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Monitoramento e avaliação da borracha natural crua utilizando a técnica de análise térmica dinâmico-mecânica

Monitoring and evaluation of the raw natural rubber using the technique of dynamic mechanical thermal analysis

Resumos

A borracha natural obtida do látex sangrado de quatro clones de seringueira (Hevea brasiliensis) foi preparada pela coagulação do látex com ácido acético (10%) e seca ao ar a 65 ºC (48 horas). Os dados de DMTA foram utilizados para monitorar e avaliar as propriedades termo dinâmico-mecânicas. Os resultados sugerem um possível aumento na massa molecular média do poliisopreno e, também, uma variação em sua distribuição para a borracha natural dos quatro clones de seringueira.

Borracha natural; clones; seringueira; propriedades termo dinâmico-mecânicas


Natural rubber of latex tapping of four rubber tree clones (Hevea brasiliensis) were prepared by coagulated latex with acetic acid (10%) and air drying at 65 °C (48 hours). DMTA data were used to monitor and evaluate the thermo dynamic-mechanical properties. The results suggest a possible increase in the average molecular mass of polyisoprene and also a variation in its distribution of natural rubber for four rubber tree clones.

Natural rubber; clones; rubber tree; thermo dynamic-mechanical properties


ARTIGO TÉCNICO CIENTÍFICO

Monitoramento e avaliação da borracha natural crua utilizando a técnica de análise térmica dinâmico-mecânica

Monitoring and evaluation of the raw natural rubber using the technique of dynamic mechanical thermal analysis

Rogério M. B. MorenoI; Luiz Henrique C. MattosoI; Aldo Eloizo JobII; Paulo de Souza GonçalvesIII

IEmbrapa Instrumentação Agropecuária, São Carlos/SP

IIDepartamento de Física, Química e Biologia,UNESP, Presidente Prudente/SP

IIIInstituto Agronômico de Campinas/SP

Autor para correspondência Autor para correspondência: Rogério M. B. Moreno Embrapa Instrumentação Agropecuária Rua XV de Novembro 1452, Caixa Postal 741 CEP: 13560-970, São Carlos, SP E-mail: rogerio@cnpdia.embrapa.br

RESUMO

A borracha natural obtida do látex sangrado de quatro clones de seringueira (Hevea brasiliensis) foi preparada pela coagulação do látex com ácido acético (10%) e seca ao ar a 65 ºC (48 horas). Os dados de DMTA foram utilizados para monitorar e avaliar as propriedades termo dinâmico-mecânicas. Os resultados sugerem um possível aumento na massa molecular média do poliisopreno e, também, uma variação em sua distribuição para a borracha natural dos quatro clones de seringueira.

Palavras-chave: Borracha natural, clones, seringueira, propriedades termo dinâmico-mecânicas.

ABSTRACT

Natural rubber of latex tapping of four rubber tree clones (Hevea brasiliensis) were prepared by coagulated latex with acetic acid (10%) and air drying at 65 °C (48 hours). DMTA data were used to monitor and evaluate the thermo dynamic-mechanical properties. The results suggest a possible increase in the average molecular mass of polyisoprene and also a variation in its distribution of natural rubber for four rubber tree clones.

Keywords: Natural rubber, clones, rubber tree, thermo dynamic-mechanical properties.

Introdução

A borracha natural é utilizada em uma ampla gama de aplicações industriais, tais como na manufatura de pneus, produtos para uso médico e paramédico, adesivos, calçados e outros. A qualidade de um produto manufaturado de borracha depende da qualidade da borracha natural crua[1].

Nos últimos anos, vêm ocorrendo a busca e a utilização de materiais naturais menos nocivos ao meio ambiente que é beneficiado pela utilização da borracha natural.

O Brasil, que já foi o principal produtor e exportador de borracha no mundo, hoje produz apenas cerca de 1% da produção mundial, o que é insuficiente para o consumo interno, sendo necessária a importação de aproximadamente 60% da borracha consumida no país[2]. Cabe salientar que, a indústria pneumática é a maior consumidora com consumo de 75% da produção mundial.

As propriedades físico-químicas da borracha natural variam com o tempo de estocagem, período do ano e origem clonal[1,3-5]. Além disso, as indústrias estão cada vez mais exigentes em relação à qualidade e uniformidade da borracha natural produzida no país.

A Embrapa Instrumentação Agropecuária, em parceria com o Instituto Agronômico (IAC) tem um programa que avalia clones de seringueira plantados em larga escala e auxilia na recomendação de novos clones no Estado de São Paulo, com o intuito de investigar o efeito das variações de condições climáticas e sazonais na qualidade e uniformidade da BN crua.

O objetivo deste estudo foi utilizar a análise térmica dinâmico-mecânica (DMTA) para monitorar e avaliar o comportamento dinâmico-mecânico da BN crua de quatro clones de grande difusão no Estado de São Paulo em função do tipo de clone e o período de coleta.

Materiais e Métodos

As sangrias foram realizadas em doze árvores de cada um dos quatro clones (GT 1, PB 235, IAN 873 e RRIM 600) no município de Votuporanga/SP (Estação Experimental IAC) nas datas de: 27/01 (1), 10/02 (2), 24/02 (3), 09/03 (4), 23/03 (5), 06/04 (6), 20/04 (7), 04/05 (8), 18/05 (9), 15/06 (10) e 29/06/2000 (11). O látex foi estabilizado com solução de NH4OH a 5%, coagulado com solução de ácido acético a 3N e o coágulo foi passado em uma calandra para a obtenção de mantas com espessura de 2 mm, sendo seco em estufa à 65 ºC.

A plasticidade Wallace (P0) foi determinada seguindo a norma ABNT - NBR 11597 [6].

Na obtenção dos resultados de DMTA foi utilizado o equipamento NETZSCH DMA 242C com interface TASC 414/3A e controlador 242. As condições dos ensaios, no modo de tensão de tração, foram: freqüência de 10,0 Hz, faixa de temperatura de -100 a 180 °C, razão de aquecimento: 5 ºC/min e resfriamento sob atmosfera de N2, sendo a deformação máxima aplicada de 0,025% com amplitude máxima de 60 µm e uma força dinâmica máxima de 3,0N com força estática 1,5X e força dinâmica aplicada. As dimensões dos corpos de prova foram: 10,00 mm de comprimento, 5,5 mm de largura e 1,75 mm de espessura.

Resultados e Discussão

As Figuras 1 e 2 ilustram a dependência do logaritmo do módulo de armazenamento (log E') em função da temperatura.



Dos resultados obtidos (Tabela 1) não se observa um comportamento padrão. Nos casos, onde há um aumento do valor do módulo de armazenamento máximo (E'máx) com o aumento do índice de retenção da plasticidade Wallace (P0) pode estar ocorrendo um aumento da massa molecular média (MM)do poliisopreno. A maior MM propicia o maior emaranhamento das cadeias poliméricas elevando os valores do E'máx, tendo em vista que há uma boa correlação entre P0 e a massa molar de peso média (Mw)[7]. Fatores como o percentual de gel, formação de ramificações e a própria distribuição de massa molecular (DMM) podem influenciar nos valores de E'. Os casos, em que o aumento na P0 é acompanhado de um decréscimo no E', podem ser explicados pela possível alteração na DMM. Em geral, a DMM é bimodal e um aumento da fração de menor MM pode funcionar como um plastificante interno[8], facilitando o deslizamento das cadeias poliméricas e diminuindo o valor da temperatura de transição vítrea (Tg) e do E'máx como no caso do clone PB 235 (coleta 9). Nos casos, onde um decréscimo na P0 é acompanhado por um acréscimo do E'máx, pode estar ocorrendo um aumento na quantidade de ligações cruzadas (% de gel) e nas ramificações de cadeia que propiciam um maior impedimento de desenrolamento das cadeias poliméricas favorecendo o aumento do E'máx.

Notam-se variações significativas entre os clones e coletas. As maiores variações no E'máx foram obtidas pelo clone RRIM 600 e as menores pelo clone IAN 873. Os clones IAN 873 e PB 235 apresentaram o maior e o menor valor médio do E'máx. (2230,4 e 1489,4) MPa, respectivamente.

As propriedades da borracha natural crua variam com o tipo de clone e o período de coleta em que a borracha é obtida[1,3,4]. No trabalho realizado por Ferreira et al. (2002)[4] as propriedades da borracha natural crua variaram significativamente em função do tipo de clone, método de sangria e condições climáticas ao longo do ano. O conteúdo de borracha seca no látex (DRC) tende a diminuir no início da estação mais fria e seca (maio a junho), porém, as % de cinzas e nitrogênio aumentaram no mesmo período. A plasticidade Wallace (P0) e a viscosidade Mooney (VR) mostraram uma boa correlação linear e o maior valor médio para essas duas propriedades foi obtido pelo clone RRIM 600.

A faixa de MM é praticamente a mesma para a maior parte dos clones (GT 1, PB 235 e RRIM 600), mas os valores médios e os formatos das curvas de DMM são diferentes[8,9]. Enquanto clones com borrachas de baixa e média MM apresentam DMM bimodal distinta, clones com borrachas de alta MM usualmente apresentam uma DMM unimodal[9].

As Figuras 3 e 4 ilustram a dependência do fator amortecimento (tan d) em função da temperatura.



A Tg foi medida no ponto máximo da curva do fator amortecimento (tan d) em função da temperatura[10] e apresentou variações distintas nas onze coletas para cada um dos quatro clones. O clone RRIM 600 teve a menor variação na Tg e o clone GT 1 a maior (Tabela 1). Os materiais poliméricos têm um comportamento viscoelástico (0,001 < tand < 3)[11] e os valores obtidos estão dentro dessa faixa.

As variações da MM e na DMM, aliados a variação na quantidade de ligações cruzadas, podem influenciar nos valores E'máx da borracha natural, o que influenciará nos valores da Tg. Uma maior MM deve, em princípio, diminuir a mobilidade das cadeias poliméricas deslocando as Tg para valores mais altos. De um modo geral, os resultados mostram que um aumento no E'máx leva a um acréscimo na Tg (Tabela 1).

Na borracha natural a presença de microgel, macrogel e ramificações na cadeia do poliisopreno têm implicações nas propriedades de interesse tecnológico. Enquanto o macrogel é responsável pelo endurecimento durante a estocagem da borracha natural, a formação do microgel no látex afeta a viscosidade deste que resultará na borracha natural. Diferente do macrogel, que é formado na borracha natural seca sob estocagem, o microgel é formado no látex presente nos vasos laticíferos da seringueira[12]. A formação do microgel no látex é iniciada pela condensação de grupos aldeído variando entre 100 e 420 unidades por molécula de poliisopreno[13]. Esse processo de condensação também promove o aumento das ligações cruzadas entre as cadeias poliméricas influenciando nos valores da P0 e do E'máx. Como, em geral, a borracha natural possui DMM bimodal, uma maior fração de moléculas com menor MM pode plastificar a fração de maior MM[8] aumentando a mobilidade das cadeias poliméricas deslocando a Tg para valores menores.

Conclusões

Os resultados indicam comportamentos distintos nas propriedades termo dinâmico-mecânicas das borrachas cruas dos quatro clones estudados. Estes comportamentos sugerem a variação, tanto da MM do poliisopreno como da distribuição.

Agradecimentos

Os autores agradecem o suporte financeiro concedido pela FAPESP, CNPq e Embrapa Instrumentação Agropecuária.

Enviado: 21/11/05

Reenviado: 24/02/06

Aprovado: 06/03/06

  • 1. Le Roux, Y.; Ehabe, E.; Sainte-Beuve, J.; Nkengafac, J.; Nkeng, J.; Ngolemasango, F.; Gobina, S. - Journal of Rubber Research, 3, p.142, (2000).
  • 2. International Rubber Study Group - Natural Rubber Statistical Bulletin, 58, p.9, (2004).
  • 3. Yip, E. - Journal of Natural Rubber Research, 5, p.52, (1990).
  • 4. Ferreira, M.; Moreno, R. M. B.; Gonçalves, P de S.; Mattoso, L. H. C. - Rubber Chemistry and Technology, 75, p.1, (2002).
  • 5. Moreno, R. M. B.; Ferreira, M.; Gonçalves, P de S.; Mattoso, L. H. C. - Pesquisa Agropecuária Brasileira, 38, p.583, (2003).
  • 6. Associação Brasileira de Normas Técnicas - Borracha natural: NBR 11597, Rio de Janeiro, 1996, 22 p.
  • 7. Bonfils, F.; Flori, A.; Sainte-Beuve, J. - Journal of Applied Polymer Science, 74, p.3078, (1999).
  • 8. Bonfils, F.; Char, C.; Garnier, Y.; Sanago, A.; Saint-Beuve, J. - Journal of Rubber Research, 3, p.164, (2000).
  • 9. Subramaniam, A. - Rubber Chemistry and Technology, 45, p.346, (1972).
  • 10. Sircar, A. K.; Galaska, M. L.; Rodrigues, S.; Chartoff, R. P. - Rubber Chemistry and Technology, 72, p.513, (1998).
  • 11. Canevarolo, S. V. - Análise dinâmico-mecânica para sistemas poliméricos. Parte 1: O amortecimento (tand). Seção tecno-científica, Associação Brasileira de Polímeros, (1991) 36.
  • 12. Sethuraj, M. R. & Mathew, N. M. "Natural rubber: Biology, Cultivation and Technology", ELSEVIER, Amsterdam (1992).
  • 13. Burfield, D. R. - Journal of Natural Rubber Research, 1, p.202, (1986).
  • Autor para correspondência:
    Rogério M. B. Moreno
    Embrapa Instrumentação Agropecuária
    Rua XV de Novembro 1452, Caixa Postal 741
    CEP: 13560-970, São Carlos, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 2006
    • Data do Fascículo
      2006

    Histórico

    • Recebido
      21 Nov 2005
    • Revisado
      24 Fev 2006
    • Aceito
      06 Mar 2006
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