Open-access Biossorção de azul de metileno utilizando resíduos agroindustriais

Biosorption of methylene blue using agro-industrial residues

Resumos

O presente trabalho avaliou a capacidade de adsorção do corante azul de metileno nos resíduos da palha de milho e da bainha do palmito pupunha in natura. A caracterização dos resíduos foi determinada utilizando-se a microscopia eletrônica de varredura e espectroscopia na região do infravermelho a qual indicou a presença de grupos carboxílicos, hidroxila e carbonila. O tempo necessário para que o sistema atingisse o equilíbrio para ambos os resíduos foi de 240 min, seguindo uma cinética descrita pelo modelo de pseudo-segunda ordem. A capacidade máxima de adsorção foi de 102,8 mg g-1 para o resíduo da palha de milho, seguindo o modelo de isoterma de Langmuir e 50,9 mg g-1 para o resíduo de palmito pupunha, sendo que o modelo que melhor se ajusta foi Freundlich. Desta forma, esses resíduos são promissores para a adsorção do corante azul de metileno em efluentes.

efluente; corante; palha de milho; palmito pupunha


This study evaluated the ability of adsorption of methylene blue dye in waste of corn straw and sheath of palmetto pupunha in natura. The characterization of the waste was performed using MEV and spectroscopy in the infrared region, which indicated the presence of carboxyl groups, hydroxyl and carbonyl. The time required for the system to reach equilibrium for both residues was approximately 240 min, following the kinetics of pseudo-second order. The maximum adsorption capacity was 102.8 mg g-1 for corn straw, following the isotherm model of Langmuir and 50.9 mg g-1 for the residue of the sheath of palmetto pupunha, following the isotherm model of Freundlich. Thus, the wastes are promising for adsorption of methylene blue dye in effluents.

effluents; dye; corn stover; palmetto pupunha


Introdução

O setor têxtil vem exercendo importante posição no cenário da economia brasileira visto a grande escala em sua produção; contudo, também é significativo o grande volume de efluentes (líquidos, sólidos e gasosos) gerado por este setor (Souza & Rosado, 2009).

Um dos principais problemas encontrados pelo setor têxtil está na remoção dos corantes sintéticos de seus efluentes; estima-se que em aproximadamente 20 t ano-1 de corantes consumidos pela indústria têxtil cerca de 20% são descartados como efluentes; o principal motivo desta perda está relacionado à incompleta fixação do corante à fibra do tecido, durante o processo de tingimento (Kunz et al., 2002; Dallago & Smaniotto, 2005).

Entre os corantes de maior aplicabilidade destaca-se a classe dos reativos, que se caracterizam por apresentar, em sua estrutura, um ou mais grupamentos –N = N– ligados a sistemas aromáticos conferindo-lhe maior estabilidade química (Kunz et al., 2002).

Nesta classe se encontra o azul de metileno, um corante catiônico muito empregado na indústria têxtil no tingimento de tecidos de algodões e lãs porém quando não tratado de forma adequada o lançamento não controlado em rios e lagos afeta não só a transparência das águas mas também limita a passagem de radiação solar diminuindo a atividade fotossintética natural provocando alterações na biota aquática e originando toxicidade aguda e crônica desses ecossistemas (Kunz et al., 2002; Silva & Oliveira, 2012).

Em virtude de sua aplicação extensiva e seu efeito tóxico causado sobre a biota aquática, torna-se necessário um tratamento prévio de seus despejos antes do lançamento em corpos receptores; desta forma, novas tecnologias vem sendo estudadas a fim de se minimizar tais riscos (Kunz et al., 2002; Dallago & Smaniotto, 2005).

O método da adsorção vem sendo muito empregado no tratamento desses efluentes corados devido ao seu baixo custo e facilidade de operação; esta técnica se baseia na remoção desses contaminantes pela interação entre o corante com algum material adsorvente (Gonçalves et al., 2007).

Entre os materiais adsorventes com grande capacidade absortiva está o carvão ativado, em virtude das suas propriedades únicas, incluindo estrutura porosa e elevada área de superfície. Entretanto apresenta, como desvantagem, alto custo em sua produção (Ajmal et al., 2000; Asadullah et al., 2010).

Desta forma, abre-se espaço para pesquisas de novos materiais adsorventes como materiais biológicos e subprodutos agrícolas visando à substituição do carvão ativado (Ozsoy & Kumbur, 2006). Em busca de novos materiais adsorventes este trabalho visa à utilização de resíduos do palmito pupunha o qual possui uma demanda nacional de 100000 t ano-1, representando 18% do mercado deste produto no Brasil. Com características únicas, como produtividade precoce, a produção do palmito pupunha gera grande quantidade de biomassa (bainha, folhas, nervuras) propícia à utilização nos processos de adsorção (Chaimsohn, 2000; Salvado et al., 2012).

Outro produto agroindustrial que merece destaque é o milho, destinado desde a alimentação humana e animal até indústrias de alta tecnologia. O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de milho e, diferentemente de outros grãos, sua produção é voltada para o abastecimento do mercado interno. A alimentação animal representa a maior parte do consumo desse cereal, isto é, cerca de 70% no mundo (EMBRAPA, 2012). Desta forma, optou-se para a utilização da palha de milho em busca de um novo material adsorvente em razão de sua grande disponibilidade e baixo custo.

Diante do exposto este trabalho tem, como objetivo, avaliar a adsorção do corante azul de metileno utilizando, como material adsorvente, os resíduos agroindustriais como a palha de milho e a bainha do palmito pupunha, ambos in natura.

Material e Métodos

Os resíduos agroindustriais utilizados neste trabalho foram obtidos na região de Toledo-PR. Para a realização dos experimentos os adsorventes foram mantidos em estufa com temperatura controlada a 60 °C durante aproximadamente 24 h. Os materiais foram triturados e peneirados (peneira Bertel, 42 mesh) a fim de se obter uma granulometria mais homogênea.

A caracterização dos materiais foi realizada utilizando-se o infravermelho com transformada de Fourier (FTIR, Shimadzu); para a identificação dos grupamentos químicos também se utilizou a microscopia eletrônica de varredura (MEV) com a finalidade de se avaliar a morfologia da superfície das amostras.

Para avaliar a carga da superfície dos adsorventes realizou-se o potencial de carga zero (PHpcz) segundo metodologia proposta por Boas et al. (2012).

As análises de adsorção em função do pH e tempo foram realizadas utilizando-se 50 mL do corante em concentração de 100 mg L-1 para cada resíduo, as quais foram agitadas com 0,5 g de resíduo em um agitador orbital. Para avaliar a adsorção do corante em função do pH, foram realizadas medidas em uma faixa de pH variando de 3 a 11 por 24 h. As medidas de cinética de adsorção foram realizadas em um intervalo de tempo que variou de 1 a 1440 min. Após definido o tempo, foram realizados experimentos de isoterma de adsorção para avaliar a capacidade de adsorção em função da concentração do corante. As medidas foram feitas em um intervalo de concentração de azul de metileno variando de 10 a 2000 mg L-1, com tempo de agitação de 6 h. Ambas as análises foram feitas em pH 7,0.

Todas as medidas foram realizadas em batelada e duplicata sendo que, ao final de cada experimento, o líquido sobrenadante foi filtrado, diluído e analisado utilizando-se um espectrofotômetro Shimadzu UV-1601PC. Para as análises estatísticas (média e desvio padrão) foi utilizando o software BIOESTAT.

Os dados obtidos foram usados para calcular a quantidade de corante adsorvido por grama do resíduo (qeq), Eq. 1.

em que:

C0 - concentração inicial do azul de metileno em solução, mg L-1;

Ceq - concentração em equilíbrio do azul de metileno em solução, mg L-1; e

V - volume da solução, L; M - massa seca do adsorvente em solução, mg L-1.

Resultados e Discussão

O fenômeno da adsorção ocorre devido à presença de grupos funcionais que constituem o material adsorvente; utilizou-se, então, o infravermelho para identificar esses grupos. A Figura 1 apresenta o espectro de infravermelho obtido para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha.

Figura 1.
Espectro de infravermelho dos resíduos da palha de milho e palmito pupunha

Observa-se a presença de uma banda larga e forte em 3402 cm-1, que pode estar atribuída ao alongamento vibracional da ligação da hidroxila (O-H); a região 2920 cm-1 indica um alongamento vibracional da ligação (C-H). Picos em 1740, 1421 e 1151 cm-1 são referentes ao alongamento vibracional da ligação dos grupos carbonilas (C-O). Segundo a literatura, a banda em 1730 cm-1 ocorre para o grupo carbonila presentes em éster e no grupamento carboxila (Vullo, 2003). As fortes bandas em 1054 cm-1 confirmam a presença de polissacarídeos (Özcan et al., 2005). Assim, pode-se confirmar a presença de grupamentos hidroxila, carbonila e grupos carboxílicos, em ambos os resíduos, os quais são os principais responsáveis pela interação do azul de metileno com os materiais adsorventes. Foi verificada, também, a superfície dos adsorventes utilizando-se a microscopia eletrônica de varredura (MEV) podendo-se observar que a superfície dos adsorventes se apresenta irregular. Na Figura 2 é possível visualizar que os adsorventes possuem grande superfície de contato podendo favorecer a adsorção do corante presente em solução.

Figura 2.
Micrografia dos resíduos de palmito pupunha ampliada 800 vezes (A) e palha de milho ampliada 1200 vezes (B)

Outro fator que influencia na adsorção é a carga da superfície do adsorvente no qual o valor do pH da solução indica a propensão da superfície em ser carregada positivamente ou negativamente. Desta forma, quando o pH < pHpcz o resíduo apresentará predominância de carga superficial positiva sendo favorecida a adsorção de ânions e em pH > pHpcz a carga superficial será negativa favorecendo a adsorção de cátions (Özacar & Sengil, 2003).

Pode-se observar, na Figura 3, que o ponto de carga zero para a palha de milho e palmito pupunha foi 4,4 e 3,5, respectivamente, indicando a propensão desses resíduos em possuir carga negativa no pH de trabalho 7,0, favorecendo a adsorção do corante catiônico.

Figura 3.
Determinação do potencial de carga zero (pHpcz) para o resíduo de palha de milho (■) e palmito pupunha (•)

Na Figura 4 foi possível constatar que com o aumento do pH da solução a adsorção aumenta para ambos os resíduos até pH 7. Em pH mais baixo houve menor adsorção do corante devido, possivelmente, à maior concentração de íons H+ livres em solução, que são preferencialmente adsorvidos inibindo, assim, a adsorção do corante (Ajmal et al., 2000).

Figura 4.
Influência do pH na adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha (•)

Este resultado ainda corrobora com o pHpcz o qual justifica a interação entre o adsorvato e o adsorvente em razão do caráter catiônico do corante azul de metileno com a superfície negativa dos adsorventes; desta maneira, optou-se por trabalhar em pH 7 para ambos os resíduos.

Observa-se, na Figura 5, que o equilíbrio de adsorção começa a ser atingido para ambos os resíduos a partir de 240 min, não sendo observadas variações expressivas tornando a adsorção praticamente constante. Optou-se, porém, por trabalhar com um tempo de 360 min (6 h) para garantir que o processo esteja em equilíbrio.

Figura 5.
Cinética da adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha (•)

Nota-se ainda, para ambos os resíduos, que a velocidade de remoção foi mais rápida inicialmente em virtude da maior área de superfície disponível recobrindo toda a superfície externa, seguindo lentamente para a superfície interna do adsorvente (Carvalho et al., 2010). A rápida adsorção e o alcance de equilíbrio em curto período de tempo demonstram a eficiência dos resíduos; entretanto, pode-se observar uma adsorção maior para o resíduo de palha de milho.

Para melhor entendimento deste mecanismo e analisar os dados obtidos experimentalmente, aplicaram-se os modelos de pseudo-primeira ordem, pseudo-segunda ordem, equação de Elovich e difusão intra-partícula (Doğan et al., 2004; Kalavathy et al., 2005; Özcan et al., 2005; Pérez-Marín et al., 2007; Gerola et al., 2013). Os valores encontrados para cada modelo se encontram na Tabela 1.

Tabela 1
Parâmetros cinéticos dos modelos de pseudo 1ª ordem, pseudo 2ª, Elovich e Difusao Intra-Particula para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha

Comparando os valores para os quatro modelos propostos na Tabela 1, observa-se que o modelo de pseudo-segunda ordem é o que melhor descreve a cinética de adsorção visto que apresentou valores de coeficiente de correlação linear (R2) 0,999 para ambos os resíduos, estando próximo de 1. Além disto, pode-se constatar que os valores de Qeq calculados para este modelo estão bem próximos aos obtidos experimentalmente (10,2 para a palha de milho e 8,13 para o palmito pupunha). Este modelo indica que a velocidade da reação é dependente da quantidade de soluto adsorvido na superfície do adsorvente e da quantidade adsorvida no equilíbrio (Ho et al., 1996).

A isoterma de adsorção mostra a relação de equilíbrio entre a quantidade de material adsorvido e a concentração na fase líquida. A forma do gráfico da isoterma auxilia na determinação do mecanismo de adsorção e pode sugerir o tipo de adsorção que ocorre entre o adsorvente e adsorbato.

Na Figura 6 pode-se observar, para o resíduo do palmito pupunha, uma isoterma do tipo L (segundo a classificação das isotermas de Giles) (Giles & Smith, 1974), a qual indica uma diminuição da disponibilidade dos sítios de adsorção quando a concentração da solução aumenta.

Figura 6.
Isoterma da adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha (•)

Também é possível observar que a superfície do resíduo da palha de milho apresentou maior afinidade pelo soluto adsorvido indicando uma isoterma do tipo H (Carvalho et al., 2010). Desta forma, notou-se maior eficiência para o resíduo da palha de milho (102,8 mg g-1), apresentando capacidade de adsorção duas vezes maior que o resíduo do palmito pupunha (50,9 mg g-1).

No intuito de investigar a isoterma de adsorção os dados experimentais apresentados na Figura 6 foram ajustados aos modelos matemáticos: Langmuir, Freundlich, DubinineRadushkevich (DER) e Temkin (Temkin & Pyzhev, 1940; Kalavathy et al., 2005; Massocatto et al., 2013). Os valores obtidos para os parâmetros dos modelos em ambos resíduos se encontram na Tabela 2.

Tabela 2
Parâmetros dos modelos de Langmuir, Freundlich, Temkin e Dubinine (DER) para adsorção do azul de metileno para o resíduo da palha de milho e palmito pupunha

Analisando os valores da Tabela 2 pode-se dizer que o sistema de adsorção obedece aos modelos de Langmuir e Freundlich para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha, apresentando valores para o coeficiente de correlação linear (R2) próximos de 1.

Os valores de qm (capacidade máxima de adsorção) e b (intensidade adsorvida) obtidos por Langmuir comprovam a melhor eficiência para o resíduo da palha de milho devido, possivelmente, à maior disponibilidade de grupos carboxilas presentes neste resíduo.

Esses resultados indicam que apesar dos resíduos apresentarem basicamente a mesma composição: celulose, hemicelulose e lignina, as quantidades podem variar dependendo do resíduo, sendo que esses compostos podem favorecer o processo de adsorção. Esses componentes incluem compostos orgânicos (alcoois, ésteres, esteroides e outros) e inorgânicos ou compostos minerais (Santos et al., 2012).

Dentre os resíduos apresentados neste estudo o de palha de milho apresenta maior quantidade em porcentagem de celulose, hemicelulose e lignina em sua estrutura (Aguiar, 2010; Duprat, 2012), favorecendo a adsorção, fato este que corrobora com o resultado obtido pela isoterma de adsorção que demonstra a eficiência da palha de milho em adsorver praticamente duas vezes a mais que o palmito.

Além comparando a capacidade máxima de adsorção do azul de metileno dos resíduos apresentados neste estudo com outros materiais adsorventes, como: bagaço de cana (qm = 31,79 mg g-1); casca de arroz (qm = 40,58 mg g-1); casca de banana (qm = 20,80 mg g-1) e casca de laranja (qm = 18,60 mg g-1) (Silva & Oliveira, 2012; Vadivelan & Kumar, 2005; Annadurai et al., 2002), constatou-se que os materiais que apresentaram maior capacidade foram a palha de milho (qm = 102,8 mg g-1) e o palmito pupunha (qm = 50,96 mg g-1).

Conclusões

1. O pH 7,0 apresentou melhor resposta na adsorção para ambos os resíduos.

2. No ensaio cinético o equilíbrio foi atingindo a partir de 240 min para os dois resíduos estudados e o modelo que melhor descreveu este sistema foi o pseudo segunda-ordem.

3. Os modelos de Langmuir e Freundlich foram os que se adequaram melhor apresentando valores de correlação linear próximos a 1, para ambos os resíduos estudados.

4. Os resíduos possuem boas propriedades adsortivas podendo ser utilizados como material alternativo na remoção do corante azul de metileno.

Agradecimentos

À Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE, pelo apoio financeiro; à Fundação Araucária, pela bolsa de mestrado concedida e ao CNPq, pela bolsa de Iniciação Científica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul 2015

Histórico

  • Aceito
    30 Jan 2015
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