Open-access Consumo e perfil social e demográfico dos diferentes arranjos domiciliares de idosos no Brasil: análises a partir dos dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares

Resumo

Objetivo:  Delinear o perfil social e demográfico dos diferentes arranjos domiciliares de idosos, bem como calcular o gasto médio anual do consumo desses arranjos, de acordo com os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (2008/2009).

Método:  Trata-se de uma pesquisa com caráter quantitativo, descritivo, com corte transversal, a qual se utilizaram dados secundários, extraídos dos microdados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (2008/2009) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Para delinear o perfil social e demográfico dos diferentes arranjos domiciliares foi realizada uma análise exploratória dos dados. Já para identificar se existia desigualdade na distribuição do consumo foi utilizado o índice de Gini.

Resultados:  Os resultados permitiram constatar que os consumidores idosos já podem ser vistos como constituintes de novas gerações, a maioria deles possui apenas ensino fundamental e reside na área urbana do país. Houve uma predominância feminina como chefe dos arranjos domiciliares sem a presença de cônjuge. Ao verificar a distribuição do consumo anual de todas as famílias, encontrou-se um maior peso das categorias: despesas diversas, habitação, transporte e alimentação.

Conclusões:  Entender as características socioeconômicas dos diferentes arranjos domiciliares de idosos, bem como suas relações de consumo de bens e serviços é extremamente relevante, já que os bens e serviços oferecidos a esse segmento populacional podem proporcionar satisfação e melhoria da qualidade de vida.

Palavras-chave: Idoso; Características da População; Características da Família; Brasil

Abstract

Objective:  to define the social and demographic profile of the different household arrangements involving the elderly, as well as to calculate the average annual consumption of such household arrangements according to the Pesquisa de Orçamentos Familiares (the Study on Family Budgets) (2008/2009).

Method:  a quantitative, descriptive, cross-sectional study was performed using secondary data extracted from the micro-data of the Study on Family Budgets (2008/2009), carried out by the Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (the Brazilian Institute of Geography and Statistics). In order to define the social and demographic profile of different household arrangements an exploratory analysis of the data was carried out, and the Gini index was used to identify if there was inequality in the distribution of consumption.

Results:  The results showed that elderly consumers can be seen as constituents of new generations, while most have only an elementary education and reside in an urban region of Brazil. There was a predominance of female heads of households in which there was no spouse present. When evaluating the distribution of the annual consumption of all the families, a greater weighting of the categories miscellaneous expenses, housing, transportation and food was found.

Conclusions:  Understanding the socioeconomic characteristics of the different home arrangements of the elderly, as well as their relationships with the consumption of goods and services, is extremely important, since the goods and services offered to this segment of the population can provide satisfaction with and improvement in quality of life.

Keywords: Elderly; Population Characteristics; Family Characteristics; Brazil

INTRODUÇÃO

A partir dos anos de 1970 diversas foram as mudanças sociais ocorridas na sociedade, especialmente aquelas relativas à redução das taxas de fecundidade e mortalidade, e ao aumento da longevidade, todas com impactos diretos sobre o tamanho e a composição das famílias, bem como nas relações de gênero e nos padrões de consumo1. Uma das transformações sociais mais importantes está relacionada ao aumento demográfico dos idosos, sendo crescente o fenômeno do envelhecimento da população em todas as sociedades economicamente desenvolvidas ou em desenvolvimento2.

No Brasil, em geral, e, principalmente, em algumas regiões do país, o processo de envelhecimento da população está em expansão. Desde 2004 já se observa uma mudança no formato da pirâmide etária da população, indicando o envelhecimento das pessoas com 60 anos ou mais de idade, com predominância das mulheres (8,0% em relação ao total da população; e, os homens, 4,3%). Em 2015, a população residente estimada no Brasil foi de 204,9 milhões de pessoas, representando um crescimento de 0,8% em relação ao ano anterior, ou seja, de 1,7 milhão de pessoas, sendo que 14,3% dessa população era representada pelos idosos3. Assim, o acelerado ritmo de envelhecimento no Brasil cria novos desafios para a sociedade contemporânea, uma vez que esse processo ocorre num cenário de profundas transformações sociais, econômicas, urbanas, industriais e familiares.

Como em vários outros países em desenvolvimento, o envelhecimento populacional no Brasil, ocorre mais rápido e em um contexto socioeconômico desfavorável devido às baixas taxas de crescimento econômico; à crise fiscal do estado; aos elevados níveis de desigualdade social; às altas taxas de analfabetismo; aos problemas com saneamento, habitação, pobreza; e, também, à carência de instituições devidamente consolidadas, entre outros4.

Há de ressaltar, que no Brasil, com a estabilização econômica proporcionada pelo Plano Real, houve um aumento do poder aquisitivo e do bem-estar das famílias brasileiras. Com essas mudanças econômicas, o padrão de consumo modificou-se, havendo mudanças nas estruturas dos gastos e dos rendimentos das famílias5,6.

De maneira geral, muito se tem estudado sobre o perfil demográfico dos idosos, sua distribuição geográfica e os efeitos fisiológicos e psicológicos do ato de envelhecer aos quais estão sujeitos. Mas pouco se sabe sobre como pensam e se comportam as pessoas com mais de 60 anos enquanto consumidores. Se, por um lado, cresce a importância dessas pessoas na vida econômica, social e política do país, por outro, faltam dados sobre seus hábitos de compra e de consumo7. Alguns autores corroboram afirmando que as pesquisas sobre comportamento do consumidor idoso, ao contrário do Brasil, avançaram muito nas últimas décadas em países norte-americanos, e que na Índia tem-se percebido também a transformação dos hábitos de compra dos idosos8.

Assim sendo, o envelhecimento populacional acarreta impacto significativo em diversos setores, já que esse segmento da população possui demandas próprias, sendo que grande parcela tem vida economicamente ativa e está preocupada em viver mais e melhor9. Neste sentido, há uma nova geração de idosos mais atualizada, participativa e exigente, protagonizando inúmeras relações de consumo, não mais restrita apenas à contratação e à utilização dos serviços relacionados à saúde10.

É importante ressaltar ainda que, à medida que se envelhece, as preferências e necessidades por produtos e serviços tendem a mudar. As necessidades e gastos de uma família são afetados por fatores como o número de pessoas na família, sua idade e o número de adultos que trabalham fora. Reconhecendo que as necessidades e gastos familiares mudam com o tempo, é necessário destacar o ciclo de vida familiar, que combina tendências na composição da renda e da família com as mudanças nas demandas colocadas para essa renda11, como é o caso dos idosos.

Entretanto, percebe-se a importância do estudo do comportamento do consumidor, uma vez que conhecendo as características culturais e sociais, é possível descobrir as necessidades e percepções dos consumidores, a fim de satisfazê-los12.

Contudo, é imprescindível o conhecimento do comportamento de consumo do idoso e de suas famílias, para poder contribuir de forma significativa com o dimensionamento de políticas públicas, principalmente previdenciárias, já que uma análise sobre o dispêndio familiar, principalmente da família de baixa renda, fornece um importante parâmetro para se medir sua sobrevivência13. Neste sentido, ressalta-se que entender as relações de consumo desse segmento é extremamente relevante, pois os bens e serviços oferecidos devem proporcionar satisfação e melhoria na qualidade de vida dos idosos14.

Deste modo, é importante compreender como os diferentes arranjos domiciliares intervêm no consumo de bens e serviços pelos idosos, o que pode contribuir para uma maior compreensão sobre a dimensão do envelhecimento em termos do consumo. Entretanto, objetivou-se com este estudo delinear o perfil social e demográfico do consumidor idoso em diferentes arranjos domiciliares no Brasil, bem como identificar, calcular e comparar os tipos de bens e serviços que os arranjos domiciliares de idosos consomem, de acordo com os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2008/2009).

A POF (2008/2009) visa principalmente mensurar as estruturas de consumo, dos gastos, dos rendimentos e parte da variação patrimonial das famílias, possibilitando, traçar um perfil das condições de vida da população brasileira a partir da análise de seus orçamentos domésticos. Além disso, várias características dos domicílios e das famílias também são investigadas pela POF (2008/2009), ampliando assim o seu potencial de utilização dos resultados da pesquisa15.

MÉTODO

Os dados analisados neste artigo são parte do projeto “O Comportamento do Consumidor Idoso em Diferentes Arranjos Familiares: Uma Análise Histórica e Comparativa a partir dos Dados das Pesquisas de Orçamentos Familiares”.

A presente pesquisa teve caráter quantitativo, descritivo, com corte transversal e utilizou-se de dados secundários extraídos dos microdados Despesas, Rendimentos e Condições de Vida da Pesquisa de Orçamentos Familiares (2008/2009), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A opção por trabalhar com esses dados deveu-se ao fato de a pesquisa ser a nível nacional, a qual constavam perguntas detalhadas sobre as duas medidas de bem-estar: consumo e renda, além de possibilitar uma comparação de todo território brasileiro, por ser realizada tanto na área urbana como na área rural do país.

A POF (2008/2009) é a quinta e mais atual pesquisa realizada pelo IBGE sobre orçamentos familiares. O período de coleta dos dados da POF consistiu de maio de 2008 a maio de 2009, contando com 55.970 domicílios, de todas as regiões do país15.

Dentre as diversas variáveis que compõem a base de dados da POF 2008/2009, foram selecionadas para esta pesquisa as seguintes variáveis que descrevem o perfil social e demográfico dos arranjos domiciliares de idosos: sexo; idade; raça; unidade da federação; curso mais elevado que frequentou; condição no domicílio (pessoa de referência, cônjuge, filho, outro parente, agregado, pensionista, empregado doméstico e parente de empregado doméstico); tamanho do domicílio; valor da renda total do domicílio. E, em relação aos tipos de bens e serviços consumidos nos diferentes arranjos domiciliares de idosos, selecionou-se as seguintes variáveis de consumo: alimentação (dentro e fora do domicílio), habitação, vestuário, transporte, higiene e cuidados pessoais, assistência à saúde, educação, recreação, fumo, despesas correntes (despesas com serviços bancários, pensão, indenização, etc.) e despesas diversas (despesas com animais de estimação, serviços profissionais, cerimônias, etc.).

Para satisfazer os objetivos propostos neste estudo, o universo de análise consistiu-se de sete diferentes arranjos domiciliares de idosos que constituíam unidades domésticas e viviam em todas as regiões do país. A escolha do limite de idade na classificação do idoso (igual ou superior a 60 anos) foi baseada nos critérios estabelecidos pelo Estatuto do Idoso16.

É importante mencionar que a POF (2008/2009) não apresenta uma classificação dos tipos de arranjos domiciliares. Neste sentido, construiu-se uma classificação analítica para estudar os arranjos domiciliares dos idosos, a saber: Unipessoal (idoso que mora sozinho); Composto (pessoa de referência do domicilio e outros parentes); Casal sem Filhos (pessoa de referência que reside apenas com o cônjuge); Casal que Mora com Filhos (residem pessoa de referência, cônjuge e filho); Casal sem Filhos e Parentes (pessoa de referência, cônjuge e outros parentes); Casal que Mora com Filhos e Parentes (pessoa de referência, cônjuge, filho(s) e outros parentes); e, Monoparental (pessoa de referência, filho(s) e/ou outros parentes).

Em todos os arranjos domiciliares, pelo menos um dos membros que o constituía era idoso. A pessoa de referência foi considerada aquela que era responsável pelas despesas da habitação. O cônjuge era o morador que vivia conjugalmente com a pessoa de referência. O(s) filho(s) era(m) aquele(s) considerado como filho legítimo, adotivo ou de criação da pessoa de referência e/ou do seu cônjuge. Outros parentes foram considerados os indivíduos que tivessem ou não qualquer grau de parentesco com a pessoa de referência ou com o seu cônjuge, essa classificação foi feita a partir da agregação das categorias “outro parente”, “agregado”, “pensionista”, “empregado doméstico” e “parente de empregado doméstico” que a POF (2008/2009) utiliza para classificar os moradores das unidades de consumo.

Para delinear o perfil socioeconômico dos diferentes arranjos domiciliares foi realizada uma análise exploratória dos dados17.

Já para identificar se havia desigualdade na distribuição do consumo entre os arranjos domiciliares, foi utilizado o cálculo do índice de Gini das variáveis de despesas dos arranjos. O índice varia de 0 a 1, quanto mais próximo de zero, maior a igualdade, por outro lado, quando o índice de Gini for igual a um representa o grau máximo de desigualdade18.

Para obter estimativas do universo de análise da POF (2008/2009) optou-se por realizar os cálculos utilizando-se o fator de expansão. Assim, a pesquisa apresentou 180,650 milhões de pessoas pesquisadas, dessas 20,314 milhões possuíam 60 anos ou mais, representando 11,25% da população total. Porém, para atingir aos objetivos aqui propostos e considerando apenas os arranjos domiciliares de idosos enquanto unidade consumidora, foi detectada a presença de outliers para a variável consumo domiciliar anual. Então, realizou-se um recorte no tamanho da amostra para melhorar os pressupostos de normalidade e permitir uma maior precisão dos estimadores. O critério utilizado foram dois desvios-padrão em relação à primeira e à última porcentagem de consumo (equivalentes às observações menores a R$300,00 e maiores a R$228.819,00). Para a variável renda, detectou-se o mesmo problema e, portanto, a amostra foi recortada utilizando-se o mesmo critério da variável consumo para o limite inferior de renda, e um desvio-padrão abaixo da porcentagem 90 para o limite superior da renda (equivalentes às observações menores a R$93,00 e maiores a R$28.567,00). Contudo, a amostra final deste estudo consistiu de 13.899.071 pessoas distribuídas nos arranjos domiciliares onde pelo menos um dos membros era idoso.

Embora os dados deste estudo sejam relativos a seres humanos, por serem procedentes de banco de dados de uso e acesso público, não houve necessidade do mesmo ser submetido à aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa.

RESULTADO E DISCUSSÃO

Para compreender o idoso como indivíduo particular dentro de um foco de estudo mais amplo, foi realizada uma análise exploratória dos dados, por meio de uma breve caracterização de suas condições de vida, estudando-se as seguintes variáveis: idade, sexo, nível de escolaridade, cor e regiões do país.

A POF (2008/2009) pesquisou 20,314 milhões de pessoas que possuíam 60 anos ou mais. Esses idosos, em média tinham 69,9 anos (±7,9), sendo o mínimo de 60 anos e máximo de 104 anos, 75% possuíam 75 anos ou menos e 10% tinham 81 anos ou mais, com predominância do sexo feminino correspondendo a 11,3 milhões de mulheres (55,6%). Dados do Censo Demográfico de 201019 revelam que a maior concentração de mulheres nas idades mais avançadas está relacionada à sobremortalidade masculina, fenômeno presente em quase todos os grupos etários, sendo que no grupo de idosos, fica mais evidente o efeito da maior mortalidade masculina, uma vez que um quantitativo menor de homens atinge essa idade 20.

Em relação ao nível de escolaridade dos idosos pesquisados pela POF, 69,09% (n=10,8 milhões) informaram possuir apenas o ensino fundamental, com uma média de 4,5 anos de estudo.

No que se refere à raça/cor desses idosos, foi constatado que, 55,36% (n=11,2 milhões) eram brancos; 35,11% (n=7,1 milhões) pardos; 7,71% (n=1,5 milhões) pretos; 1,03% (n=0,20 milhões) amarelos; e, 0,48% (n=0,09 milhões) indígenas, sendo que o restante não sabia ou não quis informar.

Ao analisar a distribuição geográfica dessas pessoas de 60 anos ou mais de acordo com a residência e segundo o Estado da Federação, encontrou-se uma maior concentração de pessoas idosas na região Sudeste, concentrando 46,5% (n=9,4 milhões). Vale notar que os três Estados mais populosos (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro) do país continham, também, o maior número de pessoas idosas, assim como a maior proporção de idosos como porcentagem da população total. Por outro lado, os Estados com menor presença de pessoas idosas foram, em ordem de importância: Sergipe, Amazonas, Distrito Federal, Tocantins, Rondônia, Acre, Amapá e Roraima. Em conjunto, esses estados continham menos de 5% da população idosa a nível nacional, isso se deve possivelmente ao processo migratório ocorrido nessas regiões e pela busca por melhor qualidade de vida em outras regiões do país.

Ao realizar a distribuição dos idosos, pesquisados pela POF, por estados federativos em relação ao sexo, foi possível detectar que os estados brasileiros que apresentaram as maiores porcentagens de mulheres idosas foram: Rio Grande do Norte (61,09%), Rio de Janeiro (60,74%) e Pernambuco (59,85%). Em contrapartida, os estados do Tocantins (54,14%), Amapá (52,66%), Mato Grosso (51,19%) e Acre (51,03%) apresentaram mais homens idosos. De acordo com dados do Censo Demográfico de 201019, os estados de Tocantins, Acre e Mato Grosso apresentam mais homens que mulheres na população de idosos devido ao histórico de imigração diferenciada nessa região por sexo.

Além disso, foi possível verificar que 82,89% (n=16,8 milhões) dos idosos residiam na zona urbana do país, caracterizando esse segmento populacional como urbanizada, tendência que pode ser explicada pelo fato de a população idosa buscar nas áreas urbanas melhores condições e atendimento às suas necessidades, além de ser a região que concentra a maior parcela da população brasileira.

No que se refere aos arranjos domiciliares aos quais os idosos estavam inseridos, os três tipos mais comuns foram o monoparental, casal sem filhos, e, unipessoal. Outras pesquisas20 mostram que o modelo tradicional de família, constituído por um casal heterossexual, sendo o homem provedor e a mulher a cuidadora do lar está desaparecendo, dando lugar a novos arranjos familiares, principalmente de famílias do tipo monoparental e unipessoal. Os três arranjos domiciliares menos comuns foram casal sem filhos e parentes, arranjo composto, e casal que mora com filhos e parentes (Tabela 1).

Tabela 1
Situação de convivência domiciliar dos idosos no Brasil. Brasil, 2009.

No que se refere à distribuição geográfica dos arranjos domiciliares estudados, percebe-se que a maioria dos arranjos localizava-se na região Sudeste do país, sendo 51,59% (n=1.398.400) do arranjo casal sem filho; 50,96% (n=1.296.292) do unipessoal; 46,30% (n=1.027.368) do casal com filho; 43,44% (n=529.843) do arranjo composto; 43,41% (n=1.201.134) do monoparental; e, 37,39% (n=667.246) do casal com filho e outros parentes; e, apenas a maioria do arranjo casal sem filho e outros parentes que localizava-se no Nordeste (35,86% ou n=234.733) do país.

Em todos os arranjos domiciliares em estudo, a maioria residia na zona urbana do país. Alguns autores21 também observaram que há um incentivo à vida urbana e que o meio rural está ficando cada vez mais desabitado. O processo de urbanização do país pode ser uma explicação para esse fato, além de que o processo de envelhecimento ocasiona a necessidade de uma atenção maior para com a sua saúde, o que é proporcionado no meio urbano.

Os arranjos domiciliares nos quais os idosos estavam inseridos e que fazem parte da amostra em estudo possuem características que os diferem, conforme descrito na Tabela 2.

Tabela 2
Caracterização dos arranjos domiciliares de idosos. Brasil, 2009.

Nota-se que o nível de escolaridade dos chefes e dos cônjuges em todos os arranjos domiciliares é baixo, visto que, a grande maioria possuía apenas o ensino fundamental. No que se refere ao nível de escolaridade dos filhos houve um aumento apresentando um índice maior do ensino médio e ensino superior, isso ocorreu provavelmente devido às maiores chances que os filhos tiveram de frequentar a escola em relação aos seus pais. E o nível de escolaridade dos outros parentes também se apresentou um pouco maior em relação ao chefe e cônjuge, mas o que predomina ainda entre eles é o ensino fundamental.

Vale ressaltar que a média dos anos de estudos dos membros dos arranjos domiciliares foi de 6 anos, com a média dos filhos se sobressaindo a este (7,5 anos), reafirmando assim o maior nível de escolaridade dos filhos. E, em relação à renda total dos arranjos domiciliares, os arranjos casal com filhos e casal com filhos e parentes são os que possuem em média maior renda.

Verifica-se, também, que o arranjo casal que mora com filhos apresentou idosos, em média, mais jovens do que nos demais arranjos, o que pode ser explicado pelo ciclo de vida em que se encontram. Por outro lado, os idosos dos arranjos composto apresentaram em média idade mais alta. As mulheres idosas predominaram nos arranjos composto, unipessoal e monoparental.

Em relação ao consumo dos arranjos domiciliares estudados, evidenciou-se uma distribuição assimétrica no consumo total anual, explicada pelo maior consumo dos domicílios situados no percentil 90. Essa assimetria se reflete numa média (R$25.470,00) significativamente superior à mediana (R$14.340,00).

Por outro lado, os 25% dos domicílios de menor renda, que fazem parte da amostra em estudo, tinham um consumo anual de R$6.851,00. O consumo mínimo identificado foi de R$317,00 enquanto o maior foi de R$228.332,00.

Além disso, ao estudar com maior profundidade a distribuição do consumo encontrou-se que os 10% das famílias com maior consumo gastavam aproximadamente 17 vezes mais do que os 10% das famílias que apresentaram menor consumo. Essa desigualdade na distribuição do consumo evidencia-se num coeficiente de Gini de 0,55.

O arranjo domiciliar que apresentou melhor distribuição do consumo anual foi o casal com filhos e outros parentes. No outro extremo, o arranjo monoparental evidencia a distribuição do consumo total mais desigual (Figura 1).

Figura 1
Coeficiente de Gini do consumo anual, segundo o arranjo domiciliar. Brasil, 2009.

Ao estudar a distribuição das categorias do consumo anual de todos os domicílios em estudo, encontrou-se um maior peso da categoria despesas diversas, seguido pela categoria habitação, transporte e alimentação. Dados da POF de 2002/200322 já revelavam que os gastos com habitação eram, para todos os tipos de composições domiciliares, o de maior peso entre as despesas de consumo. No que se refere à alimentação, outros autores23 abordam que o principal critério de escolha de alimentos na população é o preço do mesmo, onde muitas vezes as pessoas são conscientes de que o alimento precisa fazer bem à saúde, porém fazem escolhas que podem não ser as melhores para a saúde devido ao recurso disponível para gastar com alimentação, precisando avaliar o que se pode ou não comprar. As categorias menos importantes foram fumo, alimentação fora do domicílio e educação (Figura 2).

Figura 2
Distribuição do consumo por categoria de despesa. Brasil, 2009.

A distribuição de consumo dos diferentes arranjos domiciliares evidencia um maior gasto com habitação e despesas diversas, seguido por assistência à saúde e alimentação dentro do domicílio. O arranjo unipessoal apresentou maior consumo em três tipos de despesas: habitação, assistência à saúde e alimentação dentro do domicílio, comprometendo 63,38% de sua renda. Esses dados vêm ao encontro dos apresentados em outro estudo14 onde revelou que nos arranjos unipessoais e casal residindo com o cônjuge no Brasil, os gastos com itens de habitação, alimentação dentro do domicílio e assistência à saúde foram os mais altos nos arranjos domiciliares estudados. O arranjo casal com filhos se sobressaiu aos demais no consumo com educação e transporte (Tabela 3), o que pode ser explicado pela presença de filhos no domicílio e pela etapa do ciclo de vida em que a família se encontra.

Tabela 3
Distribuição percentual do consumo por arranjo domiciliar. Brasil, 2009.

Com exceção do fumo, é interessante observar que o item menos consumido foi alimentação fora do domicílio para todos os arranjos estudados. Embora não tenha sido investigado neste estudo, tal hábito pode estar relacionado à busca por práticas saudáveis de alimentação que influenciam na melhoria de sua qualidade de vida.

É interessante observar que os itens menos consumidos por todos os arranjos domiciliares em estudo foram fumo, despesas correntes, educação e alimentação fora do domicílio, que podem ser explicadas pela etapa do ciclo de vida em que os idosos se encontram. Outros estudos24 também revelam que uma das mudanças mais significativas que os idosos fizeram em relação ao seu estilo de vida foi o abandono do uso de tabaco, já que o fumo é considerado um fator de risco cada vez maior de doenças.

Embora tenha sido uma limitação para a discussão dos resultados, sabe-se que a pesquisa realizada torna-se mais relevante pela falta de materiais bibliográficos que tratem do assunto voltado para o público idoso nos diferentes arranjos domiciliares, como forma de comparar os estudos.

CONCLUSÕES

O acelerado processo de envelhecimento da população brasileira e a consequente mudança no perfil demográfico do país tem gerado desafios sociais, econômicos e suscitado a necessidade de pesquisas na área do envelhecimento.

É notório que uma das transformações sociais mais importantes que ocorreram na sociedade nos últimos anos está relacionada com o aumento demográfico dos idosos, devido ao aumento da expectativa de vida combinado com a redução nas taxas de fecundidade. Como uma das consequências, uma nova proporção da população passa a consumir bens e serviços diferenciados, buscando por preços e marcas que atendem sua necessidade, aumentando assim a demanda no mercado.

Contudo, percebeu-se ao realizar a presente pesquisa que os três tipos mais comuns de arranjos em que os idosos estão inseridos são monoparental, casal sem filhos e unipessoal, o que pode ser um indicativo que diante da viuvez, eles preferem viver sozinhos a residirem com outros parentes. Já os arranjos menos comuns foram casal sem filhos e parentes, composto, e o casal que mora com filhos e parentes. Embora a porcentagem de mulheres idosas se sobreponha aos homens, elas são maioria apenas em três tipos de arranjos domiciliares: composto, unipessoal e monoparental, que, por sua vez, são os dois arranjos mais vulneráveis em termos de rendimento.

Os itens mais consumidos pelos arranjos domiciliares em estudo onde os idosos estavam inseridos foram habitação, assistência à saúde e alimentação dentro do domicílio, comprometendo mais de 40% da renda de cinco arranjos estudados, com exceção de casal com filhos, e casal com filhos e parentes. O comprometimento de grande parcela da renda faz com que menos recursos financeiros estejam disponíveis para lazer e outros tipos de despesas como produtos de higiene e vestuário.

Sabe-se que ainda há poucos estudos a respeito do consumidor idoso, sendo necessária a realização de outras pesquisas como esta, a fim de enriquecer e complementar este estudo, visto que entender as relações de consumo desse segmento é extremamente relevante, haja vista que os bens e serviços oferecidos proporcionem satisfação e melhoria da qualidade de vida. Assim, entende-se que a discussão levantada não se esgota aqui, mas acredita-se que os resultados deste estudo permitirão contribuir para o avanço das pesquisas sobre o comportamento do consumidor idoso em diferentes arranjos domiciliares.

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  • 24 Souza MAH, Porto EF, Souza EL, Silva KI. Perfil do estilo de vida de longevos. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2016;19(5):819-26.
  • Financiamento da pesquisa:
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo nº 472082/2012-4. Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). Processo nº BPD-00024-14 e nº PPM-00017-14.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2017

Histórico

  • Recebido
    11 Abr 2017
  • Revisado
    11 Jul 2017
  • Aceito
    11 Set 2017
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