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Importância da determinação da hemoglobina glicada no monitoramento do paciente portador de diabetes mellitus

EDITORIAL EDITORIAL

Importância da determinação da hemoglobina glicada no monitoramento do paciente portador de diabetes mellitus

Está bem estabelecido que, no paciente portador de diabetes mellitus (DM), os níveis de glicose no sangue, persistentemente elevados, são extremamente tóxicos ao organismo. O descontrole permanente resulta, no decorrer dos anos, numa série de complicações, incluindo danos em diversos tecidos, perda da função normal e falência de vários órgãos.

A hemoglobina glicada, também conhecida como A1c, embora seja utilizada desde 1958 como uma ferramenta de avaliação do controle glicêmico em pacientes portadores de diabetes, passou a ser cada vez mais empregada e aceita pela comunidade científica após 1993, depois de ter sido validada pelos dois estudos clínicos mais importantes sobre a avaliação do impacto do controle glicêmico sobre as complicações crônicas do diabetes: o Diabetes Control and Complications Trial (DCCT), de 1993, e o United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS), de 1998. Essas pesquisas demonstraram que manter o nível de A1c abaixo de 7% no paciente diabético reduz significativamente o risco de desenvolvimento de complicações típicas dessa doença.

No Brasil, o Grupo Interdisciplinar de Padronização da Hemoglobina Glicada – A1c publicou um documento de posicionamento oficial acerca da importância da A1c para a avaliação do controle glicêmico em pacientes com DM, no ano de 2004, abordando os principais aspectos clínicos e laboratoriais relacionados a esse parâmetro laboratorial, incluindo condições de variação pré-analítica e analítica.

Foram estabelecidas as recomendações acerca da utilidade do teste e os valores ideais de controle para adultos, crianças e idosos.

Segundo esse posicionamento, os testes de A1c necessitam ser realizados, pelo menos, duas vezes ao ano para todos os pacientes, porém, quando esses não conseguem atingir um controle adequado, a recomendação é fazê-los de três em três meses. A dosagem de A1c está indicada tanto para os portadores de diabetes tipo 1 como para os de tipo 2, sendo que a meta a ser atingida para o efetivo controle, em ambas as condições, é abaixo de 7%, tanto no adulto como no adulto jovem.

Nas crianças, durante a fase pré-puberal, o nível aceitável de A1c é de até 8% e, na fase puberal, inferior a 8,5%.

Nos pacientes idosos, um nível de A1c de até 8% é apropriado. A tentativa de um controle rígido da glicemia nessa faixa etária, assim como nas fases pré-puberal e puberal, pode induzir a efeitos colaterais indesejados, como, por exemplo, episódios importantes de hipoglicemia.

Na gravidez, o acompanhamento da paciente pela dosagem de A1c não está indicado. Nessa situação é muito mais eficiente um controle rigoroso dos níveis das glicemias de jejum e duas horas após as refeições e a frutosamina. O acompanhamento pré-natal é fundamental para minimizar os riscos de complicações como macrossomia e, principalmente, aborto espontâneo.

Os níveis de A1c, diferentemente da glicemia, não retornam ao normal imediatamente após a normalização da glicose no sangue. O intervalo para que a A1c atinja os níveis desejados após um episódio de descontrole é de aproximadamente dez semanas. Assim sendo, a repetição do exame de A1c para avaliar a eficácia de um tratamento deve ser realizada somente dois a três meses após o início ou a modificação do tratamento. Antes disso, os níveis de A1c praticamente não fornecerão informações úteis.

Em relação aos aspectos analíticos, algumas situações clínicas podem ser responsáveis por interferências na análise da hemoglobina glicada. As doenças que alteram a sobrevida das hemácias, como anemia hemolítica e hemorragia, por reduzirem a vida média das hemácias, podem resultar em valores falsamente baixos. A anemia por carência de ferro, vitamina B12 ou folato, que aumentam a vida média das hemácias, por sua vez, resulta em valores falsamente elevados. Outras condições clínicas que podem interferir no resultado de A1c são: hipertrigliceridemia, hiperbilirrubinemia, uremia, alcoolismo crônico, uso crônico de opiáceos ou salicilatos, na dependência da metodologia utilizada.

O posicionamento oficial recomenda que os laboratórios utilizem os métodos rastreáveis ao DCCT, conforme certificado pelo National Glycohemoglobin Standardization Program (NGSP), bem como estimula a participação ativa e regular em um programa de ensaios de proficiência específico para hemoglobina glicada. Esse documento foi criado visando a difusão dos conhecimentos clínicos e laboratoriais, de maneira simplificada, sobre esse importante exame laboratorial. A leitura desse documento certamente complementará o entendimento dos profissionais, tanto da área clínica quanto da laboratorial, acerca do tema. O arquivo completo poderá ser extraído do sítio da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML). Boa leitura!

Nairo Massakazu Sumita

Professor-assistente doutor da disciplina de Patologia Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP); diretor do Serviço de Bioquímica Clínica da Divisão de Laboratório Central do Hospital das Clínicas da FMUSP; coordenador médico do Serviço de Química Clínica do Departamento de Patologia Clínica do Hospital Israelita Albert Einstein

Adagmar Andriolo

Professor livre-docente de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/UNIFESP); assessor médico do Fleury – Centro de Medicina Diagnóstica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2006
  • Data do Fascículo
    Jun 2006
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