Resumos
OBJETIVO: verificar se a desnutrição pregressa, além de causar déficit na estatura de meninas também poderia estar causando uma limitação funcional à capacidade de realização de exercício máximo e submáximo em bicicleta ergométrica. CASUÍSTICA: 24 meninas, 12 eutróficas de idade (média ± DP) 9,13 ± 0,79 anos; peso 27,64 ± 3,64 kg; e altura 131,31 ± 6,04 cm; e 12 com desnutrição pregressa; idade 9,75 ± 1,10 anos; peso 25,16 ± 2,33 kg; e altura 125,06 ± 3,90 cm. METODOLOGIA: Avaliação clínica e teste ergoespirométrico em bicicleta ergométrica, a partir do qual foram obtidas as variáveis metabólicas e cardiorrespiratórias analisadas. Protocolo de teste: 2 minutos iniciais a 25 watts, seguidos de incrementos de 15 watts a cada 2 minutos, até a exaustão. RESULTADOS: Testes de esforço máximo: não foram observadas diferenças entre o grupo de meninas eutróficas (E) e o grupo de meninas com desnutrição pregressa (D) para nenhuma das variáveis analisadas: VO2max l/min., VO2max ml/min/kg, VEmax , R, FCmax, %FCmax prev e Watts max. Teste de esforço submáximo: foram observadas diferenças entre os grupos para as seguintes variáveis: VO2 l/min LA, % VO2max , FC LA, % FCmax LA, VE LA, % VEmax LA. Não foram encontradas diferenças entre os grupos para: VO2 ml/min/kg LA e Watts LA. CONCLUSÃO: O restabelecimento da relação peso para estatura em meninas com desnutrição pregressa, considerado como critério de eutrofia, é válido também para indicar ausência de limitação funcional da capacidade de realização de exercício.
Exercício; Consumo de oxigênio; Meninas; Desnutrição pregressa; Eutrofia
OBJECTIVE: The metabolic and cardiovascular responses of eutrophic girls and girls who underwent early undernutrition, were examined during physical exercise, in order to verify whether previous undernutrition could, in addition to cause a deficit in the children's height, and limit their functional capability to perform a maximal and submaximal exercise in an ergometric bicycle. SUBJECTS: Our sample was composed of 24 girls, of which 12 were eutrophic, with 9.13 ± 0.79 years (mean ± s.d.), 27.64 ± 3.64 kg of body weight, and 131.31 ± 6.04 cm in height. The 12 early undernourished girls were 9.75 ± 1.1 years old, 25.16 ± 2.33 kg, and 125.06 ± 3.9 cm high. MEASUREMENTS: The method included clinical evaluation and ergo-spirometric test on an ergometric bicycle, from which all the metabolic and cardiac-respiratory variables were obtained and analyzed. The test protocol was an initial two minutes period with 25 watts, followed by increments of 15 watts every two minutes, until exhaustion. RESULTS: Analysis of the results of the test of maximal effort did not reveal significant differences between eutrophic (E) and early undernourished (UN) girls in any of the variables: VO2max expressed in l/min (E = 1.11 ± 0.25; UN = 1.02 ± 0.19); VO2max expressed in ml/min/kg (E = 40.23 ± 6.98; UN = 40.53 ± 6.32), VEmax (E = 40.61 ± 8.79; UN = 38.25 ± 8.95), R (E = 1.13 ± 0.07; UN = 1.13 ± 0.05), HRmax (E = 195.33 ± 9.13; UN = 193.85 ± 11.18), previous % HRmax (E = 92.87 ± 4.33; UN = 92.80 ± 4.87), and maximum watts (E = 90.00 ± 20.56; UN = 91.25 ± 11.33). Analysis of the results obtained in test of submaximal effort, reflected by the intensity of effort in the anaerobic threshold (AT), showed differences between the groups in the following variables: VO2max expressed in l/min. (E = 0.77 ± 0.14; UN = 0.62 ± 0.13), % of VO2max (E = 70.07 ± 7.52; UN = 61.21 ± 9.83), HR (E = 166.58 ± 14.25; UN = 146.33 ± 17.40), % HRmax (E = 85.31 ±6.41; UN = 75.50 ± 7.73), VE (E = 24.18 ± 5.81; UN = 17.69 ± 4.30), % VEmax (E = 59.64 ± 8.45; UN = 46.95 ± 10.59). No differences were found for VO2max, expressed in l/min/kg (E = 28.06 ± 4.87; UN = 24.81 ± 5.31) and watts (E = 51.25 ± 17.47; UN = 45.00 ± 9.77). CONCLUSION: The reestablishment of the ratio weight/height in early undernourished girls is also useful to indicate lack of limitation of functional capability to perform physical exercises.
Exercise; Oxygen consumption; Stunted; Eutrophic girl
Artigo Original
RESPOSTAS METABÓLICAS E CARDIORRESPIRATÓRIAS AO EXERCÍCIO MÁXIMO E SUBMÁXIMO EM MENINAS EUTRÓFICAS E COM DESNUTRIÇÃO PREGRESSA
* * Correspondência: R. Pedro de Toledo, 980 - conj. 51 - Vila Clementino - Cep: 04039-002 São Paulo/SP - Brasil - Tel.: (11) 5575-3875 E-mail: anacf@osite.com.br A.C. Fernandez; I.P. Cintra; A.L. Sawaya; M. Fisberg; A.C. da Silva
Departamento de Pediatria e Neurofisiologia e Fisiologia Endócrina - Universidade Federal de São Paulo; Departamento de Nutrição - Universidade Federal de Ouro Preto-MG
RESUMO ¾ OBJETIVO: verificar se a desnutrição pregressa, além de causar déficit na estatura de meninas também poderia estar causando uma limitação funcional à capacidade de realização de exercício máximo e submáximo em bicicleta ergométrica.
CASUÍSTICA: 24 meninas, 12 eutróficas de idade (média ± DP) 9,13 ± 0,79 anos; peso 27,64 ± 3,64 kg; e altura 131,31 ± 6,04 cm; e 12 com desnutrição pregressa; idade 9,75 ± 1,10 anos; peso 25,16 ± 2,33 kg; e altura 125,06 ± 3,90 cm.
METODOLOGIA: Avaliação clínica e teste ergoespirométrico em bicicleta ergométrica, a partir do qual foram obtidas as variáveis metabólicas e cardiorrespiratórias analisadas. Protocolo de teste: 2 minutos iniciais a 25 watts, seguidos de incrementos de 15 watts a cada 2 minutos, até a exaustão.
RESULTADOS: Testes de esforço máximo: não foram observadas diferenças entre o grupo de meninas eutróficas (E) e o grupo de meninas com desnutrição pregressa (D) para nenhuma das variáveis analisadas: VO2max l/min., VO2max ml/min/kg, VEmax , R, FCmax, %FCmax prev e Watts max. Teste de esforço submáximo: foram observadas diferenças entre os grupos para as seguintes variáveis: VO2 l/min LA, % VO2max , FCLA, % FCmax LA, VE LA, % VEmax LA. Não foram encontradas diferenças entre os grupos para: VO2 ml/min/kg LA e Watts LA.
CONCLUSÃO: O restabelecimento da relação peso para estatura em meninas com desnutrição pregressa, considerado como critério de eutrofia, é válido também para indicar ausência de limitação funcional da capacidade de realização de exercício.
UNITERMOS: Exercício. Consumo de oxigênio. Meninas. Desnutrição pregressa. Eutrofia.
INTRODUÇÃO
Um dos problemas mais característicos relacionados à nutrição é a desnutrição, pois a privação dos nutrientes essenciais nos primeiros anos de vida pode levar à diminuição da velocidade do crescimento e do desenvolvimento, causando um tipo de desnutrição conhecida por proteico-calórica. Este tipo é a mais comum e está associada a elevadas taxas de morbidade e mortalidade (Chaves, 1985) .
O Brasil apresenta um grande contingente de desnutridos, embora tenha evoluído favoravelmente da década de 70 para os dias atuais. Os dados da pesquisa nacional desenvolvida pelo INAN e pelo IBGE, em Março de 1990, indicam que 31% das crianças brasileiras menores de cinco anos apresentam algum tipo de desnutrição, sendo que 5% sofrem de desnutrição moderada ou grave. O Sudeste, embora não apresente o maior índice de prevalência de desnutrição, concentra o segundo contingente de desnutridos.
Nos países em desenvolvimento o retardo no crescimento, provocado pela desnutrição, pode afetar até 50% das crianças menores de cinco anos (Avelar et al., 1991). No Brasil, segundo pesquisa realizada em 1989 (PNSN, 1989), a prevalência de déficit de estatura/idade em crianças pré-escolares foi de 15,4%. Durante a infância a desnutrição crônica, e algumas doenças, atrasam o crescimento reduzindo o desenvolvimento ósseo e retardando a puberdade (Meredith & Dwyer, 1991).
A adaptação à baixa ingestão de nutrientes, condições sanitárias deficientes, e/ou doenças da infância, são freqüentemente caracterizadas por um menor potencial de crescimento, tornando os indivíduos menores do que a sua determinação genética (Greulich, 1958; Satynarayana et al., 1986).
Um estudo realizado em favelas de São Paulo mostrou elevada correlação entre a obesidade nos adolescentes e a desnutrição pregressa (Sawaya et al., 1995). A obesidade e o sobrepeso associados com a desnutrição pregressa, foram encontrados em 8,7% dos meninos e 7,5% das meninas, enquanto que em crianças com estatura normal para idade 3,7% daqueles e 4,7% daquelas apresentaram obesidade. Nos adolescentes a obesidade foi identificada em 35% das meninas com baixa estatura para a idade, enquanto que nas com estatura normal para idade (segundo NCHS ) a prevalência de obesidade só foi identificada em 13%. De acordo com os dados apresentados, parece que as meninas são mais afetadas pela obesidade quando comparadas aos meninos.
De acordo com Sawaya; Amigo & Sigulem (1989) as crianças com desnutrição pregressa, sem déficit de peso para a idade, são consideradas eutróficas. Em estudo mais recente com crianças com desnutrição pregressa, observou-se que estas apresentavam valores mais baixos para a taxa de metabolismo de repouso, expressos por calorias por dia, e valores mais altos quando expressos por quilograma de peso corpóreo, e massa magra quando comparadas a crianças eutróficas, alteração tipicamente descrita para as desnutridas (Grilo, 1996).
A desnutrição causa diminuição da massa muscular e pode influenciar o VO2máx (Spurr & Reina, 1990; Armstrong & Wesman, 1994). Quando o consumo de oxigênio é expresso em termos de massa corporal magra, a diferença entre desnutridos e eutróficos é drasticamente reduzida e, em alguns casos, ocorre uma inversão. Indivíduos desnutridos podem apresentar valores significativamente mais elevados do que os eutróficos, provavelmente associados a uma menor contribuição de gordura para o peso do músculo do desnutrido (Spurr & Reina, 1990; Armstrong & Wesman, 1994).
Segundo estudos realizados em cortadores de cana, em 1983, existe uma relação entre estado nutricional e produtividade, levando à especulação sobre os efeitos que a desnutrição crônica teria, durante a infância, no desenvolvimento do consumo máximo de oxigênio (VO2máx), o principal índice de aptidão cardiorrespiratória, bem como no possível prognóstico das capacidades do adulto serem influenciadas pela criança afetada. Foi observado que adultos com diferentes níveis de nutrição mostraram uma redução progressiva no consumo máximo de O2, de acordo com a severidade da desnutrição, relacionada com diferenças na massa magra (Spurr et al., 1983).
Em um estudo realizado com crianças de classe socioeconômica baixa, no interior de São Paulo, com deficiências de nutrição, observou-se que estas crianças apresentavam atrasos no desenvolvimento e pior performance física do que crianças eutróficas da mesma região, provavelmente devido a um quadro de desnutrição vigente (Desai et al., 1981).
Não foi possível encontrar na literatura dados a respeito de exercício em crianças com desnutrição pregressa. Uma vez que está comprovado que este tipo de desnutrição causa déficit em relação à estatura, torna-se importante verificar se houve também prejuízo no que diz respeito à capacidade normal para a realização de exercícios estimada pelo VO2max e limiar anaeróbio, e se, ao alcançar uma relação peso/estatura esperada, a criança passa a apresentar também respostas fisiológicas ao exercício semelhantes às crianças eutróficas.
O objetivo deste estudo foi comparar as respostas metabólicas e cardiorrespiratórias ao exercício máximo e submáximo de meninas eutróficas e com desnutrição pregressa e verificar se o déficit de estatura, resultado da desnutrição pregressa, causa algum tipo de influência ou de prejuízo na capacidade funcional da realização do teste de esforço máximo ou submáximo.
METODOLOGIAS
CASUÍSTICA:
A amostra foi constituída de 24 crianças do sexo feminino pré-púberes, pois meninas apresentam uma maior prevalência para a obesidade, segundo estudo realizado em São Paulo7, na faixa etária dos 9 aos 11 anos, residentes em favelas da cidade de São Paulo. Doze meninas com peso e estatura normais - valores na faixa de 90 a 110% dos valores referência específico para a idade - e estatura/idade com 95% de adequação (NCHS, 1973), outras 12 com peso para estatura normal (90 - 110% dos valores de referência - NCHS), mas com os critérios para serem classificadas para desnutrição pregressa, definida como abaixo de 95% de estatura esperada para a idade, de acordo com o critério de Watelow (Waterlow, 1976, 1977).
Todas as crianças foram submetidas à uma avaliação clínica, e somente foram incluídas aquelas que não apresentaram alguma patologia prévia e nem contra indicação para atividade física intensa. O consentimento para a participação no estudo foi obtido dos pais ou responsáveis pelas crianças, que foram informados de todos os procedimentos, tendo liberdade para interromper a participação em qualquer momento da pesquisa.
Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética Médica da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP - EPM).
AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA POR CRESCIMENTO:
Peso: O peso corporal foi obtido através de balança eletrônica, marca Kratos, com capacidade máxima para 150 kg e subdividida em 50g (Grilo, 1996).
Estatura: A estatura foi verificada com fita métrica (Microtoise - Stanley - Mabo Ltd), um instrumento simples, com extensão de 2,00 m, dividida em centímetros e subdividida em milímetros, com visor de plástico e esquadro acoplado a uma das extremidades (Grilo, 1996).
TESTE ERGOESPIROMÉTRICO
O teste incremental de esforço máximo foi realizado em cicloergômetro compatível com a altura das crianças. O início da atividade foi com 25 watts, com o primeiro aumento de carga de 10 watts, seguidos de aumentos de 15 watts a cada 2 minutos até à exaustão, ou o alcance de um ou mais critérios de obtenção do VO2máx (ACSM, 1994).
Durante o teste foram obtidas variáveis metabólicas e cardiorrespiratórias através de um sistema metabólico computadorizado.
As variáveis respiratórias e metabólicas foram obtidas pelo método de calorimetria indireta respiratória, por meio de um sistema metabólico (Vista XT metabolic sistem, EUA) computadorizado (Intel 486, DX2, 66mhz).
A monitorização, aquisição e registro da freqüência cardíaca foi feita através de um freqüencímetro polar VANTAGE XL, a cada 5 segundos, durante todo o teste. Para definição dos valores da freqüência cardíaca do limiar anaeróbio foi utilizada a média dos quatro valores da freqüência cardíaca correspondente ao tempo do limiar anaeróbio. Para a definição da freqüência cardíaca máxima foi utilizado o valor máximo registrado pelo aparelho.
LIMIAR ANAERÓBIO
Foi determinado pelo aumento no VO2 e VE/VO2, sem, no entanto, haver aumento na relação VE/VCO2, e as trocas gasosas respiratórias apresentarem um valor de 1 ou maior que este (Zeballos & Weisman, 1994).
MÉTODOS ESTATÍSTICOS:
Para a análise dos resultados foram aplicados os seguintes testes:
1. Teste t de student para a análise de variáveis independentes (Sokal, 1969), para comparar o peso e a estatura entre as crianças eutróficas (Grupo I) e as crianças com desnutrição pregressa (Grupo II).
2. Teste de Mann-Whitney (Siegel, 1975) para comparar as crianças dos grupos I e II para as demais variáveis estudadas.
Foi fixado o a em 0,05 ou 5% (a £ 0,05) o nível de rejeição da hipótese de nulidade, assinalando-se com um asterisco os valores significativos.
RESULTADOS
Antropometria das meninas eutróficas e com denutrição pregressa.
Os resultados de idade, peso e estatura das meninas eutróficas e com desnutrição pregressa estão apresentados na tabela 1 como média±desvio padrão:
Não houve diferença estatisticamente significativa para idade e peso entre os dois grupos, porém para o quesito altura aconteceu o oposto, uma vez que os grupos foram selecionados com nível de corte altura/idade de 95%, o que caracteriza a desnutrição pregressa (Waterlow,1977).
Os resultados de peso esperados para a estatura e relação peso para a estatura das meninas eutróficas e com desnutrição pregressa estão apresentados na tabela 2 como média±desvio padrão. Os resultados de estatura esperados para a idade e a relação estatura para a idade estão apresentados na tabela 3 como média±desvio padrão:
Os valores de peso para a estatura e desta para a idade estão de acordo com os níveis de corte descritos na metodologia.
RESULTADOS DO TESTE DE ESFORÇO MÁXIMO
Os valores de consumo máximo de oxigênio no teste de esforço máximo para meninas eutróficas e com desnutrição pregressa estão apresentados na tabela 4 como média ± desvio padrão:
Não houve diferença significativa entre os grupos para os valores de consumo máximo de oxigênio, tanto em litros por minuto quanto dividido por quilograma de peso corporal.
Os valores máximos de ventilação e do quociente das trocas respiratórias durante o teste de esforço máximo estão apresentados na tabela 5 com valores expressos como média±desvio padrão.
Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos para os valores de ventilação máxima e quociente respiratório.
A tabela 6 apresenta os valores de freqüência cardíaca máxima obtida durante o teste de esforço e a sua porcentagem prevista em valores expressos como média ±desvio padrão:
Os grupos I e II não apresentaram diferenças significativas para os valores de freqüência cardíaca máxima e para a sua porcentagem esperada durante o teste de esforço.
A tabela 7 apresenta os valores de carga máxima de trabalho alcançada durante o teste de esforço de meninas eutróficas e com desnutrição pregressa expressa em média±desvio padrão.
Não houve diferenças entre os dois grupos para os valores de carga máxima atingida durante o teste de esforço.
Resultados submáximos do teste de esforço
Os valores de consumo de oxigênio no limiar anaeróbio e da porcentagem do consumo máximo de oxigênio de meninas eutróficas e com desnutrição pregressa estão apresentados na tabela 8 e os valores estão expressos como média±desvio padrão.
Não houve diferença estatística significativa entre os dois grupos para os valores de consumo de oxigênio dividido por quilograma de peso corporal no limiar anaeróbio ventilatório. As meninas eutróficas apresentaram maiores valores para o consumo de oxigênio em litros no limiar anaeróbio ventilatório e para a porcentagem do VO2max utilizada no limiar anaeróbio ventilatório.
A tabela 9 apresenta os valores de freqüência cardíaca obtida no limiar anaeróbio ventilatório durante o teste de esforço e a sua porcentagem no limiar anaeróbio ventilatório com os valores expressos como média±desvio padrão.
As meninas eutróficas apresentaram maiores valores para a freqüência cardíaca no limiar anaeróbio ventilatório e para a porcentagem da freqüência cardíaca máxima utilizada no limiar anaeróbio ventilatório.
Os valores da ventilação no limiar anaeróbio ventilatório e da porcentagem da ventilação máxima no limiar anaeróbio ventilatório durante o teste de esforço máximo estão apresentados na tabela 10 com valores expressos como média ± desvio padrão.
As meninas eutróficas apresentaram maiores valores para a ventilação no limiar anaeróbio ventilatório e para a porcentagem da ventilação máxima utilizada no limiar anaeróbio ventilatório.
A tabela 11 apresenta os valores de carga de trabalho no limiar anaeróbio ventilatório de meninas eutróficas e com desnutrição pregressa expressa em média desvio ± padrão.
O grupo I, formado por meninas eutróficas, não apresentou valores de carga de trabalho diferentes do grupo II, meninas com desnutrição pregressa.
DISCUSSÃO
Segundo os dados das tabelas 1, 2 e 3, as crianças do presente estudo estão dentro dos padrões para serem classificas nos dois grupos descritos na metodologia, um denominado de eutróficas e o outro, de grupo com desnutrição pregressa.
Quando o grupo das eutróficas é comparado aos dados nacionais apresentados por França, Matsudo, França (1993) percebe-se que os dados sobre estatura e peso são coincidentes, entretanto o grupo das desnutridas pregressas apresenta menor valor para a estatura, enquanto os valores de peso são coerentes com os descritos no citado estudo. Esta diferença na estatura é a principal característica da desnutrição pregressa.
Os estudos existentes utilizando a mesma metodologia ou semelhante a deste estudo, medidas indiretas através da análise de gases expirados, são, na sua maioria, com crianças atletas, crianças que apresentam algum tipo de patologia, ou devido a circunstâncias pós-operatórias. Poucos são os estudos com as crianças não-atletas e os estudos realizados com as desnutridas são ainda mais escassos.
Cooper; Weiler-Ravell; Whipp & Wasserman (1984) reportaram valores de VO2max (mL/min/kg) com média de 38±7 para meninas não-atletas com idade média de nove anos, enquanto que Armon; Cooper; Flores; Zanconato & Barstow, (1991) relataram média igual a 43±6 (mL/min/kg), para crianças (meninos e meninas) não-atletas com idades entre os 6 e 12 anos.
Os valores apresentados por este estudos são similares com os descritos acima, tanto para as meninas eutróficas (VO2max mL/min/kg = 40,23±6,98), quanto para as com desnutrição pregressa (VO2max mL/min/kg = 40,53±6,32), e estão de acordo com os valores de consumo máximo de oxigênio previstos por Cooper & Weiler-Ravell (1984) para crianças menores de 13 anos (38±7 mL/min/kg).
Em um estudo realizado por Rutenfranz et al. (1981) os valores médios de consumo de oxigênio para meninas norueguesas com idade média de nove anos, expresso em litros/min, foi de 1,48±4. Este estudo apresentou valores menores para as eutróficas (1,11±0,25) e para as meninas com desnutrição pregressa (1,02±0,19). Essa diferença pode estar associada a diferenças étnicas, nutricionais e, também, a diferenças de composição corporal, uma vez que a altura média das meninas do citado estudo é de 136,1 cm, enquanto que a deste estudo é de 131,31 cm para as eutróficas e 125,06 para as com desnutrição pregressa.
A maioria dos estudos sobre aptidão cardiorrespiratória realizados em crianças brasileiras utilizaram métodos indiretos (Desai et al., 1981; Anjos & Boileau, 1988; Duarte & Duarte, 1989), e não apresentaram valores de consumo de oxigênio obtidos por metodologia semelhante à utilizada neste estudo.
Desai et al. (1981) utilizaram a freqüência cardíaca com determinante da capacidade de trabalho físico em testes realizados com crianças em bicicleta ergométrica. Foi relatado que crianças de baixo nível socio-econômico (bóias-frias) quando comparadas a crianças de classe média de cidades do interior de São Paulo, apresentaram uma menor performance física, relacionando-a com um menor tamanho corporal e uma menor massa magra, conseqüentes de desnutrição nos primeiros anos de vida. Foi também observado que crianças desnutridas apresentavam valores significativamente maiores para FC nas mesmas cargas de trabalho de crianças eutróficas, o que sugere que crianças desnutridas apresentaram menor condicionamento físico que controles.
Anjos & Boileau (1988) utilizaram a intensidade de esforço necessária para elevar a FC até 170 bpm (PWC 170) para determinação da aptidão cardiorrespiratória em meninos eutróficos e desnutridos com desnutrição vigente. Duarte & Duarte (1989) avaliaram a capacidade aeróbia de crianças eutróficas de 10 a 18 anos com a aplicação do teste PWC 170. Entretanto, Reybrouck; Weymans; Stijns & Van der Hauwaert (1986), não obtiveram bons resultados com PWC 170 para diferenciar crianças com cardiopatia em relação a um grupo controle sem doença, e concluíram que o limiar anaeróbio ventilatório é um índice mais sensível.
Barac-Nieto, Spurr, Reina (1984) conduziram um estudo, comparando o consumo de oxigênio de crianças desnutridas e eutróficas, e concluíram que os resultados mostrando que o VO2max das desnutridas expresso por kg de peso corporal era maior que das eutróficas se devia ao fato de que as crianças desnutridas apresentavam maior proporção de massa magra corporal.
Nossos resultados demonstram que meninas com desnutrição pregressa apresentam VO2max e respostas cardiorrespiratórias ao exercício máximo similares às das meninas eutróficas. A capacidade máxima de realização de trabalho (watts max) durante o teste de esforço máximo também não apresentou diferenças entre os grupos. Assim, é provável que a desnutrição nos primeiros anos de vida possa não ter efeito longitudinal se a criança recuperar a relação peso/estatura esperada, após um aumento na ingestão calórica.
Os valores de consumo de oxigênio no limiar anaeróbio encontrados neste estudo são similares aos descritos por Cooper; Weiler-Ravell; Whipp & Wasserman, (1984), de 23±4 mL/min/kg, e os por Armon; Cooper; Flores; Zanconato & Barstow, (1991), de 23,6±3,5 mL/min/kg, estão de acordo com os valores de 23±4 mL/min/kg previstos para meninas menores de 13 anos (Cooper & Weiler-Ravell, 1984).
Neste estudo não foi possível determinar diferenças no consumo de oxigênio do limar anaeróbio, expresso por quilograma de peso corporal, entre meninas eutróficas e com desnutrição pregressa. Aparentemente, a recuperação da relação esperada de peso/estatura é suficiente para o restabelecimento da capacidade de trabalho submáximo.
As diferenças encontradas, entre as meninas com desnutrição pregressa e as eutróficas para os valores de consumo de oxigênio no limiar anaeróbio ventilatório expresso por litros/min e em porcentagem do VO2max, porcentagem do VEmax no limiar anaeróbio ventilatório e VE no limiar anaeróbio ventilatório, parecem estar mais relacionadas com a diferença de estatura existente, visto que os maiores valores foram apresentados pelas eutróficas que possuem maior estatura que as com desnutrição pregressa.
A inexistência de diferenças significativas na carga de trabalho no limiar anaeróbio indica que as meninas apresentam capacidades de realização de trabalho submáximo semelhantes (mesma carga em watts), mas, quando se considera o gasto energético representado por litros de O2 consumido, observa-se que as meninas com desnutrição pregressa parecem apresentar melhor economia de movimento, isto é, menor consumo de oxigênio para uma mesma intensidade de trabalho.
Fatores relacionados com a composição corporal, não analisada no presente estudo, podem ser responsáveis pela melhor economia de movimento observada no grupo formado por meninas com desnutrição pregressa.
Os menores valores de freqüência cardíaca e VE, apresentados no limiar anaeróbio ventilatório pelas meninas com desnutrição pregressa, parece indicar uma menor sobrecarga nos sistemas cardiovascular e respiratória para a realização de trabalho submáximo, porém são necessários estudos complementares para uma comprovação mais detalhada a respeito da sobrecarga nos sistemas cardiovascular e respiratório durante o exercício em crianças com desnutrição pregressa.
Os dados do presente estudo sugerem que as crianças desnutridas pregressas apresentam uma adaptação para produzir menor estresse fisiológico para a realização de atividade física submáxima ou moderada, quando comparadas a crianças eutróficas.
De acordo com os resultados deste estudo, o critério de restabelecimento da relação esperada peso/estatura para considerar crianças com desnutrição pregressa como recuperadas parece ser adequado também para indicar normalidade da potência aeróbia máxima, limiar anaeróbio, resposta ventilatória e de freqüência cardíaca ao exercício.
SUMMARY
Metabolic and cardiovascular responses to maximal and submaximal exercise in eutrophic and stunted girls
OBJECTIVE: The metabolic and cardiovascular responses of eutrophic girls and girls who underwent early undernutrition, were examined during physical exercise, in order to verify whether previous undernutrition could, in addition to cause a deficit in the children's height, and limit their functional capability to perform a maximal and submaximal exercise in an ergometric bicycle.
SUBJECTS: Our sample was composed of 24 girls, of which 12 were eutrophic, with 9.13 ± 0.79 years (mean ± s.d.), 27.64 ± 3.64 kg of body weight, and 131.31 ± 6.04 cm in height. The 12 early undernourished girls were 9.75 ± 1.1 years old, 25.16 ± 2.33 kg, and 125.06 ± 3.9 cm high.
MEASUREMENTS: The method included clinical evaluation and ergo-spirometric test on an ergometric bicycle, from which all the metabolic and cardiac-respiratory variables were obtained and analyzed. The test protocol was an initial two minutes period with 25 watts, followed by increments of 15 watts every two minutes, until exhaustion.
RESULTS: Analysis of the results of the test of maximal effort did not reveal significant differences between eutrophic (E) and early undernourished (UN) girls in any of the variables: VO2max expressed in l/min (E = 1.11 ± 0.25; UN = 1.02 ± 0.19); VO2max expressed in ml/min/kg (E = 40.23 ± 6.98; UN = 40.53 ± 6.32), VEmax (E = 40.61 ± 8.79; UN = 38.25 ± 8.95), R (E = 1.13 ± 0.07; UN = 1.13 ± 0.05), HRmax (E = 195.33 ± 9.13; UN = 193.85 ± 11.18), previous % HRmax (E = 92.87 ± 4.33; UN = 92.80 ± 4.87), and maximum watts (E = 90.00 ± 20.56; UN = 91.25 ± 11.33). Analysis of the results obtained in test of submaximal effort, reflected by the intensity of effort in the anaerobic threshold (AT), showed differences between the groups in the following variables: VO2max expressed in l/min. (E = 0.77 ± 0.14; UN = 0.62 ± 0.13), % of VO2max (E = 70.07 ± 7.52; UN = 61.21 ± 9.83), HR (E = 166.58 ± 14.25; UN = 146.33 ± 17.40), % HRmax (E = 85.31 ±6.41; UN = 75.50 ± 7.73), VE (E = 24.18 ± 5.81; UN = 17.69 ± 4.30), % VEmax (E = 59.64 ± 8.45; UN = 46.95 ± 10.59). No differences were found for VO2max, expressed in l/min/kg (E = 28.06 ± 4.87; UN = 24.81 ± 5.31) and watts (E = 51.25 ± 17.47; UN = 45.00 ± 9.77).
CONCLUSION: The reestablishment of the ratio weight/height in early undernourished girls is also useful to indicate lack of limitation of functional capability to perform physical exercises.
KEY-WORDS: Exercise. Oxygen consumption. Stunted. Eutrophic girl.
AGRADECIMENTOS
Flávio Ascanio Antônio Lauro e Sérgio Garcia Stella pela ajuda na realização dos testes e Luciane Grillo por trazer os voluntários para a pesquisa.
Artigo recebido: 21/07/98
Aceito para publicação: 15/08/00
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
18 Jan 2001 -
Data do Fascículo
Out 2000
Histórico
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Recebido
21 Jul 1998 -
Aceito
15 Ago 2000