Acessibilidade / Reportar erro

Modificação das propriedades das fibras de curauá por acetilação

Modification of the properties of curauá fibers by acetylation

Resumos

Nos compósitos cimentíceos as fibras vegetais podem sofrer vários graus de degradação quando expostas ao ambiente alcalino. O meio alcalino degrada os componentes macromoleculares das fibras, principalmente pela solubilização da lignina e a desfibrilação da celulose, comprometendo suas propriedades físicas e mecânicas. A resistência das fibras vegetais ao ataque alcalino pode ser aumentada por meio de tratamentos químicos superficiais como a acetilação que apresenta capacidade de reduzir a natureza higroscópica de compostos lignocelulósicos pela introdução de grupos funcionais hidrofóbicos em sua estrutura química. Objetivou-se, então neste trabalho, a aplicação do tratamento de acetilação em diferentes níveis, visando melhorias na durabilidade das fibras. O tratamento de acetilação nas fibras de curauá foi aplicado em diferentes temperaturas e tempos reacionais e sua eficiência, considerando-se a redução da hidrofilicidade e a manutenção do desempenho físico-mecânico das fibras, foi avaliada pelos ensaios de absorção de água por imersão, resistência mecânica, espectroscopia de infravermelho, microscopia eletrônica de varredura, análise termogravimétrica e difratometria de raios-x. Quando acetiladas, as fibras de curauá apresentaram absorções até 55% menores que nas fibras não tratadas. As perdas na resistência mecânica foram próximas aos 52%. O tratamento de acetilação agregou grupos químicos hidrofóbicos na composição e alterou o caráter cristalino das fibras.

Ananas erectipholius; tratamento de fibras; hidrofilicidade; resistência


In cementitious composite the vegetable fibers may suffer various degrees of degradation when exposed to alkaline medium. The alkaline degradation of macromolecular components of fibers mainly by lignin solubilization and cellulose defibrillation, compromising the physical and mechanical properties. The resistance of plant fiber to alkali attack can be improved by chemical surface treatments such as acetylation that can reduce the hygroscopic nature of lignocellulosic introducing hydrophobic functional groups in its chemical structure. Thus, the aim of this study was the application of the acetylation treatment at different levels to improve the durability of the fibers.The acetylation treatment in curauá fiber was applied at different temperatures and reaction times, and its efficiency, considering the reduction of hydrophilicity and maintenance of the physical-mechanical performance of fibers was evaluated by water absorption, mechanical resistance, infrared spectroscopy, scanning electron microscopy, thermogravimetric analysis and diffraction of x-rays. When acetylated curauá fibers absorbed up to 55% less water than untreated fibers. In strength, losses were up 52%. The acetylation treatment introduced hydrophobic chemical groups in the composition and changed crystalline character of fibers.

Ananas erectipholius; treatment of fibers; hydrophilicity; resistance


CONSTRUÇÕES RURAIS E AMBIÊNCIA

Modificação das propriedades das fibras de curauá por acetilação

Modification of the properties of curauá fibers by acetylation

Fernanda F. M. LopesI; Gilmar T. AraújoII; Saionara LunaIII; José W. B. do NascimentoIV; Valneide R. da SilvaIV

IUATA/UFCG. R. Coronel João Leite 517, Centro, CEP 58800-000, Pombal, PB. Fone: (83) 3431-2376, E-mail: fndmelo@yahoo.com.br

IIUAEQ/UFCG. Fone: (83) 2101-1115. E-mail: gilmartrindade@deq.ufcg.edu.br

IIIQuímica Indústrial. Fone: (71) 8629-5127. E-mail: saionaraiq@hotmail.com

IVUAEA/UFCG. Fone: (83) 2101-1482. E-mail: wallace@deag.ufcg.edu.br; rval707@yahoo.com.br

RESUMO

Nos compósitos cimentíceos as fibras vegetais podem sofrer vários graus de degradação quando expostas ao ambiente alcalino. O meio alcalino degrada os componentes macromoleculares das fibras, principalmente pela solubilização da lignina e a desfibrilação da celulose, comprometendo suas propriedades físicas e mecânicas. A resistência das fibras vegetais ao ataque alcalino pode ser aumentada por meio de tratamentos químicos superficiais como a acetilação que apresenta capacidade de reduzir a natureza higroscópica de compostos lignocelulósicos pela introdução de grupos funcionais hidrofóbicos em sua estrutura química. Objetivou-se, então neste trabalho, a aplicação do tratamento de acetilação em diferentes níveis, visando melhorias na durabilidade das fibras. O tratamento de acetilação nas fibras de curauá foi aplicado em diferentes temperaturas e tempos reacionais e sua eficiência, considerando-se a redução da hidrofilicidade e a manutenção do desempenho físico-mecânico das fibras, foi avaliada pelos ensaios de absorção de água por imersão, resistência mecânica, espectroscopia de infravermelho, microscopia eletrônica de varredura, análise termogravimétrica e difratometria de raios-x. Quando acetiladas, as fibras de curauá apresentaram absorções até 55% menores que nas fibras não tratadas. As perdas na resistência mecânica foram próximas aos 52%. O tratamento de acetilação agregou grupos químicos hidrofóbicos na composição e alterou o caráter cristalino das fibras.

Palavras-chave:Ananas erectipholius, tratamento de fibras, hidrofilicidade, resistência

ABSTRACT

In cementitious composite the vegetable fibers may suffer various degrees of degradation when exposed to alkaline medium. The alkaline degradation of macromolecular components of fibers mainly by lignin solubilization and cellulose defibrillation, compromising the physical and mechanical properties. The resistance of plant fiber to alkali attack can be improved by chemical surface treatments such as acetylation that can reduce the hygroscopic nature of lignocellulosic introducing hydrophobic functional groups in its chemical structure. Thus, the aim of this study was the application of the acetylation treatment at different levels to improve the durability of the fibers.The acetylation treatment in curauá fiber was applied at different temperatures and reaction times, and its efficiency, considering the reduction of hydrophilicity and maintenance of the physical-mechanical performance of fibers was evaluated by water absorption, mechanical resistance, infrared spectroscopy, scanning electron microscopy, thermogravimetric analysis and diffraction of x-rays. When acetylated curauá fibers absorbed up to 55% less water than untreated fibers. In strength, losses were up 52%. The acetylation treatment introduced hydrophobic chemical groups in the composition and changed crystalline character of fibers.

Key words:Ananas erectipholius, treatment of fibers, hydrophilicity, resistance

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, as pesquisas sobre a empregabilidade de fibras vegetais na construção civil, como reforço em compósitos cimentíceos em substituição às fibras minerais e sintéticas, têm-se intensificado. No Brasil existem diversas culturas com potencial para produção de fibras e resíduos agrícolas aplicáveis na confecção desses compósitos, com grandes benefícios socioeconômicos.

As matrizes à base de cimento são frágeis e quebradiças e, sob a ação de pequenos esforços de tração ou deformações por alongamento, tendem à formação de fissuras. Com a adição de fibras, a fissuração da matriz é reduzida, uma vez que as fissuras são interligadas pelas fibras e, como resultado, ocorre um aumento na tenacidade e na resistência à tração e ao impacto. Além disso, o compósito, ao invés de se romper subitamente após o início da fissuração da matriz, apresenta uma deformação plástica considerável que o torna um material adequado para construção (Sarmiento & Freire, 1997; Melo Filho, 2005; Lima et al., 2007).

Nos compósitos cimentíceos as fibras vegetais podem sofrer vários graus de degradação quando expostas ao ambiente alcalino e à intensidade deste elemento, a qual é determinada pelas características da fibra. Dependendo do tipo de fibra e da solução alcalina utilizada, pode ocorrer a incompatibilidade entre fibra e matriz que pode ser classificada como incompatibilidade química que por sua vez, pode enfraquecer ou petrificar a fibra, e incompatibilidade física, passível de causar perda de aderência (Silva, 2002).

O meio alcalino degrada principalmente a lignina presente nas fibras vegetais, tornando-a solúvel, ocasionando a separação das fibrilas de celulose (desfibrilamento) que até então estavam unidas pela lignina. A separação dos filamentos pode estar associada a outros processos de degradação como a petrificação, que também pode estar associada à perda da tenacidade de compósito a longo prazo, e a degradação severa em função de contínuas mudanças de volume das fibras vegetais dentro da matriz de cimento (Agopyan et al., 2005).

Para desenvolver compósitos que apresentem boas propriedades físico-mecânicas é necessário melhorar a interface entre a matriz e o material lignocelulósico. Ao se aperfeiçoar a interface do compósito, as propriedades das fibras podem ser melhoradas pela modificação de seus componentes constituintes, através de tratamentos químicos superficiais. De acordo com estudo realizado por Motta (2005), as modificações na superfície das fibras alteram propriedades como aderência e absorção de umidade, e as modificações dos constituintes estruturais alteram propriedades de equilíbrio, tais como a instabilidade dimensional com a variação de umidade.

A acetilação pode reduzir a natureza higroscópica das fibras lignocelulósicas e aumentar a estabilidade dimensional de compósitos pela introdução de grupos funcionais hidrofóbicos. Na reação entre as fibras e o anidrido acético, os polímeros do grupo hidroxila, das paredes celulares, são substituídos pelo grupo acetila, causando a plastilização da celulose das fibras.

O trabalho teve como objetivo determinar a influência do tratamento químico de acetilação na modificação das propriedades físicas e mecânicas das fibras de curauá (Ananas erectipholius).

MATERIAL E MÉTODOS

As fibras de curauá (Ananas erectipholius) utilizadas foram produzidas e beneficiadas no município de Santarém, Pará. O experimento foi conduzido no Laboratório de Química de Biomassa e Recuperação de Resíduos Sólidos da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Campina Grande, PB. Antes da realização do tratamento de acetilação as fibras de curauá foram lavadas em água a 50 ± 2 °C e posteriormente em água destilada a temperatura ambiente, para retirada do material residual do beneficiamento, como mucilagem e ceras presentes em sua superfície, secadas em estufa a 60 ± 2 °C, por 24 h, e armazenadas em dessecador.

Anterior ao tratamento de acetilação, as fibras foram embebidas em uma solução aquosa de NaOH a 1% por 1 h e repetidamente lavadas, até que apresentassem pH neutro na solução de lavagem final e secadas em estufa a 60 ± 2 °C, durante 24 h. Para a realização dos tratamentos de acetilação a metodologia adotada foi adaptada de D'Almeida et al. (2005), em que as amostras de fibras foram acondicionadas em um reator de condensação, sob agitação e em banho termostático com solução de anidrido acético e ácido acético, na proporção de 1,5:1,0 em massa. Os tempos reacionais (contato entre fibras e solução) foram de 1 e 3 h, a temperaturas de 100 e 120 °C. Decorrido o tempo de reação as amostras foram lavadas inicialmente com água corrente e, posteriormente, com água destilada, onde permaneceram durante 1h, apresentando pH entre 5-6 na solução de lavagem final; enfim, foram secadas em estufa a 60 ± 2 °C, durante 24 h, e armazenadas em dessecador com sílica gel, até o momento dos ensaios.

Ensaios de caracterização das fibras

Na determinação da absorção d'água, as fibras não tratadas e acetiladas previamente secadas, foram pesadas (cerca de 1 g) e imersas em recipientes com água destilada; as fibras foram retiradas d'água, secadas superficialmente com papel absorvente e pesadas em balança semianalítica após 0,5, 2 e 24 h do início do teste. Os resultados foram determinados de acordo com a Eq. 1.

em que:

P0 - peso seco inicial, g

P1 - peso após imersão em água, g

Na avaliação do comportamento mecânico das fibras pela resistência a tração, utilizou-se uma máquina de ensaios universal, com velocidade de 1 mm min-1. Para que as garras da máquina pudessem segurar as fibras, corpos de prova foram montados com o auxílio de papel tipo cartolina, nas dimensões de 15 x 2,0 cm. As fibras foram coladas a esses corpos de prova deixando-se um comprimento útil de ensaio de 10 cm. Utilizaram-se 12 corpos de prova por tratamento. Na confecção dos resultados foram contabilizados apenas os oito melhores ensaios, com base no ajuste dos dados experimentais aos calculados. O diâmetro médio das fibras utilizado nos ensaios, foi determinado com base na leitura do diâmetro de 30 fibras obtidos por projeção ampliada e com leitura direta por um projetor de perfil vertical.

Para determinação da presença e intensidade de grupos acetila nas fibras de curauá em decorrência do tratamento de acetilação, utilizou-se a espectroscopia na região do infravermelho avaliando-se comprimentos de onda entre 500 e 4000 cm-1; para o ensaio, as fibras foram secadas em estufa a 80 ± 2 °C, por 24 h, de forma que perdessem a maior parte do conteúdo de água livre sobre a superfície, sem modificar sua composição química pela exposição ao calor; em seguida, as fibras foram picadas, maceradas e prensadas em pastilhas de NaCl; as mudanças morfológicas na superfície das fibras foram realizadas com base nas imagens obtidas por microscopia eletrônica de varredura (MEV), utilizando-se elétrons secundários e voltagem de aceleração de feixe de elétrons entre 15-20 kV. Obtiveram-se as curvas termogravimétricas (TGA), derivadas da termogravimétrica (DTG) e termogravimétricas diferenciais (DTA) a partir dos dados termogravimétricos coletados em uma termobalança, com degradação das amostras em uma taxa de aquecimento de 10 oC min-1, entre as temperaturas ambiente e até 500 oC, em atmosfera de oxigênio com vazão de 50 mL min-1; as difratometrias de raios-X foram realizadas com radiação de Cu, entre ângulos de 5° d" 2θ d" 50°, com velocidade de varredura de 2°.min-1, voltagem de 40 kV e corrente de 30 mA. a cristalinidade da celulose foi calculada de acordo com a Eq. 2, proposta pelo método empírico de Segal, descrito por Subramanian et al. (2005).

em que:

I002 - intensidade máxima difratada pela celulose cristalina (2q ~ 22)

IAM - intensidade da difração da celulose amorfa (q = 18°)

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quando se comparam os valores de absorção obtidos para as fibras acetiladas com aqueles das fibras não tratadas (Tabela 1), observa-se que o tratamento de acetilação em todos os níveis estudados, teve efeito inibidor na hidrofilicidade das fibras. As acetilações em fibras de curauá apresentaram tendências diferenciadas com absorção máxima de 44% a 100 °C e mínima de 37% a 120 °C, em 24 h de imersão, ou seja, absorção 7% menor nas fibras acetiladas a120 °C, por 1 h (A3) porém, estatisticamente, as fibras de curauá acetiladas se comportaram da mesma forma quanto à absorção de água, em todos os níveis estudados; neste caso a eficiência da acetilação não foi condicionada a pontos extremos do tratamento e o efeito da temperatura, segundo a análise de variância, não apresentou influência significativa na eficiência. A comparação do menor valor de absorção observado no tratamento de acetilação com aquele obtido nas fibras não tratadas, mostrou que a hidrofilicidade das fibras foi reduzida em até 55%, após 24 h de imersão.

As polioses presentes nas fibras são as principais responsáveis pela absorção de água mas a acessibilidade da celulose amorfa e lignina, também contribui para este processo. A umidade provoca inchamento na parede celular da fibra e, para o curauá, o inchamento ocorre até que a parede celular esteja saturada com água. Além deste ponto a umidade se apresenta como água livre nos espaços vazios das fibras, não provocando mais inchamento (Spinacé et al., 2009).

As fibras de curauá tiveram resistência mecânica afetada em todos os níveis de acetilação aplicados, decrescendo seus valores conforme o incremento de tempo e temperatura no processo de acetilação (Tabela 2). As fibras acetiladas apresentaram reduções (nos valores máximos suportados até a ruptura) de 35 a 76% na força, de 15 a 38% no alongamento e de 6 a 65% na tensão. De acordo com Spinacé et al. (2009), os valores de tensão de ruptura para as fibras de curauá, 900 ± 200MPa, e módulo de Young, 36 ± 10GPa, são mais elevados do que para outras fibras vegetais, como bambu, palma, coco e sisal. Esses valores também foram bastante superiores àqueles encontrados neste estudo para fibras de curauá obtidas na mesma região. As discrepâncias podem estar relacionadas às condições de ensaios adotadas, com velocidade de 2,0mm min-1, e ao diâmetro médio das fibras utilizado nos ensaios (60 µm). O aumento da temperatura no processo de acetilação condicionou as fibras de curauá a uma degradação maior em suas propriedades mecânicas, independente do tempo utilizado.

Pela comparação com o espectro de infravermelho das fibras de curauá não tratadas, é possível constatar que a acetilação promoveu modificações significativas nos grupos químicos formadores das estruturas das fibras (Figura 1). O comportamento das fibras em comprimento de onda próximo a 3400 cm-1, relativos à presença das hidroxilas (O-H), foi semelhante demonstrando fraca influência do processo de acetilação nesses grupos. Observaram-se variações nas bandas características de acoplamentos C-H a cerca de 3000 cm-1 no tratamento de acetilação. Segundo Khalil et al. (2001), a presença dessas bandas está relacionada aos estiramentos ocorridos nos anéis aromáticos e alcanos. Em 1750 cm-1 as fibras de curauá apresentaram incremento de banda correspondente ao grupo carbonila, com alta intensidade de pico registrado nos espectros. Na análise espectroscópica obtida para fibras de coco acetiladas por Khalil et al. (2001), também foi observado o incremento de carbonilas (C=O), pela formação de grandes picos entre 1752 e 1976 cm-1, em razão de ligações do grupo acetil. Em 1250 cm-1 as fibras acetiladas apresentaram sensível aumento na intensidade dos picos que, de acordo com Hoareau et al. (2005), está relacionado ao estiramento dos acoplamentos C-O. Tomczak et al. (2007) relataram que modificações ocorridas entre 1800 e 400 cm-1 estão ligadas às interferências nas unidades estruturais da celulose e que este efeito ocorre com maior intensidade nas fibras com mais de 70% de celulose em sua composição.


O comportamento das fibras de curauá não tratadas e acetiladas 120 °C, por 1 h, obtido pela análise térmica, pode ser observado nas curvas de TGA, DTG e DTA mostradas na Figura 2. A perda de massa pela retirada da água presente nas amostras de fibras de curauá acetiladas foi menor que aquela registrada nas fibras não tratadas, com aproximadamente 3,8% até 235 °C. Entre 237 e 374 °C, a perda de massa nas fibras acetiladas foi de 79%, de forma contínua e acelerada, com intensidade máxima em 345 °C, diferente do ocorrido nas fibras não tratadas que apresentaram perda de massa gradativa devido à degradação de diferentes compostos. As diferenças neste comportamento estão relacionadas à esterificação ocorrida nas fibras após o tratamento de acetilação que, supostamente, proporcionou a retirada parcial de polioses e água. A termodegradação de polissacarídeos, como poliose e celulose, pode ocorrer pela quebra de ligações glicosídicas (C-H, C-O e C-C), desidratação, e por reações de descarboxilação e descarbonilação, com formação de ligações C-C, C = C e C-O, bem como de grupos carbonila e carboxila. A perda de massa de lignina ocorre em altas temperaturas e sua degradação está relacionada à desidratação, produzindo derivados insaturados com cadeias laterais e liberação de água, CO2, CO e metano (Spinacé et al., 2009). Outro efeito da acetilação foi a modificação da temperatura de degradação dos componentes químicos das fibras de curauá. Quando acetiladas, a degradação possivelmente referente às polioses e celuloses, sofreu um incremento de 18 °C, entre 237 e 374 °C, e as ligninas de 8 °C, entre 451 e 500 °C. O tratamento de acetilação retardou a decomposição e aumentou a estabilidade térmica das fibras. As degradações observadas nas curvas de TGA também foram acompanhadas pelo efeito exotérmico gerado nas curvas de DTA.


As fibras de curauá acetiladas a 120 °C, por 1 h, apresentaram superfície pouco atacada com o tratamento que, aparentemente, promoveu uma limpeza superficial (Figura 3B). É possível perceber, na fibra acetilada, a formação de partículas de acetato de celulose e a remoção de parte da estrutura celular parenquimática. As mudanças na morfologia são importantes para prever a interação das fibras com a matriz em compósitos. Ao estudarem as micrografias de fibras de curauá não tratadas, Spinacé et al. (2009) observaram uma superfície lisa e compacta, sem fibrilação.


Os difratogramas das fibras de curauá não tratadas e acetiladas a 120 °C, por 1h (Figura 4), revelaram que o tratamento de acetilação modificou o comportamento da celulose com reduções de 30% na concentração da porção cristalina e de 7,8% na porção amorfa, quando comparadas com as não tratadas. O índice de cristalinidade das fibras de curauá acetiladas foi de 66,4%, cerca de 8,1% menor que aquele registrado para as fibras não tratadas.


CONCLUSÕES

1. O tratamento de acetilação modificou a estrutura química das fibras de curauá pela substituição de grupos químicos hidrofóbicos, evidenciado pela deposição do acetato a celulose na fibra.

2. A acetilação promoveu a remoção parcial de polioses e celulose amorfa, componentes mais hidrofóbicos, das fibras de curauá.

3. O tratamento de acetilação promoveu uma limpeza superficial das fibras vegetais diminuindo a hidrofilicidade pela possível diminuição no número de poros, passando a apresentar uma superfície mais lisa.

4. O índice de cristalinidade das fibras de curauá diminuiu consideravelmente com a acetilação, demonstrando que o tratamento alterou o caráter cristalino das fibras.

LITERATURA CITADA

Protocolo 036.09 – 10/03/2010 - Aprovado em 20/12/2010

  • Agopyan, V.; Savastano Júnior, H.; John, V. M.; Cincotto, M. A. Developments on vegetable fibre-cement based materials in São Paulo, Brazil: An overview. Cement & Concrete Composites, v.27, p.527-536, 2005.
  • D'Almeida, A. L. F. S.; Calado, V.; Barreto, D. W.; D'Almeida, J. R. M. Acetilação da fibra de bucha (Luffa cylindrica). Polímeros: Ciência e Tecnologia, v.15, p.59-62, 2005.
  • Hoareau, W.; Trindade, W. G.; Siegmund, B.; Castellan, A.; Frollini, E. Sugar cane bagasse and curaua lignins oxidized by chlorine dioxide and reacted with furfuryl alcohol: Characterization and stability. Polymer Degradation and Stability, v.86, p.567-576, 2005.
  • Khalil H. P. S. A.; Ismail H.; Rozman H. D.; Ahmad M. N. The effect of acetylation on interfacial shear strength between plant fibres and various matrices. European Polymer Journal, v.37, p.1037-1045, 2001.
  • Lima, P. R. L; Toledo Filho, R. D.; Nagahama, K. J.; Fairbairn, E. M. Caracterização mecânica de laminados cimentíceos esbeltos reforçados com fibras de sisal. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.11, p.644-651, 2007.
  • Melo Filho, J. A. Desenvolvimento e caracterização de laminados cimentíceos reforçados com fibras longas de sisal. Rio de Janeiro, COPPE/UFRJ. 2005. 114p. Dissertação Mestrado
  • Motta, L. C. Melhoria do desempenho de fibras de coco e sisal para reforço de matrizes cimentíceas através de tratamento termomecânico e impregnação de resinas. São Paulo: USP/Escola Politécnica. 2005. 133p. Tese Doutorado
  • Sarmiento, C. R.; Freire, W. J. Argamassa de cimento e areia combinada com fibras de bagaço de cana-de-açúcar. Engenharia Agrícola, v.17, p.1-8, 1997.
  • Silva, A. C. Estudo da durabilidade de compósitos reforçados com fibras de celulose. São Paulo: Escola Politécnica/USP, 2002. 128p. Dissertação Mestrado
  • Spinacé, M. A. S.; Lambert, C. S.; Fermoselli, K. K. G.; Paoli, M. A. Characterization of lignocellulosic curaua fibres. Carbohydrate Polymer, v.77, p.47-53, 2009.
  • Subramanian, K.; Kumar, S. P.; Jeyapal, P.; Venkatesh, N. Characterization of lignocellulosic seed fibre from Wrightia tinctoria plant for textile applications an exploratory investigation. European Polymer Journal, v.41, p.853-861, 2005.
  • Tomczak, F.; Satyanarayana, K. G.; Sydenstricker, T. H. D. Studies on lignocellulosic fibers of Brazil: Part III - Morphology and properties of Brazilian curauá fibers. Composites: Part A, v.38, p.2227-2236, 2007.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Mar 2011

Histórico

  • Recebido
    20 Dez 2010
  • Aceito
    20 Dez 2010
Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola, UFCG, Av. Aprígio Veloso 882, Bodocongó, Bloco CM, 1º andar, CEP 58429-140, Tel. +55 83 2101 1056 - Campina Grande - PB - Brazil
E-mail: revistagriambi@gmail.com