ARTIGOS
Lógica comparada das neuroses* * Texto de uma intervenção pronunciada nas Jornadas do Espaço Analítico, "A noção de estrutura continua pertinente em psicanálise?", 21 de novembro de 2004, Rio de Janeiro.
Comparative logic of the neurosis
Gisèle Chaboudez
Psicanalista, membro do Espace Analytique, Paris, França. Espace Analytique, 56, Rue de Bourgogne 75007, Paris, France
RESUMO
Explora-se a análise das estruturas clínicas entrevistas nas neuroses a partir de um ponto de vista lógico, inspirado por Lacan em sua releitura de Freud. Com esta estratégia e com o auxílio de passagens clínicas ilustrativas, pretende-se esclarecer os caminhos que se traçam na escolha da histeria e da obsessão. Procura se deter, em especial, nas vicissitudes da dialética entre o sentido e o ser desde o momento bem precoce da relação com o Outro materno, passando pela entrada do Nome do Pai e do Édipo e os efeitos duradouros que se produzem na relação com o discurso.
Palavras-chave: Psicanálise, neurose, estrutura, Lacan.
ABSTRACT
Throughout this article, it's developed the task of exploring, from a logical point of view inspired by Lacan in his re-reading of Freud, the analysis of the clinical structures recognized in the neurosis. With this strategy and with the aid of illustrative clinical passages, it's intended to clear the ways that are traced in the choice of hysteria and of obsession. This article's lingered specially in the vicissitudes of the dialectic between the meaning and the being from the too precocious moment of the relationship with the maternal Other, passing through the entrance of the Name of the Father and through Oedipus and the lasting effects that are produced in the relation with the speech.
Keywords: Psychoanalysis, neurosis, structure, Lacan.
A apreensão do que era uma estrutura, ocorrida no século passado, veio do fato de Freud ter compreendido o inconsciente como estrutura de linguagem; em seguida, definiram-se as estruturas clínicas. Quando ele elaborou nesses termos nossas neuroses, psicoses e perversões, isso teve por efeito, pode-se dizer, normalizar a patologia, reaproximá-la da norma. Cada sujeito, mesmo que seus sintomas e seu desvio fossem graves, funcionava segundo um processo comparável àquele da norma. Bastaria tentar isolar o ponto no qual a estrutura teria falhado, sem que a própria estrutura fosse fundamentalmente diferente daquelas que convêm à saúde e à vida em sociedade, salvo exceção. A patologia não era mais uma degenerescência. Em nossos dias, ao contrário, por vezes censuramos estas estruturas clínicas por patologizarem, de algum modo, a norma, ou de insinuarem a patologia ali onde há apenas os apuros infinitamente diversos do desejo, as variadas e ricas modalidades da sexualidade.
Seria um retorno justo das coisas ou uma torção pervertida do gesto liberador de Freud? Decerto há um efeito problemático de nomeação e de objetivação como se observou antes, na introdução, e às vezes até mesmo uma nomeação lateral, como no caso das homossexualidades, por exemplo, por muito tempo consideradas sistematicamente como perversões, ainda que elas se desenvolvam com mais freqüência no quadro das neuroses. Mas, em essência, esse movimento de censura ou de desinteresse perante a definição psicanalítica das estruturas integra-se num quadro de evolução do conjunto dos discursos que se prendem às manifestações bem tangíveis de sintomas sem querer pensar o quer que seja de sua causa. 'E, de resto, para que serve pensar?' provocam eles quando se sabe que o pensamento nem sempre tem efeitos sensíveis. É aí, então, que nossa proposta avança em face de uma evolução moderna dos discursos em que a psicanálise, embora ela seja sempre até mesmo cada vez mais solicitada por sujeitos que não pensam menos, doravante se encontra exposta a uma ideologia na qual não é bom pensar, que, de forma decidida, anuncia não pensar. Há, exatamente na psicanálise considerando-se que ela não se dá conta disso aquilo que é seu pecado de juventude, em suma, ter querido elaborar um discurso que torne os outros habitáveis para cada um (dos outros discursos). Espera-se dela, de agora em diante, apenas que acolha a palavra sofrida enquanto outros discursos ocupar-se-iam com certeza com mais seriedade do pouco que haveria para se saber, ao mesmo tempo reivindicando para eles a eficácia que se nega à psicanálise. Está aí a verdade, a temível torção do gesto freudiano. Com efeito, acolher esta palavra continua sendo a ação da psicanálise, mas é ainda necessário que esta pense aquela. Como sua ação se perpetuaria? Como ela conservaria algo de decisivo, algo eficaz se ela não é pensada contínua e decisivamente por cada um?
De fato, longe de as estruturas clínicas inventariadas por Freud aparecerem como uma elaboração obsoleta, parece que elas se revelam sempre mais válidas na medida que nossos conceitos se renovam. Se há alguma coisa que nenhuma evolução do discurso, nenhuma rearticulação lacaniana tenha encetado com fundamento é justamente a repartição, antes verificada, de possibilidades da estrutura segundo estes termos. Desde então, como perseguir a elaboração destas estruturas daí em diante? Qual limite ela reeencontra? Para nós, em que se transformaram a histeria, a obsessão ou ainda a fobia? Sua estrutura em sua sincronia é, poderia-se dizer, bem conhecida, com sua elaboração freudiana seguida da lacaniana e os numerosos trabalhos que as prolongam. Mas sua lógica é menos conhecida; ela implica uma diacronia, porém não se resume a isso. Pensar sua lógica, em uma e em outra, uma em relação à outra, permitiria melhor compreender com que elas se relacionam, a quais impasses na estrutura que instaura a linguagem elas respondem, e qual o custo da solução que elas constroem para um sujeito. Cada analisando se apercebe bem rápido de que há uma lógica em suas ações paradoxais, mesmo se ele não sabe como ela se dá, mesmo se esta lógica lhe parece irracional. Fracassar numa prova, malograr num encontro amoroso, por exemplo; muitos entre eles suspeitam rapidamente que este revés visa preservar alguma coisa do ser na sua relação com o Outro. Então, como pensar a lógica das neuroses daqui por diante?
Freud tinha se interessado ainda cedo pelo momento da escolha da neurose, sem apresentá-lo completamente em termos lógicos. Havia apontado uma coisa admirável: que a chegada na infância de cada uma das que ele chamava psiconeuroses, dentre as quais incluía as psicoses, era uma precocidade de algum tipo contrário ao momento da libido no qual cada um ficaria vinculado, fixado. Assim, a chegada da histeria, a mais precoce, no primeiro período da infância, tinha como par no plano da libido o que ele chamava 'o primado do genital'; a chegada da obsessão, no segundo período da infância, entre 6 e 8 anos, tinha como par uma escolha de objeto efetuada antes que o primado do genital fosse realizado. E a chegada da paranóia e da parafrenia (o que chamamos hoje de esquizofrenia), uma chegada tardia, na adolescência, fazia par respectivamente com o narcisismo e o auto-erotismo, quer dizer, com os primeiros modos, os primeiros estados da libido. Parece que nada de essencial tenha vindo, hoje em dia, contradizer tais observações. Elas supõem então dois tempos de escolha da neurose e pedem, portanto, uma abordagem lógica suscetível de explicá-las, mas esta lógica não saberia satisfazer-se numa cronologia, dado que, de saída, Freud implica uma torção.
A elaboração de uma lógica existe em Lacan sem que ele, todavia, tenha mostrado o uso que fazia dela na clínica das neuroses enquanto que, evidentemente, servia-se dela e a construía a partir dali. Ele a chamou de alienação-separação, indicando assim que o sujeito do inconsciente se constitui de início no Outro primordial, aquele que lhe fala a partir de um número restrito de significantes dois, para ser preciso e se encontra exposto a uma escolha forçada devido ao que cada um desses significantes implica para ele.
Ora, poder-se-ia dizer que os termos desta escolha e seu momento encontram-se com o que Freud desenvolvia, esboçava sobre uma escolha da neurose em 1913. Um dos significantes, aquele do desejo de uma mãe referindo-se a esta criança aí, a representa na origem não ainda como um sujeito, mas como um ser este ser que confere o fato de ser o objeto de um gozo; primeiro tempo do Édipo relido por estes termos. Mas este ser não tem então nenhum sentido. Sabe-se bem que há um sentido em ser o objeto de um gozo, mas é um sentido sem sentido. Não há ninguém que não seja o objeto do gozo do Outro, mas este ser aí não tem sentido, e pode ser que possamos dizer que há rejeição do sentido vindo do Outro como o fez Hector Yankélevich. O outro significante, aquele do Pai, lhe confere um sentido na mesma proporção em que este gozo aí é interdito; neste caso, ele se torna um sujeito, mas então perde o ser. A escolha difícil, forçada, diz Lacan, se efetua, entretanto, com mais freqüência em favor do sentido para produzir um sujeito, é o caso da neurose por oposição à psicose enquanto que a perversão tenta reunir as duas. Assim, opera-se na neurose uma separação que constitui uma saída desta alienação que o fazia vacilar entre o ser do gozo e o sentido de sua perda, entre não ser nenhum ser ou não ter nenhum sentido. Tendo perdido o ser, este sujeito está preso ao vazio do ser, barrado, dividido. Mas tendo um sentido, ele pode dar um sentido às coisas, ele pode pensar. Uma nova escolha para reencontrar uma forma de ser o restabelecerá a uma forma de escolher o sentido, isto já está feito, e fazendo-o ele pensa alguma coisa; tratar-se-á de tampar esta perda do ser com uma aparência de ser e este será o fato da fantasia, com a ajuda de um objeto, o objeto da pulsão, oral, anal, seguido por outros mais. Da mesma maneira que o ser que ele perdeu no primeiro tempo o objeto da pulsão do qual ele é desmamado, educado é separado dele, aquele causa o seu desejo, o seu desejo de reencontrar algo, é este o ponto em comum entre eles. E nesta fantasia, ele vacila, portanto, outra vez entre o pensamento de um sujeito vazio e a aparência de ser o objeto, mas não da mesma maneira. E aí as coisas se estabilizam por um tempo.
Desse modo, tal sujeito não poderá dizer "eu tenho um sentido, logo eu sou" porque ele apenas teve um sentido não sendo mais. Não se pode dizer mais, como no Cogito, "penso, logo sou", visto que apenas se pôde pensar ali precisamente em não ser mais, enquanto ele apenas podia ser não tendo sentido e, por conseguinte, não pensando. Vejam como um sujeito se produz sendo de início esvaziado do ser, depois sendo dividido entre não ser e não pensar. Deste modo de causação do sujeito resultam dois pólos subjetivos: no pólo do inconsciente, que funda o sentido pelo efeito da função do Pai, ele pensa alguma coisa, formula um pensamento do sexo, da sexuação, sobre o modo de ter ou não o falo, mas ele não é mais, o que ele é se enuncia "eu não sou", ele é separado do ser que lhe conferia o gozo do Outro enquanto este Outro é, doravante, tão vazio, tão dividido quanto ele. No pólo do isso, que tenta tampar, compensar, mascarar os efeitos do Nome do Pai sobre o ser, aquele do Outro como o seu, ele reencontra uma forma de ser, um falso ser, aquele da fantasia, amplamente submetido à pulsão que encobre seu acesso à castração e ao outro sexo sobre um modo oral, anal, sadomasoquista ou escopofílico. Mas aí ele não pensa e, notadamente, não há diferença sexual.
Há, portanto, dois tempos de alienação com um tempo de separação entre eles no qual se forma uma neurose e, portanto, dois tempos de escolha, o segundo se erigindo sobre os termos resultantes do primeiro, como uma repetição que é uma simples sucessão de proposições lógicas. Além do mais, há dois princípios de separação, pois um é a função do Pai sobre a vertente significante, o outro é a função que o objeto tem sobre a vertente do gozo, na medida que o objeto é o que servirá para tampar a perda do ser. Vê-se, então, uma vertente na qual o sujeito é o efeito, a presa, do significante, onde ele é mais falado do que fala, e uma vertente na qual ele produz um ato de corte nesta cadeia e que o funda ou produz como sujeito. O desdobramento no tempo de uma neurose procederia, em certo número de vezes, de uma repetição da escolha entre o ser e o sentido e depois entre o ser e o pensamento sobre o sexo. E não é apenas no Édipo e em sua saída, mas ao longo de uma vida, em especial nas grandes etapas da sexualidade que vem em seguida, a adolescência, o parto, a menopausa ou andropausa e nos encontros fundamentais que comportam esta vida. Esta lógica pode esclarecer a constituição das neuroses, mas também seu futuro.
Além da dimensão sincrônica da estrutura que Lacan desenvolveu infinitamente, ela pode permitir restabelecer uma dimensão diacrônica, que estava presente em Freud, no estudo das neuroses, integrando uma lógica da repetição em suas duas vertentes do automatismo simbólico e do encontro com o real. Vou tentar me apoiar nesta lógica para comentar certos traços de uma ou outra neurose por este ponto de vista: os traços que podemos observar em certos casos e não em outros, que não são generalizáveis pois a clínica comporta muitas variações possíveis mas que são suficientemente freqüentes e exemplares para nos permitir refletir sobre a articulação lógica.
A histeria e a obsessão se esclarecem uma pela outra, realizando, de alguma forma, dois modos opostos de escolha. Haveria, com efeito, alguma coisa de precoce na disposição para a histeria e isto seria um primeiro modo de separação, uma primeira saída da alienação antes de qualquer recalcamento, antes que a função do Pai fosse o princípio. Recordamos que, por um tempo, Freud designou que na origem da histeria haveria muito pouco prazer. Sabemos bem que, antes de mais nada, ele evocava uma experiência sexual precoce sofrida passivamente, o que ele recusou depois. Mas este muito pouco prazer é uma equação aplicável em outro lugar, pois vale também, com muita freqüência, em relação ao desejo do Outro primevo, a mãe. Isso pode responder, por exemplo, a um muito pouco desejo no Outro, a mãe, um desejo marcado por fragilidade, abandono, por largar ao relento, por retornos intempestivos, toda aquela relação caótica de falta de desejo materno ou de um desejo hesitante ou contraditório que tem, por conseqüência, que o ser de gozo que constitui inicialmente a criança é muito pouco garantido. Isto não impede, eventualmente, que, por exemplo, a criança possa se apresentar para a mãe como a metáfora de seu amor pelo pai, mas o ser não garante o amor, ele garante a consistência do desejo do Outro. E quando ele é muito pouco consistente, a vacilação excessiva do ser torna esta alienação insustentável. Qualquer que seja o real ao qual a criança é confrontada, quando uma separação se produz ali, aquela criança ainda não diz respeito a um sujeito. A escolha efetuada aqui não consiste em renunciar ao ser primeiro do gozo, pois para renunciar a ele seria ainda preciso ter sido, mas que, ao recusá-lo, deixa-se de decidir que ele faltou. Separar-se do que falta e por conta desta falta é diferente de renunciar ao que há e que é preciso perder. Por tampar a falta do ser, então, não há outra coisa senão o objeto e, neste momento, a criança é equivalente ao objeto. O objeto 'seio' é mais do bebê que da mãe, sublinha Lacan, e, portanto, lhe é equivalente porque ele, bem como aquele, é este objeto imprensado sobre o peito da mãe. Esta separação primeira é uma recusa do ser no Outro, pelo Outro; ela visa o que o Outro perde e se apóia por fazer isso sobre o objeto. A criança se separa, apoderando-se, de modo alucinatório, do objeto do qual ele necessitou no Outro, o seio, segundo uma forma de mutilação oral do Outro prazer alucinatório que Freud identificava no processo primário. Então, ele se nutre do nada do objeto alucinado, sendo bastante equivalente à inclinação suicida própria da histeria. Vê-se, por exemplo, as crianças que, num mês qualquer, simplesmente se recusam a comer, ou ainda outras que, como esta analisanda, desenvolveriam numa idade semelhante um eczema em todo o corpo a ponto de ninguém, a começar pela mãe, poder tocá-la. Antes de qualquer recalcamento, uma separação realizando um começo de subjetividade pode, então, cravar-se com a ajuda do objeto e de um objeto que é a criança e introduzir um primeiro sentido neste sem-sentido. Certas crianças fujonas desde a idade de 2 anos depois passeiam por aqui e acolá sem a sombra de uma angústia. É que elas trazem consigo seu ser alucinado, um ser que não quer mais ser função do gozo daquele Outro, mas que, desde então, tem por fundamento apenas a alucinação. É observado quanto à relação com o corpo neste caso, marcada por uma agilidade precoce, aberta tanto às acrobacias quanto à dança. É que o corpo está livre quer dizer, reutilizável de não ser mais o gozo do Outro ou, pelo menos, de se separar dele. Pela função do objeto alucinado, sonhado, este modo de separação é, em seguida, reconduzido muitas vezes ao longo da neurose. Ele se reencontrará concernindo o sujeito, uma vez advindo e os objetos seguintes.
De forma que, em seguida, entre o ser e o sentido, entre ser penosamente o objeto do desejo, gozar penosamente do desejo e ter um sentido, a escolha do sentido, do Nome do Pai logo será feita. Ter um sentido é o que resta quando não é certo que se seja. E o sentido opta, ao mesmo tempo, pela significação do falo. Será sobre o mesmo modo alucinatório e segundo a mesma dialética oral que o sujeito se apossa do falo, na saída do Édipo, tanto no menino quanto na menina, mas com certeza não com as mesmas conseqüências. Isto pode ser bastante alucinatório em um menino que, por exemplo, acorda numa manhã tendo sonhado que era o Homem-aranha e que não está bem certo se despertou do sonho. E, a partir daí, tudo na realidade que vier a contradizer o fato, como, por exemplo, ter de aprender o que ele não sabe, poderá se achar impedido: ele já sabe, por um modo bastante alucinado, sonhado; como ele já tem o falo pelo mesmo modo, então ele não aprende. Apossar-se do falo é recusar não tê-lo, pois não tê-lo é equivalente a sê-lo segundo a disjunção entre o ser e o ter que introduz a função do Pai; logo, o ser foi recusado. Mas o é também porque o ter constitui uma alternativa sustentável ao ser do qual o sujeito é separado. Aquela jovem menina cujos primeiros anos foram marcados pelo eczema, mais tarde se constituiu, segundo suas palavras, como um menino faltoso. A escolha do sentido e do "eu não sou" marcou toda sua infância como uma recusa a não ter o falo. Esta recusa sonhada da castração certamente barra o acesso aos substitutos do falo como o desejo de ter um filho, pois para substituí-lo é preciso que se falte ao menos um instante. Assim, nesse sentido, o sujeito histérico é, com efeito, fixado (segundo os termos freudianos) no primado do genital sob a égide do falo segundo a significação introduzida pelo Pai.
E apenas muito mais tarde na adolescência, por exemplo que um modo de escolha do ser pode, então, retornar na troca sexual, na relação com o outro sexo, quer dizer, pelo menos às vezes. E, de novo, a escolha pode comportar o mesmo caráter alucinatório, sonhado, o que pode evocar aquilo que Freud chamava belamente de 'processo primário póstumo'. E, de novo, este consiste em se apossar do objeto que o sujeito é, para se fazer o objeto do desejo de um Outro, abrigo do desejo do homem enfim encontrado por uma mulher, enquanto que esta escolha é problemática para um homem. A fantasia é bem aquela janela para o real que Lacan descrevia, pois o real é, aqui, aquilo que o sujeito era antes de ele ser sujeito e que não é mais. Contudo, fazer-se ser consiste em parecer o objeto do desejo e não sê-lo, o que não é a mesma coisa. Este falso ser da fantasia neurótica consiste em se oferecer ao desejo do Outro sem que jamais seja possível realizá-lo. Na adolescência, esta mesma analisanda sofreu de uma fobia de um enrubescimento que surgia quando um homem parecia desejá-la e que, de fato, lhe barrava a via de um encontro amoroso bem sucedido, constrangendo-a a refugiar-se na angústia, como se se tratasse de uma barreira de interdição natural que a impedia do acesso ao gozo do homem ou mesmo de seu desejo. Oferecer-se ao desejo do Outro, fazendo de si a metáfora, o faz surgir, mas sem poder ou querer realizá-lo é a forma de ação quase ritual da neurose na relação com o outro sexo. Na histeria feminina, isto ganha o acento particular de que o desejo sexual do homem logo serve para consagrar, atestar o ser fálico do sujeito como o desejo da mãe teria de fazê-lo, como não o fez ou como lhe foi recusado fazê-lo. Este retorno a uma nova alienação dá fim à separação primeira; isto porque o desejo do homem é o outro termo da nova alienação, o qual é escolhido como proteção definitiva contra o desejo problemático da mãe.
É lá, na adolescência, que a fantasia de sedução pelo Pai encontra seu lugar, em geral de modo retroativo. Lá, há alguém que terá querido gozar com ela futuro anterior e por aí o sujeito reencontra, encontra, uma aparência de amarração primeira no ser. O jovem homem encontra também muitos temores de homossexualidade na histeria masculina que tem a mesma origem. É preciso que o Pai tenha querido isto, pois o sujeito, que optou tão cedo pela escolha de seu sentido, chega no fim do prazo sem qualquer fundamento de seu ser, fora a alucinação. E sobre esta base, o que prescreve a lei sexual a uma mulher, esta lei que faz da mulher o objeto de desejo do homem segundo a função fálica, é chamado a fundar seu ser. O sujeito apela agora ao Pai não mais para ter um sentido, mas desta vez para fundar retroativamente refundar, se se pode dizer assim seu ser, que não pode fundar-se senão sobre um gozo do Outro suspenso. Por exemplo, tal jovem mulher não sabia o que a tinha feito experimentar, a partir da adolescência, tal mal-estar diante de seu pai, de suas atitudes ambíguas, seus olhares, e ela diz: 'como ele não dizia nada, acreditei que ele experimentava um sentimento interdito'. É sabido que esta crença ultrapassa os casos em que a realidade do desejo do pai está implicada, o que não quer dizer que ela não ocorresse. Esta crença se apresenta, de fato, como um apelo ao desejo do Outro sob a forma inversa, na qual o Outro, o Pai desta vez, a deseja. O Nome do Pai deve assegurar, portanto, não apenas a lei e o sentido, mas também a existência de um desejo que não lhe terá falhado e que significará, enquanto desejo sexual, o que o desejo da mãe não significou o ser do sujeito. Daí o lugar essencial do Édipo na histeria, daí a equação resolvida por Freud através de uma simples transformação lógica: cena de sedução igual a Édipo. O desejo sexual do Pai e além de todo homem é tão mais convocado, chamado a se efetuar que, se quisermos, diz-se que o prazer original foi muito fraco, que o desejo primeiro foi problemático de alguma forma e recusado e que o que devia investir a criança de valor fálico falhou por qualquer razão que seja. Daí o sujeito tornar-se um "ser para o sexo". Uma analisanda chamava este ser de 'viciado no desejo do homem'. Uma outra, que entrava na adolescência com uma vida sexual que consistia em se entregar sem sentimentos aos homens que a desejavam, chamava a isto de seu 'batismo pagão'. A histeria clama por reverter de alguma forma a equação da lei sexual, a equação de uma versão para o Pai, o ser que foi recusado no sistema anterior ao sujeito ao qual ele tinha ou não faltado. Daí sua constituição em discurso, porque é na lei do discurso que ela encontra seu endereço,1 1 A palavra francesa adresse comporta tanto o significado de endereço quanto de graça, jeito, garbo que oferece à frase uma riqueza que não pode ser traduzida para o português. (N. da T.) sua pátria, sua pátria-mãe, se poderia dizer, deixando eventualmente para denunciá-la ao mesmo tempo em que a apóia.
Vê-se, assim, como esta lógica poderia esclarecer o devir do sujeito e como suas diferentes etapas regulam, como tantas propostas lógicas sucessivas, alguma coisa que vai de encontro com o modo da separação do sujeito ponto que Freud tinha observado como escolha precoce da histeria tanto quanto sua insistência na dialética do falo. Entretanto, poder-se-ia objetar: sabe-se o quanto o histérico fica alienado do desejo do Outro. É verdade, mas notemos que é bem diferente para um sujeito ser revirado pelo significante que o representa ou pelo significante pelo qual ele representa alguma coisa. O sujeito histérico é revirado pelo significante pelo qual ele representa alguma coisa enquanto é separado e até mesmo esquece que é separado daquele que o representa.
Esta lógica intervém como uma escolha repetida ao longo de uma vida entre as duas partes da divisão do sujeito, desde o Édipo, passando pela adolescência e além. A cada alienação segue um modo de separação que se apossa, ostenta o objeto, sendo reconduzido, fazendo uma nova alienação por outros termos. Uma escolha se repete a cada etapa entre o ser e o sentido, entre o falso ser da fantasia e o pensamento do inconsciente, entre o "eu não penso" do sujeito e seu "eu não sou". Esta escolha se faz às vezes num sentido, às vezes num outro e por vezes retorna ao ser, sem retornar à escolha primeira porque ela diz respeito a um "por-ser". Ela coloca um significante que resulta da escolha precedente sobre um termo, atrelando-se a um novo significante, apossando-se de um novo objeto e assim cada elemento da cadeia se desloca um grau. Mas ela se desdobra segundo uma topologia circular, pois o retorno a uma nova alienação que implica a separação passa por um termo da escolha antiga, o que dá quase sempre a impressão, quando se inicia uma etapa nova da vida, de se percorrer de novo, de se retomar alguma coisa antiga, integrando-a ao que vem depois, pois o engatamento se faz num novo significante. A repetição quer o novo. Esta circularidade no retorno avança também sem retorno, pois ela se afivela segundo uma espécie de espiral que se desenvolve em direção a um centro que Lacan descrevia no duplo anel topológico. A repetição freudiana é iluminada aí pela lógica lacaniana.
Do ponto de vista desta lógica, o obsessivo se situa no pólo oposto da estrutura. Para ser mais preciso, parece que a primeira separação é, neste caso, menos precoce e que isto se alinha ao que Freud observava sobre uma chegada mais tardia da neurose, tanto que os primeiros sintomas são também os efeitos de uma separação. Aí também Freud tinha pensado por um tempo, antes de recusá-lo, que a neurose ocorria devido a uma experiência sexual precoce, porém desta vez ativa e muito prazerosa. E aí também ele insistia que este muito prazer primeiro fosse aplicável à relação com o desejo do Outro, a mãe. Pode-se considerar numerosos tipos de desejos suscetíveis de produzi-lo (o muito prazer primeiro), por exemplo, um desejo cuja consistência é sustentada, quer dizer, erotizada em excesso e, no fundo, pouco importa qual tipo. A origem do ser não mantém senão um gozo no Outro e a relação com o objeto que construirá a fantasia será uma janela sobre o real. A criança é, aqui, talvez, mais freqüentemente metonímia do falo para a mãe do que metáfora de seu amor pelo pai, e isso comporta uma consistência diferente do desejo e, portanto, do ser.
Podemos, aqui ainda, tentar discernir a escolha da neurose freudiana do processo de separação lacaniano. Petrificado sob o desejo do Outro que por alguma razão é grande fonte de prazer, o futuro obsessivo permanece por muito tempo no ser fálico que ele constitui por este desejo, mas logo será a partir desta posição do ser que lhe será necessário assegurar sua defesa contra o desejo. Isto pode se alinhar ao que Freud percebia como disposição para a neurose obsessiva, uma escolha de objeto que é feita antes das pulsões serem reunidas sob o primado do genital, daí dizia ele a predominância do erotismo anal e sádico que se endereça ao objeto através do ódio e assegura, então, a representacionalidade das pulsões genitais. O desejo do Outro direcionado a ele lhe parece destrutivo, sublinhava Lacan, deste modo, mesmo sem o desejo ele não é nada tendência suicida própria à obsessão. O assujeitado volta-se contra a causa de seu próprio desejo, o que o marca com uma inibição fundamental e, então, ele não cessa de reparar este Outro que poderia sucumbir sob seus golpes.
Uma primeira subjetivação é aquela da demanda do Outro, especialmente na educação do asseio anal, pois ela constitui a criança como quem pode dar algo ou recusar-se a dá-lo. Mas esta dialética da demanda primeira do Outro implica também que o que é demandado é uma maravilha enquanto é demandado, em seguida, não é outra coisa senão merda desde que é abandonado, e o dom tem, desde então, valor de abandono. É sabido o quanto as constipações e encopreses podem marcar a primeira infância neste caso. Mas é além desta primeira dialética que o sujeito faz-se possuidor deste estranho objeto que se sustenta pela demanda do Outro para largá-lo apenas por desgosto uma vez que ele perde seu valor tão logo é abandonado, de forma que ele pensa duas vezes ou mais antes de satisfazê-lo. Esta demanda causa seu desejo de reter o objeto como também a escapadela nesta retenção a que se chama compulsão.
No entanto, poder-se-ia objetar que a criança obsessiva, é separada bem cedo do desejo do Outro, dado que afirma tão cedo seu próprio desejo, não o larga jamais, persiste diante de tudo, como sublinhava Lacan o que é marcado por cóleras constantes. Mas, precisamente, estas cóleras são mais sinal de alienação do que de separação, pois é no seio do próprio ser que ele tenta encontrar um sentido, impondo, pois, seu desejo para o objeto. Vê-se esta alienação, por exemplo, no fato de que a mínima separação de sua mãe o aniquila, uma vez que seu afastamento com certeza é interpretado como sanção de seu ódio, e sobretudo porque ele é então deixado abandonado no plano do ser, não representado. É, em seguida, também a partir do ser que ele se constituirá como tendo imaginariamente o falo nesse engodo com a mãe no qual cada um pode tê-lo enquanto ele o é. Tê-lo implica também 'ter-se' e é apenas em nome do Outro que ele se tem. Vê-se, por exemplo, ao contrário do que observamos em geral na histeria, uma criança desajeitada e não sabendo bem o que fazer de um corpo como se ele não o tivesse, como se o corpo não fosse livre, já que ele permanece sendo a metáfora do gozo do Outro. Mas é também a partir do lugar do Outro que ele sabe, que o saber se desenvolve amplamente, este saber do qual Freud dizia ser uma forma sublimada da pulsão de dominação característica da pulsão anal.
Assim, por exemplo, este menino que, com seis anos pula a classe de alfabetização porque sabe ler, escreve sem erros ortográficos, subtrai e soma, explica que se ele aceitar começar a se vestir sozinho agora, ele quererá que sua mãe continue a lhe dar banho por enquanto, pois lhe dá prazer quando ela banha suas costas. Esta prazer vem com o saber, que tem seu lugar no Outro.
O sentido do ter fálico, aqui, não é alternativa saudável ao ser, como na histeria, mas defesa contra o ser a partir do ser. É a partir desta demanda do Outro que causa seu desejo de reter que ele se constitui imaginariamente como tendo o falo, no caso do menino ou recebendo-o do outro como presente, no caso da menina e, portanto, no final das contas, tendo-o também, só que num substituto. É a partir do lugar do Outro e a partir do ser que representa que ele elabora um primeiro modo de sentido e de subjetividade e desenvolve sua relação com os objetos.
A função do Pai intervém de maneira bem diferente do que na histeria. Aqui, parece que o Pai se apresenta particularmente como morto, mas, de fato, ele intervém mais. De alguma maneira esta morte é colocada na origem e em certas vezes enuncia-se que no mesmo instante em que ele nasceu, o Pai morria; ela é também janela para o real de uma fantasia que expulsa o sem-sentido primeiro, reencontrando os pedaços.
Fala-se de que Pai? Não o Pai do Nome e da Lei que, de qualquer maneira, é apresentado, mas sim aquele que suscita o gozo da mãe. Que a criança como substituto fálico à disposição tenha sido um gozo tão potente quanto um gozo sexual para a mãe ou que o genitor tornado pai tenha, então, sido marcado por um interdito, qualquer que seja o real encontrado e produzido neste lugar, o ser do gozo da fantasia se construiu portanto assim. O assassinato do Pai ganha um lugar particular na medida que intervém na fantasia como um fato antes de ser um desejo. Para este sujeito, o Pai esteve sempre morto e não é por nada, é por sua existência mesmo. Nisto, diz Lacan, o sujeito se furta a existir. Para ele, implora-se aos céus que haja um pai a matar, pelo menos ele existiria, de modo que aqui, no momento em que a metáfora do Pai se efetua, de alguma forma o ser do sujeito se torna um "ser para a morte", para a morte de um pai que o fará existir.
A elaboração de um Pai que enfim goza e logo com a mãe, na fantasia da cena primitiva descrita por Freud, especialmente na obsessão, lhe assegura não ser a única causa do gozo desta mãe. A construção de um Pai mítico sobre o modelo do Pai da horda, aquele cuja questão não é mais que ele faça ou não a mãe gozar, mas que ele goze de todas as mulheres, lhe assegura que o Pai que faltou no Édipo responderá ao apelo na comunidade do discurso. Ali haveria alguém que nenhuma castração deteria quanto ao gozo e aquele ali, enfim, deveria ser morto e não já estar morto. De alguma forma, a separação se produziria naquele lugar, in situ: se ali também é preciso que o Outro o perca, isto é apenas sobre o modelo no qual ele faz-se de morto, não se move, continuando a se oferecer ao Outro materno para representar seu gozo; entretanto este dom é apenas o dom de nada. Uma vez sujeito, ele fica representado pelo significante do desejo do Outro, mas, a partir de então, este Outro é dividido em dois significantes, de modo que ele vacila, oscila sem cessar entre este significante e aquele junto ao qual ele está representado como sujeito.
Reconhecer esta lógica na neurose poderia, assim, esclarecer as escolhas sucessivas em seu futuro na saída do Édipo e após ela e alguns de seus principais traços. Pode-se questionar a fobia também sobre esta base? Em que sentido ela é uma placa de contorno entre os processos da neurose, como avançava Lacan? A fobia corresponde mais a um momento da estrutura do que propriamente a uma estrutura, mesmo, evidentemente, que este momento possa se fixar, se eternizar. Exceto quando sua ocorrência se dá no quadro de uma psicose que é outra coisa bem diferente , parece que ela se produz, sobretudo, ao redor destas grandes etapas de separação que são o Édipo, a adolescência e outras posteriores. No que se refere ao pequeno Hans, Lacan propunha considerar o cavalo, objeto da fobia, como servindo ao significante castrador ali onde o pai real faltava neste serviço, de metáfora suplente, por conseguinte. Na cadeia de significantes do Outro, onde o sujeito é submetido à alienação entre o ser e o sentido, se alguma coisa falta, outra coisa lhe faz suplência. Entretanto, se esta outra coisa lhe faz suplência, permanece-se no modelo da separação do sujeito e não apenas em sua alienação no ponto de vista da cadeia significante.
O sujeito fóbico é aquele que parece tentar se separar, passando-se pelo Nome do Pai. Não se trata apenas do fato de uma das funções do Pai ser inoperante, trata-se também de que o sujeito tenta se introduzir fundando-se sobre o objeto único; nisto, a fobia sanciona e faz suplência, por sua vez, ao modelo de separação. Hans mostra, assim, como ele faz dele mesmo o pai, pai das crianças imaginárias, de alguns filhotes amorosos, enquanto ainda está numa relação de satisfação imaginária com a mãe. Isto supõe uma topologia especial, pois se, de imediato, ele se faz imaginariamente o pai, em seguida faz o trabalho do Pai em direção ao Outro materno, que consiste em reduzir o Outro ao objeto; ele se faz, de alguma maneira, à imagem de São Cristóvão que Freud adorava comentar , posto na estranha situação de carregar o Outro, sendo que este Outro é aquele que carrega o mundo. Se São Cristóvão carrega o Cristo, sendo que Cristo carrega o mundo dizia Freud onde poderia São Cristóvão apoiar seus pés? Parece que isto pode se aplicar à fobia, na criança ou no adulto. O caso exemplar é precisamente, então, a fobia dos transportes de que Hans também sofria, já que, independente de sua fobia do cavalo que puxa o carro, ele tinha também uma fobia do próprio carro, uma angústia de o carro levá-lo se ele estivesse sentado em cima e o mesmo disparasse. A fobia seria uma tentativa de encontrar saída da alienação, passando-se pelo Nome do Pai no momento
mesmo em que ele está presente na estrutura. Neste sentido, poder-se-ia dizer que a fobia dos transportes é o próprio modelo da fobia, aquele que se refere ao movimento do mundo no qual, para continuar a metáfora, não se sabe mais onde se põem os pés quando algo os leva metrô, avião, elevador; nesse momento, é trazido, de alguma forma, o Outro que carrega o mundo. A agorafobia realiza a forma extrema, na qual não se pode deparar com nada do que é o mundo. A fobia sucumbe em geral quando o sujeito aceita servir-se de um Nome do Pai qualquer que seja para efetuar a separação e não apenas do objeto; e ele encontra assim um significante mais eficaz que o da fobia para poder recalcar o desejo do Outro.
Esta lógica pode, então, esclarecer para nós a clínica das neuroses pelo tanto que ela procede. Ela nos mostra como o objeto do qual o sujeito se separa deixa sua marca em toda a dialética da castração e como o significante comporta dois modos distintos de representação do sujeito pelo e para. O discurso da neurose traz igualmente a marca deste objeto e desta significância.
O discurso da histérica é aquele do inconsciente em exercício dizia Lacan e, com efeito, ele é revirado por este "eu-não-sei" que enuncia o vazio do ser e o pensamento sobre o sexo de acordo com o falo. Entretanto, a fantasia diz respeito ao que pode ocupar este vazio bem pouco suportável, afirmando, de fato, a existência de um Outro consistente e gozando de um sujeito que se faz objeto. Sua declaração é de que há, há especialmente este Outro, ele existe, ele é consistente. Declara como se ele houvesse para que ele haja pelo modo de desejo realizado do sonho. E ao fazê-lo, um único significante é invocado, aquele junto ao qual o sujeito é representado, esquecendo que o Outro é dividido em dois significantes, que há um outro do qual ele é separado e que o representa. É o que Lacan chamava a autenticidade da histérica, ou seja, a que segue sua própria lei. O obsessivo adota uma relação com o discurso totalmente diferente. Ele não esquece que é representado por um significante, aquele do desejo do Outro, mas o nega o que Lacan chamava de 'sua sinceridade'. O que ele diz é que não há, que não é, não é minha mãe denegação descrita por Freud. Marca do recalcamento, mas também que lhe lembremos conjuração: dizer que não é para que não seja, para que não haja. Ele nega o ser representado pelo significante do desejo do Outro e nega ser o objeto; porém, em sua fantasia, ele se faz do Outro dividido entre dois significantes e se encontra, por este fato, entregue à vacilação interminável da alienação, o que apenas prende o objeto. Haveria, assim, toda uma elaboração sobre a clínica por ser feita em termos lógicos, da qual Lacan nos indicou as pistas. Pois a estrutura do inconsciente, se não for retransmitida pela lógica da fantasia, encontrará seu limite.
Recebido em 18/4/2005. Aprovado em 17/5/2005.
Tradução
Pedro Cattapan
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
12 Jan 2006 -
Data do Fascículo
Dez 2005