Open-access A confiabilidade da informação fornecida pelo indivíduo a respeito de seu posicionamento habitual de língua

The reliability of the information provided by the individuals about their habitual tongue position

Resumos

OBJETIVO: verificar a confiabilidade da informação fornecida por adultos e crianças a respeito do posicionamento habitual de língua. MÉTODOS: foram investigadas 30 crianças e 30 adultos em dois momentos, com diferença mínima de sete e máxima de vinte e um dias. Inicialmente foi realizada a observação do posicionamento habitual de língua. Em seguida, o participante foi questionado a respeito de seu posicionamento habitual. Após a resposta, a língua foi estimulada com uma espátula de madeira, a fim de aumentar a percepção. Posteriormente, questionou-se, novamente, o indivíduo. Em seguida, orientou-se o participante a observar onde sua língua permanece habitualmente na cavidade oral, até o segundo momento da avaliação. Nesta oportunidade, o participante foi questionado a respeito de seu posicionamento habitual de língua. Os dados foram analisados por meio da estatística Kappa. RESULTADOS: não foi possível visualizar o posicionamento habitual de língua em 100% da amostra. Quanto à confiabilidade geral das respostas verificou-se classificação entre discreta e regular. As crianças apresentaram respostas pouco consistentes e bastante diversificadas, já em relação aos adultos, parte apresentou respostas corretas logo no primeiro questionamento e parte somente apresentou respostas confiáveis após estimulação de percepção intra-oral. CONCLUSÕES: a confiabilidade da informação fornecida pelos indivíduos da amostra a respeito de seu posicionamento habitual de língua varia entre discreta e regular, sendo, portanto, baixa, tanto em crianças quanto em adultos. Uma possível estratégia a ser utilizada na prática clínica fonoaudiológica é questionar o paciente quanto ao seu posicionamento lingual após determinado período de observação.

Língua; Avaliação; Sistema estomatognático


PURPOSE: to check the reliability of the information provided by adults and children about the habitual tongue position. METHODS: we investigated 30 children and 30 adults in two phases, with minimum difference of seven and maximum of twenty-one days. Initially we observed the usual position of the tongue. Then the subjects were questioned about the habitual position After the response, the tongue was stimulated with a wooden spatula, in order to enhance perception. Then, the subjects were guided to observe where their tongue was usually positioned in the oral cavity, until the second assessment. This time, the subjects were asked about their habitual position of the tongue. Data were analyzed using Kappa statistic. RESULTS: it was not possible to observe the usual position of the tongue in 100% of the sample. As for the general reliability of the responses, it was found between mild and regular classification. The children showed responses to be little consistent and very diverse. As for the adults, part of them submitted correct answers in the first question and others only submitted reliable answers after intra-oral perception stimulation. CONCLUSIONS: the reliability of the information provided by the individuals in the sample on the usual position of the tongue varies from mild, regular, and therefore low, both in children as in adults. A possible strategy to be used in clinical speech therapy practice is questioning the patients about their tongue position after a period of observation.

Tongue; Evaluation; Stomatognathic System


A confiabilidade da informação fornecida pelo indivíduo a respeito de seu posicionamento habitual de língua

The reliability of the information provided by the individuals about their habitual tongue position

Ana Fernanda Rodrigues CardosoI; Silvana BommaritoII; Brasília Maria ChiariIII; Andréa Rodrigues MottaIV

IFonoaudióloga; Residente Multiprofissional Integrada em Saúde do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (Área de concentração: Saúde Cardiovascular), Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil; Graduação pela Universidade Federal de Minas Gerais

IIFonoaudióloga; Professora Adjunto do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo – São Paulo – Brasil; Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo

IIIFonoaudióloga; Professora Titular do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo – São Paulo – Brasil; Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo

IVFonoaudióloga; Professora Assistente do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil; Doutoranda em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Ana Fernanda Rodrigues Cardoso Rua Quixadá, 1074, Bairro Nova Floresta Belo Horizonte (MG), CEP: 31140-220 E-mail: anafrc@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: verificar a confiabilidade da informação fornecida por adultos e crianças a respeito do posicionamento habitual de língua.

MÉTODOS: foram investigadas 30 crianças e 30 adultos em dois momentos, com diferença mínima de sete e máxima de vinte e um dias. Inicialmente foi realizada a observação do posicionamento habitual de língua. Em seguida, o participante foi questionado a respeito de seu posicionamento habitual. Após a resposta, a língua foi estimulada com uma espátula de madeira, a fim de aumentar a percepção. Posteriormente, questionou-se, novamente, o indivíduo. Em seguida, orientou-se o participante a observar onde sua língua permanece habitualmente na cavidade oral, até o segundo momento da avaliação. Nesta oportunidade, o participante foi questionado a respeito de seu posicionamento habitual de língua. Os dados foram analisados por meio da estatística Kappa.

RESULTADOS: não foi possível visualizar o posicionamento habitual de língua em 100% da amostra. Quanto à confiabilidade geral das respostas verificou-se classificação entre discreta e regular. As crianças apresentaram respostas pouco consistentes e bastante diversificadas, já em relação aos adultos, parte apresentou respostas corretas logo no primeiro questionamento e parte somente apresentou respostas confiáveis após estimulação de percepção intra-oral.

CONCLUSÕES: a confiabilidade da informação fornecida pelos indivíduos da amostra a respeito de seu posicionamento habitual de língua varia entre discreta e regular, sendo, portanto, baixa, tanto em crianças quanto em adultos. Uma possível estratégia a ser utilizada na prática clínica fonoaudiológica é questionar o paciente quanto ao seu posicionamento lingual após determinado período de observação.

Descritores: Língua; Avaliação; Sistema estomatognático.

ABSTRACT

PURPOSE: to check the reliability of the information provided by adults and children about the habitual tongue position.

METHODS: we investigated 30 children and 30 adults in two phases, with minimum difference of seven and maximum of twenty-one days. Initially we observed the usual position of the tongue. Then the subjects were questioned about the habitual position After the response, the tongue was stimulated with a wooden spatula, in order to enhance perception. Then, the subjects were guided to observe where their tongue was usually positioned in the oral cavity, until the second assessment. This time, the subjects were asked about their habitual position of the tongue. Data were analyzed using Kappa statistic.

RESULTS: it was not possible to observe the usual position of the tongue in 100% of the sample. As for the general reliability of the responses, it was found between mild and regular classification. The children showed responses to be little consistent and very diverse. As for the adults, part of them submitted correct answers in the first question and others only submitted reliable answers after intra-oral perception stimulation.

CONCLUSIONS: the reliability of the information provided by the individuals in the sample on the usual position of the tongue varies from mild, regular, and therefore low, both in children as in adults. A possible strategy to be used in clinical speech therapy practice is questioning the patients about their tongue position after a period of observation.

Keywords: Tongue; Evaluation; Stomatognathic System.

INTRODUÇÃO

Ao se realizar a avaliação orofacial deve-se ter em mente que, ao final, a mesma precisa fornecer informações suficientes para direcionar ações, além de evidenciar possíveis encaminhamentos, visto que tal avaliação viabiliza o conhecimento anatômico e funcional do sistema estomatognático 1.

No que se refere ao exame clínico dos aspectos habituais dos órgãos fonoarticulatórios, é importante e necessário verificar a localização da língua na cavidade oral.

Tal importância decorre, dentre outros fatores, da relação que o posicionamento habitual da língua apresenta com o desenvolvimento dos arcos dentários, sendo considerado um dos fatores determinantes da má oclusão 2, podendo influenciar inclusive o próprio andamento do tratamento ortodôntico/ortopédico 3.

Entretanto, alterações no posicionamento oral não são de fácil mensuração e diagnóstico 4, assim como também é difícil investigar os movimentos da língua dentro da cavidade oral, apesar de vários métodos instrumentais já terem sido desenvolvidos com esse objetivo. Na literatura é possível encontrar estudos que empregaram eletromiografia de superfície com uso de eletrodos sobre o ápice lingual 5, sensores colados nas faces internas dos dentes 6, 7 e Ressonância magnética 8. Entretanto, o método mais relatado é a avaliação cefalomé-trica 5,9-11. Tal avaliação permite observar a posição da língua apenas em um determinado instante e, no momento da tomada da radiografia, são orientadas a posição de cabeça, a oclusão dentária e o vedamento labial, que podem modificar o posicionamento real da língua 10.

Contudo, alguns autores 11, admitem que a telerradiografia de perfil, modificada com uso de contraste de sulfato de bário sobre a língua, permite boa visualização do posicionamento habitual deste órgão. Outros 9, afirmam que os meios mais confiáveis para se avaliar tal posicionamento são a cinefluoroscopia e a videofluoroscopia, por serem exames dinâmicos, considerando-se que a língua não possui uma posição estática dentro da boca e, em um mesmo indivíduo, pode assumir diversas posições.

Assim, pode-se perceber que técnicas instrumentais para investigação acerca do posicionamento habitual de língua, bem como de seu funcionamento, são limitadas.

A língua pode assumir diversas posições habituais: papila palatina, região alveolar inferior, assoalho oral ou entre os dentes 12 tornando essa tentativa de análise objetiva bastante complexa. Outra classificação possível, por meio da antroposcopia, é: na papila, no assoalho oral, interdentalizada anteriormente, interdentalizada lateralmente, outra e não observado 13.

Uma possibilidade descrita na literatura para se avaliar o posicionamento lingual é a utilização de creme dental infantil aplicado no ápice da língua, sendo o indivíduo orientado a permanecer em posição habitual por tempo determinado, avaliando-se, em seguida, a região oral que recebeu o contato com o creme dental 14. Alguns profissionais realizam a verificação do posicionamento lingual por meio da inspeção visual, solicitando que o paciente abra a boca, calma e lentamente 15. Entretanto, essa conduta faz com que a língua permaneça necessariamente no assoalho oral 12 e pode não representar o estado mais relaxado dos músculos linguais 15 Já outros preferem, empregar um afastador labial para visualizar a relação da língua com a arcada dentária 16.

Assim, para não se avaliar o posicionamento erroneamente, pode-se perguntar ao paciente o local que a mesma ocupa na cavidade oral 12, 16-17. Caso o paciente não saiba informar, apontam-se os locais de possível permanência da língua. Isso pode colaborar tanto no diagnóstico do posicionamento em si, quanto informar o grau de percepção e autoconhecimento que o paciente possui das suas estruturas orais 12.

Portanto, quando não é possível visualizar o local de permanência habitual da língua na cavidade oral, visto que ainda não existem meios objetivos de fácil acesso para isto, a conduta adotada por muitos fonoaudiólogos é perguntar ao indivíduo onde a língua permanece habitualmente na cavidade oral. Acredita-se que o mesmo quando questionado pela primeira vez a respeito de seu posicionamento habitual de língua possa apresentar uma resposta diferente da que forneceria após submeter-se à estimulação intra-oral. Dada a importância, no âmbito da avaliação e terapia fonoaudiológicas, de se determinar o posicionamento habitual da língua de um indivíduo portador de distúrbio orofacial, este estudo se fez necessário.

Deste modo, o objetivo deste estudo foi verificar a confiabilidade da informação fornecida por adultos e crianças a respeito do posicionamento habitual de língua.

MÉTODOS

Participaram deste estudo experimental prospectivo 60 indivíduos, divididos em dois grupos, sendo o primeiro constituído por 30 participantes com idades entre seis e doze anos e o segundo grupo também constituído por 30 participantes, todos apresentando idade superior a 18 anos. O primeiro grupo foi subdividido em três outros subgrupos, com 10 indivíduos cada, de acordo com as idades, a saber: subgrupo A apresentando 6 ou 7 anos de idade; subgrupo B apresentando 8 ou 9 anos de idade e subgrupo C com idades entre 10 e 12 anos.

Indivíduos com idades inferiores a seis anos não participaram deste estudo, por se acreditar que a informação fornecida por estes poderia apresentar uma baixa confiabilidade em decorrência da pouca idade e, conseqüentemente, dificuldades no entendimento das solicitações realizadas no momento da avaliação. Indivíduos com idades entre 13 e 17 anos também não constituíram amostra deste estudo. Sabe-se que está é uma faixa etária de intenso crescimento ósseo e adaptação das estruturas craniofaciais e, conseqüentemente, nova acomodação dos órgãos fonoarticulatórios. Estudo conduzido com adultos evidenciou correlação entre alteração da posição habitual de língua e número de ausências dentárias (19).

A amostra para esta pesquisa foi selecionada por conveniência, incluindo indivíduos dos sexos feminino e masculino. O tamanho da amostra foi definido baseado no número mínimo para a análise estatística.

Os critérios de exclusão foram a não concordância em participar do estudo, apresentar idade inferior a seis anos e entre treze e dezessete anos, ter se submetido à terapia orofacial previamente, ser fonoaudiólogo ou estudar tal ciência e possuir algum comprometimento físico ou cognitivo que interferisse na coleta de dados.

Os indivíduos foram convidados a participar deste estudo por meio do termo de consentimento livre e esclarecido e posteriormente orientados sobre o roteiro de avaliação a que se submeteram. Esta avaliação, desenvolvida pelas pesquisadoras, consta de três etapas realizadas em dois momentos distintos, com diferença mínima de sete e máxima de vinte e um dias, necessitando, portanto, de dois encontros com cada participante.

O intervalo entre os dois momentos do estudo foi arbitrariamente estabelecido pelas pesquisadoras, considerando-se um tempo mínimo de uma semana para que a observação pudesse ser realizada e um tempo máximo não maior que três semanas para que o participante não se esquecesse da verificação realizada. Além disto, o fato da intervenção fonoaudiológica ser, em muitos casos, semanal, implicou na escolha do tempo mínimo de uma semana, já que pode ser possível a aplicação deste procedimento na prática clínica fonoaudiológica.

No primeiro encontro da coleta de dados, conduzida pela pesquisadora principal, foi realizada a observação do posicionamento habitual de língua do indivíduo.

Em seguida, na primeira etapa, o indivíduo foi questionado a respeito de seu posicionamento habitual de língua. Caso o indivíduo não soubesse responder, era dado ao mesmo as seguintes opções de respostas: dentes superiores, dentes inferiores, papila palatina, região alveolar inferior, entre os dentes ou outro. Caso o participante informasse que sua língua permanece habitualmente em outro local, foi solicitado ao mesmo que especificasse tal localização. Se, ainda assim, o indivíduo não soubesse informar o local, seria registrado que o mesmo não soube responder.

Após a resposta, na segunda etapa do estudo, a língua do participante foi estimulada com uma espátula de madeira, realizando-se três movimentos nas laterais direita e esquerda da língua e três movimentos no terço anterior da mesma, a fim de aumentar sua percepção. Posteriormente, o indivíduo foi novamente questionado a respeito de seu posicionamento lingual, tendo as mesmas opções de respostas que na etapa anterior. Em seguida, orientou-se o participante a observar onde a língua permanece habitualmente na cavidade oral, até o segundo encontro.

No segundo encontro, que constituiu a terceira etapa, realizada de sete a vinte e um dias após o primeiro momento, o participante foi, novamente, questionado a respeito de seu posicionamento habitual de língua, tendo as mesmas opções de respostas anteriores.

A avaliação proposta foi realizada em um ambiente tranqüilo, estando presente somente o participante e a pesquisadora principal, não havendo necessidade de estrutura específica. O participante manteve-se, durante toda a avaliação, sentado, apresentando joelhos e quadril a 90º e com cabeça em posição habitual.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais sob o parecer número ETIC 193/08.

A análise dos dados foi realizada por meio da estatística Kappa, sendo o banco de dados estruturado a partir do Epi-info 6.0. Para interpretação dos resultados empregou-se a seguinte classificação: quase perfeita – 0,80 a 1,00; boa – 0,60 a 0,80; moderada – 0,40 a 0,60; regular – 0,20 a 0,40; discreta – zero a 0,20 e pobre – -1 a zero.

RESULTADOS

Com relação à caracterização geral da amostra, 65% dos participantes deste estudo eram do sexo feminino e 35% do sexo masculino. No grupo 1, 60% dos indivíduos eram do sexo feminino e no grupo 2, 70% dos participantes também eram mulheres. O subgrupo A foi composto por 60% de crianças do sexo feminino, o subgrupo B por 70% de crianças do sexo feminino e no subgrupo C metade (50%) dos participantes eram do sexo feminino.

Quanto à idade dos participantes, a Figura 1 revela as medidas de tendência central e dispersão.


No que se refere à observação da posição habitual de língua, não foi possível visualizar tal posicionamento em 100% da amostra.

A confiabilidade de cada etapa deste estudo (1ª, 2ª e 3ª) e a confiabilidade geral das respostas dos participantes podem ser observadas nas tabelas 1, 2 e 3 e na Figura 2.


DISCUSSÃO

Na investigação da integridade do sistema estomatognático, depara-se, por vezes, com a dificuldade de se avaliar clinicamente, sem a utilização de métodos objetivos, o posicionamento habitual de língua 18. Como forma de resolver esta dificuldade é usual que se solicite ao indivíduo que informe a posição que tal estrutura ocupa na cavidade oral 12,17. Entretanto, apesar da avaliação das estruturas e das funções estomatognáticas fazer parte da rotina fonoaudiológica, não é comum a descrição da forma de realização da avaliação do posicionamento habitual de língua 19-24.

No momento inicial deste estudo, primeiro encontro, foi realizada a observação da posição habitual de língua do participante, sendo que não foi possível visualizar tal posicionamento em 100% da amostra. Isto é o que freqüentemente ocorre na prática clínica fonoaudiológica, visto que não é possível observar a posição habitual de língua quando os lábios encontram-se em contato 11.

Alguns autores consideram adequado o posicionamento da língua na região anterior do palato duro 25. Outros ainda avaliam como adequada a posição habitual de língua localizada na papila palatina e alterada quando tal estrutura encontra-se rebaixada ou entre os dentes 26. Cabe considerar que a língua pode assumir diferentes posições na cavidade oral 10, não existindo um padrão único de posicionamento habitual deste órgão 27, podendo os dados variar de acordo até mesmo com a atividade desempenhada pelo sujeito 4.

No presente estudo, verificou-se que o posicionamento habitual de língua relatado por grande parte da amostra, nas diferentes etapas, foi língua tocando em dentes superiores ou inferiores. Entretanto, acredita-se que o apoio não ocorria sobre os dentes e sim na região de transição dentes/alvéolo, uma vez que nenhum participante, durante os dois encontros realizados apresentou sinal relevante de qualquer alteração orofacial ou oclusal. Os dados encontrados não corroboram com o resultado de estudo objetivo, em que foram encontrados onze tipos diferentes de posicionamento lingual 11.

Em seguida, foi verificada a confiabilidade das respostas dos participantes quanto ao seu relato a respeito de seu posicionamento habitual de língua. No tocante à confiabilidade geral das respostas dos participantes, foi constatado que no subgrupo A e no grupo 2 a confiabilidade foi regular, pouco melhor que a confiabilidade dos demais subgrupos (discreta). Tal constatação não se relaciona ao fato de que com o aumento da idade, há também o aumento da credibilidade das respostas dos indivíduos, como acreditava-se.

Deste modo, questionar o paciente, seja ele adulto ou criança, quanto ao seu posicionamento habitual de língua ou mesmo estimular a região buscando aumentar a percepção da estrutura, podem não ser bons procedimentos, já que a confiabilidade das respostas é baixa. Deve-se ressaltar que a resposta fornecida pelo participante na terceira etapa do estudo foi considerada como a mais confiável, visto que nesta o indivíduo foi orientado a observar seu posicionamento lingual em casa por, no mínimo, uma semana, o que favorece uma resposta mais próxima do que de fato ocorre.

Buscando-se analisar os dados de cada etapa separadamente, a confiabilidade entre a primeira e segunda, ou seja, ao comparar-se as respostas fornecidas anteriormente e após estimulação da língua com espátula de madeira, constatou-se que nos subgrupos A e C as informações foram mais confiáveis, atingindo a classificação moderada. Entretanto, as repostas do subgrupo B foram as mais baixas do estudo e no grupo 2 a classificação foi regular. Assim, constatou-se que apenas crianças de seis e sete anos ou entre dez e doze anos se beneficiaram com a estratégia de estimulação. O fato de chamar a atenção para o órgão parece favorecer uma mudança no posicionamento habitual de língua nos indivíduos pesquisados.

No tocante à confiabilidade entre a segunda e terceira etapa do estudo, isto é, comparando-se as respostas após estimulação da língua com espátula de madeira e as respostas fornecidas após período determinado (sete a 21 dias), observou-se baixa confiabilidade nas respostas das crianças, exceto para aquelas entre oito e nove anos de idade, que alcançaram a maior classificação do presente estudo. Entretanto, por se tratar de um dado isolado, que não se repetiu em outras etapas do trabalho, tal informação torna-se pouco relevante. Os adultos apresentaram uma confiabilidade razoável, atingindo a classificação moderada.

Com relação à confiabilidade das respostas entre a primeira e terceira etapa do estudo, ou seja, comparando-se as respostas fornecidas anteriormente à estimulação e após período determinado (sete a 21 dias), observa-se que, novamente, as repostas do subgrupo B foram as de mais baixa confiabilidade do estudo (pobre). A confiabilidade das respostas das crianças de seis e sete anos e entre dez e doze anos foi classificada como discreta e a dos adultos como moderada, sendo uma confiabilidade razoável.

Assim, verificou-se que, entre os adultos, parte dos pesquisados relata a posição habitual de língua corretamente apenas quando questionado e parte somente relata a resposta correta após estimulação. Entretanto, como não é possível saber se a resposta adequada é a primeira ou a que ocorreu após estimulação, talvez seja necessário utilizar como estratégia para um adequado reconhecimento do posicionamento lingual, um contato posterior, solicitando ao paciente neste período, seja ele criança ou adulto, que observe sua posição lingual.

Todavia, independente de qual posicionamento habitual de língua o terapeuta acredite ser o adotado pelo paciente, ou se este é confiável ou não, é importante que a avaliação orofacial leve em consideração a integração de todos os dados obtidos, não se fixando apenas na informação acerca da posição lingual. A indicação ou não de intervenção fonoaudiológica não deve ser baseada apenas em um aspecto da avaliação.

Entretanto, devido à estreita relação existente entre a posição habitual da língua e as demais estruturas e funções do sistema estomatognático, torna-se necessário desenvolver métodos específicos, a fim de se avaliar tal posicionamento de maneira confiável. Portanto, para maior objetividade e melhor relação com as demais áreas de atuação, é necessário que sejam implementados métodos objetivos de fácil acesso para avaliação da posição habitual de língua na prática clínica fonoaudiológica, tornando, assim, a avaliação mais específica.

Cabe ressaltar que este estudo contou com limitações importantes, como a reduzida amostra, que pode influenciar os resultados obtidos, além da mesma não ter sido selecionada de forma randomizada. O fato deste estudo depender de uma observação do participante, também constitui fator limitante, já que o indivíduo pode não se lembrar de verificar seu posicionamento lingual no período determinado ou ainda pode não se envolver com o estudo, não cumprindo esta solicitação. Não foi encontrado na literatura pesquisada nenhum estudo com metodologia semelhante ao realizado. Assim, sugere-se a realização de novas pesquisas sobre o tema, com amostra representativa, objetivando confirmar os dados encontrados e acrescentar novas informações às existentes.

CONCLUSÃO

A confiabilidade da informação fornecida pelos indivíduos da amostra a respeito de sua posição habitual de língua varia entre discreta e regular, sendo, portanto, baixa, tanto em crianças quanto em adultos. Uma possível estratégia a ser utilizada na avaliação miofuncional orofacial e cervical, quando não é possível visualizar a estrutura da língua, é questionar o paciente quanto ao seu posicionamento após determinado período de observação.

Recebido em: 04/02/10

Aceito em: 29/07/2010

Conflito de interesses: inexistente

Referências bibliográficas

  • 1. Genaro KF, Berretin-Felix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial Protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55.
  • 2. Sponholz G, Vedovello Filho M, Boecker EM, Lucatto AS, Valdrighi HC, Vedovello SAS, et al. Postura lingual: sua relação com a maloclusão. RGO. 2007;55(2):169-74.
  • 3. Chawla HS, Suri S, Utreja A. Is tongue thrust that develops during orthodontic treatment an unrecognized potential road block? J Indian Soc Pedod Prev Dent. 2006;24(2):80-3.
  • 4. Mew J. Tongue posture. Br J Orthod. 1981;8(4):203-11.
  • 5. Takada K, Kowe AA, Yoshida K, Sakuda M. Tongue posture at rest: an electromyographic and cephalometric appraisal. J Osaka Univ Dent Sch. 1985;25:139-51.
  • 6. Tsuiki S, Handa S, Ohyama K. A simple method for evaluation of tongue position. J Oral Rehabil. 2007;34:304-10.
  • 7. Yanagisawa K, Takagi I, Sakurai K. Influence of tongue pressure and width on tongue indentation formation. J Oral Rehabil. 2007;34(11):827-34.
  • 8. Mehnert J, Landau H, Mussler A, Reinicke J, Müller-Hartwich R, Orawa H et al. Comparison between logopedic and MRI findings in evaluating tongue function. J Orofac Orthop. 2009;70(6):455-67.
  • 9. Jabur LB. Posicionamento habitual da língua em indivíduos com oclusão normal [monografia]. São Paulo: CEFAC; 1997.
  • 10. Bianchini EMG. A cefalometria nas alterações miofuncionais orais: diagnóstico e tratamento fonoaudiológico. 5Ş ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Pró-Fono; 2002.
  • 11. Tessitore A, Crespo AN. Análise radiográfica da posição habitual de repouso da língua. Pró-Fono. 2002;14(1):7-16.
  • 12. Junqueira P. Avaliação miofuncional. In: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia: aspectos clínicos na motricidade oral. 2Ş ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p.13-21.
  • 13. Cattoni DM, Fernandes FDM, Francesco RCD, Latorre MRDO. Características do sistema estomatognático de crianças respiradoras orais: enfoque antroposcópico. Pró-Fono. 2007;19(4):347-51.
  • 14. Matos VF, Sekito FM. Estudo do posicionamento de língua e lábios em sujeitos com disfunção temporomandibular e dor orofacial. Rev CEFAC. 2009;11(13):370-37.
  • 15. Kotsiomiti E, Farmakis N, Kapari D. Factors related to the resting tongue position among partially and completely edentulous subjects. J Oral Rehabil. 2005;32:397-402.
  • 16. Mehnert J, Landau H, Orawa H, Kittel A, Krause M, Engel S, Jost-Brinkmann PG, Müller-Hartwich R. Validity and reliability of logopedic assessments of tongue function. J Orofac Orthop. 2009;70(6):468-84.
  • 17. Taylor PM. Uma maneira de abordar as alterações miofuncionais orofaciais. In: Marchesan IQ. Tratamento da deglutição: a atuação do fonoaudiólogo em diferentes países. São José dos Campos: Pulso; 2005. p.259-72.
  • 18. Cardoso KR, Giellow I, Mattos MCF. Posicionamento habitual de língua nos padrões faciais anteroposteriores. In: Marchesan IQ, Zorzi JL, Gomes ICD. Tópicos em Fonoaudiologia 1997/1998. São Paulo: Lovise; 1998. p.233-60.
  • 19. Maciel CTV, Barbosa MH, Toldo CA, Faza FCB, Chiappetta ALML. Disfunções orofaciais nos pacientes em tratamento ortodôntico. Rev CEFAC. 2006;8(4):456-66.
  • 20. Mangilli LD, Rodrigues CS, Campiotto AR. A intervenção fonoaudiológica no pós-operatório da hipertrofia benigna do músculo masseter. R Dental Press Ortodon Ortop Facial. 2006;11(2):103-9.
  • 21. Oliveira CF, Busanello AR, Silva AMT. Ocorrência de má oclusão e distúrbio articulatório em crianças respiradoras orais de escolas públicas de Santa Maria, Rio Grande do Sul. RGO. 2008;56(2):169-74.
  • 22. Maciel KRA, Albino RCM, Pinto MMA. A prevalência de distúrbio miofuncional orofacial nos pacientes atendidos no ambulatório de pediatria do Hospital Luís de França. Rev Pediatr. 2007;8(2):81-90.
  • 23. Maciel CTV, Barbosa MH, Toldo CA, Faza FCB, Chiappetta ALML. Disfunções orofaciais nos pacientes em tratamento ortodôntico. Rev CEFAC. 2006;8(4):456-66.
  • 24. Turra GS, Schwartz IV. Evaluation of orofacial motricity in patients with mucopolysaccharidosis: a cross-sectional study. J Pediatr. 2009;85(3): 254-60.
  • 25. Degan VV, Puppin-Rontani RM. Remoção de hábitos e terapia miofuncional: restabelecimento da deglutição e repouso lingual. Pró-Fono. 2005;17(3):375-82.
  • 26. Pereira AC, Jorge TM, Júnior PDR, Berretin-Felix G. Características das funções orais de indivíduos com má oclusão Classe III e diferentes tipos faciais. Dental Press Ortodon Ortop Facial. 2005;10(6):111-9.
  • 27. Marcondes CP. Determinação da posição de repouso da língua em indivíduos com oclusão dentária normal [dissertação]. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo; 2007.
  • Endereço para correspondência:
    Ana Fernanda Rodrigues Cardoso
    Rua Quixadá, 1074, Bairro Nova Floresta
    Belo Horizonte (MG), CEP: 31140-220
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Recebido
      04 Fev 2010
    • Aceito
      29 Jul 2010
    location_on
    ABRAMO Associação Brasileira de Motricidade Orofacial Rua Uruguaiana, 516, Cep 13026-001 Campinas SP Brasil, Tel.: +55 19 3254-0342 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revistacefac@cefac.br
    rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
    Acessibilidade / Reportar erro