RESUMO
Este artigo examina a previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos utilizando dividend yields em sete mercados desenvolvidos: EUA, Reino Unido, Japão, França, Alemanha, Itália e Espanha. No total, esses países representam cerca de 85% do índice Morgan Stanley Capital International (MSCI) World Index. O uso de séries temporais longas com dados atualizados permite a comparação não apenas entre países, mas também entre períodos, colocando em perspectiva a existência ou não de mudanças perceptíveis desde a década de 1980. A maior parte da literatura sobre esse tópico está focada nos EUA. Essa ênfase nos EUA é ainda mais pronunciada quando se trata de examinar a relação entre imprevisibilidade de dividendos e suavização de dividendos. Há também a necessidade de saber se as relações já documentadas para o período pós-Segunda Guerra Mundial ainda se mantêm durante as últimas três décadas, quando as bolsas de valores foram submetidas a um alto nível de turbulência em todo o mundo. A relação entre dividend yield, retornos e crescimento de dividendos é central para se compreender o funcionamento dos mercados de capitais e tem implicações consideráveis na precificação de ativos de capital e nas estratégias de investimento. No geral, os resultados mostram que, mesmo para os mercados de capitais desenvolvidos, não existe um padrão claro sobre a capacidade preditiva dos dividend yields sobre os retornos de ações e o crescimento de dividendos; ao contrário, essas relações parecem ser dependentes do tempo e específicas de cada país. Para cada país, a capacidade preditiva do dividend yield é examinada em um modelo VAR estrutural de primeira ordem, aplicando testes de significância bootstrap, e o grau de suavização de dividendos é avaliado utilizando quatro modelos de ajuste parcial para o comportamento dos dividendos. Além disso, realizou-se uma análise fora da amostra, utilizando pseudo-R2 e uma estatística ajustada de erro quadrático médio de previsão (EQMP) normal. Para o período pós-Segunda Guerra Mundial, os retornos são previsíveis, mas os dividendos são imprevisíveis nos EUA e no Reino Unido, enquanto o padrão oposto é observado na Espanha e na Itália. Na Alemanha, há evidências de previsibilidade no curto prazo para retornos e dividendos, enquanto na França apenas os retornos são previsíveis. No Japão, nenhuma das variáveis pode ser prevista. Os resultados da suavização de dividendos mostram que os dividendos são mais persistentes nos EUA e no Reino Unido; entretanto, não há uma conexão clara entre suavização de dividendos e previsibilidade para os outros países. Uma conclusão importante a se reter da análise fora da amostra é que a previsibilidade dos retornos após a Segunda Guerra Mundial, especialmente presente nos EUA, pareceu estar ausente nas últimas três décadas, provavelmente devido à turbulência sofrida pelos mercados de ações durante este último período.
Palavras-chave:
retorno de ações; crescimento de dividendos; dividend yield; suavização de dividendos; previsibilidade de longo prazo
ABSTRACT
This paper examines stock returns and dividend growth predictability using dividend yields in seven developed markets: United States of America (US), United Kingdom (UK), Japan, France, Germany, Italy, and Spain. Altogether, these countries account for around 85% of the Morgan Stanley Capital International (MSCI) World Index. The use of the long time series with up-to-date data allows the comparison not only between countries, but also across periods, putting into perspective the existence or not of noticeable changes since the 1980’s. The majority of the literature on this topic is US-centered. This emphasis on the US is even more pronounced when it comes to examining the relationship between the dividend unpredictability and dividend smoothing. There is also the need to know if the relationships already documented for the post-Second World War (WWII) period still hold during the last three decades, when stock markets were subjected to a high level of turbulence worldwide. The relationship between dividend yields and returns and dividend growth is central to understand the functioning of capital markets, and has considerable implications for capital asset pricing and investment strategies. Overall, the results show that even for developed capital markets there is no clear pattern on the predictive ability of dividend yields on stock returns and dividend growth, instead these relationships seem to be time-dependent and country-specific. For each country, the predictive ability of the dividend yield is examined in a first-order structural VAR framework by applying bootstrap significance tests and the degree of dividend smoothing is assessed using four partial-adjustment models for the dividend behavior. Additionally, an out-of-sample analysis is conducted using pseudo-R2 and a normal mean squared prediction error (MSPE) adjusted statistic. For the post-WWII period, returns are predictable, but dividends are unpredictable in the US and the UK, while the opposite pattern is observed in Spain and Italy. In Germany, there is some evidence of short-term predictability for both returns and dividends, while in France only returns are predictable. In Japan, neither variable can be forecasted. The dividend smoothing results show that dividends are more persistent in the US and the UK, however, there is no clear connection between dividend smoothness and predictability for the other countries. An important conclusion to retain from the out-of-sample analysis is that the predictability of returns after the WWII, especially present in the US, appeared to have been missing in the last three decades, most probably due to the turmoil experienced by the stock markets during this last period.
Keywords:
stock return; dividend growth; dividend yield; dividend smoothing; long-run predictability
1. INTRODUÇÃO
A relação entre dividend yield, retornos e crescimento de dividendos é uma questão central para se compreender o funcionamento dos mercados de capitais e tem implicações consideráveis na precificação de ativos de capital e nas estratégias de investimento das carteiras. Esse tópico de pesquisa não é novo, mas ainda não há conclusões gerais consensuais, e a discussão sobre se os principais resultados obtidos para os EUA são aplicáveis a outros países permanece bastante atual.
Para os EUA, a corrente principal da literatura considera que o dividend yield tem algum poder preditivo nos retornos, mas o poder preditivo diminui substancialmente quando o crescimento de dividendos é a variável explicada. Uma possível explicação proposta na literatura são as práticas de suavização de dividendos adotadas por empresas estadunidenses.
Este artigo contribui para a literatura existente ao oferecer evidências internacionais adicionais sobre o poder preditivo dos dividend yields sobre retornos e crescimento de dividendos. Mais precisamente, o artigo analisa essas relações nos EUA, Reino Unido, Japão, França, Alemanha, Itália e Espanha, utilizando a maior série temporal disponível. O objetivo do artigo não é construir previsões significativas e robustas de retorno e crescimento de dividendos, o que, discutivelmente, seria melhor alcançado pela inclusão de outras variáveis econômicas e financeiras como regressores ao invés de apenas o dividend yield. Este artigo está em consonância com Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.), que constrói um teste conjunto para a previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos utilizando apenas o dividend yield como regressor. Também tentamos descobrir se há algum padrão que relacione medidas de suavização de dividendos e previsibilidade de crescimento de dividendos, como em Chen, Da e Priestley (2012Chen, L., Da, Z., & Priestley, R. (2012). Dividend smoothing and predictability. Management science, 58(10), 1834-1853.). Por fim, para conferir mais robustez aos nossos resultados, realizamos uma análise fora da amostra sobre a capacidade de previsão do dividend yield. Embora as metodologias utilizadas em nosso artigo já tenham sido usadas por outros, nosso artigo possui alguns pontos fortes, que são os seguintes: ele utiliza dados atualizados, incluindo o período pós-crise financeira de 2007; compara os resultados para os mercados de ações mais importantes do mundo, e não apenas para os EUA ou o Reino Unido; e combina análises dentro e fora da amostra.
O restante deste estudo estrutura-se em cinco seções. A Seção 2 oferece uma breve revisão da literatura sobre o tópico do poder preditivo do dividend yield. A seção 3 apresenta os dados e fornece algumas estatísticas descritivas. A Seção 4 descreve os conceitos teóricos básicos sobre as relações entre dividend yield, retornos e crescimento de dividendos, os modelos voltados a avaliar a suavização de dividendos e a metodologia utilizada para medir a capacidade de previsão do dividend yield fora da amostra. A seção 5 apresenta os resultados e a seção 6 conclui o artigo.
2. REVISÃO DA LITERATURA
Nas últimas décadas, muitos autores estudaram a previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos por meio do dividend yield [ver, por exemplo, Ferson e Harvey (1991Ferson, W. E., & Harvey, C. R. (1991). The variation of economic risk premiums. Journal of Political Economy, 99(2), 385-415.), Campbell e Ammer (1993Campbell, J. Y., & Ammer, J. (1993). What moves the stock and bond markets? A variance decomposition for long-term asset returns. The Journal of Finance, 48(1), 3-37.), Cochrane (2001Cochrane, J. H. (2001). Asset pricing. Princeton, NJ: Princeton University. , 2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.), Lettau e Ludvigson (2005Lettau, M., & Ludvigson, S. C. (2005). Expected returns and expected dividend growth. Journal of Financial Economics, 76(3), 583-626.), Lettau e Van Nieuwerburgh (2007Lettau, M., & Van Nieuwerburgh, S. (2007). Reconciling the return predictability evidence. Review of Financial Studies, 21(4), 1607-1652.) e, mais recentemente, Maio e Santa-Clara (2015Maio, P., & Santa-Clara, P. (2015). Dividend yields, dividend growth, and return predictability in the cross section of stocks. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 50(1-2), 33-60.), Golez e Koudijs (2018Golez, B., & Koudijs, P. (2018). Four centuries of return predictability. Journal of Financial Economics, 127(2), 248-263.), Jagannathan e Liu (2019Jagannathan, R., & Liu, B. (2019). Dividend dynamics, learning, and expected stock index returns. Journal of Finance, 74(1), 401-448.), le Bris, Goetzmann e Pouget (2019le Bris, D., Goetzmann, W. N., & Pouget, S. (2019). The present value relation over six centuries: The case of the Bazacle Company. Journal of Financial Economics, 132(1), 248-265.) e Piatti e Trojani (2019Piatti, I., & Trojani, F. (2019). Dividend growth predictability and the price-dividend ratio. Management Science, 66(1).)]. A principal conclusão é que o dividend yield prevê fortemente os retornos das ações, mas não prevê as taxas de crescimento dos dividendos. No entanto, esse resultado tem sido cada vez mais contestado por outros trabalhos, mostrando que o dividend yield também prevê o crescimento de dividendos. Campbell e Shiller (1988Campbell, J. Y., & Shiller, R. J. (1988). The dividend yield and expectations of future dividends and discount factors. The Review of Financial Studies, 1(3), 195-228.) relatam que, para os EUA, a razão dividendo-preço previa significativamente o crescimento de dividendos no intervalo de um ano, até 1986. Ang (2002Ang, A. (2002). Characterizing the ability of dividend yields to predict future dividends in log-linear present value models [Working Paper]. Columbia University.) chega à mesma conclusão utilizando dados até 2000; entretanto, ele também conclui que, para horizontes além de um ano, não há previsibilidade significativa do crescimento de dividendos por meio da razão dividendo-preço. Um estudo mais recente realizado por Chen (2009Chen, L. (2009). On the reversal of return and dividend growth predictability: A tale of two periods. Journal of Financial Economics, 92(1), 128-151.) apresenta algumas evidências de que o dividend yield realmente previa o crescimento agregado dos dividendos nos EUA no período anterior à Segunda Guerra Mundial, mas esse poder preditivo desaparece no pós-guerra. Binsbergen et al. (2010Binsbergen, V., Jules, H., & Koijen, R. S. (2010). Predictive regressions: A present-value approach. The Journal of Finance, 65(4), 1439-1471.), utilizando a estrutura do modelo de valor presente, mostram que os dividendos nos EUA são previsíveis por meio de todo o histórico dos dividend yields. Piatti e Trojani (2019Piatti, I., & Trojani, F. (2019). Dividend growth predictability and the price-dividend ratio. Management Science, 66(1).) aplicam testes de bootstrap aos dados do mercado acionário dos EUA para o período entre 1946 e 2010, e confirmam que as evidências de previsibilidade de retornos (dividendos) do pós-guerra nos modelos de benchmark de valor presente são fortes (fracas) de forma semelhante aos testes preditivos de regressão padrão, o que é consistente com o relato de dois períodos documentado na literatura referente à utilização de regressões preditivas.
Maio e Santa-Clara (2015Maio, P., & Santa-Clara, P. (2015). Dividend yields, dividend growth, and return predictability in the cross section of stocks. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 50(1-2), 33-60.) apontam que a convicção generalizada de que a variação do dividen yield está exclusivamente relacionada aos retornos esperados e não ao crescimento esperado dos dividendos, embora válida para o agregado do mercado acionário, não é verdadeira para carteiras de ações pequenas e ações de valor, nas quais o dividend yield está principalmente relacionado a mudanças futuras nos dividendos. Os autores mostram que o que explica as variações temporais na razão dividendo-preço de ações pequenas é a previsibilidade do crescimento futuro dos dividendos, enquanto no caso das ações grandes, a questão está totalmente relacionada à previsibilidade dos retornos, especialmente em horizontes mais longos.
Jagannathan e Liu (2019Jagannathan, R., & Liu, B. (2019). Dividend dynamics, learning, and expected stock index returns. Journal of Finance, 74(1), 401-448.) demonstram que o crescimento de dividendos nos EUA no período pós-guerra é previsível em um modelo que incorpora informações sobre a política de pagamento de dividendos em função da taxa de crescimento dos dividendos. A ideia principal é que remunerações elevadas em relação aos dividendos implicam que as empresas têm retido a remuneração no passado e, portanto, espera-se que paguem mais dividendos no futuro. Utilizando dados dos EUA, os autores mostram que seu modelo prevê de 42,4 a 46,4% da variação nas taxas anuais de crescimento de dividendos entre 1946 e 2016 dentro da amostra, e de 39,5 a 41,3% da variação nas taxas anuais de crescimento de dividendos entre 1976 e 2016 fora da amostra.
A maioria dos estudos sobre a previsibilidade dos retornos por meio do dividend yield (ou razão dividendo-preço) utiliza dados dos EUA. Essa ênfase nos EUA é ainda mais pronunciada quando se trata de examinar a previsibilidade do crescimento de dividendos [ver Paye e Timmermann (2006Paye, B. S., & Timmermann, A. (2006). Instability of return prediction models. Journal of Empirical Finance, 13(3), 274-315.)]. Entretanto, há alguns estudos sobre outros países. Campbell (2003Campbell, J. Y. (2003). Consumption-based asset pricing. Handbook of the Economics of Finance, 1(2), 803-887.) conduz um estudo abrangente sobre a determinação de preços de ativos dentro de uma estrutura baseada no consumo, utilizando dados internacionais. Ele encontra algumas evidências sobre a previsibilidade do crescimento de dividendos por meio da razão dividendo-preço em vários países, mas não nos EUA. Engsted e Pedersen (2010Engsted, T., & Pedersen, T. Q. (2010). The dividend-price ratio does predict dividend growth: International evidence. Journal of Empirical Finance, 17(4), 585-605.) estudam o poder do dividend yield na previsão do crescimento de dividendos nos países escandinavos. Eles mostram que o grau de previsibilidade depende de as variáveis utilizadas na análise serem reais ou nominais.
Os diferentes resultados sobre a capacidade do dividend yield em prever o crescimento de dividendos colocam em perspectiva que essa capacidade é provavelmente condicionada pelo período amostral e pode ser específica para cada país. Por exemplo, Lettau e Ludvigson (2005Lettau, M., & Ludvigson, S. C. (2005). Expected returns and expected dividend growth. Journal of Financial Economics, 76(3), 583-626.) oferecem uma potencial justificativa para a ausência de previsibilidade do crescimento de dividendos por meio da razão dividendo-preço no período após a Segunda Guerra Mundial. Eles concluem que as previsões de dividendos e as previsões de retornos excessivos de ações estão positivamente correlacionadas aos ciclos econômicos. As variações, tanto nos retornos esperados quanto no crescimento esperado de dividendos, são compensadas na razão dividendo-preço. Eles também oferecem uma explicação para a razão consumo-riqueza ter um poder maior do que o log da razão dividendo-preço na previsão de retornos excessivos do mercado de ações em horizontes de médio prazo. Chiang (2008Chiang, K. (2008). High dividend yield does predict lower dividend growth: A natural experiment. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1107192
http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1107192...
) mostra que, quando os dividendos não capturam os fluxos de caixa futuros relevantes, o crescimento esperado dos dividendos não é previsível por meio dos dividend yields. Eles argumentam que isso se deve ao nivelamento da série de dividendos, que por sua vez resulta da manipulação e das mudanças nas políticas financeiras das empresas.
Golez e Koudijs (2018Golez, B., & Koudijs, P. (2018). Four centuries of return predictability. Journal of Financial Economics, 127(2), 248-263.) concluem que a previsibilidade dos retornos a partir dos dividend yields tem sido uma característica robusta dos mercados financeiros nos últimos quatro séculos e argumentam que uma possível justificativa para a ausência de previsibilidade dos dividendos é a crescente desconexão entre lucros e dividendos. Uma proporção de dividendos para lucros mais baixa implica que as empresas ‘empurram’ a remuneração dos acionistas para o futuro. Dado que os retornos esperados parecem ser menos persistentes do que as taxas de crescimento de dividendos esperadas, adiar o pagamento de dividendos aumenta a sensibilidade relativa dos dividend yields a choques nos retornos esperados e reduz a capacidade dos dividend yields em prever taxas de crescimento de dividendos. Le Bris et al. (2019le Bris, D., Goetzmann, W. N., & Pouget, S. (2019). The present value relation over six centuries: The case of the Bazacle Company. Journal of Financial Economics, 132(1), 248-265.) estudam os preços da Bazacle Company de Toulouse, a mais antiga corporação acionária documentada, no período de 1372 a 1946, utilizando preços de ações e dividendos líquidos, e mostrando que as mudanças nas expectativas de dividendos futuros explicam uma fração significativa das variações de preços. Esse achado é consistente com a importância relativa do fluxo de caixa versus notícias sobre taxas de desconto para empresas individuais.
Provavelmente, a explicação mais estabelecida para a ausência de previsibilidade de dividendos tem a ver com a maneira como as empresas definem suas políticas de dividendos e, mais especificamente, com a prática de suavização de dividendos. Chen et al. (2012Chen, L., Da, Z., & Priestley, R. (2012). Dividend smoothing and predictability. Management science, 58(10), 1834-1853.) relatam que a suavização de dividendos pode destruir a previsibilidade dos dividendos em uma amostra finita. De fato, há uma diferença perceptível nas políticas de dividendos das empresas dos EUA antes e depois da Segunda Guerra Mundial, sendo que os pagamentos de dividendos mostram-se muito mais suavizados no período pós-guerra. Portanto, as estratégias de suavização de dividendos adotadas pelas empresas estadunidenses após a Segunda Guerra Mundial são uma explicação plausível para o motivo pelo qual, nos EUA, o crescimento de dividendos é previsível antes da Segunda Guerra Mundial, mas não depois.
Na literatura sobre a suavização de dividendos, os EUA aparecem com peso preponderante e as evidências internacionais sobre a relação entre imprevisibilidade de dividendos e suavização de dividendos são escassas. Geralmente, os autores estudam separadamente as duas questões e, quando há evidências de imprevisibilidade de dividendos e suavização de dividendos para um país em particular, eles concluem que provavelmente existe uma relação causal da segunda para a primeira. Rangvid, Schmeling e Schrimpf (2014Rangvid, J., Schmeling, M., & Schrimpf, A. (2014). Dividend predictability around the world. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 49(5-6), 1255-1277.) elaboraram um estudo de referência sobre essa relação para o período de 1973 a 2009, utilizando uma lista abrangente de países. Os autores mostram que a previsibilidade de dividendos é mais fraca em mercados grandes e desenvolvidos, onde os dividendos são mais suavizados, a empresa típica é maior e a volatilidade é menor, donde concluem que a aparente falta de previsibilidade de dividendos nos EUA não se estende uniformemente a outros países. Nosso estudo oferece evidências adicionais sobre o poder preditivo do dividend yield e sua relação com a suavização de dividendos para sete das economias mais desenvolvidas do mundo, utilizando dados atualizados.
3. DESCRIÇÃO DOS DADOS
Este artigo examina a previsibilidade do crescimento de dividendos e dos retornos das ações nos EUA, Reino Unido, Japão, França, Alemanha, Itália e Espanha, utilizando a série temporal de preços anuais de ações, dividendos e lucros desde a sua disponibilidade até 2016. Utilizam-se dados anuais em vez de dados mensais ou trimestrais porque, nessas freqüências mais estreitas, os erros de medição de dividendos são mais graves. Consequentemente, os dados anuais têm a frequência adequada para serem utilizados em estratégias de investimento de longo prazo, com horizontes de vários anos.
Para esses países, coletamos no banco de dados da Global Financial Data as séries temporais do “índice total de retorno das ações”, indicado por IRt , “índice de preços das ações” (Pt ), “dividend yields das ações” (DYt ) (em porcentagem) , “earnings yields das ações” (E/Pt ) e "índice de preços ao consumidor" (IPCt ) (o índice subscrito refere-se ao final do ano t). Os dados foram obtidos no nível agregado do índice geral de ações de cada país, fornecido pela Global Financial Data. O período de amostragem é diferente para cada país e, para alguns países, os “earnings yields das ações” só estão disponíveis vários anos depois de todas as outras séries. A Figura 1 mostra os períodos amostrais de todas as séries, para cada país.
Os dados brutos foram então utilizados para calcular as séries apropriadas. As séries de dividendos são obtidas como Dt = (DYt /100)Pt , portanto o crescimento anual de dividendos é dado por CDt = (Dt /Dt-1 ) - 1. As razões preço-lucro são obtidas simplesmente invertendo-se a série de earnings yields (P/E)t = ((E/P)t )-1 , e as séries de lucros são obtidas calculando-se Et = (E/P)t Pt . Os retornos aritméticos são dados por Rt = (RIt /RIt-1 ) - 1. Todas as variáveis nominais, incluindo o crescimento de dividendos e os retornos, foram então deflacionadas pelos índices nacionais de preços ao consumidor (IPC) de modo a obter seus valores reais. As estatísticas descritivas do retorno aritmético real, crescimento real de dividendos e dividend yields para cada país são apresentadas na Tabela 1. Para os países (EUA, Reino Unido, Japão e França) em que existem dados antes da Segunda Guerra Mundial, a amostra geral é dividida em dois segmentos: o período anterior à Segunda Guerra Mundial, desde o início das amostras até 1945, e o período pós-guerra, de 1946 a 2016.
Para a amostra geral, considerando os EUA, o Reino Unido, o Japão e a França, o retorno médio anual varia de 5,7% para a França a 8,9% para o Japão, enquanto o crescimento médio dos dividendos, sempre inferior ao retorno médio no respectivo país, varia de 0,9% no Japão a 3,8% na França. Para esses países, o retorno médio e o crescimento médio dos dividendos mostram um padrão crescente do período pré-Segunda guerra ao período pós-guerra, enquanto seus desvios padrão (DP) não mostram um padrão claro. Para o dividend yield, os valores médios diminuíram, enquanto o DP aumentou da primeira subamostra para a segunda. O coeficiente de autocorrelação de primeira ordem dos retornos tornou-se negativo no período após a Segunda Guerra Mundial, exceto para o Japão, enquanto para o crescimento de dividendos, esse coeficiente aumentou no período pós-guerra. As estatísticas para Alemanha, Itália e Espanha referem-se a períodos de amostragem posteriores à Segunda Guerra Mundial e, portanto, são mais comparáveis com a subamostra pós-guerra dos outros quatro países. A estatística mais desalinhada das demais é o coeficiente de correlação negativa do crescimento de dividendos para a Itália. O coeficiente 𝜑 1 mostra que o dividend yield é altamente persistente, independentemente do país ou período de amostragem, variando de 0,5 (EUA, período anterior à Segunda Guerra Mundial) a 0,90 (Japão, amostra geral).
4. ESPECIFICAÇÕES DOS MODELOS
Esta seção apresenta os conceitos e modelos teóricos centrais ao exame do poder do dividend yield na previsão dos retornos de ações e do crescimento de dividendos em diferentes horizontes temporais. Além disso, apresenta o conceito de suavização de dividendos, os modelos de política de dividendos estimados na próxima seção e, ainda, uma metodologia simples, mas amplamente reconhecida, para avaliar o poder preditivo dos dividendos fora da amostra.
4.1. O Modelo de Dividend Yield para Retornos de Ações e Crescimento de Dividendos
Seguindo Campbell e Shiller (1988Campbell, J. Y., & Shiller, R. J. (1988). The dividend yield and expectations of future dividends and discount factors. The Review of Financial Studies, 1(3), 195-228.), pode-se derivar a seguinte aproximação de retorno log-linear de um período:
onde 𝑟 𝑡+1 , 𝑑 𝑡+1 e 𝑝 𝑡+1 denotam o log-retorno, o log-dividendo e o log-preço de uma dada ação no período t + 1, respectivamente, e c é a constante de linearização. Assim, ∆dt+1 é a taxa de crescimento logarítmico do dividendo
onde E[d - p] é o dividend yield logarítmico esperado que pode ser simplesmente estimado pela média do dividend yield logarítmico histórico. Portanto, ρ é dependente de tempo e tipicamente próxima da unidade.
A relação de valor presente pode ser obtida resolvendo-se a equação 1, assumindo expectativas condicionais e impondo uma condição de não-bolha no dividend yield, ou seja, lim 𝑗→∞ 𝜌 𝑗 𝑑 𝑡+𝑗 − 𝑝 𝑡+𝑗 =0 . Assim,
Essa equação indica que o dividend yield atual pode ser visto como o valor descontado de todos os retornos 𝑟 𝑡+𝑗+1 e taxas futuras de crescimento de dividendos ∆𝑑 𝑡+𝑗+1 , tanto descontadas quanto em uma taxa constante 𝜌 (menos uma constante 𝑐 1 − 𝜌 ). A equação 3 implica que o dividend yield prevê retornos futuros e/ou o crescimento futuro de dividendos.
Para examinar a previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos pelo dividend yield, utilizamos a representação VAR de primeira ordem dos retornos, crescimento de dividendos e dividend yields, conforme proposto por Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.):
A previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos pode ser avaliada por testes marginais padrão. Entretanto, Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.) destaca que a identidade na equação 1 se aplica a cada ponto de dados, conectando assim os coeficientes de regressão e os erros no sistema VAR (equações 4, 5 e 6). Assim, a projeção da equação 1 em 𝑑 𝑡 − 𝑝 𝑡 implica que os coeficientes de regressão devem obedecer à identidade aproximada
e os erros no VAR estão ligados via 𝜀 𝑡+1 𝑟 = 𝜀 𝑡+1 𝑑 − 𝜌𝜀 𝑡+1 𝑑𝑝 .
Supondo que o processo de dividend yield não seja explosivo, 𝜑 ≤ 1 𝜌 , é impossível haver uma hipótese nula em que tanto os retornos quanto o crescimento de dividendos sejam imprevisíveis. Em outras palavras, supondo a ausência bolhas, se o dividend yield não previr o retorno futuro de ações (crescimento futuro de dividendos), ele deve necessariamente prever o crescimento futuro de dividendos (retorno futuro de ações). Portanto, sob a hipótese nula de não previsibilidade de retornos, 𝑏 𝑟 = 0, o crescimento de dividendos deve ser previsível, ou seja, 𝑏 𝑑 deve ser negativo (nula I). Por outro lado, se o dividend yield não previr o crescimento futuro de dividendos, 𝑏 𝑑 = 0, ele deverá prever os retornos futuros, ou seja, 𝑏 𝑟 deve ser positivo (nula II).
4.2. Suavização de Dividendos
Alguns autores argumentam que uma possível explicação para a imprevisibilidade do crescimento de dividendos são as diretrizes utilizadas pelas empresas com o objetivo de suavizar os dividendos pagos aos acionistas, ou seja, as empresas tendem a determinar o pagamento de dividendos levando em conta os lucros atuais e os pagamentos de dividendos passados, nivelando assim a série temporal de dividendos.
A medida mais utilizada de suavização de dividendos é dada por
The most used dividend smoothness measure is given by
onde 𝜎(∆𝑑) é o DP do crescimento de dividendos e 𝜎(∆𝑒) é o DP do crescimento de lucros. Um valor maior de S significa que a suavização de dividendos é menor.
Para investigar a presença de suavização de dividendos em nossa amostra, aplicamos a mesma estrutura de Chen et al. (2012Chen, L., Da, Z., & Priestley, R. (2012). Dividend smoothing and predictability. Management science, 58(10), 1834-1853.). Essa estrutura inclui quatro modelos: o modelo de ajuste parcial para o comportamento de dividendos proposto por Lintner (1956Lintner, J. (1956). Distribution of incomes of corporations among dividends, retained earnings, and taxes. American Economic Review, 46(2), 97-113.), duas variantes desse modelo introduzidas por Chen et al. (2012), e um quarto modelo proposto por Marsh e Merton (1987Marsh, T. A., & Merton, R. C. (1987). Dividend behavior for the aggregate stock market. Journal of Business, 60(1), 1-40.). O modelo do Lintner e as outras duas variantes mostram a velocidade de ajuste (SA, do inglês speed of adjustment) do pagamento de dividendos a um choque nos lucros da empresa. O primeiro modelo é conforme segue:
onde ∆ 𝐷 𝑡 é a mudança no nível de dividendos, 𝐸 𝑡 é o nível de lucros, e 𝐷 𝑡−1 é o pagamento defasado de dividendos. Nesse modelo, −𝛼 2 é o chamado parâmetro SA. Um choque positivo nos lucros da empresa resulta em um pagamento adicional de dividendos.
O segundo modelo é conforme segue:
onde ∆𝐸 𝑡 é a mudança no nível de lucros e ∆ 𝐷 𝑡−1 é a mudança no pagamento de dividendos defasado em um período. Neste modelo, 1 − 𝛽 2 é o SA, portanto, β2 pode ser interpretado como uma medida da suavização de dividendos.
O terceiro modelo é conforme segue:
Nesse modelo, 𝛾 2 pode ser interpretado como sendo a métrica da suavização de dividendos. Um valor maior de 𝛾 2 significa um pagamento de dividendos mais suavizado.
O quarto modelo, proposto por Marsh e Merton (1987Marsh, T. A., & Merton, R. C. (1987). Dividend behavior for the aggregate stock market. Journal of Business, 60(1), 1-40.) é conforme segue:
onde 𝐷 𝑡+1 é o dividendo do próximo período e 𝑃 𝑡 é o preço em 𝑡. Esse modelo permite capturar a intensidade da resposta dos dividendos a mudança permanentes de lucros. Aqui, 𝜆 1 pode ser interpretado como sendo o a métrica da suavização de dividendos, tal que um maior 𝜆 1 corresponde a menos suavização de dividendos.
4.3. Poder Preditivo Fora da Amostra
Esta subseção descreve o procedimento adotado para gerar previsões e avaliar sua precisão. Utilizamos uma janela expansiva para prever os retornos e as taxas de crescimento de dividendos, com base nas equações 4 e 5, respectivamente. Seguindo Campbell e Thompson (2008Campbell, J. Y., & Thompson, S. B. (2008). Predicting the equity premium out of sample: Can anything beat the historical average? Review of Financial Studies, 21(4), 1509-1531.), o poder preditivo adicional dos modelos em relação à média histórica pode ser medido através do pseudo R² fora da amostra:
e
onde 𝑅 𝑂𝑂𝑆,𝑟 2 e 𝑅 𝑂𝑂𝑆,𝛥𝑑 2 são o pseudo R² para os retornos e taxas de crescimento de dividendos, 𝑡 0 e 𝑇 representam o primeiro e o último ano do período fora da amostra, 𝑟 𝑡−1 e Δ𝑑 𝑡−1 são as previsões baseadas em modelo de retorno e crescimento de dividendos utilizando informações até o momento 𝑡 − 1, e 𝑟 𝑡−1 e Δ𝑑 𝑡−1 são as médias de retorno e crescimento de dividendos utilizando dados até o momento 𝑡 − 1.
Avaliamos se os modelos exibem uma capacidade preditiva mais alta do que a média histórica, utilizando a estatística ajustada de erros quadráticos médios de previsão (EQMP) de Clark e West (2007Clark, T. E., & West, K. D. (2007). Approximately normal tests for equal predictive accuracy in nested models. Journal of Econometrics, 138(1), 291-311.). Esse teste é uma versão modificada aproximadamente normal da estatística EQMP, que os autores demonstram ser subdimensionada. Sua hipótese nula estipula que o EQMP do modelo e o da média histórica são iguais, ao passo que, de acordo com a hipótese alternativa, as previsões do modelo são mais precisas. A forma mais conveniente de implementar esse teste unilateral é calcular
e depois regressar 𝑓 𝑟,𝑡 e 𝑓 𝑟,𝑡 sobre uma constante e utilizar a estatística t resultante para um coeficiente 0. As hipóteses nulas de capacidade preditiva igual são rejeitadas no nível de confiança de 5%, se a estatística t exceder 1,645 (teste unilateral).
5. RESULTADOS EMPÍRICOS
Esta seção apresenta os resultados das estimativas dos modelos apresentados anteriormente. Os sistemas VAR são estimados por mínimos quadrados ordinários (OLS). Observe, no entanto, que os erros de VAR devem ser serialmente não correlacionados, mas podem apresentar correlações cruzadas significativas, portanto, os estimadores de OLS de 𝑏 𝑟 , 𝑏 𝑑 e 𝜑 são consistentes, mas enviesados em amostras pequenas. Assim, nessa estrutura, os testes das hipóteses devem ser realizados utilizando métodos intensivos de cálculo, como a reamostragem bootstrap ou a simulação de Monte Carlo. A Tabela 2 apresenta os resultados das VAR (1), equações 4, 5 e 6, para as amostras gerais dos sete países estudados, utilizando variáveis reais (deflacionadas pela taxa de inflação).
Conforme esperado, o fator de desconto constante (𝜌) é próximo da unidade, variando de 0,958 para o Reino Unido e para a Espanha a 0,973 para o Japão. O coeficiente 𝜑 para a equação do dividend yield é bastante alto, mas abaixo da unidade, variando de 0,698 para a Alemanha a 0,959 para o Japão, mostrando um maior grau de persistência no processo dos dividend yields. Todas as estimativas de 𝜑 são significativas no nível de 1% e a equação do dividend yield apresenta o 𝑅 2 mais elevado para todos os países. Em termos absolutos, esses coeficientes de determinação são elevados, exceto para a Espanha, onde o 𝑅 2 =0,008. Os coeficientes para as equações de retornos e crescimento de dividendos, isto é, 𝑏 𝑟 e 𝑏 𝑑 , apresentam os sinais esperados, exceto para França, onde 𝑏 𝑑 > 0, e para a Itália, onde 𝑏 𝑟 < 0. A proporção da variabilidade do crescimento de dividendos de um período à frente explicada pelo dividend yield é apenas ligeiramente inferior à proporção correspondente para os retornos de um período à frente para o Reino Unido, Japão e França. Portanto, há evidências de que o crescimento de dividendos é mais previsível pelo dividend yield do que os retornos apenas para EUA, Alemanha e Itália.
A coluna denominada Pm na Tabela 2 exibe os valores p correspondentes à hipótese nula de não previsibilidade de retornos e não previsibilidade de crescimento de dividendos, com base em um único parâmetro, enquanto a Pc apresenta os resultados do teste conjunto de Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.). O teste tradicional (Pm) revela que os retornos são previsíveis apenas no Reino Unido e na França, o que corrobora os achados de Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.) de que esse teste carece de poder para detectar a previsibilidade dos retornos. O teste conjunto é capaz de rejeitar a hipótese nula de não previsibilidade, no nível de significância de 5% para todos os países, exceto Japão e Itália. Com relação ao crescimento de dividendos, o teste de parâmetro único rejeita a hipótese nula para EUA, Alemanha, Itália e Espanha. De acordo com o teste conjunto, essa hipótese é rejeitada para mais um país: o Japão.
As colunas 8 a 10, denominadas como “Corr. de resíduos”, apresentam o DP dos resíduos na diagonal e as correlações cruzadas fora da diagonal. O DP dos retornos varia de 0,18 para os EUA a 0,46 para a França. O DP de retornos extraordinariamente elevado para a França pode ser explicado pelo período turbulento durante a Segunda Guerra Mundial. Os resíduos da equação de crescimento de dividendos mostram um padrão semelhante: são mais altos na França e no Japão do que nos demais países. Os erros para as equações de retornos e dividend yield são negativamente correlacionados para todos os países, mas os valores absolutos das correlações para o Japão e a França são consideravelmente mais baixos que os dos demais países. Isto é importante porque a correlação negativa entre esses erros gera uma correlação negativa entre as estimativas 𝑏 𝑟 e 𝜑, o que aumenta o poder do teste conjunto em relação ao teste marginal unilateral. Os erros de retornos e crescimento de dividendos estão positivamente correlacionados para todos os países, exceto França e Espanha. Esse fenômeno e o inesperado coeficiente na equação de crescimento de dividendos podem ser vistos como “sinais de alerta” no caso da França.
A falta de previsibilidade dos retornos e do crescimento de dividendos pode ser atribuída a práticas de suavização de dividendos e recompra de ações, conforme apontado por Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.), entre outros. Ou seja, se os preços mudarem hoje em resposta a notícias de dividendos vários anos à frente, essas informações não seriam capturadas pelo VAR de 1 ano apresentado nas equações 4, 5 e 6, porque tais notícias não seriam refletidas nos dividendos do ano seguinte. Para lidar com esse problema, testamos se os retornos e taxas de crescimento de dividendos em horizonte longo podem ser previstos com base no dividend yield. Esses resultados são apresentados nas tabelas 3 e 4, respectivamente. Essas tabelas também apresentam os resultados para as duas subamostras, ou seja, pré e pós-Segunda Guerra Mundial.
Na amostra completa, os retornos são previsíveis para todos os horizontes temporais nos EUA e no Reino Unido e imprevisíveis no Japão e na Itália. Para os demais países, a evidência é mista: a hipótese nula de não previsibilidade é rejeitada na Espanha (um ano), na França (um e cinco anos) e na Alemanha (um, cinco e 20 anos). Na análise das subamostras, há evidências de um aumento na previsibilidade para os EUA e o Reino Unido no período pós-Segunda Guerra Mundial, enquanto a França exibe o padrão inverso. Para o Japão, os retornos são imprevisíveis nos dois sub-períodos.
Em relação à previsibilidade do crescimento de dividendos, a Tabela 4 revela que está presente na Espanha em todos os horizontes temporais e completamente ausente no Japão e na França. Os dividendos são previsíveis em horizontes temporais de até 10 anos nos EUA, em um, dois, cinco e 20 anos na Itália, e apenas em um ano no Reino Unido e na Alemanha. Na análise das subamostras, podemos observar uma diminuição na previsibilidade do crescimento de dividendos para os EUA e para o Reino Unido no período pós-Segunda Guerra Mundial e não há tendência discernível na capacidade de prever dividendos na França e no Japão.
Em suma, não podemos concluir que os testes de longo horizonte proporcionem um aumento impressionante de poder em relação aos testes de um ano. Isso está em desacordo com Cochrane (2008Cochrane, J. H. (2008). The dog that did not bark: A defense of return predictability. Review of Financial Studies, 21(4), 1533-1575.), que mostra que há um aumento significativo de poder se o horizonte de tempo for estendido para além de 15 anos.
A seguir, discutimos os resultados das várias medidas de suavização de dividendos apresentadas na seção 4.2. Também analisamos a conexão entre essas medidas e os resultados de previsibilidade. Observe que, se os dividendos forem fortemente suavizados, a ligação entre dividend yield e crescimento de dividendos será quebrada. Assim, o crescimento de dividendos não será previsível e 𝑏 𝑑 tenderá a 0. A suavização de dividendos também aumenta a autocorrelação do dividend yield (𝜑), o que torna seu efeito na previsibilidade dos retornos ( 𝑏 𝑟 ) ambíguo (ver a equação 7).
A Tabela 5 apresenta os modelos estimados do comportamento de dividendos mencionados na última seção e o parâmetro de suavização. Os modelos são estimados utilizando OLS com erros padrão corrigidos de Newey-West. Tivemos de excluir a Alemanha devido à falta de dados.
A primeira parte dessa tabela revela que os dividendos se tornaram mais estáveis nos EUA após a Segunda Guerra Mundial, de acordo com todas as medidas consideradas: a volatilidade dos dividendos em relação aos lucros diminuiu de 0,525 para 0,234, a SA diminuiu para os modelos Lintner, Chen-Da-Priestley 1 e Marsh-Merton, e o parâmetro de suavização aumentou de 0,249 para 0,374 para Chen-Da-Priestley 2. Comparando esses resultados com a Tabela 4, concluímos que, conforme esperado, mais suavização de dividendos implica em menos previsibilidade de dividendos, corroborando Chen et al. (2012Chen, L., Da, Z., & Priestley, R. (2012). Dividend smoothing and predictability. Management science, 58(10), 1834-1853.).
Na comparação entre países, optamos por focar nos valores pós-Segunda Guerra Mundial para os EUA e o Reino Unido, uma vez que, para os demais países, nossos dados não cobrem o período anterior à guerra.
A primeira coluna da Tabela 5 mostra a volatilidade do crescimento de dividendos em relação à volatilidade do crescimento dos lucros. Por essa medida, os dividendos são os mais estáveis nos EUA (0,234) e os mais voláteis na Espanha (0,968). Um aspecto notável é que a volatilidade de dividendos na Espanha é mais do que o dobro da volatilidade de dividendos em todos os outros países. Esses resultados corroboram Rangvid et al. (2014Rangvid, J., Schmeling, M., & Schrimpf, A. (2014). Dividend predictability around the world. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 49(5-6), 1255-1277.), que concluíram que os dividendos são mais estáveis em mercados maiores, e Renneboog e Trojanowski (2007Renneboog, L., & Trojanowski, G. (2007). Control structures and payout policy. Managerial Finance, 33(1), 43-64.) e Denis e Osobov (2008Denis, D. J., & Osobov, I. (2008). Why do firms pay dividends? International evidence on the determinants of dividend policy. Journal of Financial economics, 89(1), 62-82.), que mostraram que os dividendos são mais suaves nos EUA do que na França, na Alemanha e no Japão.
A SA nos modelos Lintner e Chen-Da-Priestley 1 avalia a rapidez com que as empresas ajustam seus dividendos em resposta a um choque nos lucros. Em Lintner, a SA para a Itália é a mais rápida (0,276), seguida pelo Japão e pela França (0,181), e para os EUA é a mais lenta (0,102). Conforme Chen-Da-Priestley 1, os dividendos são mais persistentes nos EUA e no Reino Unido do que nos outros países. Curiosamente, as empresas francesas e espanholas aumentam seus dividendos, após um choque positivo nos lucros, em mais de 100% do aumento de dividendos de longo prazo implicado na meta de proporção de dividendos.
Para Chen-Da-Priestley 2, o coeficiente da variação defasada dos dividendos é positivo e altamente significativo para os EUA e para o Reino Unido, o que indica que as empresas nesses países praticam uma forte suavização de dividendos. Inesperadamente, no Japão, na França e na Espanha, esse coeficiente é negativo, mas não é significativamente diferente de 0 no nível de significância de 5%.
O coeficiente 𝜆 1 , no modelo de Marsh-Merton, captura a resposta dos dividendos a mudanças permanentes nos lucros. As empresas dos EUA e do Reino Unido são as mais lentas a reagir a um choque nos lucros, como na maioria dos outros modelos, enquanto as empresas francesas são as mais rápidas.
No geral, as diferentes medidas de suavização de dividendos mostram alguma consistência, pois todas classificam os EUA e o Reino Unido entre os países onde a persistência de dividendos é mais forte. No entanto, há alguma incoerência para os demais países. A Espanha apresenta a maior volatilidade de dividendos e a menor suavização de dividendos, conforme Chen-Da-Priestley 2, mas Lintner mostra que este é o segundo país que mais suaviza os dividendos. Para a França, os modelos Chen-Da-Priestley 1 e Marsh-Merton a colocam como o país que menos pratica a suavização de dividendos, mas sua volatilidade de dividendos é a segunda mais baixa.
Esses resultados apóiam a hipótese de que o crescimento de dividendos é imprevisível em países onde as empresas suavizam seus dividendos. O crescimento de dividendos é imprevisível após a Segunda Guerra Mundial nos EUA, enquanto, no Reino Unido, é previsível apenas no horizonte de um ano. No entanto, os dividendos são fortemente previsíveis na Espanha e na Itália, e imprevisíveis na França e no Japão, embora estes países apresentem um grau semelhante de suavização de dividendos.
Nossos resultados sobre a precisão das previsões de retornos e de crescimento de dividendos abrangem o período de 1900 a 2016 para os EUA e França, 1946 a 2016 para o Reino Unido e o Japão, e 1981 a 2016 para a Alemanha. O curto período de dados disponível para Espanha e Itália impede a realização de uma análise fora da amostra para esses países.
As figuras 2 e 3 exibem as diferenças entre os erros cumulativos de previsão com base nas médias históricas e nos modelos, para os retornos e as taxas de crescimento de dividendos, respectivamente.
Diferença entre os erros quadráticos cumulativos de previsão com base na média histórica e no modelo para os retornos
Diferença entre os erros quadráticos cumulativos de previsão com base na média histórica e no modelo para o crescimento de dividendos
Os segmentos das linhas que apresentam curvas crescentes (decrescentes) devem ser interpretados como períodos em que os modelos superam as (ficam aquém das) médias históricas. Os retornos são altamente previsíveis no Japão, após a Segunda Guerra Mundial até o final dos anos 1950, mas, depois, o desempenho do modelo parece muito ruim. Há também alguma evidência de previsibilidade de retornos na França após a Segunda Guerra Mundial e no Reino Unido em meados dos anos 1970. A Figura 3 revela que a taxa de crescimento de dividendos era previsível nos EUA durante a primeira metade do século XX, no Japão após a Segunda Guerra Mundial e na Alemanha durante a maior parte do período considerado.
A Tabela 6 apresenta o pseudo R² fora da amostra e sua significância de acordo com a estatística ajustada pelo EQMP.
A Tabela 6 mostra que o pseudo R² é positivo para as previsões de retorno no Reino Unido (significativas no nível de 5%) no período completo fora da amostra. Também é positivo e significativo no nível de 1%, para as previsões de crescimento de dividendos nos EUA e na Alemanha. Durante o primeiro sub-período, o pseudo R² é positivo apenas para a previsibilidade do crescimento de dividendos nos EUA. O sub-período após a Segunda Guerra Mundial mostra evidências de previsibilidade de retornos em vários países. O pseudo R² é positivo no Reino Unido, nos EUA e na França, e é estatisticamente significativo nos níveis de 1 e 5% nos últimos dois países, respectivamente. No último período compreendido entre 1981 e 2016, a previsibilidade parece quase ausente. A única exceção é a taxa de crescimento de dividendos na Alemanha, que possui um pseudo R² positivo e altamente significativo.
6. CONCLUSÃO
A literatura financeira afirma que a variação do dividend yield pode ser explicada por notícias sobre retornos futuros e dividendos futuros, o que significa que é possível determinar a origem dos movimentos dos preços a partir das notícias visíveis sobre dividendos ou fluxos de caixa. No presente estudo, confirmamos alguns dos resultados altamente reproduzidos para os EUA. Na verdade, para o agregado do mercado de ações dos EUA, os retornos futuros esperados representam a maior parte da variação observada nos dividend yields.
Estendemos a análise de estudos anteriores considerando seis países adicionais que, juntamente com os EUA, representam cerca de 85% do Morgan Stanley Capital International (MSCI) World Index. Nossos resultados para o período pós-Segunda Guerra Mundial revelam que os retornos são previsíveis nos EUA e no Reino Unido, mas os dividendos são imprevisíveis, enquanto o padrão oposto é observado na Espanha e na Itália. Na Alemanha, há evidências de previsibilidade no curto prazo tanto para ao retornos quanto para os dividendos, enquanto na França apenas os retornos são previsíveis. No Japão, nenhuma das variáveis pode ser prevista.
Os resultados da suavização de dividendos mostram que os dividendos são mais persistentes nos EUA e no Reino Unido do que nos demais países. As várias medidas de volatilidade de dividendos não oferecem uma classificação consistente para Japão, França, Itália e Espanha (a Alemanha foi excluída da análise devido à falta de dados). No entanto, apresentamos suporte moderado à hipótese de que a previsibilidade de dividendos é mais baixa nos países onde os dividendos são fortemente suavizados, uma vez que não há previsibilidade de dividendos nos EUA e no Reino Unido, onde a suavização de dividendos é a mais forte, mas não podemos estabelecer uma conexão clara entre volatilidade e previsibilidade de dividendos para os outros países.
As comparações entre países, no tocante a medidas de suavização de dividendos, devem ser conduzidas com cautela. Diferentes padrões contábeis entre os países podem comprometer a comparabilidade dos lucros, o que adiciona ruído aos nossos estimadores de persistência de dividendos. Além disso, deve-se ressaltar que nosso banco de dados não cobre o mesmo período de tempo em diferentes países. No entanto, nosso estudo oferece novas percepções sobre a análise entre países envolvendo a relação entre suavização e previsibilidade de dividendos, e abre as portas para novas pesquisas que, utilizando dados mais abrangentes ou métodos mais sofisticados, possam confirmá-las ou refutá-las.
Uma conclusão importante a se reter da análise fora da amostra é que a previsibilidade dos retornos após a Segunda Guerra Mundial, especialmente presente nos EUA, pareceu estar ausente nas últimas três décadas, provavelmente devido à turbulência sofrida pelos mercados de ações durante este último período.
De maneira geral, os resultados mostram que, mesmo para os mercados de capitais desenvolvidos, não há um padrão claro para a capacidade preditiva dos dividend yields sobre os retornos das ações e o crescimento de dividendos; em vez disso, tais relações parecem ser dependentes do tempo e específicas de cada país.
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Editado por
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
10 Jul 2020 -
Data do Fascículo
Sep-Dec 2020
Histórico
-
Recebido
20 Mar 2019 -
Revisado
02 Maio 2019 -
Aceito
24 Jan 2020