Resumos
No presente trabalho, avaliou-se o efeito do uso contínuo das adubações orgânica e mineral na cultura do milho e sobre a acumulação e a disponibilidade do nitrogênio em um Argissolo Vermelho-Amarelo. Estudou-se a produção de milho em função das doses de 0 e 40 m³ ha-1 ano-1 de composto orgânico (palhada de soja e feijão com esterco bovino), combinadas com 0, 250 e 500 kg ha-1 ano-1 da fórmula 4-14-8 aplicados no plantio, e 0, 100 e 200 kg ha-1 ano-1 de sulfato de amônio em cobertura. O uso contínuo da adubação orgânica aumentou a produtividade de milho com o efeito da adubação química sendo menos expressivo. Observou-se, ainda, aumento do C total. Com base nos resultados observados, pôde-se concluir que o uso contínuo da adubação orgânica proporcionou aumento na reserva (N total) e na disponibilidade de N, sendo essas características pouco influenciadas pela adubação química.
carbono orgânico; ensaio de longa duração; adubação contínua
This study aimed to evaluate the effect of continuous use of the organic and mineral fertilization in maize crop and on the accumulation and availability of nitrogen in a Cambic Yellow Red Podzol. The maize yield was evaluated as a function of doses from 0 to 40 m³ ha-1 year-1 of the organic compost (beans and soybean straw with manure) combined with 0, 250 and 500 kg ha-1 year-1 of the formula 4-14-8 applied at the planting time, and the application of 0, 100 and 200 kg ha-1 year-1 of ammonium sulphate. The plots consisted of eight furrows (8 m length) 1.0 m apart from each other in a randomized experimental block design with four replications. The results showed that the continuous use of the organic fertilization increased maize productivity, whereas the chemical fertilization showed less expressive effects. Increases in both the total carbon and KMnO4- oxidized carbon were observed. The results also show that the continuous use of the organic fertilization provided an increase in total N reserve and availability of N, while the chemical fertilization had little influence on these characteristics.
organic carbon; long-term experiment; continuous fertilization
MANEJO DE ÁGUA E SOLO
Acumulação de nitrogênio e carbono no solo pela adubação orgânica e mineral contínua na cultura do milho1 1 Parte da Tese de Mestrado do primeiro autor, apresentada à Universidade Federal de Viçosa
Nitrogen and carbon accumulation in soil through continuous organic and mineral fertilization of maize crop
Celsemy E. MaiaI; Reinaldo B. CantaruttiII
IDoutorando, UFCG. E-mail: celsemymaia@bol.com.br
IIDepartamento de Solos, UFV.CEP 36571, Viçosa, MG
RESUMO
No presente trabalho, avaliou-se o efeito do uso contínuo das adubações orgânica e mineral na cultura do milho e sobre a acumulação e a disponibilidade do nitrogênio em um Argissolo Vermelho-Amarelo. Estudou-se a produção de milho em função das doses de 0 e 40 m3 ha-1 ano-1 de composto orgânico (palhada de soja e feijão com esterco bovino), combinadas com 0, 250 e 500 kg ha-1 ano-1 da fórmula 4-14-8 aplicados no plantio, e 0, 100 e 200 kg ha-1 ano-1 de sulfato de amônio em cobertura. O uso contínuo da adubação orgânica aumentou a produtividade de milho com o efeito da adubação química sendo menos expressivo. Observou-se, ainda, aumento do C total. Com base nos resultados observados, pôde-se concluir que o uso contínuo da adubação orgânica proporcionou aumento na reserva (N total) e na disponibilidade de N, sendo essas características pouco influenciadas pela adubação química.
Palavras-chave: carbono orgânico, ensaio de longa duração, adubação contínua
ABSTRACT
This study aimed to evaluate the effect of continuous use of the organic and mineral fertilization in maize crop and on the accumulation and availability of nitrogen in a Cambic Yellow Red Podzol. The maize yield was evaluated as a function of doses from 0 to 40 m3 ha-1 year-1 of the organic compost (beans and soybean straw with manure) combined with 0, 250 and 500 kg ha-1 year-1 of the formula 4-14-8 applied at the planting time, and the application of 0, 100 and 200 kg ha-1 year-1 of ammonium sulphate. The plots consisted of eight furrows (8 m length) 1.0 m apart from each other in a randomized experimental block design with four replications. The results showed that the continuous use of the organic fertilization increased maize productivity, whereas the chemical fertilization showed less expressive effects. Increases in both the total carbon and KMnO4- oxidized carbon were observed. The results also show that the continuous use of the organic fertilization provided an increase in total N reserve and availability of N, while the chemical fertilization had little influence on these characteristics.
Key words: organic carbon, long-term experiment, continuous fertilization
INTRODUÇÃO
Entre os fatores que contribuem para o incremento da produtividade das culturas, a disponibilidade de N é um dos mais importantes, pois se trata de um nutriente absorvido em maiores quantidades pela maioria das culturas e o que exerce efeito mais pronunciado na produção. Apesar disso, o manejo da adubação nitrogenada é difícil, por ser o N um elemento que apresenta dinâmica complexa e em virtude do fato da adubação química não apresentar efeito residual (Raij, 1991).
A principal reserva de nitrogênio do solo é a matéria orgânica, com grande significado para o suprimento do nutriente para as culturas. O N orgânico é mineralizado à amônia que, nas condições de acidez predominante nos solos, é convertida a NH4+ ou, então, a NO3-, pela ação das bactérias nitrificantes. O nitrato é de alta mobilidade no solo, principalmente na camada superficial, devido à adsorção não-específica a que o íon está sujeito e à predominância de cargas negativas no complexo coloidal do solo, decorrente sobretudo da presença da matéria orgânica. Diante disso, a forma de NH4+ pode ser mais eficientemente adsorvida às cargas negativas do solo. Tanto a forma nítrica como a amoniacal são absorvíveis pelas plantas (Thicke et al., 1993).
A curto prazo, a dinâmica do N no solo é difícil de ser prevista. A quantidade de N inorgânico no solo depende, entre outros fatores, da disponibilidade de resíduos orgânicos, da relação C:N do solo, da umidade e do pH do solo. Em contrapartida, o teor total de N do solo praticamente não varia a curto prazo, ou mesmo no período de alguns anos (Raij, 1991).
O N potencialmente mineralizável do solo é uma medida da quantidade de N mineralizado sob condições ótimas de umidade e temperatura; assim, pode ser empregado para estimar o N que será disponibilizado durante o ciclo de uma cultura. Durante o período de crescimento das plantas, existe variação nas quantidades de N inorgânico (principalmente NO3-) e também na capacidade que o solo tem de fornecer N às plantas, por meio da mineralização. A contribuição relativa das formas orgânicas e minerais varia de acordo com o tipo de solo e o sistema de manejo (Stanford & Smith, 1976).
As principais formas inorgânicas são o NH4+ e o NO3-, embora o nitrito possa ser encontrado em certas condições. A maior parte do N inorgânico do solo é derivada da mineralização da matéria orgânica do solo e da aplicação de fertilizantes nitrogenados (Fernandes & Rossiello, 1995). Devido às perdas do N inorgânico por lixiviação, fixação e desnitrificação, na utilização de índices de disponibilidade de N geralmente não está incluído o N inorgânico presente no solo, e a medida do potencial de mineralização do solo pode indicar a disponibilidade de N, por ser razoavelmente constante de um ano para o outro, a não ser que o tipo de cultura ou a quantidade e qualidade do resíduo incorporado sejam alterados (Dahnke & Johnson, 1990).
Neste trabalho, objetivou-se avaliar o efeito do uso contínuo das adubações orgânica e mineral na cultura do milho e sobre a acumulação e a disponibilidade do N em um Argissolo Vermelho-Amarelo na Zona da Mata mineira.
MATERIAL E MÉTODOS
Caracterização da área experimental
Utilizaram-se, para o estudo, amostras de solo coletadas em uma área experimental na Estação Experimental de Coimbra, pertencente à Universidade Federal de Viçosa, localizada no município de Coimbra (20º 45' S; 42º 51' O) na Zona da Mata mineira. A região apresenta precipitação pluviométrica de 1.300 a 1.400 mm, concentrada entre outubro e março, durante a estação quente. O solo da área experimental é um Argissolo Vermelho-Amarelo fase terraço, muito argiloso. No início do experimento, este solo, que já havia sido intensamente cultivado, apresentava pH 5,9; Al3+, Ca2+ e Mg2+ iguais a 0,0; 2,6 e 1,7 cmolc kg-1, respectivamente; P e K disponíveis (Mehlich-1) iguais a 11 e 58 mg kg-1 , respectivamente, e teor de C orgânico igual a 2,3 dag kg-1.
O experimento com a cultura do milho foi iniciado em 1984, e sua produção de milho tem sido avaliada sob as doses de 0 e 40 m3 ha-1 ano-1 de composto orgânico, combinadas com três doses de adubo químico, ao longo de 13 cultivos, até o momento. As adubações químicas correspondem a 0, 250 e 500 kg ha-1 da fórmula 4-14-8 aplicados no plantio. Esta adubação correspondeu à aplicação acumulada nos 13 anos, de 130, 455 e 260 kg ha-1 de N, P2O5 e K2O, respectivamente, na menor dose, e de 260, 910 e 520 kg ha-1 , na maior dose. Em cobertura aplicaram-se, em cada cultivo, 0, 20 e 40 kg ha-1 de N na forma de sulfato de amônio. Nos 13 anos foram aplicados, em cobertura, 0, 260 e 520 kg ha-1 de N. O composto orgânico utilizado, feito de palhada de soja e feijão junto com esterco bovino, apresentou, em média, 380 g kg-1 de água, 0,36 g cm-3 de densidade e teores de P, K, Ca, Mg e N de 0,7; 2,8; 1,0; 0,4; e 3,2 dag kg-1 , respectivamente. Essa adubação forneceu, durante os 13 anos, 3.714, 812 e 3.250 kg ha-1 de N, P e K, respectivamente. A relação C:N do composto orgânico era de 5:1. As informações gerais do experimento são citadas em Galvão (1995).
Na amostragem de solo realizada coletaram-se 12 amostras simples por parcela, nas camadas de 0-10 e de 10-20 cm. As amostras simples foram coletadas na área útil das parcelas, em uma faixa de 20 cm de largura, localizada sobre o sulco de plantio, retirando-se três amostras simples por sulco na área útil da parcela. As amostras simples de cada camada foram reunidas em uma amostra composta, sendo o solo destorroado e passado em peneira com malha de 4 mm, para remover raízes e fragmentos de palha. Após homogeneização, retiram-se duas subamostras, de aproximadamente 0,25 dm3, que foram utilizadas para as determinações químicas. Uma das subamos-tras foi mantida com a umidade natural, acondicionada em saco plástico e mantida em geladeira até a análise, e a outra foi transformada em terra fina seca ao ar (TFSA).
Para a avaliação da fertilidade da área, foram feitas amostras compostas com os solos das duas profundidades de cada parcela e enviadas para análise química no Laboratório de Solos da Universidade Federal de Viçosa, cujos resultados são apresentados na Tabela 1.
Análises químicas
Nas amostras mantidas com umidade natural, as formas inorgânicas de nitrogênio (NH4+ e NO3-) foram extraídas com KCl 1,0 mol L-1, utilizando-se a relação solo:solução de 1:10 e agitação por uma hora. No filtrado, foi determinado o NH4+ e o NO3- O amônio foi determinado pela destilação Kjeldhal (Keeney & Nelson, 1982) e o NO3- foi determinado indiretamente, após sua redução a NO2-, empregando-se sulfato de hidrazina, este dosado colorimetricamente, com base na reação Griess-Ilosvay, conforme descrito por Keeney & Nelson (1982). Os resultados foram corrigidos para peso de TFSA.
Nas subamostras de TFSA, determinaram-se o nitrogênio total, o nitrogênio potencialmente mineralizável e o carbono total. O nitrogênio total foi determinado em 0,5 g de TFSA passada em peneira de 0,15 mm (100 mesh) após ter sido triturada em almofariz. O solo foi submetido a digestão sulfúrica e o nitrogênio dosado por destilação Kjeldahl (Bremner & Mulvaney, 1982).
O nitrogênio mineralizável anaerobicamente (NMA) foi determinado pelo método da incubação anaeróbica, desenvolvido por Waring & Bremner (1964) adotando-se o procedimento descrito por Keeney (1982). Após o período de incubação de sete dias a 35 ºC, os tubos foram agitados e a mistura solo-água transferida para tubos de destilação, juntamente com 15 mL de KCl 1,0 mol L-1 e aproximadamente 0,3 g de MgO. O NH3 liberado foi imediatamente destilado e o NH4+ dosado, conforme metodologia descrita por Keeney & Nelson (1982). Determinou-se o NH4+ inicialmente presente no solo e, por diferença, foi calculada a quantidade de NH4+ produzida durante a incubação.
O carbono total foi determinado em amostras de solo trituradas em almofariz e passada em peneira de 0,5 mm, pelo método de Walkley-Black, citado por Defelipo e Ribeiro (1981).
Análises estatísticas
Os dados foram submetidos a análise de variância e análise de correlação (Pearson), utilizando-se o sistema computacional SAEG (Sistema de Análise Estatística e Genética) desenvolvido pela Universidade Federal de Viçosa. Para a análise de variância, as duas profundidades de amostragem foram consideradas isoladamente e as correlações realizadas com os valores médios das duas profundidades.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Produtividade do milho
A produtividade de milho até o 13° cultivo possibilitou uma análise sobre a tendência para o efeito dos tratamentos avaliados (Figura 1). Observa-se, na ausência da adubação orgânica, tendência de queda na produtividade de milho, tanto sem adubação mineral quanto com aplicação de 250 kg ha-1 ano-1 da fórmula 4-14-8 (mais 100 kg ha-1 ano-1 de sulfato de amônio em cobertura) (Figura 1A). Com a aplicação de 500 kg ha-1 ano-1 de 4-14-8 (mais 200 kg ha-1 ano-1 de sulfato de amônio) a produtividade se manteve, ao longo do período, em torno de 5 t ha-1, embora tenham sido registradas produtividades de 6 t ha-1.
Com aplicação de 40 m3 ha-1 ano-1 de composto orgânico, além de a produtividade ter sido superior, observou-se tendência de incremento ao longo dos 13 cultivos, independentemente da adubação mineral (Figura 1B). Comparando-se as tendências das produtividades apresentadas nas Figuras 1A e 1B observa-se, ainda, que é evidente a interação positiva entre a adubação orgânica e a mineral, com esta última contribuindo menos para o aumento da produtividade.
A tendência de aumento da produtividade com o tempo, nos tratamentos que receberam compostos orgânicos, deve-se à importância desta adubação para a manutenção e construção da fertilidade e para a melhoria das condições físicas do solo. Comparando-se a análise do solo dos tratamentos sem adubação mineral mas com aplicação de 0 e 40 m3 ha-1 de composto orgânico, verifica-se que o efeito residual da adubação orgânica proporcionou 3,3 e 2,7 vezes mais fósforo e potássio disponíveis, assim como 1,6 e 1,3 vezes mais cálcio e magnésio trocáveis, respectivamente (Tabela 1), porém é importante a adubação mineral, para que sejam alcançadas maiores produtividades de milho, o que contribui para tornar o sistema de produção economicamente viável, diante das altas produtividades alcançadas em regiões ou países com agricultura desenvolvida. Por outro lado, as tendências verificadas mostram a importância da adubação orgânica para a sustentabilidade da produtividade de milho, sobretudo em sistema de produção de baixo nível tecnológico.
Carbono orgânico no solo
Tanto os teores de carbono orgânico total como a fração do carbono lábil, nas camadas de 0 a 10 e 10 a 20 cm do solo, foram positivamente influenciados pela adubação orgânica (Tabela 2). Os teores de carbono orgânico total nas duas camadas de solo foram, em média, superiores nos tratamentos que receberam adubação orgânica, sendo os maiores teores de carbono orgânico total encontrados na camada de 0 a 10 cm.
Os tratamentos com composto orgânico (d = 0,36 g cm-3, 380 g kg-1 de água e 160 g kg-1 de carbono) receberam, durante os 13 anos do experimento, 18.570 kg ha-1 de C. Com base nos teores atuais (considerando-se a densidade do solo igual a 1,0 g cm-3) estimam-se as quantidades de 49.800 e 61.800 kg ha-1 de C na camada de 0-20 cm, nos tratamentos sem e com adubação orgânica, respectivamente. Levando-se em conta que o solo no início do experimento apresentava 46.000 kg ha-1 de C (2,3 dag kg-1) houve, mesmo sem adubação orgânica, incremento de 3.800 kg ha-1 de C (8%) o que se deve à incorporação dos restos culturais. Com a adubação orgânica, esse ganho foi de 15.800 kg ha-1 de C (34%). Assumindo-se uma eficiência de assimilação do carbono de 35% (Kiehl, 1985) esperar-se-ia que este ganho fosse da ordem de 5.530 kg ha-1 de C. O ganho adicional de 10.270 kg ha-1 se deve à maior quantidade de biomassa de restos culturais incorporados, em razão do efeito conjunto das adubações orgânica e mineral sobre a produtividade biológica da cultura.
O uso contínuo da adubação orgânica proporcionou aumento médio na CTC total de 41% (Tabela 1), observando-se tendência de diminuição da CTC com o aumento da adubação mineral. A diminuição da CTC (tanto em termos absolutos como relativos) com o aumento da adubação mineral, provavelmente se deve à intensificação da atividade microbiana com a correção das restrições nutricionais do solo. O aumento na atividade microbiana intensifica a mineralização da matéria orgânica do solo, principalmente das formas prontamente lábeis, causando redução nos teores de matéria orgânica do solo. Jenkinson (1971) verificou que o carbono lábil é decomposto mais rapidamente em compostos humificados mais recentes que em materiais mais estabilizados no solo. Sampaio et al. (1990) verificaram perda de 52% do carbono do solo durante o primeiro mês de decomposição da palha de milho incorporada, o que foi atribuído ao consumo inicial pelos microrganismos dos substratos mais facilmente oxidáveis. Para Stott e Martin (1990) entre 60 e 80% do carbono adicionado ao solo são perdidos na forma de CO2 no primeiro ano. Esta perda é mais intensa até aproximadamente 30-50 dias após a aplicação da matéria orgânica, diminuindo em razão do esgotamento das formas mais lábeis.
Observou-se que a relação C:N, nas duas camadas, variou de 14:1 a 16:1. Os menores valores médios foram observados nos tratamentos que receberam adubação orgânica, embora a diferença tenha sido significativa apenas na camada de 0 a 10 cm (Tabela 2), em virtude do composto orgânico incorporado anualmente possuir relação de 5:1.
Apesar dos 13 anos de cultivo, observa-se que a relação C:N está acima do valor de 10:1, que é atingido com a completa humificação da matéria orgânica, o que ocorre em torno de 30-50 dias após a incorporação do composto orgânico, sem dúvida pela incorporação da palha de milho após cada cultivo. Segundo Cerri et al. (1997) se a relação C:N da matéria orgânica do solo aumenta, a relação C:N dos ácidos húmicos também aumenta, o que indica menor grau de humificação que degradabilidade potencial mais alta da matéria orgânica dos solos cultivados.
Sampaio et al. (1990) estudando a decomposição da palha de milho, verificaram que a relação C:N em solo de Pernambuco decresceu de um valor de 21:1 para valores de 8-10:1, em três profundidades estudadas. Segundo os autores, isto resulta da perda mais acelerada de carbono que do N, principalmente na fase inicial da mineralização. Nesta fase, as taxas de desapareci-mento de C e N foram de magnitude semelhante, mas o reservatório lábil de carbono foi de duas a três vezes maior. Na fase seguinte, as taxas de perdas de N foram de cerca da metade das de carbono.
Nitrogênio total
O N total inclui as formas orgânicas, que são as predomi-nantes, e inorgânicas, do elemento no solo. Embora essa característica nem sempre se relacione com a disponibilidade de N, a relação com o teor de matéria orgânica do solo é sempre estreita. Assim, o teor de N total nas camadas de 0 a 10 e 10 a 20 cm foi positivamente influenciado pela adubação orgânica (Tabela 3). Os teores médios de N total nos tratamentos que receberam adubação orgânica foram 44% e 27% superiores nas profundidades de 0 a 10 e 10 a 20 cm, respectivamente.
O maior teor de N total na camada superficial se deve à incorporação dos resíduos vegetais e à aplicação do composto nessa camada. Resultados semelhantes foram obtidos por Stanford et al. (1974), Gotoh & Koga (1983), Dick & Christ (1995) e Xu et al. (1996).
O maior teor de N total nos tratamentos que receberam adubação orgânica evidencia o efeito residual do composto orgânico aplicado ao longo dos 13 anos. O composto orgânico foi a fonte primária de N orgânico no solo, estimando-se a adição total de 3.714 kg ha-1, e a incorporação da palha do milho intensificou a reciclagem, favorecendo a manutenção do N no solo. A diferença na quantidade de N acumulado na camada de 0 a 20 cm, nos tratamentos com e sem adubação orgânica, indica ganho médio de 1.066 kg ha-1 de N (considerando-se a densidade do solo igual a 1,0 g cm-3) o que representa 29% de N total aplicado por meio do composto orgânico.
Os teores médios de N total observados nesse estudo foram superiores aos valores médios observados por Xu et al. (1996) em solos da Austrália, em 123 experimentos de adubação nitrogenada para cereais, em que foram encontrados teores médios de 0,12 e 0,07 dag kg-1, com valores máximos de 0,24 e 0,18 dag kg-1, para as profundidades de 0 a 10 e 10 a 20 cm, respectivamente.
Independentemente da aplicação ou não do composto orgânico, a adubação mineral, que veiculou ao longo dos 13 cultivos, um total de 390 a 780 kg ha-1 de N, pouco alterou o teor de N total no solo. Considerando-se que a adubação mineral contribui para maior produção de grãos (Figura 1) e, conseqüentemente, maior biomassa (palhada) sugere-se que a reciclagem, por si, pouco contribuiu para o aumento do N total e, possivel-mente, da matéria orgânica do solo. A maior quantidade de N reciclado nessas condições pode, no entanto, ter sido compensada pela maior exportação na produção de grãos ou pela intensificação das perdas.
Nitrogênio mineralizado anaerobicamente
O teor de N total, via de regra, não caracteriza o compartimento de N do solo mais facilmente mineralizável (fator quantidade ou N lábil) o qual determina a disponibilidade de N, se as condições forem favoráveis à mineralização. O NH4+ produzido sob condições anaeróbicas (solo submerso) denominado N mineralizado anaerobicamente (NMA) proporciona, conforme metodologia desenvolvida por Waring & Bremner (1964) uma estimativa adequada da fração lábil de N.
O NMA na camada de solo de 0 a 10 cm foi, em média, maior nos tratamentos com adubação orgânica (Tabela 4). Além disso, verificou-se significância para o efeito principal da adubação química observando-se, em média, maior valor de NMA na maior dose dessa adubação; já para a camada de 10 a 20 cm houve efeito apenas da adubação orgânica.
A adubação orgânica proporcionou aumento médio dos teores de NMA, nas camadas de 0 a 10 e 10 a 20 cm, de 47 e 37%, respectivamente, o que se deve à alteração qualitativa na matéria orgânica do solo, representando um aumento do fator quantidade de N. Neste sentido, verificou-se que, em média, o NMA variou inversamente com a relação C:N do solo (Tabelas 2 e 4).
O aumento do NMA em função da adubação química é devido, provavelmente, ao efeito da matéria orgânica sobre a disponibilidade de N, fósforo, potássio e enxofre, o que favorece a maior atividade microbiana durante a incubação. Resultados semelhantes foram encontrados por Munevar & Wollum (1977) com a aplicação de fósforo e potássio.
Na profundidade de 0 a 10 cm, o NMA correspondeu a 2,8 e 3,1% do N total, na ausência e na presença do composto orgânico, respectivamente (Tabela 4); já para a profundidade de 10 a 20 cm esses percentuais foram de 2,9 e 3,2. Wang et al. (1996) trabalhando com índices de mineralização da matéria orgânica em um Ferrosol da Tasmânia obtiveram, pelo método da incubação anaeróbica, proporção semelhante de NMA em relação ao N total. Verificaram, ainda, que maiores teores de NMA foram encontrados na camada de 0 a 10 cm, diminuindo até a profundidade de 105 cm, e que aproximadamente 50% do N mineralizado anaerobicamente foram encontrados na camada de 0 a 10 cm.
Em experimento de longa duração, realizado no campo, estudando a mineralização do N do solo em várias profundidades, Hadas et al. (1986) constataram que o teor de N total e do N mineralizado anaerobicamente diminuiu com a profundidade do solo devido, provavelmente, à diminuição da atividade microbiana no solo, e que a quantidade do N mineralizável em solos que receberam adubação NPK, foi praticamente o dobro da dos solos que não receberam adubação.
CONCLUSÕES
1. O uso contínuo da adubação orgânica proporcionou aumento no N-total e na disponibilidade de N, sendo essas características pouco influenciadas pela adubação química.
2. O uso contínuo da adubação orgânica aumentou a produtividade de milho, saindo de uma produtividade de 3,5 para 8 t ha-1, nos treze anos de cultivo.
LITERATURA CITADA
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Set 2004 -
Data do Fascículo
Abr 2004
Histórico
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Aceito
06 Fev 2004