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Pós de Al2O3/SiC obtidos a partir de reação de redução carbotérmica

Al2O3/SiC powders from carbothermal reduction reaction

Resumos

Neste trabalho foram utilizadas matérias-primas naturais para a obtenção de pós Al2O3/SiC através da redução carbotérmica das mesmas por um agente rico em carbono. Os aluminossilicatos estudados foram caulim, cianita e ilita-moscovita, sendo que os mesmos foram reduzidos ou por negro de fumo ou por grafite. Os pós resultantes da reação foram caracterizados por microscopia eletrônica de varredura e transmissão, difração de raios X e picnometria de hélio. Durante a reação, as diferenças existentes tanto na estrutura das matérias-primas quanto na composição química produziram pós com morfologia diversa. Foram encontradas estruturas como grandes aglomerados esféricos, whiskers, partículas e aglomerados fibrosos.

Redução carbotérmica; aluminossilicatos; compósito Al2O3/SiC; matérias-primas naturais


In this work natural raw materials were used to obtain Al2O3/SiC powders by carbothermal reduction. The aluminosilicates studied were kaolin, kyanite and illite-muscovite and the reductor agents were carbon black or graphite. The reaction powders were characterized by transmission and scanning electron microscopy, X-ray diffraction and helium picnometry. During the reaction, the differences among the raw materials structures as well as into the chemical composition produced powders with several morphologies. Big spherical agglomerates, whiskers, particles and fibrous clusters were found.

Carbothermal reduction; aluminosilicates; Al2O3/SiC composites; natural raw materials


Pós de Al2O3/SiC obtidos a partir de reação de redução carbotérmica

(Al2O3/SiC powders from carbothermal reduction reaction)

F. M. Spiandorello, C. E. Borsa, R. H. G. A. Kiminami

Departamento de Engenharia de Materiais, DEMa-UFSCar

Via Washington Luiz, km 235, C. P. 676, S. Carlos, SP, Brasil, 13565-905

Resumo

Neste trabalho foram utilizadas matérias-primas naturais para a obtenção de pós Al2O3/SiC através da redução carbotérmica das mesmas por um agente rico em carbono. Os aluminossilicatos estudados foram caulim, cianita e ilita-moscovita, sendo que os mesmos foram reduzidos ou por negro de fumo ou por grafite. Os pós resultantes da reação foram caracterizados por microscopia eletrônica de varredura e transmissão, difração de raios X e picnometria de hélio. Durante a reação, as diferenças existentes tanto na estrutura das matérias-primas quanto na composição química produziram pós com morfologia diversa. Foram encontradas estruturas como grandes aglomerados esféricos, whiskers, partículas e aglomerados fibrosos.

Palavras-chave: Redução carbotérmica, aluminossilicatos, compósito Al2O3/SiC, matérias-primas naturais.

Abstract

In this work natural raw materials were used to obtain Al2O3/SiC powders by carbothermal reduction. The aluminosilicates studied were kaolin, kyanite and illite-muscovite and the reductor agents were carbon black or graphite. The reaction powders were characterized by transmission and scanning electron microscopy, X-ray diffraction and helium picnometry. During the reaction, the differences among the raw materials structures as well as into the chemical composition produced powders with several morphologies. Big spherical agglomerates, whiskers, particles and fibrous clusters were found.

Keywords: Carbothermal reduction, aluminosilicates, Al2O3/SiC composites, natural raw materials.

INTRODUÇÃO

A obtenção de um pó contendo as fases Al2O3 e SiC é possível através de vários métodos: mistura mecânica de pós comerciais [1], pirólise de precursores orgânicos [2], processo sol-gel [3] e redução carbotérmica de aluminossilicatos. Este último consiste em misturar matérias-primas naturais com uma fonte rica em carbono e realizar a reação em uma atmosfera redutora. Vários autores já demonstraram a viabilidade deste processo [4–8]. O mesmo é interessante porque se utiliza de matérias-primas naturais, cujo custo é bem inferior que os das matérias-primas utilizadas nos outros métodos citados acima.

As reações estequiométricas teóricas para a obtenção de compósitos Al2O3/SiC a partir de caulim e cianita são mostradas abaixo:

Al2O3 • SiO2 • 2H2O + 3C ® Al2O3 + SiC + 2CO + 2H2O (A)

Caulinita

Al2O3 • SiO2 + 3C ® Al2O3 + SiC + 2CO (B)

Cianita

A ilita-moscovita é composta por estas duas fases, sendo muito complexa a determinação da quantidade presente de cada uma na matéria-prima. Assim, neste caso utiliza-se uma quantidade de carbono que se saiba que esteja em excesso para ambas.

Durante as reações de redução carbotérmica, há primeiramente a decomposição dos aluminossilicatos. No caso do caulim as reações de decomposição podem ser descritas por [9]:

3(Al2O3 • 2SiO2 • 2H2O) ® Al6Si2O13 + 4SiO2 + 6H2O (C)

Caulinita Mulita

Al6Si2O13(S) + 4SiO2 + 12C (S)® Al6Si2O13(S) + 4SiC (S) + 8CO(G) (D)

Al6Si2O13(S) + 4SiO2(S) + 18C (S)® 3Al2O3(S) + 6SiC (S) + 12CO (G) (E)

Todos os outros aluminossilicatos apresentam esse tipo de decomposição, sendo que todos passam por um estágio intermediário, onde mulita é formada [4].

Apesar das reações com os aluminossilicatos ocorrerem com relativa facilidade, existem vários fatores que influenciam nas características dos pós obtidos. Entre tais fatores estão incluídas a morfologia e a reatividade dos pós iniciais, a quantidade de fundentes presente nas matérias-primas, a razão entre as pressões parciais dos gases SiO, CO, CO2 e Si [9], formados durante a reação, e a temperatura em que a reação se processa.

Este trabalho investigou o efeito de algumas dessas variáveis nas características físicas de pós Al2O3/SiC produzidos pela redução carbotérmica de cinco matérias-primas diferentes.

MATERIAIS E MÉTODOS DE ANÁLISE

Neste trabalho foram utilizadas as seguintes matérias-primas: Caulim Coloidal, Ilita-Moscovita e Cianita, todas da Minasolo, Caulim Horii e Caulim Juareizinho. As análises químicas e as composições mineralógicas destes materiais encontram-se na Tabela I. As fontes de carbono utilizadas foram negro de fumo (área superficial de 114,89 m2/g e tamanho médio de partículas de 70 nm) e grafite (área superficial de 4,58 m2/g e tamanho médio de partículas de 1,20 mm).

Pelas análises químicas pode-se ver que as matérias-primas não são estequiométricas, ou seja, o teor de sílica (fator importante no caso deste trabalho) pode ser maior ou menor que o da fórmula estrutural teórica. Isso influencia na reação por existirem variações nas quantidade de SiO2 livre. A análise de difração de raios X mostrou que todas as matérias-primas apresentam SiO2 (quartzo) com fase minoritária.

Na Tabela II pode-se ver as diferenças existentes entre os teores de sílica teórico e real (sem considerar as impurezas) das matérias-primas. A IM não está presente pois não foi possível quantificar as duas fases, de modo a poder calcular-se o teor de sílica teórico.

As misturas de aluminossilicatos com carbono foram feitas mecanicamente em um meio aquoso. Não foram utilizadas as relações estequiométricas mostradas nas Equações (A) e (B), mas sim novas relações aluminossilicato/carbono calculadas a partir das análises químicas. As composições estudadas são mostradas na Tabela III.

As composições foram posteriormente secas e desaglomeradas em malha #100. Para a realização das reações, utilizou-se um forno Astro com elementos de grafite e atmosfera de argônio, sendo que as temperaturas utilizadas variaram de 1500 a 1600 ºC e o tempo de 2 a 3 horas. Findas as reações, os pós foram calcinados em ar a 625 ºC/2 h para a retirada de carbono residual. A caracterização dos pós foi feita via picnometria de hélio (AccuPyc 1330 – Micromeritics), difração de raios X (Krystaloflex D 500 – Siemens) e microscopia eletrônica de varredura (DSM 940 – Zeiss) e transmissão (CM 120 – Philips).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Fig. 1 mostra as fases presentes nos pós após a reação de redução. Observa-se que a única composição que apresenta mulita residual é CINF; isso devido ao tipo de mulita formada durante a reação, mais estável que a das outras reações, de modo que é mais difícil de decompô-la para a formação de alumina e carbeto de silício.


Todas as outras composições produziram apenas Al2O3 e SiC após a reação, sendo que a morfologia dos pós formados é dependente da atmosfera do forno, do teor de impurezas presente nas matérias-primas, da temperatura de reação e da morfologia dos precursores. Foi reportado que quando se tem uma atmosfera no interior do forno onde a relação PSiO/PCO é maior que 1, há a tendência de formação de whiskers [10], como no caso deste trabalho. Observa-se também que parte dos whiskers desenvolvidos teve seu crescimento pelo processo VLS (Vapour – Liquid – Solid) [11], comprovado pela presença de pequenas esferas na ponta desses whiskers. Essas esferas, que servem como sítios catalisadores, são formadas por metais de transição, notadamente ferro, que se liqüefazem durante a reação. Na Fig. 2 tem-se uma micrografia de MET de um whiskers encontrado, mostrando a esfera catalisadora.


Na Fig. 3 tem-se uma micrografia da composição IMNF, onde são vistas grandes partículas esféricas. Essas partículas são formadas durante a reação, devido principalmente à presença de potássio na matéria-prima, já que não foi observada a presença de outras impurezas na estrutura. Na superfície tem-se a presença de um vidro, formado durante o resfriamento, que impede a saída do carbono residual da reação, sendo que este fica preso em seu interior. Isto também pode ser verificado pela diminuição da densidade do pó: enquanto esperava-se uma densidade por volta de 3,33 g/cm3 encontrou-se uma de 3,14 g/cm3, devido ao carbono.


Ao se comparar a Fig. 4, uma micrografia da composição IMG, com a Fig. 3, nota-se a grande diferença existente entre as morfologias formadas. Embora em ambas as composições a quantidade de potássio seja a mesma, o efeito do líquido formado por ele durante a reação se faz notar somente na composição IMNF. Isso ocorre por causa do tamanho médio de partículas do negro de fumo (70 nm), menor que o do grafite (1,20 mm), o qual permite que as partículas sejam arrastadas, por capilaridade, pelo líquido, formando então uma esfera (forma termodinamicamente mais estável). Já na composição IMG, as partículas de grafite são muito grandes para serem arrastadas pela quantidade de líquido formado, de modo que a reação se inicia na superfície das mesmas, proporcionando a formação de estruturas com a mesma morfologia que as de grafite.


Todas as composições que se utilizaram de caulins produziram somente alumina e carbeto de silício. Na Fig. 5 pode-se ver uma micrografia da composição CCNF, representativa de todas as outras, já que a morfologia dos pós formados a partir das reações das composições CCNF, CHNF e CJNF é a mesma. Nota-se que não há a presença das grandes esferas vistas na composição IMNF, já que a quantidade de fundentes existente nos caulins é muito menor, não havendo a formação de uma quantidade de líquido suficiente para que aquela morfologia seja desenvolvida. O que se vê é a presença de whiskers de carbeto de silício, sendo que parte deles também foi formada pelo processo VLS, já que as matérias-primas não são totalmente puras, e partículas de alumina, formadas durante a decomposição do aluminossilicato. Além dos whiskers nota-se a presença de alguns aglomerados fibrosos. Esses aglomerados são o produto da alta supersaturação da atmosfera com SiO na forma gasosa. Quando se tem uma atmosfera saturada com SiO, tem-se a formação de whiskers, mas quando essa saturação atinge níveis muito elevados, começa a haver o crescimento de braços laterais no whisker, dando origem à estrutura encontrada [11]. A alumina formada está presente na forma de partículas, como a vista na micrografia.


Como já descrito, o controle da pressão parcial de gases SiO e CO é importante para o controle da morfologia dos pós formados. No caso deste estudo deve ter prevalecido a relação na qual a formação de whiskers é favorecida, onde a atmosfera dentro do forno contém uma quantidade relativa elevada do gás SiO. Isto pode provocar uma perda de silício da composição, segundo as reações [12]:

SiO2 + C ® SiO(G) + CO(G) (F)

SiO + C ® Si(S) + CO(G) (G)

Si + C ® SiC(S) (H)

de modo que a relação Al2O3/SiC presente em cada composição não seja aquela calculada teoricamente. Isto pode ser comprovado pela densidade dos pós obtidos. Na Tabela IV tem-se as quantidades teóricas de SiC esperadas para cada composição (excetuando-se as composições CINF, onde a reação não se completou, IMNF e IMG, que apresentam carbono residual preso, o que gera erros nas medidas) e as quantidades realmente encontradas, calculadas a partir das densidade reais dos pós reagidos.

CONCLUSÕES

É possível a obtenção de pós Al2O3/SiC a partir de aluminossilicatos como caulim e ilita-moscovita via redução carbotérmica. A cianita produz, em sua decomposição, um tipo de mulita mais estável, que não permite que o citado compósito seja obtido dentro das mesmas condições impostas aos outros aluminossilicatos.

A quantidade de materiais fundentes presente na matéria-prima natural influencia na morfologia dos pós finais obtidos após a reação de redução, bem como o tipo de fonte de carbono utilizada (negro de fumo ou carbono).

A formação de alguns whiskers neste caso se deu pelo processo VLS, devido à presença de metais de transição como impurezas nas matérias-primas.

O controle da atmosfera do forno se faz necessária para que se possa evitar a perda de silício na forma gasosa SiO.

AGRADECIMENTOS

Os autores gostariam de agradecer à FAPESP pelas bolsas concedidas, processos no 96/12575-0, 96/7543-2 e 96/1417-5.

(Rec. 20/11/98, Ac. 19/11/99)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Mar 2000
  • Data do Fascículo
    Dez 1999

Histórico

  • Aceito
    19 Nov 1999
  • Recebido
    20 Nov 1998
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