Acessibilidade / Reportar erro

Linfoepitelioma maligno de glândula submandibular: uma entidade rara

carcinoma; glândula submandibular; radioterapia

CASE REPORT

Linfoepitelioma maligno de glândula submandibular: uma entidade rara

Francisco Júlio Muniz NetoI; José Alberto Alves OliveiraII; Conceição Aparecida Machado de Souza CamposIII; Luis Alberto Albano FerreiraIV

IEnsino Superior, Acadêmico do quinto ano do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Ceará

IIEnsino Superior, Acadêmico do quinto ano do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Ceará. Bolsista de iniciação científica da FUNCAP

IIIPós-graduação, Médica Staff do serviço de Radioterapia do Instituto do Câncer do Ceará/ Hospital do Câncer do Ceará. Mestranda do programa Dinter-Minter

IVPós-Graduação, Médico-cirurgião do Hospital Walter Cantídio/Universidade Federal do Ceará e do Hospital Infantil Albert Sabin/ Secretaria de Saúde do Estado do Ceará

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Serviço de Radioterapia do Instituto do Câncer do Ceará Rua Papi Júnior 1222 Rodolfo Teófilo 60.430-230 Fortaleza CE Brasil

Palavras-chave: carcinoma, glândula submandibular, radioterapia.

INTRODUÇÃO

Os tumores das glândulas salivares são relativamente raros, constituindo cerca de 3 a 4% de todos os tumores da região cérvico-facial. A lesão maligna linfoepitelioma (MLEL) é considerada uma das variedades do tipo planocelular, encontrando-se intensa infiltração linfóide em seu estroma fibroso. Em relação à incidência global do MLEL, há uma predominância feminina, na proporção de 3:2 em relação ao sexo masculino; no entanto, entre os pacientes chineses, o tumor é mais prevalente em homens1.

O MLEL envolve apenas as grandes glândulas salivares, mais frequentemente a parótida; cerca de 15% dos casos ocorrem na glândula submandibular1. A patogênese tem sido atribuída ao vírus Epstein Barr (EBV), em decorrência da detecção de oncoproteínas virais em cultura de células tumorais. Uma vez ocorrida a infecção, o vírus permanece por um longo período de tempo com baixo grau de atividade nos ductos salivares epiteliais e em estado latente nos linfócitos B2.

O EBV está ligado a diversas neoplasias epiteliais, particularmente os carcinomas de nasofaringe indiferenciados (NPC). Recentes estudos indicam também forte associação da expressão do EBV e o MLEL das glândulas salivares em taiwaneses, chineses do sul da China e esquimós3.

Pacientes com MLEL são aparentemente mais propensos a metástases regionais e a distância. Esquimós têm 30% a 50% de incidência de metástases regionais, ao passo que asiáticos tem 10% de incidência1.

APRESENTAÇÃO DO CASO

Paciente feminina, 75 anos de idade, branca, com historia de aparecimento de nódulo submandibular direito em outubro de 2006. Procurou avaliação médica, sendo solicitada ultrassonografia e PAAF. Com resultado negativo para células neoplásicas na PAAF, foi submetida à ressecção limitada da glândula salivar direita em dezembro de 2006.

Em janeiro de 2007, foi encaminhada a um centro de referência oncológica com o diagnóstico histológico da peça cirúrgica de carcinoma indiferenciado tipo linfoepitelioma de glandular submandibular. Ao exame locorregional encontrou-se cicatriz cirúrgica em região submandibular direita, sem nódulos cervicais palpáveis e com oroscopia e nasofibroscopia normais. A revisão de lâminas confirmou o diagnóstico prévio. A imunoistoquímica foi compatível com carcinoma linfoepitelial WHO (citoqueratinas 40, 48, 50 e 50,6 kDa positivas). Procedeu-se a realização de tomografia computadorizada de face e pescoço, a qual não demonstrou presença de linfonodomegalias ou lesões em rinofaringe.

Optou-se, inicialmente, por radioterapia de elétrons em campo direito englobando todo o leito operatório e o primeiro escalão de drenagem, com colimações de alloy. A dose inicial de 5000 cGy, 12 MeV, 25 frações, 5 frações por semana foi seguida por reforço de 1000 cGy em 5 frações, completando 6000cGy durante o período de 23/02/07 a 13/04/07.

A paciente permanece sem evidência de recidivas locorregionais e sem fibrose da área irradiada. O exame de imagem de controle evidencia a ausência da glândula submandibular direita (Figura 1).


DISCUSSÃO

A nasofaringe, as glândulas salivares e o timo representam estruturas todas derivadas da faringe primitiva. Os carcinomas indiferenciados que ocorrem nesses sítios são histologicamente indistinguíveis1. Assim, esse tumor torna-se indiscernível dos carcinomas de nasofaringe (NPC).

É importante diferenciar um MLEL de metástases do NPC para a glândula salivar. Em casos de diagnóstico errôneo, mesmo que haja a realização de radioterapia adjuvante na glândula salivar, o tumor de nasofaringe não receberá a dose terapêutica apropriada. Assim, para que o diagnóstico de MLEL de glândula salivar possa ser estabelecido com absoluta certeza, a cuidadosa nasofibroscopia do completo trato respiratório superior e a análise de biopsias aleatórias da nasofaringe devem ser executadas a fim de descartar doença metastática1.

Os tumores MLEL podem ser infiltrativos com margens indistintas, parcialmente circunscritos ou multinodulares. As metástases regionais ocorrem primeiramente ao redor da parótida, região cervical superior, linfonodos retroauriculares e mais tardiamente nos linfonodos supraclaviculares e paratraqueais1. A tomografia computadorizada (base de crânio e nasofaringe) deve ser realizada para o diagnóstico, estadiamento e acompanhamento terapêutico. A ressonância magnética avalia melhor a recorrência e o acometimento de partes moles4.

Em decorrência do comportamento maligno do linfoepitelioma e da alta taxa de metástase para os linfonodos do pescoço nos estágios iniciais (estágios I e II), sugere-se a necessidade de dissecção do pescoço5. Estudos também demonstram que adequada excisão cirúrgica com margens livres é mandatória.

A excisão do tumor com margens amplas, a dissecção do pescoço e radioterapia e quimioterapia combinada no pós-operatório são essenciais para tratar MLEL em pacientes nos estágios avançados da doença (estágios III e IV). Para pacientes nos estágios iniciais da doença (estágios I e II), a excisão do tumor com dissecção cervical e a radioterapia no pós-operatório são fundamentais. Em pacientes com recorrência tumoral local ou regional, recomenda-se a cirurgia e a quimioterapia de resgate. Assim, ao determinar o tratamento, os cirurgiões devem sempre avaliar o estágio do tumor e se há evidencias clinicas de doença no pescoço5.

COMENTÁRIOS FINAIS

Enfatiza-se que, devido à alta taxa de recorrência e metástase do MLEL, o tratamento ideal deve ser agressivo, incluindo extensa ressecção com margens livres do tumor, dissecção das metástases nodais do pescoço e radioterapia com elétrons ou radioterapia e quimioterapia adjuvantes em casos de metástases à distancia.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 12 de março de 2009. cod. 6813

Artigo aceito em 1 de fevereiro de 2010.

Trabalho realizado no serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e de Radioterapia do Instituto do Câncer do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.

  • 1. Saw D, Lau WH, Ho JH. Malignant lymphoepithelial lesion of the salivary gland. Hum Pathol. 1986;17:914-23.
  • 2. Lanier AP, Clift SR, Bornkamm G. Epstein-Barr virus and malignant lymphoepithelial lesions of the salivary gland. Arctic Med Res. 1991;50:55-61
  • 3. Tsai CC, Chen CL, Hsu HC. Expression of Epstein-Barr virus in carcinomas of major salivary glands: A strong association with lymphoepithelioma-like carcinoma. Hum Pathol. 1996;27:258-62
  • 4. Yao-Chung Hsu, Hsiao-Feng Lu, Chao-Cheng Huang, Ruey-Fen Hsu, Chih-Ying Su. Malignant lymphoepithelial lesions of the salivary gland.Otolaryngology - Head and Neck Surgery. 2006; 134: 661-6
  • 5. W.B.Povah, W.Beecroft and I.Hodson. Malignant lymphoepithelial lesion the Manitoba experience. J Otolaryngol. 1984; 113:153-9.
  • Endereço para correspondência:

    Serviço de Radioterapia do Instituto do Câncer do Ceará
    Rua Papi Júnior 1222 Rodolfo Teófilo
    60.430-230 Fortaleza CE Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Aceito
      01 Fev 2010
    • Recebido
      12 Mar 2009
    Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Sede da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial, Av. Indianópolia, 1287, 04063-002 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (0xx11) 5053-7500, Fax: (0xx11) 5053-7512 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@aborlccf.org.br