Open-access Desempenho de novilhos de gerações avançadas do cruzamento alternado entre as raças Charolês e Nelore, terminados em confinamento

Performance of feedlot finished steers from advanced generations of rotational crossbreeding between Charolais and Nellore

Resumos

Foram avaliadas as características de estado corporal, peso, ganho de peso, consumo e eficiência alimentar de novilhos puros (Charolês - C e Nelore - N) e mestiços da segunda (G2) (¾C ¼N e ¾N ¼C), terceira (G3) (5/8C 3/8N e 5/8N 3/8C) e quarta (G4) (11/16C 5/16N e 11/16N 5/16C) geração de cruzamento, terminados em confinamento. Os novilhos foram alimentados com a mesma dieta, contendo 12,32% de proteína bruta e 2,96 Mcal de energia digestível/kg de matéria seca, com relação volumoso:concentrado de 52:48. Os consumos médios diários de matéria seca, energia digestível e de fibra em detergentes neutro e ácido, expressos em kg/animal, foram maiores nos animais mestiços em todas as gerações de cruzamento. No entanto, quando estes consumos foram expressos por 100 kg de peso vivo, as diferenças deixaram de ser significativas. A heterose retida (5,46%) foi significativa para ganho de peso médio diário. As heteroses para eficiências alimentar (ganho de peso/kg de matéria seca) e energética (ganho de peso/Mcal de energia digestível) foram negativas em todas gerações, indicando que novilhos mestiços foram menos eficientes que a média dos puros. As porcentagens de heterose para estado corporal e pesos corporais inicial e final foram expressivas e significativas em todas as gerações. O comportamento do grau de heterose nestas características acompanhou a oscilação da heterozigose individual. O cruzamento rotativo gerou mestiços superiores quanto ao consumo de matéria seca e ao peso e estado corporal, em relação aos animais puros. Os animais mestiços apresentaram mesma eficiência alimentar que os Nelore, mas foram inferiores aos Charolês quanto à eficiência alimentar e ao ganho de peso médio diário.

Bos indicus; Bos taurus; consumo alimentar; ganho de peso; heterose


The objective of this study was to evaluate body condition, weight, weight gain, food intake and efficiency of feedlot finished steers, purebreds (Charolais - C and Nellore - N), crossbreds from second (G2) (¾C ¼N and ¾N ¼C), third (G3) (5/8C 3/8N and 5/8N 3/8C) and fourth (G4) (11/16C 5/16N and 11/16N 5/16C) generations of rotational crossbreeding. The steers were fed the same diet containing 12.32% crude protein, 2.96 Mcal digestible energy/kg of dry matter and roughage:concentrate ratio of 52: 48. Average daily intakes of dry matter, digestible energy, neutral and acid detergent fiber expressed by kg/animal were higher for crossbreds in all generations. However, when these intakes were expressed per 100 kg of body weight differences were not significant. Retained heterosis (5.46%) was significant for average daily weight gain. Heterosis for efficiency of feed (kg of weight gain/kg of dry matter) and energy (kg of weight gain/Mcal of digestible energy) were negative in all generations, indicating that crossbred steers were less efficient than purebreds. Heterosis (%) for initial and final body weights and condition were expressive and significant in all generations and the level of heterosis for these traits followed the fluctuation of individual heterozygosis. Rotational crossbreeding animals were superior to purebreds for dry matter intake, body weight and condition, similar to Nellore for feed efficiency and inferior to Charolais for feed efficiency and average daily weight gain.

Bos indicus; Bos taurus; feed intake; heterosis; weight gain


MELHORAMENTO, GENÉTICA E REPRODUÇÃO

Desempenho de novilhos de gerações avançadas do cruzamento alternado entre as raças Charolês e Nelore, terminados em confinamento1

Performance of feedlot finished steers from advanced generations of rotational crossbreeding between Charolais and Nellore

Luís Fernando Glasenapp de MenezesI; João RestleII

IZootecnista, MSc, Doutorando do Programa de Pós-graduação em Zootecnia da UFSM

IIEngº Agrº, PhD, Pesquisador visitante – CNPq, UFG. E.mail: jorestle@terra.com.br

RESUMO

Foram avaliadas as características de estado corporal, peso, ganho de peso, consumo e eficiência alimentar de novilhos puros (Charolês - C e Nelore - N) e mestiços da segunda (G2) (¾C ¼N e ¾N ¼C), terceira (G3) (5/8C 3/8N e 5/8N 3/8C) e quarta (G4) (11/16C 5/16N e 11/16N 5/16C) geração de cruzamento, terminados em confinamento. Os novilhos foram alimentados com a mesma dieta, contendo 12,32% de proteína bruta e 2,96 Mcal de energia digestível/kg de matéria seca, com relação volumoso:concentrado de 52:48. Os consumos médios diários de matéria seca, energia digestível e de fibra em detergentes neutro e ácido, expressos em kg/animal, foram maiores nos animais mestiços em todas as gerações de cruzamento. No entanto, quando estes consumos foram expressos por 100 kg de peso vivo, as diferenças deixaram de ser significativas. A heterose retida (5,46%) foi significativa para ganho de peso médio diário. As heteroses para eficiências alimentar (ganho de peso/kg de matéria seca) e energética (ganho de peso/Mcal de energia digestível) foram negativas em todas gerações, indicando que novilhos mestiços foram menos eficientes que a média dos puros. As porcentagens de heterose para estado corporal e pesos corporais inicial e final foram expressivas e significativas em todas as gerações. O comportamento do grau de heterose nestas características acompanhou a oscilação da heterozigose individual. O cruzamento rotativo gerou mestiços superiores quanto ao consumo de matéria seca e ao peso e estado corporal, em relação aos animais puros. Os animais mestiços apresentaram mesma eficiência alimentar que os Nelore, mas foram inferiores aos Charolês quanto à eficiência alimentar e ao ganho de peso médio diário.

Palavras-chave:Bos indicus, Bos taurus, consumo alimentar, ganho de peso, heterose

ABSTRACT

The objective of this study was to evaluate body condition, weight, weight gain, food intake and efficiency of feedlot finished steers, purebreds (Charolais - C and Nellore - N), crossbreds from second (G2) (¾C ¼N and ¾N ¼C), third (G3) (5/8C 3/8N and 5/8N 3/8C) and fourth (G4) (11/16C 5/16N and 11/16N 5/16C) generations of rotational crossbreeding. The steers were fed the same diet containing 12.32% crude protein, 2.96 Mcal digestible energy/kg of dry matter and roughage:concentrate ratio of 52: 48. Average daily intakes of dry matter, digestible energy, neutral and acid detergent fiber expressed by kg/animal were higher for crossbreds in all generations. However, when these intakes were expressed per 100 kg of body weight differences were not significant. Retained heterosis (5.46%) was significant for average daily weight gain. Heterosis for efficiency of feed (kg of weight gain/kg of dry matter) and energy (kg of weight gain/Mcal of digestible energy) were negative in all generations, indicating that crossbred steers were less efficient than purebreds. Heterosis (%) for initial and final body weights and condition were expressive and significant in all generations and the level of heterosis for these traits followed the fluctuation of individual heterozygosis. Rotational crossbreeding animals were superior to purebreds for dry matter intake, body weight and condition, similar to Nellore for feed efficiency and inferior to Charolais for feed efficiency and average daily weight gain.

Key Words:Bos indicus, Bos taurus, feed intake, heterosis, weight gain

Introdução

No Brasil, a taxa média de abate da pecuária de corte, nos últimos dez anos, tem-se mantido em torno dos 22% (Anualpec, 2003), indicando estagnação da produtividade do rebanho. Os custos financeiros elevados dos recursos necessários para intensificar o sistema de produção e a baixa remuneração do produto final têm sido os principais responsáveis pela redução dos investimentos na pecuária de corte.

Com a baixa lucratividade observada na pecuária de corte, é necessário buscar alternativas tecnológicas que aumentem a margem de lucro do produtor, sem elevar os custos de produção. Uma alternativa para melhorar a produtividade do rebanho bovino de corte, sem grande inversão de capital, é o melhoramento genético, a partir da seleção e/ou do cruzamento inter-racial.

No sul do país, as raças bovinas de corte predominantes são as de origem européia, que são bem adaptadas às épocas do ano em que as temperaturas são mais amenas. No entanto, nas épocas quentes, o desempenho dessas raças é prejudicado pela falta de adaptabilidade às temperaturas mais elevadas. Restle et al. (1987) verificaram que bezerros de raças européias apresentaram maior ganho de peso que bezerros Nelore durante o período de inverno, entretanto, essa situação se inverteu durante o verão. Este comportamento também foi verificado por Pereira et al. (2000), em novilhos Charolês e Nelore no segundo verão em pasto nativo e no segundo inverno durante a terminação em confinamento. Esses autores observaram ainda que, nas duas épocas do ano, os animais F1, resultantes do cruzamento recíproco Charolês x Nelore apresentaram ganho de peso superior aos animais puros, indicando melhor adaptabilidade, tanto no verão como no inverno.

Ao avaliar o resultado de vários trabalhos envolvendo o cruzamento de raças européias e zebuínas, Koger (1973) relatou níveis de heterose elevados para o desempenho do rebanho de cria, porém, para a terminação em confinamento, os níveis de heterose foram mais baixos. Restle et al. (1995) observaram heterose baixa para ganho de peso de novilhos durante a terminação em confinamento. Porém, a heterose foi elevada tanto para o peso inicial como para o final, indicando que o cruzamento beneficiou o ganho de peso nas fases anteriores. Perotto et al. (2002) também observaram heteroses baixas para ganho de peso (-2,03%), conversão alimentar (-2,44%) e consumo de matéria seca (-0,41%) ao terminarem em confinamento novilhos Canchim, Aberdeen Angus e seus cruzamentos recíprocos.

Tem-se procurado, por meio do cruzamento, combinar e complementar as características de importância econômica que são expressas com diferente intensidade pelos animais das raças puras, visando acelerar o melhoramento genético com a incorporação de genes que afetam essas características e aproveitar a heterose resultante (Restle et al., 2000).

O cruzamento de raças de grande porte, como a Charolês, que apresenta elevada taxa de ganho de peso e grande massa muscular, com uma raça mais precoce em deposição de gordura, como a Nelore, resulta em animais com elevada proporção de músculo na carcaça e adequada deposição de gordura de cobertura (Restle et al., 1995). Além disso, segundo Koger (1980), a heterose é maior quando resulta do cruzamento de raças zebuínas x européias que de européias x européias ou zebuínas x zebuínas.

O experimento foi realizado com o objetivo de evidenciar o efeito do cruzamento e suas respectivas heteroses sobre as características de desempenho de novilhos em confinamento.

Material e Métodos

O trabalho foi realizado no Setor de Bovinocultura de Corte do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Comparou-se o efeito da composição racial e da heterose sobre as características estado corporal, peso, ganho de peso, consumo e eficiência alimentar de novilhos puros (Charolês - C e Nelore - N) e mestiços da segunda (G2) (3/4C 1/4N e 3/4N 1/4C), terceira (G3) (5/8C 3/8N e 5/8N 3/8C) e quarta (G4) (11/16C 5/16N e 11/16N 5/16C) gerações de cruzamento. A heterose apresentada neste trabalho é a total, decorrente da heterozigose individual e materna.

Foram utilizados 78 novilhos tomados ao acaso da fazenda experimental da UFSM, nascidos na mesma época de parição e mantidos sempre sob as mesmas condições de manejo e alimentação. Os novilhos foram gerados por fêmeas puras e mestiças inseminadas com sêmen de seis touros de cada raça (Charolês e Nelore). Quatro touros de cada raça foram utilizados para o repasse na monta a campo. Os touros Charolês que geraram os novilhos Charolês foram os mesmos que geraram os novilhos 3/4C 1/4N, 5/8C 3/8N e 11/16C 5/16N, assim como os touros Nelore que geraram os novilhos Nelore foram os mesmos que geraram os novilhos 3/4N 1/4C, 5/8N 3/8C e 11/16N 5/16C.

Ao início do período de terminação em confinamento, os animais apresentavam média de 304 kg e 20 meses de idade. O período total de confinamento foi de 97 dias, os primeiros 14 dias foram submetidos à adaptação dos animais ao ambiente do confinamento e à dieta alimentar. A dieta, igual para todos os animais, foi calculada para proporcionar GMD de 1,2 kg (NRC, 1996) e apresentava 12,32% de proteína bruta (PB), 2,96 Mcal de energia digestível e 58,30% de fibra em detergente neutro (FDN). O volumoso, representando 52% da matéria seca total oferecida, foi constituído de silagem de milho (AG 5011). O concentrado foi composto por 93,97% de farelo de trigo, 1,5% de uréia, 3,62% de calcário calcítico e 0,9% de sal, além de monensina sódica, regulada conforme recomendação do fabricante.

Os animais foram alimentados à vontade duas vezes ao dia, pela manhã e à tarde, com oferta de alimento 10% superior ao consumo voluntário diário. Diariamente, antes da primeira alimentação, as sobras do dia anterior foram retiradas e pesadas, para ajuste da oferta de alimento e posterior cálculo do consumo e da conversão alimentar. As sobras foram amostradas, no momento de sua retirada, para posterior análise laboratorial.

Os animais foram pesados no início e no final do período experimental e a cada 21 dias, após jejum de sólidos de 14 horas. Durante o período experimental, foram mantidos em confinamento semicoberto, com comedouro de alvenaria e bebedouro regulado por torneira-bóia.

Foram coletados os dados referentes às características de pesos médios inicial (PI) e final (PF), de escores corporais médios inicial (ECI) e final (ECF) (1 - muito magro; 2 - magro; 3 - médio; 4 - gordo; 5 - muito gordo), de ganho de peso médio diário (GMD) e de consumos médios de matéria seca (CMS), energia digestível (CED), FDA (CFDA) e FDN (CFDN), em kg/animal/dia (CMSD, CEDD, CFDAD, CFDND, respectivamente). Os dados de consumo também foram expressos em kg/100 kg de peso vivo (CMSP, CEDP, CFDAP, CFDNP, respectivamente) e em g/PV0,75 (CMSTM, CEDTM, CFDATM, CFDNTM, respectivamente). Foram avaliados ainda as eficiências alimentar (EA) e energética (EE) e a eficiência em transformar FDN (EFDN) em ganho de peso.

Os novilhos foram alojados em 24 boxes, segundo o esquema fatorial 4 x 2 (quatro sistemas de acasalamento x dois grupos genéticos dentro de cada sistema de acasalamento). Para cada grupo genético, foram utilizados três boxes (repetições), nos quais os animais foram distribuídos ao acaso. Cada grupo genético tinha número diferente de animais por box (seis animais para os grupos C, 3/4C 1/4N e 11/16N 5/16C; nove para os grupos 3/4N 1/4C e 11/16C 5/16N; 12 para o grupo 5/8C 3/8N; e 15 para os grupos N e 5/8N 3/8C).

Os dados foram analisados por análise de variância e as médias foram comparadas pelo teste t (SAS, 1997), utilizando-se o seguinte modelo estatístico:

em que Yijkl refere-se às variáveis dependentes; µ, à média de todas as observações; IVk, ao efeito da k-ésima idade da vaca, mãe do novilho; SAi, ao efeito do sistema de acasalamento de índice i, sendo i = 1 (puros), 2 (mestiços da G2), 3 (mestiços da G3) e 4 (mestiços da G4); GGj(SAi), ao efeito do grupo genético de índice j, aninhado dentro do sistema de acasalamento i, sendo j = 1 (Charolês) e 2 (Nelore) dentro do SA 1; 1 (3/4C 1/4N) e 2 (3/4N 1/4C) dentro do SA 2; 1 (5/8 C 3/8 N) e 2 (5/8 N 3/8 C) dentro do SA 3; 1 (11/16C 5/16N) e 2 (11/16 N 5/16 C) dentro do SA 4; e Eijkl, ao efeito aleatório residual.

Foram realizadas também análises de contraste entre mestiços e Charolês ou Nelore para as variáveis estudadas.

Foi calculada a heterose resultante das características avaliadas nas diferentes gerações de cruzamento:

H% = [(média dos mestiços dentro de cada geração/médias dos puros)-1] x 100.

A heterose retida foi calculada pela seguinte equação:

Hretida = [(média de todos os mestiços/média dos puros)-1] x 100.

Resultados e Discussão

As médias e heterose para os consumos diários de matéria seca e energia digestível, expressos em kg/animal, em 100 kg de peso vivo e em unidade de tamanho metabólico, são apresentadas na Tabela 1.

Os animais mestiços de todas as gerações do cruzamento apresentaram maior CMSD que a média dos puros, resultando em heterose de 14,28; 22,86 e 18,57% na segunda, terceira e quarta gerações de cruzamento, respectivamente. A principal causa do maior consumo dos animais mestiços foi seu maior peso, pois, ao ajustar o consumo para 100 kg de peso vivo, a diferença entre mestiços e puros deixou de ser significativa, com heterose de -3,16; -1,13 e -2,71%.

Maiores consumos de alimento por animais mestiços em relação aos puros foram citados por Chase et al. (1998), ao estudarem o desempenho em confinamento de animais Senepol e Hereford puros e seus mestiços. Galvão et al. (1991) observaram que a superioridade no CMSD dos animais mestiços Limousin x Nelore e Marchigiana x Nelore em relação aos Nelore foi ocasionada pelo seu maior porte.

Para alimentos que limitam o consumo por distensão ruminal, Mertens (1994) sugere que o consumo é melhor descrito ou expresso em porcentagem de peso vivo, tendo em vista que o efeito de enchimento da dieta tem estreita relação com o tamanho e a capacidade do trato gastrintestinal. Segundo esse autor, para dietas em que o consumo é limitado fisiologicamente, a melhor forma de expressar o consumo voluntário é em relação ao peso corporal metabólico. Os animais mestiços da terceira e quarta gerações apresentaram maior CMSTM que a média dos puros, resultando em 4,51 e 2,15% de heterose, respectivamente. Leme et al. (1985) observaram maior consumo por kg de peso metabólico em mestiços Europeu-Zebu que em animais Nelore. Restle et al. (1995) e Restle et al. (2000), no entanto, ao estudarem a heterose na primeira geração do cruzamento Charolês x Nelore, não encontraram diferença entre a média dos novilhos puros e mestiços ½C ½N e ½N ½C para CMSTM, porém, em ambos os trabalhos, os animais mestiços apresentaram maior CMSTM que os Nelore.

O valor da heterose para o CMSD acompanhou a oscilação do grau de heterozigose individual das gerações de cruzamento. O grau de heterozigose na G2 foi de 50%, passando para 75% na G3, ou seja, aumentou em 50%, enquanto a heterose para CMSD passou de 14,28 para 22,86%, representando aumento de 60,08%. Na G4, a heterozigose foi de 62,5%, representando decréscimo de 17% da G3 para a G4, ao passo que a heterose para CMSD decresceu 18,77%. O comportamento da heterose para CMSTM também acompanhou a oscilação do grau de heterozigose individual, porém, com diferente magnitude. Geralmente, as respostas heteróticas dependem do nível de heterozigose, das raças de origem dos genes nas populações em estudo, da divergência genética entre as raças envolvidas no cruzamento e das magnitudes das herdabilidades das características consideradas (Perotto et al., 2002).

Comparando os grupos genéticos dentro do sistema de acasalamento, verifica-se que, nos novilhos Charolês, o CMSD foi 15,4% maior que nos novilhos Nelore (7,5 vs 6,5 kg). Em várias pesquisas, foi constatado maior CMSD de animais Charolês, em relação aos Nelore, quando comparados na mesma faixa etária: 34% em novilhos na fase de terminação, dos 20 aos 24 meses (Restle et al., 1995); 32% em bezerros na fase de crescimento, dos 9 aos 12 meses de idade (Restle et al., 2000) e de 9% em vacas de descarte adultas (Restle et al., 2001a). Nesses estudos, como neste experimento, as diferenças deixaram de ser significativas quando expressas como CMSP ou CMSTM. No entanto, Casaccia et al. (1993) constataram que novilhos Charolês, além de apresentarem maior CMSD que os Nelore, também apresentaram maior CMSP e CMSTM.

O consumo alimentar é importante, pois está relacionado diretamente ao ganho de peso. Segundo Euclides Filho et al. (2002), o menor ganho de peso de animais das raças zebuínas está associado ao seu menor consumo alimentar. Owens et al. (1993) observaram que animais de diferentes composições corporais apresentaram ingestão diretamente proporcional à massa protéica e inversamente proporcional à deposição de gordura, sugerindo que raças selecionadas para alto ganho de peso e maior massa muscular, como a Charolês, são indiretamente selecionadas para altos consumos de matéria seca. Nardon et al. (2001), comparando uma raça de origem européia (Caracu) e uma raça zebuína (Nelore) selecionada ou não para ganho de peso, observaram que a raça européia teve maior consumo que a raça zebuína quando esta não foi selecionada. Porém, quando a raça Nelore foi selecionada para ganho de peso, a diferença de consumo deixou de existir, o mesmo ocorrendo quando o consumo foi expresso em porcentagem de peso vivo ou em unidade de peso metabólico.

Na G2 e na G3, os animais com maior predominância de sangue Nelore apresentaram maior CMSD, enquanto, na G4, os 11/16C 5/16N foram superiores aos 11/16N 5/16C. Quando o CMS foi expresso em porcentagem do peso vivo, os novilhos 5/8N 3/8C apresentaram maior consumo na G3 (2,3 vs 2,1%) e, quando expresso em unidade de tamanho metabólico, os ¾N ¼C apresentaram maior consumo na G2 (97,8 vs 90,5 g), não havendo diferença nas demais gerações para ambas as formas de expressão do consumo.

Além do efeito do peso do animal, diferenças no consumo entre grupos genéticos estão relacionadas a diferenças no seu grau de maturidade, principalmente pelo aumento da competição do espaço abdominal, ocasionado pela elevação do grau de gordura corporal (NRC, 1987). Fox et al. (1988) observaram que a ingestão de matéria seca decresceu 2,7% para cada 1% de aumento na gordura corporal, em uma amplitude de 21,3 a 31,5% da gordura corporal. Além disso, segundo Hicks et al. (1990), o principal fator a afetar o CMSD de novilhos confinados é o peso no início do confinamento. Segundo esses autores, o CMSD acompanhou o aumento do peso inicial. Relação direta entre o peso inicial e CMSD também é relatada por Bail et al. (2000), que trabalharam com animais de mesma idade e com diferentes pesos iniciais. Neste experimento, em todos os sistemas de acasalamento, o CMSD acompanhou o peso inicial dos animais (Tabela 3), estando menos relacionado ao estado corporal.

O consumo de matéria seca, assim como o de energia digestível, é afetado por vários fatores (densidade energética da dieta, composição de ganho e grupo genético), o que torna difícil a comparação destas características entre diferentes trabalhos. No entanto, considerando-se a relação volumoso:concentrado (52:48) e a idade dos animais, nota-se que o consumo de matéria seca observado neste estudo foi inferior aos valores relatados na literatura (Galvão et al., 1991 (2,80%); Oliveira et al., 1991 (2,69%) e Restle et al., 1995 (2,35%)).

Os consumos de fibra em detergente neutro e de fibra em detergente ácido, nas diferentes formas de expressão, encontram-se na Tabela 2.

Da mesma forma que o CED, os consumos de FDN e de FDA apresentaram tendência similar ao CMS, tanto nas diferenças entre raças como nos níveis de heterose.

A FDN é conhecida como o componente da parede celular que proporciona melhores estimativas do enchimento gastrintestinal, sendo mais acurada que a fibra bruta e a FDA para cálculo da propriedade dos alimentos em ocupar espaço (Mertens, 1992). A digestibilidade da FDN é regulada principalmente pelo teor de lignina do alimento (NRC, 2001). Neste estudo, em que o teor de lignina foi de 3,54%, a digestibilidade da FDN foi de 32,20%. O alto valor de FDN da dieta (58,38%) justifica o baixo consumo de matéria seca apresentado pelos animais de todos os grupos genéticos em comparação aos de outros estudos (Restle et al. 2000). No entanto, o baixo consumo não foi limitante para um bom ganho de peso, provavelmente pela baixa concentração de lignina na dieta e pela boa digestibilidade da FDN.

Os valores médios e a heterose para ganho de peso médio diário (GMD), peso e escores corporais inicial e final constam na Tabela 3.

A heterose para ganho de peso médio diário, ao contrário da heterose retida, não foi significativa nas gerações de cruzamento avaliadas. Perotto et al. (2000) observaram pouca diferença no ganho de peso de animais mestiços e puros durante a terminação em confinamento. De maneira geral, a heterose para características de alta herdabilidade, como ganho de peso na terminação em confinamento, é baixa (Restle et al., 2001b). Porém, avaliando animais na fase de crescimento, dos 9 aos 12 meses de idade, Restle et al. (2000) verificaram heterose significativa para ganho de peso em confinamento.

Estudando o desempenho animal de três gerações de cruzamento entre Charolês e Caracu, Perotto et al. (2000) observaram efeito significativo da heterose retida (7%) para GMD, superior à verificada neste experimento (5,46%). No entanto, Perotto et al. (2002) não encontraram efeito significativo de heterose retida para esta variável no cruzamento entre as raças Canchim e Aberdeen Angus.

Peacock et al. (1982), avaliando o efeito da heterose no cruzamento entre Angus (A), Brahman (B) e Charolês (C) e no retrocruzamento recíproco, verificaram que o GMD dos animais mestiços em confinamento foi 9,3% superior ao dos puros e que os efeitos diretos de heterose foram positivos para todos os mestiços F1; 19,5% para os AB; 9,5% para os BC e 3,8% para os AC.

Os novilhos Charolês apresentaram superioridade (P<0,05) de 48,98% no GMD sobre os Nelore. Vantagens do Charolês em relação ao Nelore foram relatadas em várias publicações Moletta & Restle, (1992): 16,4%; Restle et al. (1995): 15,7%; Restle et al. (2000): 42,5%; Restle et al. (2001b): 20,0%. Esses resultados indicam que a raça Charolês apresenta maior efeito genético aditivo para característica ganho de peso que a Nelore. Esta afirmação é reforçada pela análise de contrastes, em que os novilhos com maior predominância de Charolês no genótipo apresentaram maior (P<0,05) GMD que aqueles com maior predominância de Nelore.

As heteroses para pesos inicial e final acompanharam o grau de oscilação da heterozigose individual, porém com magnitudes diferentes. A heterose para peso inicial, que na G2 foi de 19,67%, passou para 27,93% na G3, com aumento de 41,99%. Para peso final, no entanto, houve acréscimo de 36,73%, de modo que a heterose passou de 13,34% na G2 para 18,24% na G3. Da G3 para G4, em que o decréscimo da heterozigose é de 17%, a heterose para o peso inicial apresentou queda de 13,89%, sendo a heterose na G4 de 24,05%, enquanto, para o peso ao final do confinamento, a heterose nessa geração foi de 16,61%, representando queda de 8,94% em comparação à G3.

Os animais mestiços foram mais pesados que os puros, tanto no início como no final do confinamento, o que está de acordo com a maioria dos trabalhos encontrados na literatura (Manzano et al., 1999; Restle et al., 2000; Restle et al., 2001b). A diferença entre o peso dos animais mestiços em relação aos puros diminuiu em 40% no final do período, se comparados quanto ao peso que apresentavam no início do confinamento. Restle et al. (1995) relataram diferença de 29%, com heterose de 13,7% no início do confinamento (aos 20 meses) e de 9,7% no final (aos 24 meses de idade). A redução da diferença de peso entre mestiços e puros indica que os animais mestiços não apresentaram a mesma velocidade de ganho de peso até o final do confinamento que os puros. Isso pode ser explicado pelo estádio mais avançado de desenvolvimento dos mestiços, comprovado pelo maior peso e estado corporal inicial em relação à média dos puros, resultando em maiores exigências energéticas de mantença e para ganho de peso. Esta afirmação foi confirmada por Restle et al. (2001b), que compararam animais mestiços e puros na fase adulta, ou seja, que já haviam completado o desenvolvimento corporal e, conseqüentemente, apresentavam deposição de gordura desde o início do confinamento, e observaram diminuição de apenas 6,7% na heterose para o peso no início e no final do confinamento de vacas de descarte, que apresentaram heterose para peso corporal de 11,05% no início e de 10,31% no final da terminação.

A heterose para o escore corporal se mostrou positiva e significativa em todas as gerações do cruzamento, tanto no início como no final do confinamento. Da mesma forma que o peso corporal, a heterose para esta característica seguiu a oscilação da heterozigose com magnitudes diferentes. O cruzamento beneficiou a deposição precoce de gordura, uma vez que os animais mestiços em todas as gerações apresentaram maior escore corporal que a média dos puros (Tabela 3). A diferença entre o escore corporal dos animais mestiços em relação aos puros reduziu no final do período de confinamento, de modo que esta diminuição não foi uniforme em todas as gerações, ou seja, houve queda de 40,87% na G2, 16,99% na G3 e 10,56% na G4.

Os novilhos N e 5/8N 3/8C apresentaram maior ECI que os C e 5/8C 3/8N, respectivamente, como conseqüência da maior precocidade em deposição de gordura em animais da raça Nelore em relação aos da raça Charolês. Porém, nas demais gerações do cruzamento, esta diferença não existiu. Ao final do confinamento, a única diferença para o EC foi entre os novilhos puros, com maior ECF para os Charolês. A maior deposição de gordura subcutânea nos novilhos Charolês em comparação aos Nelore contraria vários estudos que demonstram a maior precocidade na deposição deste tecido em animais da raça Nelore em relação aos Charolês (Moletta & Restle, 1992; Restle et al., 2000; Restle et al., 2001b). O estado corporal inicial, que foi maior nos animais Nelore, inverteu no final do confinamento, passando a ser maior nos novilhos Charolês. O acréscimo no estado corporal durante o confinamento foi 33,8% superior no Charolês. A provável explicação para esse comportamento foi o elevado ganho de peso dos novilhos Charolês em relação aos Nelore. O estado corporal final e o ganho em estado corporal apresentaram correlações positivas e significativas de 0,18 e 0,23, respectivamente, com o ganho de peso médio diário.

As médias e a heterose para eficiência em transformar MS (EA), energia digestível (EE) e FDN (EFDN) em ganho de peso estão expressas na Tabela 4. Houve heterose negativa e significativa para eficiência alimentar na G3 e G4, podendo-se observar o mesmo comportamento para EE e EFDN. A melhor eficiência dos animais puros está relacionada principalmente ao elevado ganho de peso dos novilhos Charolês. Este resultado também foi influenciado pela deposição de gordura mais precoce nos animais mestiços, uma vez que a eficiência para o depósito de tecido adiposo é menor que para o depósito de tecido muscular (Ferrel & Jenkis, 1998).

Os novilhos Charolês foram mais eficientes, apresentando 25,9% mais ganho de peso por quilo de matéria seca consumida que os Nelore. A eficiência de transformar os demais nutrientes consumidos em ganho de peso seguiu o comportamento da eficiência alimentar da matéria seca. Em geral, não se tem observado diferenças acentuadas na eficiência alimentar durante a terminação entre novilhos taurinos e zebuínos puros (Moletta & Restle, 1992; Restle et al., 1995; Manzano et al., 1999; Nardon et al., 2001). Tanto a diferença entre Charolês e Nelore como as altas heteroses negativas para eficiência alimentar são decorrentes da boa eficiência apresentada pelos animais Charolês, ocasionada principalmente pelo elevado ganho de peso médio diário durante toda a fase de confinamento.

Em todas as gerações do cruzamento, os animais com predominância do genótipo Charolês foram numericamente superiores em eficiência alimentar. Há observações na literatura de melhor conversão alimentar em novilhos mestiços com predominância de sangue Charolês em relação a novilhos com predominância de sangue Caracu (Perotto et al., 2000) ou Nelore (Restle et al., 2000). Perotto et al. (2000) atribuíram essas diferenças de conversão alimentar às diferenças nas composições do ganho de peso, que são mais eficientes nos grupos genéticos que têm maior velocidade de crescimento e menor quantidade de gordura na carcaça ao término do confinamento. Esses autores destacaram que, quando as comparações são feitas com animais da mesma faixa etária, como neste estudo, os animais menos precoces são mais eficientes.

O sucesso dos sistemas de cruzamento está intimamente relacionado à superioridade dos animais mestiços em relação às raças formadoras, principalmente se esta superioridade é em relação a cada uma das raças envolvidas. O animal Charolês é conhecido por sua alta velocidade de ganho de peso, boa conversão alimentar e deposição de gordura tardia. Por outro lado, o Nelore apresenta razoável precocidade para deposição de tecido adiposo. Neste estudo, os animais mestiços apresentaram maior consumo de matéria seca, ganho de peso médio diário, peso corporal e escore corporal final e mesma eficiência alimentar que os animais Nelore. Foram superiores aos Charolês quanto ao consumo de matéria seca, ao peso e estado corporal tanto ao início como no final da terminação, mas foram inferiores em ganho de peso médio diário e eficiência alimentar.

Conclusões

O cruzamento rotativo gerou animais mestiços superiores aos puros quanto ao consumo de matéria seca, peso e estado corporal, com a mesma eficiência alimentar que os animais Nelore, e inferiores aos Charolês para eficiência alimentar e ganho de peso médio diário.

As heteroses para eficiências alimentar e energética foram negativas em todas gerações, indicando que novilhos mestiços foram menos eficientes que a média dos puros.

A heterose retida para ganho de peso médio diário foi expressiva.

As porcentagens de heterose para estado corporal e pesos inicial e final acompanharam a oscilação da heterozigose individual.

Os novilhos Charolês e 11/16C 5/16N, quando comparados aos demais grupos genéticos, foram os que apresentaram maior ganho de peso médio diário e os Charolês, maior eficiência alimentar no período em que permaneceram confinados.

Literatura Citada

Recebido em: 22/11/04

Aceito em: 17/06/05

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  • 1
    Parte da dissertação de mestrado apresentada pelo primeiro autor, parcialmente financiada pela FAPERGS.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2005

    Histórico

    • Aceito
      17 Jun 2005
    • Recebido
      22 Nov 2004
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