Open-access Justiça reprodutiva e gênero: desafios teórico-políticos acirrados pela pandemia de Covid-19 no Brasil

Reproductive justice and gender: theoretical and political challenges in Brazil amplified by the Covid-19 pandemic

Justicia reproductiva y género: desafíos teórico-políticos exacerbados por la pandemia de Covid-19 en Brasil

Resumos

A partir de ações do poder público durante o enfrentamento da pandemia de Covid-19 no que tange aos direitos sexuais e reprodutivos, busca-se refletir sobre o descaso do Estado brasileiro em relação à saúde das mulheres, sobretudo as usuárias do Sistema Único de Saúde, descumprindo princípios assegurados constitucionalmente. A pandemia vem atingindo sobremaneira no país populações historicamente excluídas por diversos eixos de opressão e subalternização social. Sublinha-se o arrefecimento da assistência em saúde sexual e reprodutiva, que pode redundar em gravidezes imprevistas, abortos inseguros e mortes maternas, agravando condições sociais de vida de um grande contingente populacional. Argumenta-se que aportes teóricos oriundos dos estudos do feminismo negro, nomeadamente interseccionalidade e justiça reprodutiva, ao articularem os marcadores sociais da diferença ao princípio de justiça social, auxiliam-nos na compreensão dessas desigualdades sociais e na resistência coletiva ao desmonte das políticas de saúde.

Palavras-chave Gênero; Covid-19; Direitos sexuais e reprodutivos; Justiça social; Interseccionalidade


Through the analysis of government actions during the response to the Covid-19 pandemic related to sexual and reproductive rights, this article reflects on the Brazilian government’s neglect of women’s health, especially in relation to users of the country’s unified health system, violating the principles enshrined in the constitution. The pandemic has particularly affected populations who have been historically excluded by various forms of oppression and subjugation. The findings highlight the slackening of sexual and reproductive health care, which can result in unplanned pregnancy, unsafe abortion and maternal death, worsening the social conditions of a large segment of the population. By articulating the social markers of difference and the principle of social justice, it is argued that theoretical contributions from the field of black feminism, namely intersectionality and reproductive justice, can help understand social inequalities and promote collective resistance to the dismantling of the country’s health policies.

Keywords Gender; Covid-19; Sexual and reproductive rights; Social justice; Intersectionality


A partir de acciones del poder público durante el enfrentamiento de la pandemia de Covid-19 en lo que se refiere a los derechos sexuales y reproductivos, se busca reflexionar sobre la desatención del Estado brasileño con relación a la salud de las mujeres, principalmente de las usuarias del Sistema Único de Salud, incumpliendo principios asegurados constitucionalmente. La pandemia ha golpeado en el país principalmente a poblaciones históricamente excluidas por diversos ejes de opresión y subalternización social. Se subraya la disminución de la asistencia de salud sexual y reproductiva que puede causar embarazos imprevistos, abortos inseguros, muertes maternas, agravando condiciones sociales de vida de un gran grupo poblacional. Se argumenta que contribuciones teóricas provenientes de los estudios del feminismo negro, notablemente interseccionalidad y justicia reproductiva, por articular los marcadores sociales de la diferencia al principio de justicia social, nos auxilian en la comprensión de estas desigualdades sociales y en la resistencia colectiva al desmontaje de las políticas de salud.

Palabras clave Género; Covid-19; Derechos sexuales y reproductivos; Justicia social; Interseccionalidad


Introdução

A pandemia de Covid-19 provocou o acirramento do debate inevitável sobre diversas desigualdades sociais, raciais e de gênero no Brasil; e escancarou nossas feridas, expondo a cruel iniquidade da distribuição de renda no país, levando à morte de milhares de pessoas pobres e negras infectadas pelo Sars-Cov-2. A ingovernabilidade que marca o enfrentamento público desta catástrofe sanitária produziu adoecimento, mortes, sofrimento e desinformação desnecessários. As mulheres foram atingidas de diferentes modos: sobrecarga de trabalho doméstico; cuidado com filhos (na ausência de escolas e creches); cuidado de familiares doentes ou idosos; necessidade de auferir renda à sobrevivência familiar dentro ou fora de casa; desemprego; e exaustão física e mental. Também muito se falou do racismo estrutural; da invisibilidade de grupos sociais que constituem a força de trabalho formal e informal; e da violência de gênero que disparou em ambientes domésticos, perpetrada por homens impotentes, que agridem e violam as mulheres, produzindo vítimas de diversas idades.

O amparo para o sofrimento psíquico, a sobrecarga física e mental e o trabalho do luto, por seus familiares, vizinhos ou amigos, não veio do Estado. Vimos iniciativas solidárias de profissionais, voluntários e ativistas de grupos comunitários que se organizaram autonomamente para apoiar moradores de regiões empobrecidas, distribuindo cestas básicas; materiais de higiene pessoal e limpeza; máscaras de proteção; uma palavra de conforto; uma troca de olhar empático. Os comitês de gestão da crise nas periferias brasileiras formados por moradores e lideranças comunitárias são exemplos criativos e, ao mesmo tempo, trágicos do abandono do Estado, em momento de vida ou morte1,2.

Em contrapartida, comentou-se pouco no decorrer dos primeiros meses de pandemia no Brasil sobre um conjunto de questões de extrema relevância, absolutamente denegadas, relativas às relações íntimas, ao exercício da sexualidade e à reprodução ou sua prevenção. Referimo-nos ao debate público internacional a respeito das questões de saúde sexual e reprodutiva no contexto da pandemia de Covid-19, em que inúmeros guias de orientação, protocolos e artigos científicos foram divulgados por agências internacionais – como Organização Mundial da Saúde, Organização Pan-Americana de Saúde, ONU (Organização das Nações Unidas) Mulheres, Fundo de População das Nações Unidas e associações médicas – no intuito de prover informações confiáveis para a continuidade da assistência à saúde das mulheres, no tocante ao planejamento reprodutivo, à prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (IST), às ações de pré-natal, parto, pós-parto, aborto seguro, atenção à violência sexual e acompanhamento de portadoras de HIV3-8. Uma premissa fundamental comum a todos os protocolos e guidelines para gestores em saúde é o caráter essencial e irrevogável das ações em saúde sexual e reprodutiva, que não podem ser descontinuadas a despeito da pandemia em curso.

Um exemplo desse esforço internacional foi a criação, em agosto de 2020, da comissão Gender and Global Health, divulgada no periódico científico The Lancet, para debater e dinamizar as urgências que a pandemia agravou9. Experiências acumuladas por tais agências internacionais multilaterais e por organizações humanitárias em epidemias recentes, a exemplo do ebola, no continente africano, demonstram resultados preocupantes no decorrer da suspensão da atenção à saúde sexual e reprodutiva10,11.

Face à desarticulação absoluta do Sistema Único de Saúde (SUS) e das políticas públicas de saúde, construídas nos últimos trinta anos, as ações do Ministério da Saúde (MS) fracassam no enfrentamento da pandemia, seja na prevenção da disseminação do coronavírus; na oferta de cuidados aos infectados e de testes para monitoramento do seu crescimento e distribuição no território brasileiro; ou na aplicação imediata de recursos financeiros, aumentando muito sua gravidade e suas repercussões negativas, o que tem custado muitas vidas. Ao contrário de outros países, não há no atual governo brasileiro nenhuma disposição para formulação de estratégias que atenuem as iniquidades sociais, de gênero, raciais, de orientação sexual e geracionais, tampouco diálogo com a sociedade civil organizada, que tem proposto iniciativas para intervenção nesta crise12,13. Acumulamos feminicídios; violência policial do Estado aos pobres e negros; racismo institucional; e abandono absoluto pelo Estado aos seus cidadãos, gerando o que tem sido chamado de “genocídio” brasileiro em função da necropolítica instituída14.

A proposta deste artigo parte de um fato empírico concreto: a revogação pelo governo brasileiro de nota técnica emitida pelo Ministério da Saúde em junho de 2020 que visava assegurar e orientar a prestação de serviços no SUS no tocante aos cuidados em saúde sexual e reprodutiva no decorrer da pandemia. A partir daí, uma sucessão de eventos é analisada como indicadores da negligência do Estado com a saúde das mulheres, sobretudo as usuárias do SUS. Tal revogação indica claramente a opção deste governo de não considerar ações e serviços de atenção em saúde sexual e reprodutiva como essenciais para se evitar gestações imprevistas, abortos inseguros e mortes maternas, o que agrava ainda mais as condições sociais e de vida de muitas mulheres. Argumenta-se que o descaso pelo poder público infringe direitos assegurados constitucionalmente e colide com a perspectiva de justiça reprodutiva na atenção à saúde das mulheres.

Em momento de negligência do Estado com suas cidadãs diante da maior crise sanitária dos últimos cem anos e de acirramento da ofensiva antigênero no país15,16, este artigo busca aliar o registro sociopolítico deste período histórico com perspectivas teóricas que possam nos ajudar a elucidar o presente e pensar o futuro, na resistência coletiva ao desmonte das políticas de saúde. Em outras palavras, o modo como a pandemia se materializa no país vem atingindo sobremaneira populações historicamente excluídas por diversos eixos de opressão e subalternização social. A necessária elaboração de políticas públicas para intervenção social requer atenção aos múltiplos níveis de produção de desigualdades em saúde. Aportes teóricos oriundos dos estudos do feminismo negro, como interseccionalidade e justiça reprodutiva, ao articularem marcadores sociais da diferença ao princípio de justiça social, ajudam-nos na compreensão desse complexo cenário e no enfrentamento das iniquidades em saúde.

Olhando o presente sob as lentes da interseccionalidade

A pandemia de Covid-19 tem desencadeado um furor nas ciências, em geral, e nas ciências sociais e demais ciências humanas, em particular, no sentido de nos obrigar a repensar a vida em sociedade, em pleno século XXI, com suas mazelas e possibilidades. Alguns dilemas foram magistralmente explicitados por célebres autores: como conciliar o que Naomi Klein designa por “distopia tecnológica”17, tão bem traduzida no alerta que Paul Preciado18 nos faz em relação ao acirramento de novos modos de biocontrole/biovigilância digital, no âmbito de nossas próprias casas, com a miséria humana; a erradicação da vida; a segregação racial, étnica e de gênero; e o absoluto aniquilamento de direitos humanos tão fundamentais? Tempos de brutalismo e de asfixia na acepção de Achille Mbembe19. Na mesma direção, Didier Fassin nos convoca a pensar sobre nossa responsabilidade coletiva diante do tripé conceitual vulnerabilidade, desigualdade e discriminação em face da Covid-19. O autor clama por “justiça sanitária” no lugar de uma “polícia sanitária”20.

Se a pandemia nos obrigou a repensar as relações entre os seres vivos (humanos e não humanos) e artefatos que coexistem na biosfera21, outro aprendizado também se consolidou neste processo de rupturas sociais por ela agravadas: necessitamos abordar objetos de estudo na Saúde Coletiva pelo prisma da interseccionalidade e biossocialidade para se pensar temas relativos à saúde, doença e corpo22. Não há nada estritamente biológico, que não o seja igualmente social e, ao mesmo tempo, que não esteja diretamente imbricado em condições locais/situacionais, sociais e que articulem filiação de classe; pertencimento étnico e racial; posição de gênero e geracional; orientação sexual; nacionalidade; e (in)existência de deficiências.

A tradicional abordagem do gênero na área das ciências da saúde precisa ultrapassar a concepção binária (masculino/feminino; homem/mulher) que considera o gênero apenas como um indicador ou variável de estudo, incluindo homens e mulheres em sua população, mas não operando com uma análise da construção social do fenômeno em exame a partir das instituições sociais que ordenam nossa existência de modo hierárquico23.

A abordagem do gênero, aliada à contribuição dos estudos interseccionais – que situam a dominação em contextos pós-coloniais, marcados pela subordinação racial, como dimensão constituinte de nossas relações sociais – nos ajuda a compreender a violência estrutural que atinge homens e mulheres negros desde a infância, em sua socialização, e a permanência das iniquidades sociais. Nesse sentido, as relações de poder e iniquidades sistêmicas que balizam nossas experiências de vida encontram-se no centro deste debate24. Como explica Collins:

The term intersectionality references the critical insight that race, class, gender, sexuality, ethnicity, nation, ability, and age operate not as unitary, mutually exclusive entities, but as reciprocally constructing phenomena that in turn shape complex social inequalities25. (p. 2)

A perspectiva interseccional nos conduz a considerar os distintos sistemas de classificação social (como classe, sexo, raça/cor, gênero, geração e nacionalidade) de modo concomitante como classificações cruzadas que são potencializadas reiterando relações de poder e de dominação. Torna-se uma lente para ampliar a compreensão da complexidade da (re)produção das desigualdades sociais em contextos específicos26,27.

Não basta agregar indicadores para mensurar índices de desigualdades, mas entender como tais condições sociais de exclusão são (re)produzidas e se interpenetram nos agenciamentos cotidianos que tomam tais grupos como “vulneráveis” e destituídos de capacidade sociopolítica para gerirem sua própria vida. Nesse sentido, precisamos priorizar abordagens teórico-metodológicas que respondam amplamente e de modo compreensivo a múltiplos sistemas de opressão para sermos capazes de enfrentar as desigualdades que a pandemia acirrou. Vários pesquisadores têm sistematicamente alertado sobre seus dolorosos impactos na população negra e pobre do país, apenas para citar duas das múltiplas dimensões que se interseccionam na produção e reiteração de estratificações sociais diversas, com reflexo em distintos indicadores de saúde28,29. A manutenção e ampliação das políticas públicas de saúde precisam considerar a dimensão interseccional para confrontar múltiplas disparidades sociais existentes.

Justiça reprodutiva: um conceito potente do ponto de vista teórico e da ação política

A despeito da pandemia atual, cotidianamente assistimos a divulgação de notícias na mídia sobre mortes ou prisão de mulheres devido a abortos inseguros, infanticídio, esterilizações involuntárias, gravidezes imprevistas, violência sexual e mortes maternas, denotando um panorama trágico que pesquisadoras da área conhecem bem. Nos bastidores de muitos casos de violência de gênero; sofrimento e adoecimento na gravidez, parto e pós-parto; e exposição dessas mulheres à violência e ao racismo institucional nos serviços de saúde, está nossa imensa incompetência enquanto Estado para prover adequadamente educação em sexualidade e planejamento reprodutivo às mulheres, independentemente de sua idade, classe social, raça/etnia, número de filhos e situação conjugal. Se vivemos em uma sociedade misógina e machista, de absoluta hipocrisia em relação aos encargos sociais da reprodução e da maternidade, que não garante a tais mulheres assistência de saúde digna para proteger suas relações sexuais das IST e da gravidez imprevista, como podemos acusá-las de abandono à prole? De praticar aborto? De matar seus filhos neonatos? Muitas de nós sabemos o desespero de estar grávida sem o querer. Mas o que a sociedade nos diz? “E daí?”30

Se tal quadro vinha se agravando nos últimos anos em razão do desmonte de nossas políticas públicas, com a pandemia Covid-19 e o decorrente caos político nacional, resgatar o conceito de justiça reprodutiva pode nos ajudar a compreender melhor a urgência de que falamos quando se trata de planejamento reprodutivo e de garantias para gestar e parir em segurança, para aquelas que assim escolheram. A mirada dos processos de produção de desigualdades e o modo como reverberam no campo da saúde pelo prisma da interseccionalidade, associado à concepção de justiça reprodutiva, são formas potentes de pensar e propor intervenções comprometidas com o ideário de ampliação de direitos humanos e busca por equidade social.

O conceito de justiça reprodutiva não é novo entre nós. No Brasil, contamos com aporte de ilustres feministas negras (como Lélia Gonzalez, Lucia Xavier, Sueli Carneiro, Jurema Werneck e outras) na construção de uma perspectiva crítica ao paradigma dos direitos sexuais e reprodutivos, articulada ao contexto de expressiva desigualdade social vigente no país. Nota-se que, em texto seminal sobre o arcabouço ético, teórico, político e jurídico sobre direitos sexuais e reprodutivos, Corrêa e Petchesky31 já exploravam as múltiplas tensões entre os princípios da liberdade individual e da justiça social que permeiam o debate feminista há décadas. Defender a autonomia sexual e reprodutiva das mulheres sem condições sociais estruturais para manutenção de uma vida digna não nos permite ir muito longe. As circunstâncias sociais que balizam as decisões de vida das mulheres de segmentos sociais excluídos restringem sobremaneira suas possibilidades de escolha.

Na década de 1980, o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), elaborado no MS (1983) com ampla participação do movimento feminista brasileiro, já trazia em sua formulação original a perspectiva da integralidade da atenção à saúde aliada à busca de equidade social. Com o decorrer do tempo, a institucionalização das práticas em saúde foi perdendo a dimensão ética antes presente no horizonte dessas formulações, evidenciando tensões que as permeiam32.

Nesse sentido, o conceito de direitos sexuais e reprodutivos, em sua versão institucionalizada e pragmática do cotidiano dos serviços de saúde, acaba recebendo uma ênfase (indevida) baseada na escolha individual da mulher, não situada social e relacionalmente. Avaliamos que recuperar a dimensão da justiça social torna-se importante nesse contexto de crise sanitária para enfrentar o presente eivado pela negligência estatal às necessidades reprodutivas das mulheres.

Uma das primeiras ativistas feministas negras a problematizar a acepção de justiça reprodutiva, na década de 1990, entre coletivos de mulheres negras nos EUA foi Loretta Ross33, fundadora em 1997 do grupo SisterSong Women of Color Reproductive Justice Collective. Hoje o conceito tem sido amplamente discutido no meio acadêmico e jurídico34-36. Adotando a teoria feminista interseccional em sua radicalidade para abordar questões reprodutivas, essa concepção produz uma crítica à perspectiva liberal centrada no par “pro-choice/pro-life”, que tematizou a luta pelo direito ao aborto nos EUA, produzindo outra práxis política. Ao apontar limites dessa concepção mais estreita que embasa o direito à escolha reprodutiva, não tomando a maternidade como compulsória – ter ou não ter filhos, o conceito de justiça reprodutiva, cunhado em 1994, abarca também o direito a ter filhos em condições seguras, independente da condição social das mulheres (privadas de liberdade, em situação de rua, em abrigos). Como enfatiza Dorothy Roberts34: “it is a framework that includes not only a woman’s right not to have a child, but also the right to have children and to raise them with dignity in safe, healthy, and supportive environments” (p. 79).

Assinalando o modo caricato como a sexualidade e a reprodução entre mulheres negras tem sido sistematicamente abordado no imaginário social, várias ativistas denunciaram o discurso racializado e misógino vigente na sociedade norte-americana. Desde esterilizações em ambientes prisionais até a exclusão do acesso a serviços de saúde, ao planejamento reprodutivo e à proteção social para ter filhos em condições dignas, clama-se por justiça social para aquelas submetidas concomitantemente a múltiplos sistemas de exclusão (seja pelo gênero, raça, etnia, nacionalidade, orientação sexual, idade e/ou deficiências). Não se pode falar em autonomia (autodeterminação) reprodutiva quando há obstáculos estruturais que impedem tais escolhas, ou ainda, que perpetuam a desigualdade social, racial e de gênero. Tal compreensão implica o descentramento da responsabilidade das próprias mulheres por sua (in)capacidade de gerir sua vida sexual e reprodutiva; e obriga o Estado a ampará-las em algo que alude à reprodução da vida em sociedade.

Nas palavras de Loretta Ross33:

From the perspective of African American women, any health care plan must include coverage for abortions, contraceptives, well-woman preventive care, pre- and postnatal care, fibroids, infertility, cervical and breast cancer, infant and maternal morbidity and mortality, intimate partner violence, HIV/Aids, and other sexually transmitted infections. In simplest terms, we spliced together the concept of reproductive rights and social justice to coin the neologism, “reproductive justice.” Reproductive justice is based on three interconnected sets of human rights: (1) the right to have a child under the conditions of one’s choosing; (2) the right not to have a child using birth control, abortion, or abstinence; and (3) the right to parent children in safe and healthy environments free from violence by individuals or the state. Reproductive justice was never meant to replace the reproductive health (service provision) or reproductive rights (legal advocacy) frameworks. Instead, it was an amplifying organizing concept to shed light on the intersectional forms of oppression that threaten Black women’s bodily integrity. (p. 290-1)

A utilização do paradigma da interseccionalidade e do conceito de justiça reprodutiva não pretende reificar posturas identitárias e/ou essencialistas, mas sim reforçar a perspectiva de justiça social que subsidiou ambas as formulações teóricas e políticas.

Há tempos estamos defendendo que os eventos da gravidez, contracepção e aborto, embora ocorram no corpo das mulheres, são fenômenos relacionais, envolto em uma teia de relações sociais, que implicam parceiros, familiares, amigos, profissionais de saúde e condições sociais objetivas para se efetivarem37. Assim, não se tratam de escolhas individuais das mulheres, mas das condições de possibilidade que elas encontram para tomarem suas decisões reprodutivas. A formulação de justiça reprodutiva incorpora explicitamente e de modo mais amplo a necessidade de garantia de direitos sociais e econômicos em aliança aos direitos sexuais e reprodutivos, que não se viabilizam sem condições estruturais que sustentem a sobrevida das mulheres.

Com essas preocupações teóricas e políticas, passamos a reportar uma série de eventos recentes ocorridos a partir de deliberação do Ministério da Saúde de silenciar a garantia da assistência em saúde sexual e reprodutiva no decorrer da pandemia como serviço de caráter essencial às mulheres.

A negligência do Estado brasileiro com as mulheres

Ao contrário de outros contextos, somente em 1º de junho de 2020, técnicos da Coordenação de Saúde das Mulheres do Ministério da Saúde lançaram a Nota Técnica n. 16, sobre acesso à saúde sexual e reprodutiva no contexto da pandemia de Covid-1938. No entanto, logo no dia 3 de junho, o presidente da república determinou sua revogação e exoneração da equipe responsável. A alegação do presidente era a de que a nota versava sobre postura contrária de seu governo quanto à prática do aborto. Todavia, a nota fazia menção somente às três situações previstas em lei no Brasil para interrupção da gestação, a saber: gravidez decorrente de estupro; em caso de anencefalia fetal; e quando a interrupção da gestação é a única forma de salvar a vida da gestante.

A nota técnica do MS seguia preceitos veiculados pela Organização Mundial de Saúde, pela Organização Pan-Americana de Saúde e por organismos multilaterais de defesa dos direitos humanos para garantir e manter os serviços de saúde sexual e saúde reprodutiva durante a pandemia. No item 2.9, destacava:

Devem ser considerados como serviços essenciais e ininterruptos a essa população: os serviços de atenção à violência sexual; o acesso à contracepção de emergência; o direito de adolescentes e mulheres à SSSR e abortamento seguro para os casos previstos em Lei; prevenção e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo diagnóstico e tratamento para HIV/Aids; e, sobretudo, incluindo a contracepção como uma necessidade essencial38.

Não havia nada novo, nem extraordinário no documento, que cumpria apenas o objetivo de orientar gestores públicos de saúde em todo país, em contexto excepcional da pandemia.

Estudos mostram a importância da contracepção de emergência, da contracepção hormonal reversível de longo prazo (ainda não disponível no SUS), da manutenção das ações de planejamento reprodutivo, do pré-natal, parto e pós-parto, bem como dos serviços de abortamento seguro no decorrer de qualquer crise sanitária39,40. Em muitos países, medicamentos e orientações médicas para contracepção ou abortamento seguro em domicílio estão sendo providenciados para assegurarem atenção à saúde em tempo oportuno, via ações de telessaúde, nesta pandemia41.

Situações como descontinuidades no uso rotineiro de métodos contraceptivos, desabastecimento no estoque de insumos contraceptivos nas unidades de saúde e escassez de recursos financeiros em momento de crise socioeconômica para adquiri-los no sistema privado ou em farmácias podem acarretar um aumento nas gravidezes imprevistas, sem amparo de solução pela via do aborto, ilegal no país. Diversos documentos chamam atenção para a possível epidemia de gestações em função da interrupção de serviços de saúde reprodutiva quando são considerados como “não essenciais”. Na medida em que o Brasil apresenta um mix contraceptivo com maior dependência em métodos de curta duração (pílula, contracepção de emergência e preservativo masculino), estima-se, para o Brasil, que quase dois milhões de mulheres estariam descontinuando o uso de métodos contraceptivos em função da crise sanitária39. Isso responderia por 893 mil gestações imprevistas, 411 mil abortos, 1.556 mortes maternas e 20.546 mortes neonatais(c).

A desassistência tem sido a tônica vigente. Vejam-se os desdobramentos da recente epidemia do Zika vírus que atingiu muitas gestantes de regiões empobrecidas do Brasil há poucos anos (desde 2016). As mulheres seguem com muitas dificuldades para criarem seus filhos que nasceram com a síndrome congênita do Zika vírus e para obterem assistência à saúde que precisam.

Novamente, com a Covid-19, a maioria das mulheres trabalhadoras, nos mercados formal/informal ou no ambiente doméstico, e suas necessidades de saúde relativas à contracepção, à prevenção de IST, ao atendimento à violência sexual, à assistência ao pré-natal e ao parto continuam invisíveis e desprezadas. As medidas de distanciamento social decretadas em função da pandemia geraram dificuldades para o deslocamento das mulheres aos serviços públicos de saúde, reorientados para assistência prioritária aos infectados pelo coronavírus.

Sem o apoio dos serviços de saúde, com incremento da violência de gênero no contexto familiar, como elas se protegerão de novas gravidezes, das IST e da violência sexual? A desigualdade social, combinada à desigualdade de gênero e de raça, empurra tais mulheres à própria sorte. Sobrecarregadas com as atribuições domésticas e cuidados com filhos, em espaços exíguos, sem contar com apoio dos parceiros (quando existem e estão próximos), elas só têm ajuda de outras mulheres em sua rede social de parentesco ou vizinhança, sejam filhas, mães, irmãs, comadres ou amigas. Como irão trabalhar, prover a família, cuidar dos doentes e acionar a imensa burocracia do auxílio emergencial aprovado pelo Congresso Nacional?

A revogação da nota técnica gerou inúmeras manifestações de repúdio por parte de associações científicas, grupos feministas, Comitês de Mortalidade Materna, etc. Todavia, manteve-se a exoneração dos profissionais de carreira, envolvidos na sua elaboração, e nenhum outro documento no que concerne à assistência à saúde reprodutiva foi publicado. Logo em seguida, outro desagradável episódio afrontou ainda mais segmentos da sociedade civil organizada que defendem o respeito aos direitos humanos: a nomeação do médico ginecologista Raphael Câmara Parente para Secretário de Atenção Primária à Saúde do MS, um conhecido ativista contrário ao direito ao aborto, incluindo os três permissivos existentes no país. Ele respondeu à interpelação de parlamentares federais a respeito da revogação da nota técnica citada assegurando que “o Ministério da Saúde entende que o direito à saúde é indissociável do direito à vida”42, em clara disputa ideológica por valores que contrariam a laicidade do Estado.

Assim, não foi ao acaso que, em seguida à grande repercussão nacional do aborto legal de uma garota de dez anos, vítima de estupro, realizado em serviço de referência em Pernambuco(d), o MS publica a portaria n. 2.28243, em 27 de agosto de 2020, a qual “dispõe sobre o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos casos previstos em lei, no âmbito do Sistema Único de Saúde”, infringindo a legislação vigente ao obrigar profissionais da saúde a notificarem à autoridade policial o estupro relatado pela vítima, quebrando o sigilo ético, além de interpor “visualização do feto ou embrião por meio de ultrassonografia”, procedimentos desnecessários que intimidam, constrangem e torturam as mulheres que sofreram uma violência extrema e ainda necessitam enfrentar um aborto legal.

Como se não bastassem as iniciativas desastrosas do poder executivo, os retrocessos na área de saúde da mulher em meio à pandemia incluem também um projeto de decreto legislativo n. 271, apresentado em junho de 2020, pelo Deputado Filipe Barros (PSL/PR)45 para sustar três normas técnicas do MS(e). De imediato, o Conselho Nacional de Saúde se manifestou a respeito, solicitando à Câmara dos Deputados o seu arquivamento e, ao MS, que republique a nota técnica n. 16/2020 suspensa46.

Todas essas iniciativas que infringem direitos das mulheres não são aleatórias, mas esforços extremamente bem articulados de vários ministérios (Relações Exteriores; Mulher, Família e Direitos Humanos; e Educação) e de representantes do poder legislativo na direção de supressão de conquistas históricas nas últimas décadas do movimento feminista no Brasil(f).

Para completar este quadro desolador no tocante ao descaso público com a proteção da saúde sexual e reprodutiva das mulheres que dependem do SUS, cientistas feministas vêm denunciando o aumento vertiginoso de mortes maternas no Brasil, associadas à pandemia, o que representa apenas a ponta do iceberg do abandono das mulheres, gestantes ou não, nos últimos meses28,48. Mortes maternas podem ser comprovadas com investigação desses óbitos. E como contabilizar as gravidezes imprevistas e os abortos malsucedidos neste período? Tais desfechos nos preocupam sobremaneira.

A trajetória das políticas públicas de assistência à saúde das mulheres, em todas as fases de seu ciclo de vida, desde a adolescência até seu envelhecimento, esteve marcada por princípios caros ao movimento da reforma sanitária. O PAISM, em 1983, já destacava a necessária e urgente perspectiva de integralidade da assistência à saúde e do quanto são distintos os processos de adoecimento, de prevenção, de possibilidades de assistência e de cuidado em função dos contextos sociais, raciais, regionais, geracionais e laborais que atravessam as vidas das mulheres. Entram também na pauta a reivindicação (e conquista) da participação da sociedade civil organizada nos espaços de gestão colegiada e a formulação de políticas de saúde em consonância com a perspectiva dos direitos humanos, asseguradas em conferências internacionais da Organização das Nações Unidas. Assim, parece-nos fundamental chamar atenção para o necessário resgate estratégico no momento político atual da perspectiva da justiça reprodutiva, pois ela recupera o elo perdido, ao longo das últimas décadas, entre direitos sexuais e reprodutivos e direitos sociais, clamando sobretudo por justiça social. Em outras palavras, não se trata de substituição de uma perspectiva por outra, mas da necessária integração entre essas dimensões, sobretudo na proposição de políticas públicas que encampem o desafio de enfrentar as múltiplas formas de desigualdades sociais e seus impactos na saúde. Infelizmente, o atual cenário político nacional tem feito apostas para restringir direitos (sociais, trabalhistas e individuais) e propor políticas que favoreçam uma lógica individual e de mercado, cujos efeitos já se fazem sentir em indicadores de saúde como os relacionados à pandemia de Covid-19.

Considerações finais

A pandemia de Covid-19 chegou ao Brasil em um momento particularmente difícil às mulheres, em razão do conservadorismo moral e religioso que vigora no governo atual, alinhado à ofensiva antigênero mais ampla, que atinge vários outros países além da América Latina e tem na luta antiaborto um de seus principais pilares15,16. Essa viragem à direita transcende as fronteiras nacionais. O recente alinhamento do Brasil no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas a países ultraconservadores na votação contrária à inclusão do acesso universal à educação sexual em projeto de resolução para combater a discriminação contra mulheres e meninas evidencia o total giro à direita da nossa diplomacia49,50. O Brasil também assinou, com outros países (Estados Unidos, Egito, Hungria, Indonésia e Uganda), em outubro de 2020, a “Declaração Consensual de Genebra”, um acordo internacional para “promoção da saúde da mulher e do fortalecimento da família”, cujo compromisso infelizmente não é o de ampliação de direitos ou de enfrentamento das disparidades sociais e desigualdades em saúde (sobretudo da saúde reprodutiva).

As desigualdades produzem adoecimentos e mortes. O contexto de crise sanitária trazido pela pandemia Covid-19 é sobremaneira agravado com o desmonte intencional de diversas políticas públicas elaboradas nas últimas décadas. Há acelerado desmantelamento de diversos direitos, como os trabalhistas, reprodutivos, à saúde e à educação. Pode-se dizer que o atual contexto é marcado tanto pela ausência de políticas de enfrentamento das múltiplas desigualdades sociais (o que resulta na produção de mais desigualdades em saúde), quanto pela instituição de uma forma de gestão da vida e dos corpos que tem em seu cerne o deixar morrer/fazer morrer, tão bem apresentada no conceito de necropolítica de Mbembe14.

Reivindicar a utilização do conceito de justiça reprodutiva entre nós significa cobrar do Estado brasileiro o amparo a todas as mulheres que desejam ter seus filhos em condições seguras e àquelas que não desejam ter mais filhos ou ter filho algum. A escolha sobre ter ou não um filho é bastante complexa, especialmente considerando uma nação sem oferta de creches públicas e de escolas para primeira infância; e culturalmente não familiarizada com a divisão sexual do trabalho doméstico. Indo além, é necessário reconhecer os múltiplos processos de produção de desigualdades sociais e propor políticas públicas capazes de enfrentar (ou ao menos mitigar) as disparidades produzidas pelos múltiplos feixes de subordinação e hierarquização social aos quais os indivíduos (uns mais do que outros) estão submetidos. A perspectiva da interseccionalidade, aliada à da justiça reprodutiva, são importantes arcabouços teórico-políticos para proposição de intervenções que levem em consideração os processos complexos de produção de desigualdades sociais e formas possíveis de enfrentamento dos seus impactos na saúde. Em momento de apreensão social coletiva, punir ainda mais as mulheres, deixando-as à própria sorte e negando-lhes o direito à atenção à saúde sexual e reprodutiva, só nos torna mais insensíveis à morte alheia; neste caso, com gênero, classe social e cor específicos.

  • (c)
    A literatura tem reiteradamente apontado que os métodos contraceptivos reversíveis de longo prazo (LARC), como implantes subdérmicos e DIU hormonal, são uma importante opção contraceptiva neste momento de crise sanitária internacional. Todavia, é preciso muita cautela para não tomarmos tal “solução” como compulsória às mulheres, decidindo por elas algo que atinge seus corpos e saúde. Uma intervenção dessa magnitude pode ter caráter coercitivo, sobretudo em contextos nos quais as mulheres não estão bem informadas a respeito de tais dispositivos e seguras quanto aos seus possíveis efeitos4,6-8.
  • (d)
    Trata-se do episódio de gravidez de uma menina de 10 anos no Espírito Santo, resultante de sucessivos estupros sofridos ao longo de anos. A trágica história reacendeu o debate público sobre o quão frequente tem sido a violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil, além dos recorrentes entraves para assegurar um direito previsto em lei44.
  • (e)
    São elas: “Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes” (1999), “Atenção humanizada ao abortamento” (2005) e “Acesso à saúde sexual e saúde reprodutiva no contexto da pandemia da Covid” (2020).
  • (f)
    Impossível não mencionar a equivocada campanha, liderada pelo Ministério da Mulher, da Família e Direitos Humanos em fevereiro de 2020, que insistia na proposta de “abstinência sexual” para retardar a iniciação sexual de adolescentes, em razão de alegados índices de gravidez “precoce”47.
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  • Financiamento
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Editado por

  • Editora
    Ana Flávia d’Oliveira
    Editora associada
    Josefina Leonor Brown

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    04 Nov 2020
  • Aceito
    19 Maio 2021
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