Resumos
OBJETIVOS: Avaliar a influência do tratamento neoadjuvante (quimioterápico e/ou radioterápico) nas complicações pós-operatórias e letalidade hospitalar de pacientes com câncer de esôfago submetidos a esofagectomia com linfadenectomia em dois campos. MÉTODOS: Estudo retrospectivo de 132 pacientes com câncer de esôfago admitidos no Departamento de Cirurgia do Hospital Erasto Gaertner de janeiro de 1987 a janeiro de 1998, divididos de acordo com a realização ou não de tratamento neoadjuvante. Analisaram-se as variáveis relativas ao paciente (sexo, idade, estado geral, perda ponderal, co-morbidades, tabagismo, risco pulmonar), ao tumor (tipo histológico, localização, estádio clínico) e ao procedimento cirúrgico (local e tipo da anastomose, tempo cirúrgico, tempo de permanência hospitalar), relacionando-as com as complicações e mortalidade pós-operatórias. RESULTADOS: Noventa e quatro pacientes (71,2%) eram do sexo masculino. O tipo histológico predominante foi o CEC em 94,7% e oito pacientes (66,6%) eram tabagistas, e as principais co-morbidades anotadas foram: DPOC (29,55%) e HAS (15,15%). A principal localização do tumor foi o segmento torácico inferior (56,06%), com extensão tumoral média de 47,72 (8-70) mm. Seis pacientes (4,54%) eram EC I, 44 (33,33%) IIA, 24 (18,18%) IIB, 38 (28,80%) III e 17 (12,90%) IV. Quanto ao tratamento neoadjuvante, 39 pacientes (29,54%) foram submetidos a quimioterapia e 22 (16,67%) a radioterapia. As complicações pós-operatórias foram de 74,35% (p=0,0002) e 72,73% (p=0,0037), respectivamente. A taxa de complicações foi de 39,3% e a letalidade hospitalar 13,70%, representadas mais freqüentemente pelas causas pleuropulmonares. CONCLUSÕES: O tratamento neoadjuvante quimioterápico e radioterápico foi relacionado com maior ocorrência de complicações pós-operatórias, sem influência na letalidade hospitalar.
Câncer de esôfago; Complicações; Tratamento neoadjuvante; Quimioterapia; Radioterapia
BACKGROUND: To evaluate the influence of neoadjuvant treatment (chemotherapy and/or radiotherapy) on postoperative complications and hospital lethality in patients with esophageal cancer submitted to esophagectomy with two-field lymphadenectomy. METHODS: Retrospective study of 132 patients with esophageal cancer admitted in Department of Surgery in Erasto Gaertner Hospital, from January 1987 to January 1998, divided according to realization of neoadjuvant treatment or not. Variables related to patient (sex, age, general condition, ponderal loss, co-morbidities, tabagism), to tumor (histological type, localization, staging) and to surgical procedure (type and localization of anastomosis, surgical time, hospitalization time) were noted and related to postoperative complications and mortality. RESULTS: Ninety-nine patients (71.2%) were of male sex. The predominant histological type was squamous cell carcinoma in 94.7% of the cases. Eighty-eight patients (66.6%) were smokers, and the main co-morbidities noted were: chronic obstructive pulmonary disease (29.55%) and arterial hypertension (15.15%). The main localization of the tumor was inferior thoracic segment (56.06%), with average tumoral extension of 47,72 (8-70) mm. Six patients (4.54%) were stage I, 44 (33.33%) IIA, 24 (18.18%) IIB, 38 (28.80%) III and 17 (12.90%) IV. Considering the neoadjuvant treatment, 39 patients (29.54%) were submitted to chemotherapy and 22 (16.67%) to radiotherapy. The postoperative complications were 74.35% (p=0.0002) and 72.73% (p=0.0037), respectively. The complication rate was 39.3% and hospital lethality 13.70%, represented more frequently by pleuropulmonar causes. CONCLUSION: Neoadjuvant chemotherapic and radiotherapeutic treatments were related to superior occurrence of postoperative complications, without influence on hospital lethality.
Esophageal cancer; Complications; Neoadjuvant treatment; Chemotherapy; Radiotherapy
ARTIGO ORIGINAL
Influência do tratamento neoadjuvante na morbi-mortalidade das esofagectomias
Influence of neoadjuvant treatment on morbidity-mortality of esophagectomies
Flávio Daniel Saavedra Tomasich; Gerardo Cristino Gavarrette Valladares; Viviane Coimbra Augusto Demarchi; Danilo Gagliardi
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Flávio Daniel Saavedra Tomasich Rua Dr. Ovande do Amaral, 201 Jardim da Américas 81520-060 Curitiba PR Fone: (41) 361-5237 Fax: (41) 361-5071
RESUMO
OBJETIVOS: Avaliar a influência do tratamento neoadjuvante (quimioterápico e/ou radioterápico) nas complicações pós-operatórias e letalidade hospitalar de pacientes com câncer de esôfago submetidos a esofagectomia com linfadenectomia em dois campos.
MÉTODOS: Estudo retrospectivo de 132 pacientes com câncer de esôfago admitidos no Departamento de Cirurgia do Hospital Erasto Gaertner de janeiro de 1987 a janeiro de 1998, divididos de acordo com a realização ou não de tratamento neoadjuvante. Analisaram-se as variáveis relativas ao paciente (sexo, idade, estado geral, perda ponderal, co-morbidades, tabagismo, risco pulmonar), ao tumor (tipo histológico, localização, estádio clínico) e ao procedimento cirúrgico (local e tipo da anastomose, tempo cirúrgico, tempo de permanência hospitalar), relacionando-as com as complicações e mortalidade pós-operatórias.
RESULTADOS: Noventa e quatro pacientes (71,2%) eram do sexo masculino. O tipo histológico predominante foi o CEC em 94,7% e oito pacientes (66,6%) eram tabagistas, e as principais co-morbidades anotadas foram: DPOC (29,55%) e HAS (15,15%). A principal localização do tumor foi o segmento torácico inferior (56,06%), com extensão tumoral média de 47,72 (8-70) mm. Seis pacientes (4,54%) eram EC I, 44 (33,33%) IIA, 24 (18,18%) IIB, 38 (28,80%) III e 17 (12,90%) IV. Quanto ao tratamento neoadjuvante, 39 pacientes (29,54%) foram submetidos a quimioterapia e 22 (16,67%) a radioterapia. As complicações pós-operatórias foram de 74,35% (p=0,0002) e 72,73% (p=0,0037), respectivamente. A taxa de complicações foi de 39,3% e a letalidade hospitalar 13,70%, representadas mais freqüentemente pelas causas pleuropulmonares.
CONCLUSÕES: O tratamento neoadjuvante quimioterápico e radioterápico foi relacionado com maior ocorrência de complicações pós-operatórias, sem influência na letalidade hospitalar.
Unitermos: Câncer de esôfago. Complicações. Tratamento neoadjuvante. Quimioterapia. Radioterapia
SUMMARY
BACKGROUND: To evaluate the influence of neoadjuvant treatment (chemotherapy and/or radiotherapy) on postoperative complications and hospital lethality in patients with esophageal cancer submitted to esophagectomy with two-field lymphadenectomy.
METHODS: Retrospective study of 132 patients with esophageal cancer admitted in Department of Surgery in Erasto Gaertner Hospital, from January 1987 to January 1998, divided according to realization of neoadjuvant treatment or not. Variables related to patient (sex, age, general condition, ponderal loss, co-morbidities, tabagism), to tumor (histological type, localization, staging) and to surgical procedure (type and localization of anastomosis, surgical time, hospitalization time) were noted and related to postoperative complications and mortality.
RESULTS: Ninety-nine patients (71.2%) were of male sex. The predominant histological type was squamous cell carcinoma in 94.7% of the cases. Eighty-eight patients (66.6%) were smokers, and the main co-morbidities noted were: chronic obstructive pulmonary disease (29.55%) and arterial hypertension (15.15%). The main localization of the tumor was inferior thoracic segment (56.06%), with average tumoral extension of 47,72 (8-70) mm. Six patients (4.54%) were stage I, 44 (33.33%) IIA, 24 (18.18%) IIB, 38 (28.80%) III and 17 (12.90%) IV. Considering the neoadjuvant treatment, 39 patients (29.54%) were submitted to chemotherapy and 22 (16.67%) to radiotherapy. The postoperative complications were 74.35% (p=0.0002) and 72.73% (p=0.0037), respectively. The complication rate was 39.3% and hospital lethality 13.70%, represented more frequently by pleuropulmonar causes.
CONCLUSION: Neoadjuvant chemotherapic and radiotherapeutic treatments were related to superior occurrence of postoperative complications, without influence on hospital lethality.
Key words: Esophageal cancer. Complications. Neoadjuvant treatment. Chemotherapy. Radiotherapy.
INTRODUÇÃO
Na estimativa mundial realizada por Parkin et al. (1999), o câncer de esôfago é a quarta neoplasia com pior sobrevida, perdendo somente para o câncer de fígado, pâncreas e pulmão. No Brasil, em 1999, foram registradas 4.932 mortes por câncer de esôfago, representando 4,61% de todas as mortes por câncer2.
O tratamento do câncer de esôfago esbarra em dificuldades impostas pelo próprio tumor, estado geral do paciente e opções terapêuticas agressivas. A cirurgia persiste como tratamento principal, podendo atingir níveis de cura expressivos nos estágios iniciais da doença. A radioterapia e quimioterapia têm sido utilizadas como associadas à cirurgia na tentativa de melhorar os resultados e a sobrevida destes pacientes.
A utilização da radioterapia como opção pré-operatória se baseia na redução tumoral que facilitaria o procedimento cirúrgico3,4. Entretanto, essa modalidade terapêutica é controversa, tanto em relação aos benefícios dessa associação, como em relação ao potencial aumento das taxas de mortalidade e morbidade operatória.
Da mesma forma, a quimioterapia tem sido utilizada como tratamento neoadjuvante em pacientes potencialmente curáveis, baseando-se no fato de que os tratamentos isolados têm resultados pobres e no conceito de que a disseminação se processa precocemente. Especificamente na quimioterapia pré-operatória procura-se aumentar a ressecabilidade e o controle local da doença e diminuir as micrometástases, tendo em contrapartida o risco potencial de surgimento de clones tumorais quimio-resistentes, o retardo do tratamento definitivo e o aumento das complicações operatórias. A associação destas duas armas terapêuticas (quimioterapia e radioterapia) no pré-operatório, com o objetivo de aumentar a eficácia do tratamento foi utilizada por vários autores, mostrando, porém, resultados conflitantes5-7.
Diversos fatores são associados com a ocorrência das complicações pós-operatórias e letalidade hospitalar da cirurgia do câncer do esôfago, entre os quais: idade, sexo, doenças associadas, localização e/ou extensão do tumor, tipo histológico, estado nutricional e/ou deficiência imunológica, quimioterapia e/ou radioterapia, cirurgia realizada, tipo de anastomose, local da anastomose, estádio da doença, complicações pleuro-pulmonares, deiscências das anastomoses e reoperações8 10, justificando assim as preocupações na identificação de fatores de risco para o desenvolvimento dessas complicações.
Os objetivos deste estudo foram avaliar a influência do tratamento neoadjuvante (quimioterápico e/ou radioterápico) na ocorrência de complicações pós-operatórias imediatas e a letalidade hospitalar de pacientes com câncer de esôfago submetidos a esofagectomia com linfadenectomia em dois campos.
MÉTODOS
Foram avaliados 132 pacientes portadores de câncer do esôfago admitidos no Departamento de Cirurgia do Hospital Erasto Gaertner, no período de janeiro de 1987 até janeiro de 1998. Todos submetidos à rotina de exames pré-operatórios e estadiados de acordo com as normas de classificação TNM da União Internacional de Combate ao Câncer (UICC). Foram incluídos no estudo pacientes com câncer de esôfago com confirmação histológica, localizados nos segmentos abdominal e torácico superior, médio ou inferior, com até 7 cm de extensão, sem desvio significativo do eixo, sinus e/ou trajeto fistuloso ao esofagograma e esofagoscopia, sem sinais de invasão por contigüidade ou disseminação à distância. Foram excluídos os tumores da região cervical.
Os pacientes selecionados foram submetidos a esofagectomia, com ressecção macroscópica completa do tumor em todos casos, e linfadenectomia abdominal e mediastinal concomitante (cadeias para-esofágica, paratraqueal, subcarinal, para-cardiais, tronco celíaco, pequena e grande curvatura do estômago), através de laparotomia mediana xifoumbilical, tora-cotomia direita no quinto espaço intercostal e, cervicotomia lateral esquerda nas anas-tomoses cervicais. Efetuamos quatro tipos de reconstrução do trânsito: esôfagogástrica intratorácica, esôfagogástrica cervical, esôfagocólica cervical e esôfagojejunal intra-torácica, com anastomose manual ou mecânica. Foram submetidos a tratamento neo-adjuvante os pacientes com tumores T3 e/ou com suspeita de metástases linfonodais regionais aos exames de imagem, totalizando 61 casos.
Foram anotadas as seguintes variáveis: sexo, idade, estado geral através das escalas de Zubrod e Karnofsky Performance Status, grau de desnutrição, perda ponderal, co-morbidades, tabagismo, risco pulmonar, tipo histológico, localização do tumor, estadio clínico, local e tipo da anastomose, tempo cirúrgico, tempo de permanência hospitalar, complicações pós-operatórias e letalidade hospitalar. As variáveis foram comparadas em relação à realização de tratamento neoadjuvante, avaliando a ocorrência de complicações e letalidade pós-operatórias.
Foram consideradas como complicações pós-operatórias quaisquer intercorrências, isoladas ou múltiplas, de natureza diversa, que necessitaram tratamento clínico, cirúrgico ou associado, dependendo de sua gênese, ocorridas no período de 30 dias após o ato cirúrgico. Foram agrupadas em pleuro-pulmonares, cardiovasculares, fístulas, infecciosas, neurológicas, hemorrágicas, quilotórax, insuficiência renal. A mortalidade pós-operatória foi definida como os óbitos ocorridos até 30 dias após o ato cirúrgico ou após 30 dias quando decorrentes de complicações pós-operatórias.
Os resultados foram submetidos à análise estatística descritiva, testes de diferenças entre percentuais, análise univariada e multivariada. O nível de significância adotado foi de 5% (p<0,05).
RESULTADOS
Noventa e quatro pacientes (71,2%) eram do sexo masculino e 38 (28,8%) do feminino. Quanto ao tipo histológico verificamos: 125 (94,7%) casos de carcinoma de células escamosas, seis casos de adenocarcinoma (4,5%) e um caso de carcinossarcoma (0,8%).
Em relação à escala de Karnofsky, 95 (72%) dos pacientes apresentava escore igual ou superior a 80%, 36 (27%) índice igual a 70% e apenas um (0,75%) menor que 70%. Na escala de Zubrod, quatro pacientes (3%) apresentavam escore zero; 86 (65,1%), um; 36 (27,2%), dois e seis (4,5%), três. Cerca de noventa por cento do grupo sem tratamento neoadjuvante e 94,74% do submetido a tratamento neoadjuvante tinham Zubrod igual ou inferior a dois, sem diferença estatisticamente significante entre os grupos (p=0,22).
Oitenta e três pacientes (63%) apresentavam algum grau de desnutrição. Emagrecimento esteve presente em 94,7% da amostra, com perda ponderal de 10% em 37 pacientes (29,6%), de 10% a 20% em 43 (34,4%) e acima de 20% em 45 (36%).
Trinta e nove pacientes (29,55%) tinham DPOC relatada e confirmada pelos exames complementares; 15,15% tinham HAS, 6,06% hipersensibilidade a algum tipo de medicamento e 1,51% megaesôfago. Oitenta e oito pacientes (66,67%) eram tabagistas. Setenta e três por cento dos pacientes apresentava risco pulmonar I e II, e 27% risco III e IV, considerados como risco moderado e grave.
A localização dos tumores foi em segmento torácico inferior em 74 pacientes (56,06%), torácico médio em 55 (41,67%) e torácico superior em três (2,27%), com média da extensão tumoral de 47,72 mm, variando de 8 a 70mm. Em relação ao estadiamento do tumor, 11 pacientes (8,33%) eram T1, 43 (32,58%) T2, 58 (43,94%) T3 e 12 (9,09%) T4. Os linfonodos encontraram-se comprometidos em 72 casos (54,54%) e havia metástases em 17 (12,90%). Assim sendo, seis pacientes (4,54%) eram EC I, 44 (33,33%) EC IIA, 24 (18,18%) EC IIB, 38 (28,80%) EC III e 17 (12,90%) EC IV. Três pacientes não foram estadiáveis.
A anastomose esôfago-gástrica intra-torácica foi a mais freqüentemente realizada (78,04%), seguida pela esôfago-gástrica cervical (19,70%), esôfago-jejunal intra-torácica (1,5%) e coloplastia (0,75%). A confecção da anastomose foi mecânica em 87 pacientes (65,09%) e manual em 45 (34,91%). Em relação às fístulas, quando confeccionadas manualmente, ocorreram em 13,3%, comparadas com 3,44% nas realizadas com sutura mecânica, não sendo estatisticamente significante (p=0,12). Comparando o tipo de anastomose em relação à localização da mesma, nas manuais cervicais ocorreram fistulas em 21,7% e 4,55% nas manuais intratorácicas, sem significância estatística (p=0,0971). Nas confeccionadas mecanicamente ao nível cervical, 25%, contra 2,41% nas mecânicas intratorácicas, não sendo estatisticamente significante.
O tempo cirúrgico médio foi de 342,7 minutos, oscilando entre 180 até 600 minutos. A média global de permanência hospitalar foi de 20,5 dias e a pós-operatória de 15,8 dias.
Trinta de nove pacientes (29,54%) foram submetidos a tratamento quimioterápico pré-operatório com cisplatina e/ou 5-FU, variando de um a seis ciclos, com média de 2,43 ciclos. Destes, 29 (74,35%) apresentaram complicações pós-operatórias (p=0,0002) e dois (5,1%) evoluíram para óbito. (Figura 1 e Tabela 1)
Vinte e dois pacientes (16,67%) realizaram radioterapia pré-operatória, com dose média de 46 Gy (variando de 20 a 65 Gy). Dezesseis (72,73%) apresentaram complicações pós-operatórias (p=0,0037). (Figura 2 e Tabela 1)
A associação de radio e quimioterapia no pré-operatório foi utilizada em 11 pacientes (8,33%), dos quais 10 (90,90%) apresentaram algum tipo de complicação pós-operatória (p=0,0011) (Figura 3 e Tabela 1). A mortalidade pós-operatória foi de 4,5%.
Quando comparados os casos precoces, incluindo os estádios I e II (n=74), 33 (44,59%) pacientes apresentaram algum tipo de complicação pós-operatório; e 18 (32,73%) dos casos avançados (n=55), especificados como estádios III e IV. A diferença entre os dois grupos não foi estatisticamente significante, com p=0,2067.
Complicações pós-operatórias, isoladas ou múltiplas, ocorreram em 52 pacientes (39,3%), sendo especificadas na Tabela 2. As complicações relacionadas aos diferentes esquemas terapêuticos pré-operatórios seguiram as taxas da amostra geral e estão especificadas na Tabela 3. A letalidade hospitalar global foi de 13,70%, sendo especificadas as causas de óbitos na Tabela 4.
Na análise univariada e multivariada, a correlação das variáveis (sexo, idade, Zubrod, Karnofsky performance status, localização do tumor, risco pulmonar, local e tipo da anastomose, estadio clínico) com as resultantes (complicações e letalidade hospitalar) não foram consideradas estatisticamente significantes.
DISCUSSÃO
O aprimoramento da técnica cirúrgica e os avanços tecnológicos que ocorreram nas últimas décadas, não trouxeram progressos significativos na sobrevida a longo prazo nos pacientes com carcinoma de esôfago, justificando a associação de terapias de múltiplas modalidades na busca de melhores resultados. Entretanto, vários autores têm estudado exaustivamente a interferência dessas associações na morbidade pós-operatória e letalidade hospitalar, com resultados bastante controversos. Acreditamos que as grandes divergências entre as taxas obtidas pelos diferentes estudiosos do assunto sejam decorrentes de amostras com diferentes características.
As complicações pós-operatórias das esofagectomias por câncer do esôfago são freqüentes, podendo alcançar taxas de até 65%5,9-25. A porcentagem registrada em nossa casuística (39,3%) é, portanto, aceitável.
A presença de deiscência de anastomose é uma complicação freqüentemente descrita9,11,15-18,22-26, sendo em alguns estudos a principal complicação pós-operatória, podendo atingir taxas acima de 30%. Nosso índice de fístula foi de 17,3%, sendo comparável com os dados apresentados na literatura. Esta complicação pode ser atribuída ao tipos de reconstrução utilizada, no presente estudo a análise uni e multivariada mostrou que o tipo (manual ou mecânica) e local (cervical ou intra-toracica) das anastomoses não influenciou na morbidade.
Segundo Edelman (2000), 30% dos pacientes com câncer do esôfago se apresentam com doença disseminada, e aproximadamente 50% dos pacientes com estadio clínico II ou III apresentam alto risco de morte independente do tratamento realizado. Taxas de respostas variando de 40% a 60 %, médias de sobrevida de 9 a 14 meses, mostrando um prolongamento da sobrevida comparada com os grupos controles históricos, são os argumentos concretos que os defensores da quimioterapia pré-operatória utilizam7.
Schlag, em 1992, suspendeu a utilização de quimioterapia pré-operatória pelo aumento proibitivo da morbi-mortalidade operatória.
Defensores do tratamento neo-adjuvante14,29 afirmam que não constatam aumento nas taxas de complicações ou letalidade hospitalar relacionada ao mesmo. Por outro lado, a utilização da radioterapia isoladamente ou associada à quimioterapia como terapêutica neoadjuvante apresenta resultados conflitantes em relação às complicações pós-operatórias e sobrevida24,25,30-33.
Earlam & Cunha Melo (1980), em extensa revisão da literatura durante um período de 20 anos, em que incluíram 122 artigos, que coletavam 83.783 pacientes, verificaram piores resultados com esta modalidade. A partir desta época, houve uma mudança na indicação da radioterapia até chegar aos atuais esquemas. Esses resultados foram corroborados por Sugimachi et al. (1986), que analisaram os efeitos da irradiação pré-operatória, encontrando uma maior freqüência de complicações pulmonares.
Le Prisé et al. (1994), comparando quimioterapia associada a radioterapia pré-operatória e cirurgia exclusiva no tratamento do câncer do esôfago, não verificaram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, quando se avalia letalidade hospitalar e sobrevida.
Walsh et al. (1996) apresentaram 86 pacientes portadores de carcinoma de células escamosas do esôfago divididos em dois grupos. No primeiro, o tratamento foi realizado apenas com cirurgia, no segundo houve realização de quimioterapia e radioterapia pré-operatória. A letalidade hospitalar foi 7% no grupo de cirurgia exclusiva e 9,4% no outro. Já a sobrevida em três anos mostrou diferença estatisticamente significativa (p=0.01) a favor do segundo grupo, sendo 13,8% e 32%, respectivamente.
Eguchi et al. (1999) realizaram estudo comparativo entre 506 pacientes portadores de câncer do esôfago submetidos a tratamento cirúrgico exclusivo e 72 pacientes submetidos a quimioterapia e/ou radioterapia neoadjuvante. As complicações operatórias foram ligeiramente superiores no grupo submetido ao tratamento neoadjuvante, com fístulas em 24% dos casos e 16% de pneumonia. A utilização de quimioterapia e radioterapia aumentou significativamente as taxas de pneumonia (67%; p<0,05). A letalidade hospitalar registrada foi de 6% no grupo submetido a tratamento neoadjuvante e 2,4% no grupo controle.
Karl et al. (2000) publicaram os resultados de 143 pacientes portadores de câncer do esôfago tratados em uma instituição multidisciplinar especializada no tratamento das neoplasias, num período de 10 anos. Destes pacientes, 28 receberam quimioterapia e radioterapia neoadjuvante. As complicações pós-operatórias imediatas atingiram 29%, 26 (19%) pacientes com complicações pulmonares, cinco (3,5%) com fístula. A letalidade hospitalar foi de 2,1%.
Em nossa casuística, os pacientes que realizaram quimioterapia pré-operatória apresentaram 74,35% de complicações pós-operatórias e 72,73% nos pacientes submetidos a radioterapia prévia, ambos com significância estatística em relação ao grupo submetido a cirurgia exclusiva. Quando analisamos a associação de quimioterapia e radioterapia, o índice de complicações é ainda mais elevado, atingindo 90,9% da amostra (p=0,0011). Os tipos de complicações relacionadas a cada grupo de tratamento pré-operatório (quimioterapia, radioterapia e associação) seguiram uma distribuição semelhante ao geral da amostra, não sendo passíveis de análise estatística.
A letalidade hospitalar não foi influenciada pelo tratamento neoadjuvante, tanto radioterápico quanto quimioterápico. Múltiplas são as variáveis que interferem na letalidade hospitalar, tornando difíceis as comparações na literatura. A letalidade hospitalar na literatura atinge até 15%9,12,13,15-26,31,33,36,37. A letalidade obtida nessa amostra (13,7%), representa a experiência de um serviço especializado, no qual o grande número de pacientes portadores de câncer do esôfago que chegam permite uma seleção daqueles candidatos a uma cirurgia de caráter curativo com um adequado preparo pré-operatório, sendo a quimioterapia e radioterapia pré-operatórias fatores importantes a serem considerados.
As principais causas de óbitos foram pleuropulmonares, cardiovasculares, fístulas, sépsis, com resultados semelhantes ao da literatura8,11,15,24. Entre os fatores de risco que podem influenciar a freqüência de letalidade hospitalar são referidos na literatura: idade avançada, doenças cardiovasculares, estado nutricional, índice de defesa do hospedeiro, localização do tumor, tipo histológico, estádio, seleção pré-operatória, procedimento cirúrgico, complicações pleuro-pulmonares, fístulas8-10. Realizada analise uni e multivariada demonstrou que nenhuma destas variáveis foi determinante para a mortalidade na presente amostra.
CONCLUSÃO
Considerando-se as limitações da cirurgia no tratamento curativo do câncer de esôfago, a associação do tratamento neoadjuvante vem contribuir para melhorar a sobrevida desses pacientes. Com certeza, nos próximos anos, novos esquemas terapêuticos surgirão, fazendo-se perpetuar o questionamento sobre a implicação na morbimortalidade pós-operatória.
O tratamento neoadjuvante (radio-terápico e quimioterápico) foi relacionado com uma maior ocorrência de complicações pós-operatórias, não influenciando na letalidade hospitalar. Acreditamos que a utilização de terapêuticas adjuvantes deve ser feita com critérios de seleção adequados para reduzir as taxas de complicação e letalidade hospitalar.
Artigo recebido: 30/09/02
Aceito para publicação: 07/05/03
Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia do Hospital Erasto Gaertner da Liga Paranaense de Combate ao Câncer, Curitiba, PR.
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Endereço para correspondência
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Nov 2003 -
Data do Fascículo
Set 2003
Histórico
-
Aceito
07 Maio 2003 -
Recebido
30 Set 2002