Open-access Recursos fisioterapêuticos na prevenção da perda da densidade mineral óssea com lesão medular

Resumos

Este trabalho é uma revisão bibliográfica sobre os tratamentos fisioterápicos destinados a prevenção, estabilização ou lentificação da perda da densidade mineral óssea em pacientes portadores de lesão medular. Foram encontrados poucos trabalhos que se destinaram aos tratamentos fisioterápicos para desmineralização óssea. Em relação aos tipos de tratamentos encontrados foram: estimulação elétrica funcional, estimulação elétrica funcional com bicicleta ergométrica, ortostatismo e deambulação. Estes tratamentos são bastante questionáveis não tendo um consenso na metodologia, apresentando muitas controvérsias em relação à eficácia dos tratamentos, que serão discutidos no decorrer deste trabalho.

Lesão medular; Osteoporose; Reabilitação


This work is bibliographic review about the physiotherapy treatments for the attenuation, prevention and stabilization or slowing down of the bone mineral density loss in spinal cord injured patients. There are few studies focusing the efficiency the physiotherapy treatment for bone demineralization. The kinds of treatments found were: functional electrical stimulation, functional electrical stimulation with an bycicle ergometry, orthostatic and deambulation. These treatments are much questionable, and with no consensus on the methodology, with the lot of controversies in relation to the efficacy of the treatments, which are going to be discussed in the development of this study.

Spinal cord injury; Osteoporosis; Rehabilitation


ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE

Recursos fisioterapêuticos na prevenção da perda da densidade mineral óssea com lesão medular

Physiotherapy resources on bone mineral density loss prevention in patients with spinal cord injuries

Daniele RodriguesI; Guilherme HerreraII

IFisioterapeuta formada pelo Centro Universitário São Camilo

IIEspecialista em Neurologia pela UNIFESP - EPM, Mestrando em Ciências da Saúde pela UNIFESP — EPM

Endereço para correspondência Endereço para correspondência R. Constantino de Sousa 1025, apto 19. Campo Belo. CEP: 04605003 São Paulo. SP e-mail: dani.rodri@uol.com.br

RESUMO

Este trabalho é uma revisão bibliográfica sobre os tratamentos fisioterápicos destinados a prevenção, estabilização ou lentificação da perda da densidade mineral óssea em pacientes portadores de lesão medular. Foram encontrados poucos trabalhos que se destinaram aos tratamentos fisioterápicos para desmineralização óssea. Em relação aos tipos de tratamentos encontrados foram: estimulação elétrica funcional, estimulação elétrica funcional com bicicleta ergométrica, ortostatismo e deambulação. Estes tratamentos são bastante questionáveis não tendo um consenso na metodologia, apresentando muitas controvérsias em relação à eficácia dos tratamentos, que serão discutidos no decorrer deste trabalho.

Descritores: Lesão medular; Osteoporose, Reabilitação.

SUMMARY

This work is bibliographic review about the physiotherapy treatments for the attenuation, prevention and stabilization or slowing down of the bone mineral density loss in spinal cord injured patients. There are few studies focusing the efficiency the physiotherapy treatment for bone demineralization. The kinds of treatments found were: functional electrical stimulation, functional electrical stimulation with an bycicle ergometry, orthostatic and deambulation. These treatments are much questionable, and with no consensus on the methodology, with the lot of controversies in relation to the efficacy of the treatments, which are going to be discussed in the development of this study.

Key words: Spinal cord injury; Osteoporosis; Rehabilitation.

INTRODUÇÃO

No Brasil, há 130 mil indivíduos portadores de lesão medular e cada ano está incidência vem aumentando devido aos acidentes automobilísticos e principalmente à violência(15). Os indivíduos com lesão medular tem perda parcial ou total da função motora, sensitiva, autônomo, e complicações no sistema orgânico, sendo uma delas a alteração do metabolismo ósseo que conseqüentemente levará à osteoporose.

Esta perda óssea (desmineralização) é conhecida na literatura, porém sua causa não está bem esclarecida, ocorrendo no primeiro ano após a lesão medular com pico no 4-6 mês de lesão, acometendo as regiões proximais e distais dos ossos preferindo primeiro a camada trabecular e depois a camada compacta do osso.

Com a desmineralização, o risco de fratura aumenta(8,20), podendo ocorrer deformidades, ulceras, limitações para reabilitação, gerando situações de difícil manejo, tanto para os indivíduos acometidos quanto para seus familiares ou cuidadores, além dos altos custos econômico decorrente dos cuidados e com as internações, pois o custo de fratura por osteoporose é alto, nos EUA foram gastos 13.8 bilhões de dólares com tratamento médico(29) e na França, o total de custo foi aproximadamente 200 milhões(14).

Tendo em vista as várias complicações que se seguem após uma fratura e o alto custo para o tratamento, é interessante prevenir a perda da densidade mineral óssea nos pacientes com lesão medular. O objetivo deste trabalho é revisar a literatura para verificar a eficácia dos tratamentos fisioterápicos no que se refere à prevenção, estabilização ou lenhificação da perda da densidade óssea.

DISCUSSÃO

A perda da densidade mineral óssea (DMO) em pacientes com lesão medular é bem conhecida, porém sua causa não está bem esclarecida. Inicialmente devemos considerar algumas hipóteses com relação à perda da densidade mineral óssea:

  • Há autores

    (4) que mencionam que a perda óssea ocorre por alteração do sistema nervoso simpático, diminuindo o fluxo sangüíneo em algumas áreas do osso, com isso não há trocas gasosas e nem nutrientes, ocorrendo necrose celular, ativando as células osteoclásticas, o que explica a predominância da desmineralização nas áreas altamente vascularizadas

    (4).

  • Acreditam que a desmineralização ocorre pela falta de força mecânica e falta de força de compressão, resultando no aumento da reabsorção óssea

    (1).

  • Consideram que a perda óssea ocorre não por inatividade, mas sim pela ausência da pressão longitudinal dos ossos longos

    (21). Verificaram que indivíduos paraplégicos e tetraplégicos não estão aptos para sustentação de peso nos membros inferiores e desta forma não ficam expostos às forças nem à tensão muscular necessárias para estimular a formação óssea tendo disparo das atividades osteoclásticas

    (12).

  • A desmineralização ocorre no primeiro ano após a lesão medular, com pico no quarto — sexto mês de lesão, sendo evidenciada nas primeiras semanas após a lesão. O osso trabecular é o mais susceptível à osteoporose, com perda óssea de 4% ao mês nos ossos esponjosos e 2% nos ossos corticais

    (18,28) sendo que os ossos mais afetados são os que suportam mais força de compressão

    (1). Nos membros inferiores as regiões mais afetadas são epífise distal do fêmur (70%) e epífise proximal da tíbia (52%) com predominância em áreas altamente vascularizadas nos ossos longos

    (4). Sendo que a perda óssea é menor no fêmur proximal, pois está protegido por alguma força residual exercida pelo tronco quando sentado na cadeira de rodas

    10.

A diminuição da densidade mineral óssea ocorre em ordem decrescente: tetraplégico completo, incompleto; paraplégico completo, incompleto(16). Segundo Wilmet e cols(28), verificaram que espasticidade não foi suficiente para manter a integridade do esqueleto, sendo igual para ambos pacientes flácidos e espásticos. Porém Demirel(3) e cols. observaram que não há diferença entre tetraplégico e paraplégico, com perda mais aparente nos pacientes com lesões completos e flácidos.

Foram encontrados poucos trabalhos que se destinaram a verificar a efetividade dos tratamentos fisioterápicos. Em relação ao tipo de tratamento utilizado, para combater a desmineralização óssea, encontramos:

  • Estimulação elétrica funcional / bicicleta ergométrica

    (1,7,13,24) ;

  • Estimulação elétrica funcional (EEF)

    (2,7);

  • Ortostatismo

    (3,6,11,26);

  • Deambulação

    (3,9,19,22);

Tendo em vista os diversos tipos de tratamento disponíveis procuramos verificar a efetividade de cada um:

  • Estimulação elétrica funcional / bicicleta ergométrica: não foi efetivo para reverter, lentificar ou estabilizar a desmineralização óssea em pacientes com lesão medular

    (13, 24,7,1);

  • Estimulação elétrica funcional: não é eficaz para combater a perda da DMO

    (7), entretanto, há autores que verificaram que a EEF foi responsável pelo aumento da DMO

    (2);

  • Ortostatismo: não foi efetivo para reverter, lentificar ou estabilizar a desmineralização em pacientes com lesão medular

    (11,26), já outros trabalhos verificaram que pode prevenir ou retardar a perda óssea, e que os resultados foram melhores nos grupos que usaram órtese

    (3,6);

  • Deambulação: previne ou retarda a perda da densidade mineral óssea

    (3,9,19), porém Shropshire e cols.

    (22) não concordaram, pois não verificaram melhora na DMO.

Como podemos observar não existe consenso no que diz respeito à eficácia dos diversos tipos de abordagem com objetivo de prevenir, lentificar ou estabilizar a diminuição da DMO, e observamos que há muitas variáveis do tipo amostra, sexo, idade, tempo de lesão e outros que podem interferir nos resultados.

Quanto ao tamanho da amostra, a maioria dos autores(1-29) utilizou quantidade pequena de pacientes o que pode ter interferido nos resultados obtidos. Ogilvie e cols.(19) citaram que o número de pacientes estudados no seu trabalho foi pequeno, tendo então um desprezo para os resultados.

Outro fator importante que observamos nesta revisão consiste na heterogeneidade das amostras no que se refere à idade e sexo.

Quanto à idade dos pacientes, somente Leeds e cols.(13) tiveram grupo de pacientes com idade mais homogênea, limitando-se a estudarem adultos. Os outros trabalhos tiveram variações muito grandes de idade, utilizando pacientes jovens, adultos jovens e idosos e isto pode interferir nos resultados, pois o pico de massa óssea mantém-se até aos 40 anos em indivíduos normais, a partir desta idade começa ter diminuição da densidade mineral óssea e esta perda pode ser mais rápida quando associado à imobilização(21, 23).

Em relação ao sexo dos pacientes, apenas 4 autores se preocuparam em selecionar uma amostra homogênia(1,3,11), porém, os outros autores, trabalharam com ambos sexos. Todavia sabe-se que as mulheres têm uma perda óssea maior do que os homens, sendo acentuada na pós- menopausa(23). Á vista disto, mulheres com lesão medular, dependendo da idade tem maior propensão à perda óssea do que os homens podendo influenciar nos resultados dos trabalhos.

Em vista da influência, que a idade e o sexo pode exercer sobre a DMO, podemos inferir que a grande variação dessas duas categorias pode interferir nos resultados dos trabalhos apresentados.

Quando verificamos se os participantes dos trabalhos realizavam tratamento fisioterápico, observamos que apenas um trabalho citou que os pacientes realizavam fisioterapia, contudo não especificaram o tipo de exercício, freqüência da terapia e duração do tratamento(24).

Outro fator que acreditamos ter importância crítica na redução da perda da DMO é o fato dos pacientes treinarem marcha ou permaneceram em ortostatismo. Analisamos a literatura e verificamos que somente um grupo de autores, comentou que nenhuns dos seus pacientes eram deambuladores e que nunca ficaram em ortostatismo(19).

Com relação aos critérios de exclusão, foram excluídos:

  • Mulheres pós — menopausa, jovens menores de 20 anos e pacientes com uso de bisfosfonato

    (6);

  • Pacientes com lesões do motoneurônio inferior

    (7,22);

  • Doenças renais, do fígado, doenças cardiovasculares, fraturas e uso de medicamentos que podiam interferir no metabolismo

    (2,7,9,11,22)

Quando verificamos o tipo de lesão medular utilizada nos trabalhos encontramos uma heterogeneidade em relação ao tipo da lesão:

  • Lesões traumáticas e não traumáticas

    (11)

  • Lesões traumáticas

    (2,13,19)

  • Sete trabalhos não mencionaram se os pacientes eram portadores de lesão medular traumática ou não traumática.

Outro fator que acreditamos ter importância crítica na redução da DMO é a gravidade da lesão medular. Verificamos que os autores não se preocuparam com a homogeneidade da gravidade da lesão e nem com a escala de deficiências da ASIA, principalmente nas lesões medulares incompleta. Somente quatro trabalhos se preocuparam em igualar os pacientes de acordo com a gravidade da lesão, igualando-os em lesões completas(1,6,13,22) e quatro trabalhos utilizaram pacientes portadores de lesão medular incompleto e completo(2,3,7,24).

Segundo Demirel e cols.(5) os indivíduos com lesões medulares completas têm uma perda mais aparente comparado com os indivíduos com lesões medulares incompletas.

Quanto ao nível da lesão medular, observamos que somente Ledds e cols.(13) se preocuparam em selecionarem pacientes com níveis de lesão mais próximos. Os outros autores utilizaram pacientes tanto com lesões medulares altas como lesões medulares baixa, isto pode interferir nos resultados dos trabalhos apresentados.

Com relação ao tônus do paciente portadores de lesão medular: autores declaram que os indivíduos espásticos têm menor perda de DMO comparado com os pacientes flácidos5, em contra partida Wilmet e cols.(28) mencionaram que a espasticidade e manutenção da massa muscular não previnem a perda da DMO comparado com os indivíduos flácidos. Segundo Goemaere e cols.(6), o grau de espasticidade e o nível da lesão não afetam a DMO.

Relacionando o tempo de lesão, somente três trabalhos selecionaram pacientes com lesões precoce, com menos de 6 meses de lesões(3,9,22). Houve trabalhos que utilizaram pacientes com tempo de lesão acima de um ano, tendo uma variação muito grande, podendo interferir nos resultados dos trabalhos apresentados. Sabe-se que a perda da mineralização óssea ocorre nos primeiros seis meses de lesão com pico no quarto mês, estabilizando durante 12-16 meses após lesão medular(27). À vista disto demonstra a importância da intervenção precoce.

Em relação, as técnicas de mensuração utilizadas encontramos:

  • DEXA

    (1,2,6,11,13,22,24,25,26),

  • QCT

    (7,19,25);

  • RAIO-X

    (17,25).

Houve uma grande variação, a respeito ao local da mensuração da densidade mineral óssea:

  • Coluna lombar

    (1,11,19,24,26);

  • Colo do fêmur

    (1,6,11,13,19,22,24,26)

  • Trocanter

    (1,6,13,22,24);

  • Diáfise do fêmur

    (2,6);

  • Distal do fêmur, diáfise e proximal da tíbia

    (2,7).

Segundo Dauty e cols.(14), a área mais afetada com perda da DMO é a metáfise e epífise do fêmur distal e proximal da tíbia.

Kiralti e cols.(10) mencionaram que a desmineralização óssea da coluna lombar e do fêmur proximal são menores, devido à força residual exercida pelo tronco quando sentado na cadeira de rodas.

Não houve uniformidade nos trabalhos em que se refere à duração, freqüência e o tipo de trabalho utilizado.

Verificamos, que somente Goemaere e cols.(6), compararam a efetividade de 3 invenções de ortostatismo para DMO em pacientes com lesão medular, utilizando a órtese, standing frame e a cadeira de rodas que fica em ortostatismo. Dos 3 equipamento, a órtese foi a que teve maior descarga, devido ao peso axial que ela proporciona, sendo, a mais eficaz para diminuir a perda da DMO.

CONCLUSÃO

De acordo com a revisão bibliográfica a perda de densidade mineral óssea nas áreas paralisadas é bem conhecida, sendo uma das principais complicações dos pacientes portadores de lesão medular, porém o que leva esta perda não está claramente estabelecido.

Em relação ao objetivo do trabalho concluímos que não podemos mencionar quais os exercícios foram eficazes ou não, pois não houve resultados consistentes no que se refere à prevenção, lentificação da perda da DMO. Observamos que a maioria dos trabalhos estudados não estabeleceram uma metodologia adequada, apresentando grandes falhas no que se refere principalmente aos critérios de inclusão.

Acreditamos que novos trabalhos devem ser realizados contendo critérios de inclusão bem definidos como, por exemplo: o tempo da lesão, tipo da lesão (completa ou incompleta), nível da lesão (cervical, torácica alta, torácica baixa, lombar), idade, sexo, estar em tratamento fisioterápico, tipo de tratamento, portadores de órteses que possibilitam o ortostatismo ou treino de marcha.

AGRADECIMENTOS

Ao Guilherme Herrera, professor e orientador deste trabalho. À professora e coordenadora Marta Damasceno. Ao Centro Universitário São Camilo e à Fundação Selma.

Trabalho recebido em 19/02/2004.

Aprovado em 18/06/2004.

Trabalho realizado Cento Universitário São Camilo

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Maio 2007
    • Data do Fascículo
      Set 2004

    Histórico

    • Recebido
      19 Fev 2004
    • Aceito
      18 Jun 2004
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