EDITORIAL ESPECIAL
Jovens na contemporaneidade: imaginários em diálogo
Saltar ao mar e (re)significar um passado foi o que nos levou a participar do Edital do CNPq, em 2006, com o objetivo de realizar uma missão de aproximação com países de língua portuguesa CPLP - Comunidade de Países de Língua Portuguesa.
O tema proposto de aproximação com um grupo de colegas pesquisadores das Universidades de Lisboa, em Portugal, e Eduardo Mondlane, em Moçambique, não lançava dúvidas sobre sua atualidade, Jovens na contemporaneidade: imaginários em dialogo.
Um tempo social onde os fluxos entre países, regiões, continentes e, certamente imaginários se intensificaram, nos mais diversos planos - economia, trabalho, turismo, esporte, migrações, mobilidades estudantis e muitos outros - nos mobiliza a pensar que essas experiências expressam diferentes formas de pertencimentos ou pertenças e construção de novas identidades. Porém, concomitantemente, e ritualisticamente, preservamos "resíduos" coloniais e colocamos em nosso prato principal à mesa a necessidade de se pensar o pós-colonial. Também continua sendo real (e será que queremos que não seja?) negar nossa forma de ler, de se comunicar e de sonhar com uma identidade singular a cada espaço, que mantém a triangulação inter continentes, marcando nossa comunicação e narração em língua portuguesa. Aí mora nossa permanência ultramares, mantendo nossa identidade, que nos exige, ao longo do tempo, enfrentar tensões e complementaridades, estranhamentos e proximidades, ritmadas no cotidiano e que reiteram vários traços e gostos culturais entre nós. Mas, não se deixe enganar, caro leitor, que a ousadia e "o atraso" também estão presentes nesse mesclado cultural e social, de triangulação lusa, Portugal, Moçambique e Brasil, cujas desigualdades sociais e econômicas continuam postas em evidencias.
Apresentamos aqui alguns artigos relacionados ao Seminário Internacional, Jovens na contemporaneidade: imaginários em dialogo, realizado em São Paulo, entre 10 e 11 de setembro de 2007.
O eixo temático foi também um eixo exploratório dessa missão na qual nos lançamos em uma aventura de atravessar mares e encontrar os nativos em terra. Dessa forma, travamos contato com o Grupo Imigração em Saúde em Lisboa, vinculado tanto a uma produção teórica quanto à defesa dos direitos de trânsito e migração de além-mar para a Europa. Assim, há os artigos que falam do lugar dos migrantes nessa condição de trânsito entre África e União Européia - medicalização, psiquiatrização e o corpo aparecem como temas das autoras Chiara Pussetti e Cristina Santinho. Em rodopios com os jovens, ainda em Lisboa, nos encontramos com José Machado Pais e sua extensa produção sobre essa temática, que aceitou participar do projeto possibilitando sua ancoragem.
Ao aportar em Moçambique e a procurar pesquisadores locais desses temas tivemos a intermediação do antropólogo Paulo Granjo que, apaixonado por aquele país, nos narrou a sua própria "conversão" local aos rituais de saúde e doença entre os "feiticeiros" tradicionais e, ao mesmo tempo, se empolgava com seu navegar pela cidade do Maputo e seus interiores. Granjo nos apresentou uma geração de jovens professores da Universidade Eduardo Mondlane que trabalham com o tema das juventudes.
Apresentamos, com este editorial especial, uma série de artigos, publicados em sucessivos números de Saúde e Sociedade. Especificamente no atual volume, temos o artigo de José Machado Pais que destaca a tradicionalidade e contemporaneidade dos rituais de iniciação da juventude, reflexão teórica de suma importância para uma área como a da saúde pública que pensa os "ciclos" ou os intervalos etários a partir de marcadores biológicos. O presente artigo é um convite para pensarmos nos marcadores sociais e sua relação com o curso de vida. Adriano Bizza, jovem antropólogo moçambicano, apresenta o tema do associativismo juvenil, que revela uma porta de entrada possível para a sociedade moçambicana e suas redes sociais - a da associação. Mostrando o peso da sociedade civil e política que, em recente memória, conheceu momentos de conflito e de guerra e que se organiza também a partir do associativismo, sobretudo de jovens entorno do vivido.
Nos números seguintes teremos os artigos Biopolíticas da depressão nos imigrantes Africanos, de Chiara Pussetti e Reconstruindo Memórias: Jovens Refugiados em Portugal, de Maria Cristina Santinho, além dos texto de Paulo Granjo, Saúde e doença em Moçambique, e dos editorialistas sobre algumas imagens dos jovens da periferia da cidade de São Paulo.
Partindo do tema comum de reflexão sobre juventudes e imaginários, os autores, cada um a seu modo e a partir de suas experiências, relatam seus interesses de estudos e formas de abordar as questões vividas em cada país, seja como nativo ou estrangeiro, sobre o "outro", possibilitando um repertório de temas que dá um colorido particular e que certamente vai aguçar a curiosidade dos leitores da Revista Saúde e Sociedade.
A todos desejamos boa leitura.
Maria da Penha Vasconcellos
Rubens de Camargo Ferreira Adorno
Professores do LIESP - Laboratório de Estudos e Pesquisas Sociais em Saúde Pública /FSP/USP
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
05 Out 2009 -
Data do Fascículo
Set 2009