido à validação aparente e de conteúdo por três juízes. Na versão final, o instrumento contém dados relacionados ao paciente, ao procedimento anestésico-cirúrgico, à temperatura ambiental e corporal do paciente.

A mensuração da temperatura corporal do paciente foi realizada em diferentes momentos, a saber: na recepção do centro cirúrgico, na chegada na SO, no início do procedimento anestésico e a partir daí a cada 20 minutos, até o final do procedimento anestésico-cirúrgico. Os dados foram verificados com o termômetro timpânico por infravermelho, canadense, marca ProCheck®, com precisão de leitura em laboratório de ± 0,2ºC. Esse método não invasivo e fidedigno é recomendado pela American Society of PeriAnesthesia Nurses (ASPAN)(8).

A temperatura e a umidade da SO foram mensuradas com a utilização do termo-higrômetro nacional, marca Minipa®, com precisão para temperatura interna de ±1ºC e para umidade ambiente ±8% RH (relative humidity - umidade relativa). Esse equipamento foi posicionado a um metro aproximadamente da cabeça do paciente e do mesmo lado onde foi aferida a temperatura timpânica. As mensurações foram realizadas na entrada do paciente na sala, no início do procedimento anestésico e a cada 20 minutos até o final do procedimento anestésico-cirúrgico.

A coleta de dados foi executada por um dos pesquisadores, o qual realizou todas as mensurações com os mesmos equipamentos já mencionados e no período de agosto de 2006 a junho de 2007.

Os resultados foram apresentados segundo a média aritmética, o desvio padrão, a mediana e os valores mínimo e máximo. A análise de regressão múltipla foi proposta para verificar a porcentagem da variância do modelo explicada por cada uma das variáveis preditoras, descritas a seguir, na variabilidade da temperatura corporal média dos pacientes.

Para a seleção das variáveis integrantes do modelo final, utilizou-se análise bivariada, realizada por meio dos testes estatísticos paramétricos. Para a análise das diferenças entre as temperaturas médias dos pacientes, segundo sexo, doenças crônicas (existência ou não) e transfusão sangüínea (realização ou não) utilizou-se o teste t Student.

Por meio do coeficiente de correlação de Pearson, verificou-se a correlação entre a variável temperatura corporal média dos pacientes e as seguintes variáveis: duração da anestesia, duração da cirurgia, índice de massa corporal, temperatura média da sala de operação e idade.

A ANOVA foi utilizada para verificação da diferença entre as temperaturas médias dos pacientes, segundo tipo de anestesia (geral, regional ou combinada).

Foram selecionadas para a regressão múltipla aquelas variáveis cujo valor de p foi menor ou igual a 0,20 (modelo conservativo). Após a seleção das variáveis, procedeu-se, então, à análise de regressão múltipla.

O tamanho amostral foi definido segundo o número de variáveis preditivas inicialmente proposto, utilizando entre cinco e dez sujeitos para cada uma das variáveis preditivas integrantes do modelo de regressão múltipla, gerando número final para a realização deste estudo igual a 70 sujeitos(9).

A normalidade da distribuição de cada uma das variáveis foi verificada segundo o teste de Kolmogorov-Smirnov (10-11).

A técnica de dupla digitação foi utilizada e os dados coletados foram analisados por meio do software Statistical Package Social Science (SPSS 10.0). O nível de significância utilizado foi α=0,05.

RESULTADOS

Caracterização da amostra, temperatura corporal dos pacientes, temperatura e umidade da SO

A média da idade dos 70 sujeitos foi de 53,6 anos, com desvio padrão de 15,4 anos. Desses pacientes, 46 (65,7%) eram do sexo feminino e 24 (34,2%) do sexo masculino (Tabela 1).

O índice de massa corporal (IMC) dos participantes da pesquisa obteve média de 25,3 kg/m2 e mediana de 24,9kg/m2. A maioria dos pacientes analisados foi classificada como ASA 2 (49 pacientes-70%), 13 pacientes (18,5%) ASA 1, sete (10%) ASA 3 e um não foi classificado. Esse dado foi coletado por meio do prontuário do paciente e do registro feito pelo anestesista (Tabela 1).

Conforme demonstrado na Tabela 2, a duração média dos procedimentos anestésicos foi de 158,2 minutos, com mediana de 150 e desvio padrão de 53,7 minutos. Dos 70 sujeitos investigados, 54 (77,1%) pacientes foram submetidos à anestesia geral, nove (12,9%) anestesia combinada (geral + raquianestesia) e sete (10%) anestesia regional (raquianestesia ou epidural). A duração da anestesia foi maior no grupo de pacientes submetido à anestesia combinada, com média de 194,4 minutos (DP=29 minutos).

Os procedimentos cirúrgicos obtiveram a duração média de 111 minutos, com mediana de 100 e desvio padrão de 48,1 minutos, duração mínima de 40 minutos e máxima de 230 minutos.

Os tipos de procedimentos cirúrgicos com maior freqüência foram: a cirurgia de colecistectomia por via laparoscópica, a qual foi realizada em 18 pacientes (25,7%), em segundo lugar, a cirurgia de correção de hérnia de hiato, também por via laparoscópica, executada em 7 pacientes (10%) e seguida da prostatectomia em 6 pacientes (8,6%).

Em relação aos dados da temperatura corporal dos pacientes, salienta-se, aqui, que na chegada na SO a temperatura corporal média e mediana eram de 36,4ºC, diminuindo para 36,2ºC no início do procedimento anestésico e, no início da cirurgia, a temperatura média e a mediana eram de 35,6ºC. No final do procedimento anestésico-cirúrgico, a média da temperatura corporal dos pacientes foi de 33,6ºC, com mediana de 33,7ºC e desvio padrão de 0,2ºC.

Na chegada dos pacientes, a temperatura média da SO era de 24,6ºC e, na quarta hora de procedimento anestésico-cirúrgico, foi de 22,4ºC. Em relação à umidade da sala na chegada dos pacientes, a média foi de 48,6% e na quarta hora foi para 49,3%.

Associação entre a medida da temperatura corporal dos pacientes e as variáveis investigadas

Ao se aplicar os testes estatísticos pertinentes às variáveis analisadas, obteve-se os resultados que se seguem.

A normalidade para a distribuição da variável temperatura corporal para o grupo masculino (variável sexo), para o grupo que recebeu transfusão sangüínea (variável transfusão sangüínea) e para o grupo que recebeu anestesia regional e combinada (variável tipo de anestesia) foi confirmada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov.

Os resultados do teste estatístico Pearson demonstraram correlações estatisticamente significativas e negativas entre a variável temperatura média corporal dos pacientes e a duração da anestesia (r=-0,45; p≅0) e a duração da cirurgia (r=-0,43; p≅0), ou seja, quanto maior a duração da anestesia ou duração da cirurgia menor a temperatura corporal do paciente.

De forma positiva, o IMC e a temperatura média da sala foram correlacionados à temperatura corporal média dos pacientes (r=0,30; p=0,014 e r=0,43; p≅0, respectivamente), isto é, quanto maior o índice de massa corporal do paciente. ou a temperatura da sala. maior a temperatura corporal do paciente.

A transfusão sangüínea foi realizada em 14 (20%) dos pacientes investigados, sendo que a diferença entre as temperaturas corporais médias entre o grupo submetido à transfusão e o grupo não submetido à transfusão foi estatisticamente significante (t=2,41; p=0,019).

Apesar do teste t Student não indicar diferença estatisticamente significante entre a temperatura corporal média dos pacientes e sexo (t=1,83; p=0,07), essa variável foi incluída no modelo final, pois, na metodologia do estudo ficou estabelecido que seriam selecionadas para a regressão múltipla as variáveis cujo valor de p fosse menor ou igual a 0,20 (modelo conservativo).

Em relação ao tipo de anestesia, a ANOVA mostrou diferença estatisticamente significante entre as temperaturas corporais médias e os grupos (geral, regional e combinada) (F(2;67)=8,221; p=0,01), sendo que o grupo submetido à anestesia combinada apresentou temperaturas médias corporais mais baixas.

Os valores para a significância estatística encontrados para as variáveis idade e doenças crônicas foram superiores a 0,20 (r=-0,07; p=0,55 e t=-0,31; p=0,75, respectivamente) e, portanto, essas variáveis não foram incluídas no modelo final.

Dessa forma, a regressão linear multivariada foi aplicada considerando-se as seguintes variáveis preditoras: sexo, transfusão sangüínea, tipo de anestesia, duração da anestesia, duração da cirurgia, IMC e a temperatura média da SO.

Ao se considerar o modelo completo, isto é, incluindo-se todas as variáveis preditoras, a porcentagem da variância explicada foi de 53,8%, contribuindo para esse total as variáveis temperatura média da sala (β=0,45; p≅0), IMC (β=0,34; p≅0), duração da anestesia (β=-0,61; p=0,03) e tipo de anestesia (β=-0,23; p=0,01). Em um segundo, terceiro e quarto modelos, com a exclusão das variáveis menos significativas, isto é, sexo no primeiro modelo, transfusão sangüínea no segundo modelo e duração da cirurgia no terceiro, os resultados foram os mesmos, evidentemente, com mudanças nos valores de b e p, ou seja, temperatura média da sala (β=0,43; p≅0), IMC (β=0,35; p≅0), duração da anestesia (β=-0,37; p≅0) e tipo de anestesia (β=-0,22; p=0,014), com essas variáveis explicando 55,3% da variância total do modelo.

Frente ao exposto, constata-se que as variáveis tipo de anestesia, duração da anestesia, IMC e a temperatura média da SO estavam diretamente relacionadas à temperatura corporal média dos sujeitos investigados.

DISCUSSÃO

Na presente pesquisa, a duração da cirurgia obteve correlação estatisticamente significante e negativa com a temperatura corporal média dos pacientes, ou seja, quanto maior a duração da cirurgia menor a temperatura corporal do paciente. Esses resultados corroboram as diretrizes da ASPAN, nas quais o tipo e a duração do procedimento cirúrgico são apontados como fatores de risco para o desenvolvimento de hipotermia(8).

Baseados na literatura, estudiosos indicam que é mais freqüente o paciente apresentar hipotermia em cirurgias de longa duração, pois a queda mais acentuada na temperatura corporal ocorre, de fato, dentro dos primeiros 40 a 60 minutos após o início da anestesia(1).

Nesta investigação também houve diferença estatisticamente significante entre a variável transfusão sangüínea e a temperatura corporal média dos pacientes.

Dentre os resultados evidenciados em uma metanálise de 18 artigos referentes aos efeitos adversos ao paciente, devido à hipotermia, os autores salientaram o aumento do sangramento e, conseqüentemente, a necessidade de transfusão sangüínea, bem como o aumento da estadia em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e maior período de hospitalização. Nos estudos incluídos na revisão, o número de unidades de sangue total, plasma e plaquetas necessários para a transfusão dos pacientes cirúrgicos aumentou significativamente no grupo hipotérmico(12).

A maioria dos sujeitos nesse estudo recebeu anestesia geral (54 pacientes-77,1%) e os resultados apresentaram correlação estatisticamente significativa e negativa entre as variáveis duração da anestesia e a temperatura corporal média dos pacientes, ou seja, quanto maior a duração da anestesia menor a temperatura corporal do paciente. Os resultados evidenciaram também diferença estatisticamente significante entre os tipos de anestesia e a temperatura corporal média dos pacientes, sendo que o grupo submetido à anestesia combinada apresentou temperaturas médias corporais mais baixas. Esses dados corroboram a literatura quando indica que a associação da anestesia geral com a regional acarreta maior risco de hipotermia, uma vez que o prejuízo na termorregulação central acrescido da inabilidade de uma resposta termorregulatória nas pernas pode gerar hipotermia mais severa do que quando os tipos de anestesia são empregados sozinhos(2-3).

Na anestesia geral, após a indução anestésica, a temperatura corporal tende a cair devido à redistribuição interna de calor do compartimento central para o periférico do corpo humano, a seguir ocorre a fase de redução linear da temperatura (0,5 a 1ºC por hora). Essa fase se mantém enquanto houver diferença entre a produção metabólica e a perda de calor para o ambiente. A partir de determinada temperatura ocorre a vasoconstrição e a redução do fluxo de calor entre os compartimentos central e periférico, isso leva à menor redistribuição interna de calor e perda para o ambiente (fase de platô da temperatura). Um novo equilíbrio térmico ocorre entre os compartimentos central e periférico, entretanto, com valores menores de temperatura (2-3).

Na anestesia regional, a redistribuição interna de calor é restrita aos membros inferiores, portanto, de menor intensidade, assim a fase linear da hipotermia ocorre na presença de temperatura mais elevada. Essa fase é desencadeada em menor velocidade uma vez que, nesse tipo de anestesia, a produção metabólica de calor permanece mais próxima do normal. Em contrapartida, devido à extensão dos bloqueios simpático e motor, a fase linear não é interrompida, pois esse tipo de bloqueio impede a presença do mecanismo de vasoconstrição termorreguladora(2-3).

A monitorização e a manutenção da temperatura corporal do paciente no período perioperatório são aspectos relevantes, independentemente da escolha anestésica, os pacientes têm risco significativo para desenvolver hipotermia e devem ter a temperatura corporal cuidadosamente avaliada(13).

Na presente investigação, o IMC dos pacientes estava dentro da faixa considerada normal até o sobrepeso(14). Essa variável apresentou correlação positiva, ou seja, quanto maior o índice de massa corporal maior a temperatura corporal do paciente.

Em uma pesquisa os autores testaram a hipótese de que a temperatura central não dependia da gordura corporal ou do IMC, durante a fase de redistribuição interna de calor. Analisaram 40 pacientes submetidos à cirurgia eletiva de ressecção de cólon. Os resultados evidenciaram que a redução da temperatura central durante a primeira hora de cirurgia foi inversamente proporcional à porcentagem de gordura corporal ou ao IMC, ou seja, pacientes obesos requerem menor período de aquecimento com um sistema ativo de aquecimento cutâneo, do que os mais magros, especialmente em cirurgias de curta duração, nas quais a hipotermia geralmente é resultado da redistribuição interna de calor(15).

Na presente investigação, a média das temperaturas da SO apresentou variações discretas mantendo-se entre 22,4 e 24,1ºC durante o período intra-operatório. Esses resultados corroboram as diretrizes da ASPAN, as quais indicam que a temperatura da SO deve permanecer entre 20 e 24ºC(8). Essa variável apresentou correlação estatisticamente significante e positiva à temperatura corporal média do paciente, ou seja, quanto maior a temperatura da SO maior a temperatura corporal do paciente.

A Association of PeriOperative Registered Nurses (AORN)(16) indica que a perda de calor do paciente pela pele, por radiação e convecção, bem como por evaporação devido ao uso de soluções antissépticas no preparo da pele, será determinada pela temperatura da SO.

Em uma revisão de literatura, os autores indicaram que a temperatura da SO é fator significativo para a perda de calor do paciente, pois o decréscimo da temperatura ambiental conduz ao aumento da perda de calor por radiação do paciente para o ambiente(17).

A prevenção da hipotermia, no período perioperatório, além de evitar as complicações para o paciente, pode resultar em diminuição dos custos para a instituição hospitalar. A manutenção do paciente normotérmico na sala de cirurgia pode resultar em economia de $ 2 500,00 a $ 7 000,00 por paciente(12). O retorno à normotermia, freqüentemente, requer de 2 a 5 horas, dependendo da severidade da hipotermia e da idade do paciente. Os custos de uma hora de cuidados na SRPA são estimados em $ 100, sugerindo então custo adicional para a recuperação da normotermia do paciente hipotérmico de $ 200 a $ 500(18).

CONCLUSÃO

Frente aos resultados evidenciados na presente pesquisa conclui-se que:

- não houve diferença estatisticamente significante entre a temperatura corporal média dos pacientes e as variáveis sexo, idade e doença crônica;

- houve diferença estatisticamente significante entre a temperatura corporal média dos pacientes e as variáveis duração da anestesia, tipo de anestesia, duração da cirurgia, temperatura da sala de operação, IMC e transfusão sangüínea;

- na regressão linear multivariada as variáveis tipo de anestesia, duração da anestesia, IMC e a temperatura da SO estavam diretamente relacionadas à temperatura corporal média dos sujeitos investigados.

O enfermeiro tem papel importante na prevenção ou tratamento da hipotermia no perioperatório. A manutenção da normotermia pode diminuir custos para o hospital e paciente, sendo a redução de risco de complicações o aspecto mais relevante. A implementação de métodos que protejam o paciente da hipotermia pode ter profundo efeito na sua segurança e o enfermeiro deve ser o líder de todos os membros da equipe cirúrgica para tornar essa complicação um problema do passado(19).

Para tal, o conhecimento dos fatores relacionados ao desenvolvimento da hipotermia na realidade nacional proporciona evidências que contribuem para a tomada de decisão do enfermeiro na implementação de métodos para a prevenção ou tratamento da hipotermia, sendo que o sistema passivo de aquecimento (uso de lençol de algodão ou cobertor) não é suficiente e há exigência da utilização de um sistema ativo de aquecimento cutâneo (por exemplo, o sistema de ar forçado aquecido) e medidas adjuvantes como o aquecimento das soluções infundidas e daquelas utilizadas na irrigação de cavidades como o abdome, pelves ou tórax(16, 20).

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  • 1
    Paper extracted from Doctoral Dissertation;
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Aceito
      27 Out 2008
    • Recebido
      07 Maio 2008
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