Resumos
A artrite pode afetar a laringe com rouquidão e fadiga vocal. OBJETIVO: Avaliar as manifestações laríngeas da artrite reumatoide. MÉTODOS: Estudo prospectivo de 27 pacientes com artrite reumatoide por meio de videolaringoestroboscopia, avaliação perceptivo-auditiva da voz por meio da escala GIRBAS, análise acústica e questionário do Índice de desvantagem vocal. RESULTADOS: Queixas laríngeas foram descritas por 19 pacientes, principalmente disfonia intermitente e sensação de corpo estranho na garganta. O achado laringoscópico mais frequente foi o cavalgamento das aritenoides. Três pacientes apresentaram pitch considerada grave. Nove tiveram o grau de disfonia e rugosidade discretos. As medianas das medidas acústicas foram: F0, 198,39 Hz; Jitter, 0,815; Shimmer, 4,915; e NHR, 0,144. Em relação ao índice de desvantagem vocal, a mediana foi zero para todos os domínios. Existiu significância estatística relacionando a queixa vocal com todos os domínios desse índice. A classe funcional teve relação estatisticamente significante com: cavalgamento de aritenoides (p = 0,001), PPQ (p = 0,0257), Shimmer (p = 0,0295), APQ (p = 0,0195) e com o domínio físico e total do IDV (p = 0,0227 e p = 0,0425). CONCLUSÃO: Queixa laríngea foi referida por 70,4% dos pacientes e alterações laringoscópicas foram verificadas em 48%. A avaliação acústica da voz e a autopercepção mostraram-se alterados.
artrite reumatóide; laringe; laringoscopia; voz
Arthritis may affect the larynx and produce symptoms such as hoarseness and vocal fatigue. OBJECTIVE: This paper aimed to evaluate the laryngeal manifestations of rheumatoid arthritis. METHODS: This is prospective study assessed 27 patients with rheumatoid arthritis with the aid of videolaryngostroboscopy, auditory-perceptual analysis of the speech using the GIRBAS scale, acoustic analysis and the Voice Handicap Index questionnaire. RESULTS: Nineteen patients had laryngeal complaints, the main ones being intermittent dysphonia and sensation of a foreign body in the throat. The most frequent laryngoscopical finding was overlapping arytenoids. Three patients had low pitch, nine patients had mild dysphonia and roughness. Median acoustic measures were: F0, 198.39 Hz; Jitter, 0.815; Shimmer, 4.915; and NHR, 0.144. Regarding the Voice Handicap Index, the median score was zero in all domains. There was a statistically significant correlation between voice complaints and the domains of this index. Functional classes were significantly correlated to: overlapping arytenoids (p = 0.001), PPQ (p = 0.0257), Shimmer (p = 0.0295), APQ (p = 0.0195), and the VHI physical (p = 0.0227) and total domains (p = 0.0425). CONCLUSION: Laryngeal complaints were reported by 70.4% of the patients and laryngoscopical alterations were observed in 48% of the subjects. Voice acoustic evaluation and self-perception were altered.
arthritis, rheumatoid; laryngoscopy; larynx; voice
ORIGINAL ARTICLE
Videolaringoestroboscopia e avaliação vocal em pacientes portadores de artrite reumatoide
Mario Augusto Ferrari de CastroI; Rogério Aparecido DedivitisII; Elio Gilberto Pfuetzenreiter JúniorIII; Ana Paula Brandão BarrosIV; Débora dos Santos QueijaV
IMestre pela Fundação Lusíada - Santos (Cirurgião Assistente do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Santa Casa da Misericpordia de Santos, Hospital Ana Costa. Professor da Faculdade de Medicina da Fundação Lusíada)
IIProfessor Livre-Docente. Supervisor do Grupo de Laringe do Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Médico)
IIIMestre pelo Hospital Heliópolis - São Paulo. (Cirurgião de Cabeça e Pescoço Hospital Santo Amaro - Guarujá e Prefeitura de São Vicente)
IVDoutora - Universidade de São Paulo. (Fonoaudióloga Serviço de Fonoaudiologia Hospital Ana Costa - Santos e Hospital Heliópolis - São Paulo)
VMestre - Hospital Heliópolis - São Paulo (Fonoaudióloga - Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço Santa Casa da Misericórdioa de Santos e Hospital Ana Costa - Santos)
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Mario Augusto Ferrari de Castro Rua Dr. Olinto Rodrigues Dantas, nº 343 conj. 92 Santos - SP. Brasil. CEP: 11050-220 E-mail: mafc@uol.com.br
RESUMO
A artrite pode afetar a laringe com rouquidão e fadiga vocal.
OBJETIVO: Avaliar as manifestações laríngeas da artrite reumatoide.
MÉTODOS: Estudo prospectivo de 27 pacientes com artrite reumatoide por meio de videolaringoestroboscopia, avaliação perceptivo-auditiva da voz por meio da escala GIRBAS, análise acústica e questionário do Índice de desvantagem vocal.
RESULTADOS: Queixas laríngeas foram descritas por 19 pacientes, principalmente disfonia intermitente e sensação de corpo estranho na garganta. O achado laringoscópico mais frequente foi o cavalgamento das aritenoides. Três pacientes apresentaram pitch considerada grave. Nove tiveram o grau de disfonia e rugosidade discretos. As medianas das medidas acústicas foram: F0, 198,39 Hz; Jitter, 0,815; Shimmer, 4,915; e NHR, 0,144. Em relação ao índice de desvantagem vocal, a mediana foi zero para todos os domínios. Existiu significância estatística relacionando a queixa vocal com todos os domínios desse índice. A classe funcional teve relação estatisticamente significante com: cavalgamento de aritenoides (p = 0,001), PPQ (p = 0,0257), Shimmer (p = 0,0295), APQ (p = 0,0195) e com o domínio físico e total do IDV (p = 0,0227 e p = 0,0425).
CONCLUSÃO: Queixa laríngea foi referida por 70,4% dos pacientes e alterações laringoscópicas foram verificadas em 48%. A avaliação acústica da voz e a autopercepção mostraram-se alterados.
Palavras-chave: artrite reumatóide, laringe, laringoscopia, voz.
INTRODUÇÃO
Desde o trabalho de Mackenzie, em 18941, verificou-se que o reumatismo pode acometer a laringe, com rouquidão e fadiga vocal, apresentando, às vezes, grave obstrução da glote. Nesse sentido, acreditava-se que a anquilose da articulação cricoaritenoide (ACA) fosse uma afecção muito mais comum do que geralmente é suposto2.
A artrite reumatoide (AR) pode causar grandes distorções e anquilose na ACA. Dentre os mecanismos que podem restringir a função da articulação, o principal é a fixação da prega vocal unilateral ou bilateral pela anquilose consequente da AR. O exame de laringe pode nada revelar, mas deverá ser realizado para determinar se há ou não envolvimento das ACAs nos casos de AR3. Foram descritos como sinais: hiperemia e edema da mucosa que recobre a ACA; a ACA pode tornar-se desorganizada e a articulação anquilosada em uma posição deformada; e a fixação de uma ou ambas as pregas vocais pode ocorrer na posição mediana4.
Esses pacientes podem apresentar alteração na análise acústica da voz (perturbação na amplitude), fato este relacionado à presença de nódulos reumáticos e edema nas pregas vocais5.
A prevalência de disfonia em pacientes com artrite reumatoide varia de 12% a 27%6. Quanto mais ativa encontra-se a artrite reumatoide, maior é o índice de desvantagem vocal (IDV) apresentado pelos pacientes7.
O objetivo foi avaliar as alterações laríngeas decorrentes da AR por meio da videolaringoestroboscopia, bem como as alterações da voz por meio da avaliação perceptivo-auditiva, acústica e autopercepção da desvantagem vocal.
MÉTODO
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, sob o número de protocolo no CEP - 024/2009.
Foi realizado um estudo prospectivo por meio da avaliação de 27 pacientes portadoras de artrite reumatoide no período de janeiro a agosto de 2010. As pacientes foram recrutadas consecutivamente no ambulatório de reumatologia da instituição.
A amostra constituiu-se de 27 pacientes do gênero feminino, sendo que 23 eram caucasianas e quatro não caucasianas. A idade variou de 33 a 76 anos, somente uma era tabagista crônica importante. Quanto ao fator reumatoide sérico, foi positivo em todas as pacientes em algum momento da doença. A Tabela 1 mostra as características das pacientes.
Os critérios revisados pelo ACR-91 para classificação do estado funcional da artrite reumatoide são: Classe I - completamente capaz de realizar atividades rotineiras (cuidados pessoais usuais, atividades ocupacionais e não ocupacionais); Classe II - capaz de realizar cuidados pessoais e atividades ocupacionais rotineiras, mas não capaz de realizar as atividades não ocupacionais; Classe III - capaz de realizar cuidados pessoais usuais, mas limitado nas atividades ocupacionais rotineiras e nas não ocupacionais; Classe IV - limitado para realizar cuidados pessoais usuais, atividades ocupacionais rotineiras e não ocupacionais.
Como critérios de eligibilidade para o estudo, as pacientes deveriam apresentar 20 anos de idade, no mínimo, quando do surgimento dos sintomas; e pertencer às classes funcionais I, II ou III da AR (ACR-91). Foram considerados critérios de exclusão: antecedente de intubação orotraqueal por mais de 24 horas, câncer documentado de cabeça e pescoço, tratamento cirúrgico em laringe, trauma em região cervical, tratamento radioterápico em região de cabeça e pescoço, alterações neurológicas centrais ou periféricas, tratamento oncológico quimioterápico e ser portadora de outra colagenose além da AR.
Foi solicitado aos pacientes que preenchessem um questionário no protocolo de avaliação contendo: 1) Identificação; 2) Dados da artrite reumatoide (tempo de doença, associação com Síndrome de Sjögren, outras doenças associadas, classificação funcional, manifestações extra-articulares e terapêutica; 3) Queixas laríngeas. Alguns dos dados foram obtidos do prontuário da paciente ou mesmo do especialista (reumatologista) que assistia a mesma.
Foi realizada videolaringoestroboscopia usando um telescópio rígido Karl Storz® de 70º conectado a um estroboscópio Kay Elemetrics® modelo RLS 9100 B com uma microcâmera Toshiba CCD (charge-coupled device) IK-M41A. As imagens eram vistas em um monitor de vídeo Sony KV-1311 CR e gravadas em um gravador de DVD (digital video disc) Sony NS67P DVD. O exame foi realizado sob emissão vocal sustentada das vogais /e/ e /i/ sob sons modais e volume confortável.
Os dados gravados em DVD foram analisados independentemente por dois especialistas em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço com experiência em laringoestroboscopia. Os pareceres foram posteriormente analisados e uma média foi obtida e considerada como padrão de cada parâmetro em cada paciente estudado. Os parâmetros observados foram aspecto da borda livre, fechamento glótico, predomínio de fase do ciclo glótico, nível vertical de aproximação, amplitude de movimento, onda mucosa, simetria de fase, periodicidade, avaliação das aritenoides, hiperfunção, sítio da onda mucosa, aspecto da mucosa e formação de muco8. Adicionalmente, foram pesquisadas as seguintes lesões nas pregas vocais: telangectasias9, edema de aritenoides, nódulos em bambu (bamboo nodes), hiperemia e diminuição da mobilidade das pregas vocais10. Os dados foram avaliados de forma semiquantitativa.
Para a análise perceptivo-auditiva e acústica da voz das pacientes, foi realizada gravação de amostra vocal, que consistiu de emissões sustentadas da vogal /a/ no tom e intensidade habitual, contagem de números de 1 a 10 e um trecho de fala conectada. Foi utilizado um microfone profissional Shure® (Shure PG 48).
A análise acústica da voz abrangeu as medidas acústicas computadorizadas, utilizando o programa MDVP (Multi Dimensional Voice Program) da Kay Elemetrics®. A qualidade vocal foi julgada conforme a escala GRBASI para análise perceptivo-auditiva da voz11,12. A escala GRBASI é constituída de seis parâmetros: G - grau geral de disfonia; R - rugosidade; B - soprosidade; A - astenia; S - tensão e I - instabilidade. Todos os parâmetros foram avaliados de acordo com a ausência ou presença e com o grau de gravidade, sendo: 0 - ausência; 1 - leve; 2 - moderada e 3 - grave.
Para a análise acústica, foram consideradas as seguintes medidas: a) frequência fundamental (F0); b) medidas de perturbação de frequência e amplitude: Jitter (%), PPQ (pitch perturbation quotient), Shimmer (%); e APQ (amplitude perturbation quotient); c) medidas de ruído: NHR (noise-to-harmonic-ratio); e VTI (voice turbulence index).
O pitch foi avaliado como adequado, grave ou agudo, a ressonância foi avaliada como equilibrada, laringofaríngea ou hipernasal e a modulação da fala, articulação e coordenação pneumofonoarticulatória foi avaliada como adequada ou anormal e, se anormal, o grau de anormalidade foi avaliado como leve, moderado ou grave. O julgamento dos parâmetros foi realizado por três fonoaudiólogos especialistas em voz, com experiência superior a cinco anos em disfonia.
Para a avaliação autoperceptiva da desvantagem vocal, foi utilizado o questionário IDV - Índice de desvantagem vocal. O questionário é composto por três domínios: funcional, físico e emocional, cada domínio contendo 10 questões que variam de zero a quatro, sendo zero a melhor pontuação e quatro a pior pontuação. O valor da pontuação dos domínios é determinado pela somatória das respostas dadas pelos pacientes e a pontuação total é definida pela somatória dos três domínios, podendo variar de 0 a 120. Assim, quanto maior a pontuação, pior é a desvantagem vocal. Pontuações de 0 a 40 indicam impacto discreto ou ausência de impacto; de 41 a 60, impacto moderado; e, de 61 a 100, impacto grave13-15.
Os dados obtidos por meio da laringoscopia, avaliação autoperceptiva e acústica da voz e o IDV foram cruzados com o tempo de AR, classe da AR e queixas laríngeas.
Medidas de tendência central e de variabilidade foram utilizadas para descrever as variáveis numéricas (Idade, tempo de AR, medidas acústica e IDV) e a distribuição de frequências para as categorias (grau disfonia, classe AR, síndrome de Sjögren, dados laringoscopia, e variáveis de voz).
Para verificar a associação entre as variáveis numéricas (medidas) com relação aos grupos com duas categorias, o teste não paramétrico U de Mann-Whitney foi aplicado e com três categorias o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis foi adotado. O Teste Exato de Fisher foi utilizado para comparar as variáveis categóricas em tabelas 2x2.
O nível de significância de 5% foi usado para todos os testes estatísticos. O programa STATA versão 7.0 foi usado para a análise estatística.
RESULTADOS
Queixas laríngeas foram descritas por 19 das 27 pacientes e os sintomas estão relatados na Tabela 2. O achado laringoscópico mais frequente foi o cavalgamento das aritenoides, seguido de edema das aritenoides (Tabela 3).
Dentre os achados laringoscópicos, em relação à fase de fechamento, somente duas pacientes apresentaram fechamento predominantemente em fase aberta. Em relação ao cavalgamento de aritenoides, cinco pacientes apresentavam assimetria de posição na adução. Em todos os casos, o sítio da onda glótica foi a glote. O aspecto da onda mucosa foi seco em dois casos e edematoso em quatro casos. Nos parâmetros da avaliação laringoscópica, somente o cavalgamento de aritenoides mostrou significância estatística quando correlacionado com a classe da AR.
Sobre a distribuição das características da avaliação perceptivo-auditiva, três das 27 pacientes apresentaram pitch considerado grave. Nove tiveram o grau de disfonia e rugosidade discretos. Nenhuma das 27 pacientes apresentou astenia e uma apresentou soprosidade discreta. Seis participantes tiveram discreta tensão vocal e cinco, instabilidade vocal discreta. Em relação à ressonância, em 14 pacientes foi considerada equilibrada e, nas 13 restantes, laringofaríngea. Por fim, 12 participantes apresentaram esforço fonatório presente (Tabela 4). Baseada na análise acústica, quase todas as variáveis mostraram-se alteradas (Tabela 5).
Dentre as queixas relatadas pelos pacientes no Índice de desvantagem vocal (IDV), somente alguns pacientes relataram anormalidades, mas todos os três domínios - funcional (IDV-I), físico (IDV-F) e emocional (IDV-E) mostraram significância estatística quando correlacionados com a queixa de disfonia.
O cruzamento dos resultados da análise acústica com a classe da AR, PPQ, Shimmer e APQ apresentou significância estatística, enquanto o cruzamento do IDV com a classe da AR mostrou significância estatística somente no domínio físico e total do IDV.
DISCUSSÃO
Apesar de bem conhecida, a AR da laringe é inconstante e seus sintomas menos óbvios do que suas manifestações patológicas16,17.
Em nosso estudo, queixas laríngeas foram descritas por 19 das 27 pacientes (70,4%). Os sintomas mais referidos foram disfonia e sensação de corpo estranho na garganta, seguidos por fadiga vocal e xerostomia. Não encontramos relação significativa entre o tempo da AR e os demais parâmetros estudados, possivelmente pela falta de relação linear entre o tempo e a classe funcional da doença. Talvez tal relação fosse encontrada se a casuística fosse mais expressiva. Mesmo sem significância estatística, pacientes com queixa de disfonia tinham maior tempo de duração da AR. Na análise acústica, os piores resultados foram encontrados em pacientes com mais de 10 anos de AR.
Nos 50 casos de pacientes indianos com AR clássica investigados nas séries de Gairola et al.18, quarenta e dois eram mulheres e oito homens. A duração média da AR era de 37 anos. A maioria (92%) era das classes funcionais II e III. Seis pacientes (12%) tinham sintomas sugestivos de envolvimento laríngeo quando da realização de laringofibroscopia. Espessamento e irritação da mucosa acima das aritenoides foram os sinais mais comuns. Apenas um paciente mostrou evidência de envolvimento agudo, com edema e hiperemia nas aritenoides e diminuição da mobilidade da prega vocal esquerda.
Em nossas séries, a idade variou de 33 a 76 anos, com média de 55,2 anos. Somente uma era tabagista crônica importante. O tempo de história clínica variou de um a 36 anos. Cinco pacientes tinham associação com a síndrome de Sjögren. Quanto à classificação funcional (ACR-9119), houve predomínio da classe II, com 13 pacientes, seguida pela classe I, com oito pacientes, e depois classe III, com seis pacientes. Das 27 pacientes, nove apresentaram queixa de disfonia (33,3%).
Existe grande variedade de achados laringoestroboscópica, foi descritos na literatura20-25. No presente estudo, o cavalgamento de aritenoides foi o principal achado laringoscópico, sendo que cinco pacientes apresentavam assimetria de posição. O segundo achado mais frequente foi o edema das aritenoides, fenda anterior e angiodisgenesia. Nos cruzamentos da avaliação laringoestroboscópica com tempo de doença e queixa de disfonia, não houve significado estatístico. Porém, quando correlacionamos a classe da AR com a laringoestroboscopica foi encontrada significância estatística somente em relação ao cavalgamento das cartilagens aritenoides. De fato, o cavalgamento surge como consequência da artrite e anquilose da ACA e tal achado desenvolve-se à medida que a doença tem seu curso.
Considerando as sete pacientes com cavalgamento de aritenoides, chamou atenção que cinco apresentavam esforço fonatório aumentado, seis apresentavam APQ aumentado e todas mostravam aumento de Shimmer, NHR e VTI.
Em nossas avaliações, das 27 pacientes, três (11,1%) apresentaram pitch considerada grave. Nove tiveram o grau de disfonia bem como a rugosidade caracterizados como discretos. Nenhuma das 27 pacientes apresentou astenia ou soprosidade. Seis (22,2%) participantes tiveram discreta tensão vocal e cinco, instabilidade vocal discreta. Em relação à ressonância, em 14 (51,8%) pacientes foi considerada equilibrada, nas 13 (48,2%) restantes, laringofarígea. Por fim, 12 (44,4%) participantes apresentaram esforço fonatório presente.
Alterações na análise acústica vocal (perturbação de amplitude) têm sido relatadas em pacientes com nódulos reumáticos e edema nas pregas vocais. Em nossa série, ao realizarmos os cruzamentos da análise acústica da voz com a classe da AR (agrupando classe II e II e comparando-as com a classe I), tempo de doença e queixa de disfonia, encontramos significado estatístico entre classe funcional e os parâmetros PPQ, Shimmer e APQ. Quanto aos parâmetros Jitter, NHR e VTI, os valores encontrados nos pacientes em classe funcional II e III foram superiores àqueles verificados nos pacientes em classe funcional I.
O diagnóstico clínico da artrite da ACA às vezes é difícil e nem sempre está correlacionado com a atividade da doença26. Outros autores discordam dessa opinião, uma vez que, segundo suas séries, quanto mais ativa encontrava-se a AR, maior era o índice de desvantagem vocal (IDV) apresentado pelos pacientes7. Em um determinado estudo, o número de participantes com escores maiores que zero no IDV demonstrando algum grau de disfonia foi significativamente maior no grupo de pacientes quando comparados ao grupo controle. Exceção foi no domínio emocional, em que o valor total do grupo controle foi maior que do grupo em estudo6.
Em nosso estudo, foi encontrado significado estatístico para os cruzamentos do IDV (físico e total) com a classe de AR e no cruzamento do IDV (todos os domínios) com a queixa de disfonia. Certamente, isso pode ser explicado pelo fato de que o IDV é um índice autoperceptivo de desvantagem vocal. Devemos considerar que uma das pacientes apresentou valores desproporcionalmente elevados de IDV, contrastando com o restante da casuística, e isso pode ter tido impacto na avaliação estatística.
Os achados do presente estudo são exploratórios. Devido à amostra, foram realizadas comparações sem ajuste estatístico, com possibilidade de achados falso-positivos - erro tipo I, bem como não foi feito cálculo do tamanho da amostra e muitas comparações podem ter tido baixo poder, podendo resultar em erro tipo II.
Para explicar a "omissão de diagnóstico", os pacientes com AR têm muitos sinais e sintomas generalizados evidentes, como articulações distorcidas e dores fortes e numerosas relacionadas com a artrite em várias partes do corpo e isso pode ofuscar os sintomas laríngeos produzidos pela artrite da ACA3. Além disso, o padrão de vida sedentária desses pacientes, que os faz adaptar-se às alterações da doença24. No entanto, levando em consideração os testes diagnósticos sofisticados e a evolução na compreensão das manifestações laríngeas da AR, o acometimento laríngeo pela AR é frequente, porém, nem sempre sintomático, parecendo não relacionar-se à cronicidade da doença.
CONCLUSÕES
Queixa de disfonia foi referida por 70,4% dos pacientes, sendo disfonia e sensação de corpo estranho na garganta (33,3%) os mais comuns. Alterações laringoscópicas foram verificadas em 48% das pacientes. A avaliação acústica da voz e a autopercepção por meio do questionário IDV mostraram-se alterados. Houve relação significativa entre: queixa de disfonia e todos os domínios do IDV; e classe funcional da doença com: achado de cavalgamento das aritenoides, medidas acústicas de PPQ, Shimmer e APQ e os domínios físico e total do IDV.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 10 de junho de 2012. cod. 9253.
Artigo aceito em 10 de agosto de 2012.
Hospital Ana Costa e Hospital Guilherme Álvaro, Santos - SP.
- 1. Mackenzie GH. Rheumatism of the larynx. Edinb Med J. 1894;40:507-9.
- 2. Harris JT. Anchylosis of the cricoarytenoid articulation with the report of a case presenting involvement of both joints and requiring tracheotomy. Laryngoscope. 1919;29(3):139-43.
- 3. Grossman A, Martin JR, Root HS. Rheumatoid arthritis of the crico-arytenoid joint. Laryngoscope. 1961;71:530-44.
- 4. Bayar N, Kara SA, Keles I, Koç C, Altimok D, Orkun S. Cricoarytenoiditis in rheumatoid arthritis: radiologic and clinical study. J Otolaryngol. 2003;32(6):373-8.
- 5. Wojnowski W, Karlik M, Wiskirska-Woznica B, Walczak M. Voice disorders in rheumatoid arthritis. Otolaryngol Pol. 2005;59(4):603-6.
- 6. Speyer R, Speyer I, Heijnen MA. Prevalence and relative risk of dysphonia in rheumatoid arthritis. J Voice. 2008;22(2):232-7.
- 7. Fisher BA, Dolan K, Hastings L, McClinton C, Taylor PC. Prevalence of subjective voice impairment in rheumatoid arthritis. Clin Rheumatol. 2008;27(11):1441-3.
- 8. Cruz WP, Dedivitis RA, Rapoport A, Guimarães AV. Videolaryngostroboscopy following frontolateral laryngectomy with sternohyoid flap. Ann Otol Rhinol Laryngol. 2004;113(2):124-7.
- 9. Fayos JV. Carcinoma of the endolarynx: results of irradiation. Cancer. 1975;35(6):1525-32.
- 10. Chatani M, Matayoshi Y, Masaki N. Radiation therapy for larynx carcinoma: long-term results of stage I glottic carcinoma. Strahlenther Onkol. 1993:169(2):102-6.
- 11. Hirano M. Clinical examination of voice. New York: Springer-Verlag; 1981. p.81-4.
- 12. Dejonckere PH, Remacle M, Fresnel-Elbaz E. Reliability and relevance of differentiated perceptual evaluation of pathological voice quality. In: Clement MP (Ed.): Voice Update. Amsterdam: Elsevier; 1996. p.321-4.
- 13. Jacobson BH, Johnson A, Grywalski C, Silbergleit A, Jacobson G, Benninger MS, et al. The Voice Handicap Index (VHI). Development and validation. Am J Speech Lang Pathol. 1997;6(3):66-70.
- 14. Santos LM, Gasparini G, Behlau M. Validação do protocolo do Índice de Desvantagem Vocal (IDV) no Brasil [monografia]. São Paulo: Centro de Estudos da Voz; 2007.
- 15. Moerman M, Pieters G, Martens JP, Van der Borgt MJ, Dejonckere P. Objective evaluation of the quality of substitution voices. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2004;261(10):541-7.
- 16. Gardner DL, Holmes F. Anaesthetic and postoperative hazards in rheumatoid arthritis. Br J Anaesth. 1961;33:258-64.
- 17. Bienenstock H, Ehrlich GE, Freyberg RH. Rheumatoid arthritis of the cricoarytenoid joint: a clinicopathologic study. Arthritis Rheum. 1963;6:48-62.
- 18. Gairola A, Kacker S, Kumar A, Malaviya A. Laryngeal and ear involvement in rheumatoid arthritis in north India. Br J Rheumatol. 1991;30(1):65-6.
- 19. Stucki G, Stoll T, Brühlmann P, Michel BA. Construct validation of the ACR 1991 revised criteria for global functional status in rheumatoid arthritis. Clin Exp Rheumatol. 1995;13(3):349-52.
- 20. Montgomery WW, Loefgren RH. Usual and unusual causes of laryngeal arthritis. Arch Otolaryngol. 1963;77:29-33.
- 21. Pinals RS. Rheumatoid arthritis presenting with laryngeal obstruction. Brit Med J. 1966;1(5491):842.
- 22. Harris ER Grossmann A, Martin JR. Cricoarytenoid joint involvement in rheumatoid arthritis: its detection and manifestation. Arthritis Rheum. 1973;16:553.
- 23. Lawry GV, Finerman ML, Hanafee WN, Mancuso AA, Fan PT, Bluestone R. Laryngeal involvement in rheumatoid arthritis. A clinical, laryngoscopic, and computerized tomographic study. Arthritis Rheum. 1984;27(8):873-82.
- 24. Geterud A. Rheumatoid arthritis in the larynx. Scand J Rheumatol. 1991;20(3):215.
- 25. Charlin B, Brazeau-Lamontagne L, Levesque RY, Lussier A. Cricoarytenoiditis in rheumatoid arthritis: comparison of fibrolaryngoscopic and high resolution computerized tomo) ;ic findings. J Otolaryngol. 1985;14(6):381-6.
- 26. Brooker DS. Rheumatoid arthritis: otorhinolaryngological manifestations. Clin Otolaryngol Allied Sci. 1988;13(3):239-46.
Endereço para correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
24 Out 2012 -
Data do Fascículo
Out 2012
Histórico
-
Recebido
10 Jun 2012 -
Aceito
10 Ago 2012