Acessibilidade / Reportar erro

Revelação do diagnóstico de HIV dos pais

Resumo

Este artigo tem o propósito de avaliar evidências científicas, disponíveis na literatura, acerca dos fatores que interferem na decisão de revelar o diagnóstico de HIV dos pais para os filhos. Trata-se de revisão integrativa, desenvolvida nas bases de dados Medline e Lilacs, utilizando os termos [HIV or aids] and [criança or adolescente] and [revelação]. Selecionaram-se 14 artigos. Os fatores que interferem na decisão de revelar o diagnóstico foram: capacidade cognitiva e maturidade da criança; fortalecimento dos laços familiares; informações para a criança acerca da doença; adoecimento e morte dos pais; descoberta por terceiros; estigma e preconceito; reações negativas da criança; modo de falar da doença com a criança; e medo de perder o poder parental. Portanto, indica-se preparo para revelação do diagnóstico, de modo compartilhado entre os familiares que cuidam da criança e os profissionais de saúde que mantêm vínculo com essa família.

Palavras-chave:
HIV; Síndrome da imunodeficiência adquirida; Saúde da criança; Saúde do adolescente; Revelação da verdade; Família

Abstract

The aim was to assess scientific evidence available in the literature about the factors that influence the decision to disclose the parents’ HIV diagnosis to their children. The type study is integrative review in the Medline and Lilacs databases, using the words [HIV or aids] and [criança or adolescente] and [revelação]. 14 articles were selected. Factors influencing the decision to disclose the diagnosis were: the cognitive ability and maturity of the child, the strengthening of family ties, the information provided to the child about the disease, parental illness and death, the discovery by third parties, stigma and prejudice, negative reactions from the children, the way to talk about the disease with the child, and the fear of losing parental power. Therefore, a process of preparation for disclosure of the diagnosis, shared among family members who take care of the child and health professionals who maintain ties with the family, was identified.

Keywords:
HIV; Acquired immunodeficiency syndrome; Child health; Adolescent health; Truth disclosure; Family

Resumen

El objetivo de este texto fue evaluar la evidencia científica disponible en la literatura sobre los factores que influyen en la decisión de revelar el diagnóstico de VHI de los padres a los hijos. El tipo de estudio es una revisión integral en las bases de datos Medline y Lilacs, utilizando las palabras [HIV or aids] and [criança or adolescente] and [revelação]. Se seleccionaron 14 artículos. Los factores que influyen en la decisión de revelar el diagnóstico fueron: la capacidad cognitiva y la madurez del niño; el fortalecimiento de los lazos familiares; informaciones para el niño acerca de la enfermedad; enfermedad y muerte de los padres; descubrimiento por parte de terceros; estigma y prejuicio; reacciones negativas de los niños; modo de hablar sobre la enfermedad con los niños; y, miedo a perder el poder parental. Por lo tanto, se recomienda una preparación para la revelación del diagnóstico, de modo compartido entre los familiares que cuidan al niño y los profesionales de salud que mantienen vínculos con esa familia.

Palabras clave:
VIH; Síndrome de inmunodeficiencia adquirida; Salud del niño; Salud del adolescente; Revelación de la verdad; Familia

A aids se configura mundialmente como problema de saúde pública, pois desde os primeiros casos, notificados na década de 1980, está em progressiva disseminação, com repercussões no indivíduo, na família, na sociedade e na política pública11. Costa JSD, Victora CG. O que é “um problema de saúde pública”?. Rev Bras Epidemiol. 2006;9(1):144-51.33. Sousa AM, Lyra A, Araújo CCF, Pontes JL, Freire RC, Pontes TL. A política de aids no Brasil: uma revisão de literatura. J Manag Prim Health Care. 2012;3(1):62-6.. No curso da epidemia, apresentou mudanças quantitativas, no que se refere à progressão dos casos notificados, e qualitativas, no que se refere a feminização, juvenização, pauperização e interiorização das características epidemiológicas44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Boletim Epidemiológico: HIV Aids. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [acesso 31 maio 2016]. Disponível: http://bit.ly/1Sgwdh4
http://bit.ly/1Sgwdh4...
,55. Silva RAR, Duarte FHS, Nelson ARC, Holanda JRR. A epidemia da aids no Brasil: análise do perfil atual. Rev Enferm UFPE. 2013;7(10):6039-46.. O Brasil mantém políticas de acesso universal e gratuito ao tratamento antirretroviral (TARV) desde 1996 para a atenção à saúde das pessoas infectadas pelo HIV. Essa iniciativa que possibilita maior perspectiva de vida com qualidade66. Galvão MTG, Soares LL, Pedrosa SC, Fiuza MLT, Lemos LA. Qualidade de vida e adesão à medicação antirretroviral em pessoas com HIV. Acta Paul Enferm. 2015;28(1):48-53., permitindo que os infectados mantenham seus projetos de vida, como formação e ampliação da família.

Na perspectiva da aids em família, destaca-se que crianças infectadas pelo HIV foram, majoritariamente, expostas a transmissão vertical44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Boletim Epidemiológico: HIV Aids. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [acesso 31 maio 2016]. Disponível: http://bit.ly/1Sgwdh4
http://bit.ly/1Sgwdh4...
, sendo seus pais, consequentemente, também soropositivos77. Faria ER, Silva MR, Kessler HP, Gonçalves TR, Carvalho FT, Piccinini CA. Intervenções psicológicas para crianças que vivem ou convivem com HIV/Aids. PsicoUSF. 2013;18(1):65-76.,88. Gomes GC, Pintanel AC, Strasburg AC, Xavier DM. Face singular do cuidado familiar à criança portadora do vírus HIV/AIDS. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):749-54.. Os desafios clínicos e sociais vivenciados tanto pelos pais e filhos quanto pelos profissionais que desenvolvem a atenção à saúde dessa população99. Motta MGC, Ribeiro AC, Poletto PMB, Issi HB, Ribeiro NRR, Padoin SMM. Cuidado familial no mundo da criança e adolescente que vivem com HIV/aids. Cienc Enferm. 2014;20(3):69-79.,1010. Schaurich D, Freitas HMB. O referencial de vulnerabilidade ao HIV/aids aplicado às famílias: um exercício reflexivo. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(4):989-95. são muitos. Entre as demandas clínicas estão, principalmente, acompanhamento permanente de saúde e adesão ao tratamento medicamentoso66. Galvão MTG, Soares LL, Pedrosa SC, Fiuza MLT, Lemos LA. Qualidade de vida e adesão à medicação antirretroviral em pessoas com HIV. Acta Paul Enferm. 2015;28(1):48-53.,1111. Trombini ES, Schermann LB. Prevalência e fatores associados à adesão de crianças na terapia antirretroviral em três centros urbanos do sul do Brasil. Ciênc. saúde coletiva. 2010;15(2):419-25..

Repercussões sociais da soropositividade envolvem a rede de apoio familiar tanto para suporte emocional dos pais quanto para demandas de cuidado cotidiano das crianças88. Gomes GC, Pintanel AC, Strasburg AC, Xavier DM. Face singular do cuidado familiar à criança portadora do vírus HIV/AIDS. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):749-54.,1212. Frota MA, Ramos RP, Mourão SJG, Vasconcelos VM, Martins MC, Araújo MAL. Cuidado à criança com HIV: percepção do cuidador. Acta Sci, Health Sci. 2012;34(1):39-45.. Essa rede, na maioria das vezes, é restrita devido ao ocultamento do diagnóstico, relacionado ao medo do preconceito decorrente do estigma pertinente à resposta social à epidemia1313. Langendorf TF, Padoin SMM, Paula CC, Silva CB, Rocha FS. Rede de apoio das gestantes e puérperas na profilaxia transmissão vertical do HIV: revisão integrativa. Evidentia. 2013;10(43):1-7,1414. Paula CC, Cabral IE, Souza IEO. O (não) dito da aids no cotidiano de transição da infância para adolescência. Rev Bras Enferm. 2011;64(4):658-64..

Entre os desafios enfrentados pelas famílias, destaca-se a revelação do diagnóstico de soropositividade dos pais para seus filhos. Constitui processo influenciado por fatores da família e da própria criança, bem como da sociedade e dos profissionais de saúde. Requer o envolvimento e disponibilidade daqueles implicados na atenção à saúde das crianças e adolescentes.

A revelação do diagnóstico pode trazer inúmeros benefícios, mas há familiares temerosos de a criança não estar preparada o suficiente para entendê-lo e para lidar com a informação1515. Domek GJ. Debunking common barriers to pediatric HIV disclosure. J Trop Pediatr. 2010;56(6):440-2.1818. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em crianças e adolescentes. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [acesso 31 maio 2016]. Disponível: http://bit.ly/2bzuBOP
http://bit.ly/2bzuBOP...
, fazendo que os familiares adiem sua divulgação. Diante desse contexto, tem-se como objetivo avaliar evidências científicas, disponíveis na literatura, acerca dos fatores que interferem na decisão de revelar o diagnóstico de HIV dos pais para os filhos.

Método

Trata-se de estudo de revisão integrativa que se propõe sistematizar a literatura1919. Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2008;17(4):758-64. em busca de evidências que respondam à seguinte questão: “Quais são os fatores que interferem na decisão de revelar o diagnóstico de HIV dos pais para os filhos?”. O levantamento bibliográfico acessou as bases de dados eletrônicas Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), utilizando os termos [HIV or aids] and [criança or adolescente] and [revelação].

A busca foi empreendida em março de 2015. Para selecionar o corpus foram utilizados os seguintes critérios de inclusão: resumos disponíveis na base de dados; artigos de pesquisa; temática da revelação do diagnóstico de HIV dos pais para os filhos; artigos disponíveis on-line e gratuitamente na íntegra; idiomas português, inglês ou espanhol. Com a intenção de captar o maior número de artigos possível que respondessem à questão de pesquisa, não foi estabelecido recorte temporal. Entre as 550 publicações científicas identificadas nas bases de dados, 14 foram selecionadas, conforme o fluxograma de inclusão (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma de inclusão de artigos no estudo de revisão de revelação do diagnóstico de HIV dos pais para os filhos nas bases Lilacs e Medline, 2015

Esse fluxograma de seleção foi executado de modo independente por dois pesquisadores, a fim de diminuir qualquer viés de inclusão. Quando não houve consenso, um terceiro pesquisador (orientador do estudo) foi consultado. Foi utilizada ficha de extração documental para os 14 estudos selecionados2020. Ursi ES, Galvão CM. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura. Rev Latino-Am Enferm. 2006;14(1):124-31.. Desenvolveu-se avaliação da força de evidências, sendo estas classificadas de acordo com os sete níveis:

  • Nível I – são evidências provenientes de revisão sistemática ou metanálise de ensaios clínicos randomizados controlados ou oriundas de diretrizes clínicas baseadas em revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados controlados;

  • Nível II – são evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado;

  • Nível III – são evidências obtidas de ensaios clínicos bem delineados sem randomização;

  • Nível IV – são evidências provenientes de estudos de coorte e de caso-controle bem delineados;

  • Nível V – são evidências originárias de revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos;

  • Nível VI – são evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo;

  • Nível VII – são evidências oriundas de opinião de autoridades e/ou relatório de comitês de especialista2121. Fineout-Overholt E, Stillwell SB. Asking compelling, clinical questions. In: Melnyk BM, Fineout-Overholt E. Evidence-based practice in nursing & healthcare: a guide to best practice. Philadelphia: Wolters Kluwer, Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 25-39..

A análise descritiva indicou a síntese de cada publicação e as comparações dos principais resultados que respondem à questão da pesquisa. Quanto aos aspectos éticos, foram respeitadas as definições, considerações e apreciações utilizadas pelos próprios autores dos estudos primários selecionados, sendo apresentadas fidedignamente.

Resultados e discussão

Quanto à caracterização dos artigos analisados, verificou-se predomínio de estudos desenvolvidos nos países da África (n=7), seguido dos EUA (n=6) e Índia (n=1). Na área do conhecimento, houve concentração de artigos de medicina (n=6), seguidos de psicologia (n=5) e multiprofissional (n=3). Verificou-se investimento crescente no quantitativo de publicações na temática de revelação do diagnóstico de HIV, com concentração nos últimos dois triênios: 2000-2002 (n=3), 2003-2005 (n=1), 2006-2008 (n=1), 2009-2011 (n=5) e 2012-2014 (n=4). No delineamento predominaram estudos qualitativos (n=8), seguidos de quantitativos não experimentais (n=4), qualiquantitativo (n=1) e estudo clínico randomizado (n=1). Quanto à classificação das evidências, predominaram estudos de nível 6 (n=9), seguido do nível 4 (n=4) e nível 1 (n=1).

Como evidências científicas para os fatores que interferem na decisão de revelar o diagnóstico de HIV dos pais para os filhos, identificaram-se: capacidade cognitiva e maturidade da criança; fortalecimento dos laços familiares; informações para a criança acerca da doença; adoecimento e morte dos pais; descoberta por terceiros; estigma e preconceito; reações negativas das crianças; modo de falar da doença com a criança; e medo de perder o poder parental2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59. (Quadro 1, anexo Anexo Quadro 1 Extração de dados dos artigos incluídos, relacionados à revelação do diagnóstico de HIV dos pais para os filhos nas bases Lilacs e Medline, 2015 Referência Objetivos Métodos Resultados Fatores que favorecem Fatores que desfavorecem Pilowsky, Sohler, Susser22 Conhecer as razões dadas por mães com aids para divulgar ou não seu diagnóstico para seus filhos Qualitativo: 29 mães residentes em uma das duas instalações de Nova York que fornecem alojamento e tratamento médico para adultos com aids Idade suficiente da criança Declínio da saúde ou aparência física dos pais Medo da morte Estigma e discriminação Preocupação com os sentimentos dos filhos Armistead, Tannenbaum, Forehand, Morse, Morse23 Fornecer informações às famílias afetadas pelo HIV e aos profissionais sobre como tomar decisões relacionadas a divulgação Qualitativo: 87 mães afro-americanas infectadas pelo HIV e um dos seus filhos, não infectado Diagnóstico mais grave Maior rede social Filhos mais velhos Não apresentou resultados de fatores que desfavorecem a revelação Lee, Rotheram-Borus24 Examinar o impacto da revelação do diagnóstico de HIV do pai a todos os filhos adolescentes Quantitativo: coorte representativa de pais que vivem com HIV (n=301) e seus filhos (n=395) em cinco anos Diagnóstico mais grave Filhos mais velhos Não apresentou resultados de fatores que desfavorecem a revelação Nöstlinger, Jonckheer, Belder, Wijngaerden, Wylock, Pelgrom et al.25 Identificar o número de pais ou cuidadores em amostra de pessoas que vivem com HIV em Flandres, o número de crianças afetadas pelo HIV, e as características específicas relacionadas à família Quantitativo-qualitativo: 628 pacientes de três centros de referência para aids Diagnóstico mais grave Conhecimento prévio por outros membros da família • Preocupação com os sentimentos dos filhos Rwemisisi, Wolff, Coutinho, Grosskurth, Whitworth26 Avaliar atitudes de pais e atuais política e prática de aconselhamento em matéria de testes de crianças e divulgação dos pais em Uganda antes da terapia antirretroviral Qualitativo: 10 pais soropositivos recrutados da Organização de Apoio a SIDA (TASO) Idade suficiente da criança (em média aos 18 anos) Preocupação com os sentimentos dos filhos Medo do estigma Medo de que a criança venha a descobrir por terceiros, que não seja os integrantes da família Thomas, Nyamathi, Swaminathan27 Explorar percepções e necessidades de mães que vivem com HIV para enfrentar os desafios em relação ao seu comportamento em busca de saúde, medos em torno da divulgação e questões relacionadas com estigma e discriminação Qualitativo: 60 mães infectadas pelo HIV recrutadas a partir de um grande hospital maternidade e clínica de DST em Chennai, Índia Idade suficiente da criança Medo de que a criança não consiga manter segredo Delaney, Serovich, Lim28 Explorar as diferenças psicológicas entre mulheres HIV positivas que revelaram seu diagnóstico a todos, alguns ou nenhum de seus filhos biológicos Quantitativo: 90 mulheres com criança Idade suficiente da criança (em média aos 14,6 anos) Não apresentou resultados de fatores que desfavorecem a revelação Nam, Fielding, Avalos, Gaolathe, Dickinson, Geissler29 Relacionar adesão a terapia antirretroviral com a divulgação do HIV dos pais a seus filhos Qualitativo: 21 pacientes HIV positivos em terapia antirretroviral em Botsuana Diagnóstico mais grave Conhecimento prévio por outros membros da família Idade insuficiente da criança Preocupação com os sentimentos dos filhos Kennedy, Cowgill, Bogart, Corona, Ryan, Murphy et al.30 Descrever, retrospectivamente, o processo de aprendizagem das crianças cujos pais eram HIV positivo Qualitativo: 33 pais infectados pelo HIV, 27 de seus filhos menores, 19 filhos adultos e 15 cuidadores Idade suficiente da criança (entre 7 e 18 anos) Melhorar o relacionamento com pai Preocupação com os sentimentos dos filhos Medo do estigma Medo de que a criança venha a descobrir pelos outros Estigma e discriminação Murphy, Armistead, Marelich, Payne, Herbeck31 Avaliar o programa Teaching, Raising, and Communicating with Kids (TRACK) como intervenção piloto longitudinal para ajudar mães que vivem com o HIV para revelar seu diagnóstico a seus filhos jovens (entre 6 e 12 anos) Quantitativo: 80 díades Não apresentou resultados de fatores que favorecem a revelação. Preocupação com os sentimentos dos filhos Kyaddondo, Wanyenze, Kinsman, Hardon32 Examinar dilemas morais e incentivos pragmáticos que cercam a revelação do estado de HIV em Uganda Quantitativo: 148 pessoas HIV positivo Idade suficiente da criança (início da adolescência) Obrigação moral de informar aos filhos para transferência de responsabilidades familiares ou solicitação de apoio Medo de perder o poder paternal e o respeito dos filhos Culpabilização Sentimento de ódio pelos pais após a divulgação Preocupação com os sentimentos dos filhos Madiba33 Examinar o contexto social que influencia revelação do HIV dos pais para crianças, na perspectiva de pais e mães que acessam um hospital universitário na África do Sul Qualitativo: 26 pais não biológicos de crianças com idade entre 7 e 18 anos Idade suficiente da criança (em média aos 18 anos) Prevenção de comportamentos de risco Melhorar a comunicação sobre aids entre pais e filhos Medo de perguntas difíceis Medo de que a criança não consiga manter segredo Preocupação com os sentimentos dos filhos Falta de preparo dos pais Medo de perder o respeito dos filhos ou de seu julgamento Medo de ser discriminado por seus próprios filhos Rochat, Mkwanazi, Bland34 Descrever o desenvolvimento de intervenção estruturada centrada na família para apoiar mães a revelar seu diagnóstico de HIV para filhos HIV negativos na África do Sul rural, área com alta prevalência de HIV Qualitativo: 24 famílias Zulu, todas as mães eram HIV positivas e uma criança, HIV negativa Idade suficiente da criança (entre 10 e 18 anos) Melhora nas relações familiares e compreensão dos papéis e responsabilidades Aumento das atividades de promoção da saúde Melhora da confiança dos pais na promoção da saúde e educação sexual Aumento da discussão sobre riscos à criança, incluindo assédio moral, problemas com professores, abuso físico e sexual Medo de perguntas difíceis, relativas à fonte da infecção por HIV, ou morte Medo de que a criança não consiga manter segredo Tiendrebeogo, Hejoaka, Belem, Compaoré, Wolmarans, Soubeiga et al.35 Analisar se os pais revelam sua soropositividade aos filhos, os motivos da revelação, como procedem e como as crianças respondem Qualitativo: 63 pais de crianças com 7 anos de idade e que tinham estado em tratamento por mais de três anos em duas cidades grandes de Burkina Faso Idade suficiente da criança (mais velha) Empatia sobre a situação do pai Passo preliminar em direção a tomar providências para o futuro da criança, em caso de incapacidade ou morte materna Preocupação materna em relação à criança sobre a morte e o morrer; Indicações de que a criança pode não entender o que é dito; Desejo de proteger a criança de preocupações dolorosas ).

Os estudos apontaram que os pais esperam seus filhos ficarem maduros o suficiente para entender a explicação acerca do diagnóstico de HIV3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.,3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61. e que a revelação do diagnóstico deve acontecer quando se percebe que a criança é capaz de compreender e lidar com essa informação2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.. Crianças mais velhas2424. Lee MB, Rotheram-Borus MJ. Parents’ disclosure of HIV to their children. Aids. 2002;16(16):2201-7.,2727. Thomas B, Nyamathi A, Swaminathan S. Impact of HIV/Aids on mothers in southern India: a qualitative study. Aids Behav. 2009;13(5):989-96.,3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147.,3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59., no início da adolescência3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.,3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105. e entre as idades de 142828. Delaney RO, Serovich JM, Lim JY. Psychological differences between HIV-positive mothers who disclose to all, some, or none of their biological children. J Marital Fam Ther. 2009;35(2):175-80. e 18 anos3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.,3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61.,3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147. eram mais propensas a compreender a condição dos pais.

Segundo a teoria cognitiva, o desenvolvimento pode ser considerado processo de sucessivas mudanças, tanto qualitativas quanto quantitativas, das estruturas cognitivas. Essas mudanças acontecem em estágios (sensório-motor; pré-operatório; operatório-concreto; operatório-formal) que seguem idades mais ou menos determinadas (0-2 anos; 2-7 anos; 7-11 anos; 12 em diante, respectivamente). Destacando os dois últimos estágios, compreende-se que entre 7 e 11 anos a criança desenvolve noções de tempo, espaço e causalidade, sendo capaz de relacionar diferentes aspectos e abstrair dados da realidade. A partir dos 12 anos, as estruturas cognitivas da criança alcançam seu nível mais elevado de desenvolvimento e tornam-se aptas a aplicar raciocínio lógico3636. Piaget J. Seis estudos da psicologia. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2012.. Assim, é possível compreender essa referência a determinadas idades para revelação do diagnóstico, sendo indicada pela avaliação que os pais fazem da capacidade da criança de entender o diagnóstico que precisa ser comunicado entre a família.

O primeiro estágio (0-2 anos) corresponde à fase em que a criança não dispõe de representação mental e seu pensamento é difuso, tornando difícil a absorção de regras (anomia). O segundo e terceiro estágios (2-7 anos e 7-11 anos) correspondem à fase em que a criança segue as regras postas por outros, internalizando orientações e questionando pouco (heteronomia). O quarto estágio (12 anos em diante) é a fase em que se relacionam com as regras estabelecidas e sugerem novas, construindo acordos, atendendo à capacidade de refletir criticamente (autonomia)3636. Piaget J. Seis estudos da psicologia. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2012.. Essa perspectiva sustenta a vivência dos pais de esperar a criança ser capaz de compreender e lidar com o diagnóstico para proceder à revelação. Entretanto, não revelar o diagnóstico ao filho, mesmo diante de sua capacidade cognitiva de entender a situação, restringe sua autonomia.

A revelação pode ser compreendida como possibilidade de fortalecer laços entre pais e filhos, pois favorece a melhor comunicação sobre aids entre eles3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.,3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45., melhora as relações familiares e compreensão dos papéis e responsabilidades para com a criança3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147., ajuda a entender a situação do pai3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59. e favorece aproximação entre pais e filhos, como resultado positivo da revelação3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.. Essa comunicação entre pais e filhos, mesmo quando se trata de más notícias, é importante para o bem-estar e para o relacionamento em família. Entende-se “má notícia” aquela que afeta de forma negativa a visão do paciente sobre o futuro, envolve ameaça ao bem-estar físico e/ou mental ou reduz a possibilidade de escolhas na vida imediata ou futura3737. Gonçalves SP, Forte IG, Setino JA, Cury PM, Salomão JB Jr, Miyazaki MCOS. Comunicação de más notícias em pediatria: a perspectiva do profissional. Arq Ciênc Saúde. 2015;22(3):74-8..

Os pais revelaram sua condição para seus filhos como forma de educá-los acerca da doença, para que possam se cuidar e evitar serem infectados pelo HIV3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147., fornecendo informações para prevenção de comportamento de risco3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147.. Entretanto, as concepções acerca da morte podem levar os pais a adiar a revelação, pois acreditam que, ao saber do diagnóstico de HIV, os filhos poderiam pensar que seus pais fossem morrer2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.. As mães expressaram preocupações, incluindo temores acerca de informações que a criança possa levantar sobre HIV e morte3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147., e consideram a divulgação um passo preliminar para tomar providências para o futuro da criança em caso de incapacidade ou morte materna2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34..

O adoecimento dos pais é motivo que os leva a revelar seu diagnóstico, e relaciona-se com a necessidade de garantir assistência à infância caso venham a falecer2323. Armistead L, Tannenbaum L, Forehand R, Morse E, Morse P. Disclosing HIV status: are mothers telling their children? J Pediatr Psychol. 2001;26(1):11-20.,2525. Nöstlinger C, Jonckheer T, Belder E, Wijngaerden EV, Wylock C, Pelgrom J et al. Families affected by HIV: parents’ and children's characteristics and disclosure to the children. Aids Care. 2004;16(5):641-8.,2929. Nam SL, Fielding K, Avalos A, Gaolathe T, Dickinson D, Geissler PW. Discussing matters of sexual health with children: what issues relating to disclosure of parental HIV status reveal. Aids Care. 2009;21(3):389-95.,3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59.. Pais com diagnósticos mais graves eram mais propensos a contar para seus filhos2323. Armistead L, Tannenbaum L, Forehand R, Morse E, Morse P. Disclosing HIV status: are mothers telling their children? J Pediatr Psychol. 2001;26(1):11-20.,2424. Lee MB, Rotheram-Borus MJ. Parents’ disclosure of HIV to their children. Aids. 2002;16(16):2201-7.,2929. Nam SL, Fielding K, Avalos A, Gaolathe T, Dickinson D, Geissler PW. Discussing matters of sexual health with children: what issues relating to disclosure of parental HIV status reveal. Aids Care. 2009;21(3):389-95. e percebiam a necessidade deles saberem a razão de seu progenitor ficar doente2525. Nöstlinger C, Jonckheer T, Belder E, Wijngaerden EV, Wylock C, Pelgrom J et al. Families affected by HIV: parents’ and children's characteristics and disclosure to the children. Aids Care. 2004;16(5):641-8.. A saúde ou aparência física em declínio foram fatores que estavam associados à revelação do diagnóstico2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.. O medo da morte quando os pais adoecem está associado à alta letalidade da doença antes do advento do tratamento antirretroviral eficaz, e persiste – mesmo que nos dias atuais a aids seja considerada condição crônica de saúde.

Ponto que levou os pais a retardar a revelação foi a possibilidade da descoberta por terceiros, pois têm medo de que as crianças não sejam capazes de manter segredo, revelando sua condição para outras pessoas, expondo, assim, suas vidas2727. Thomas B, Nyamathi A, Swaminathan S. Impact of HIV/Aids on mothers in southern India: a qualitative study. Aids Behav. 2009;13(5):989-96.,3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.,3434. Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147.. Os pais que retardaram a divulgação também tinham o intuito de proteger a criança do estigma e discriminação relacionados ao HIV2222. Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.,2626. Rwemisisi J, Wolff B, Coutinho A, Grosskurth H, Whitworth J. “What if they ask how I got it?”: dilemmas of disclosing parental HIV status and testing children for HIV in Uganda. Health Policy Plan. 2008;23(1):36-42.,3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61., pois temem que, caso os pais de outras crianças descobrissem que têm HIV, não mais permitiriam que seus filhos brincassem juntos3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.. Ademais, têm medo de serem estigmatizados ou discriminados pelos próprios filhos3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61..

As dificuldades de comunicação ocorrem em quaisquer situações relacionais, especialmente quando envolvem doença e morte. Nesta situação específica, são ainda agravadas pelo estigma da aids, além das vulnerabilidades das crianças e adolescentes e das limitações das famílias para enfrentar o desafio da revelação, assim como o (des)preparo do profissional para promover apoio.

A geração de sentimentos negativos nas crianças contribuiu para postergar a revelação. Os pais descrevem medo de machucar3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105. seus filhos e de eles reagirem negativamente à divulgação3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61., medo de que as crianças ficassem chocadas e envergonhadas2626. Rwemisisi J, Wolff B, Coutinho A, Grosskurth H, Whitworth J. “What if they ask how I got it?”: dilemmas of disclosing parental HIV status and testing children for HIV in Uganda. Health Policy Plan. 2008;23(1):36-42.. Temem sentimentos de rejeição, ódio e culpa3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.. Os pais queriam de certa forma proteger a criança de preocupações e medos3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.,3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59., considerando que o conhecimento sobre a doença seria muito doloroso para a criança2626. Rwemisisi J, Wolff B, Coutinho A, Grosskurth H, Whitworth J. “What if they ask how I got it?”: dilemmas of disclosing parental HIV status and testing children for HIV in Uganda. Health Policy Plan. 2008;23(1):36-42.,2929. Nam SL, Fielding K, Avalos A, Gaolathe T, Dickinson D, Geissler PW. Discussing matters of sexual health with children: what issues relating to disclosure of parental HIV status reveal. Aids Care. 2009;21(3):389-95.,3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.,3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61.. As reações negativas mais comuns das crianças após a divulgação do diagnóstico paterno foi medo pelo estado de saúde e de vida dos pais e medo de serem estigmatizadas pelos amigos3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.. Após divulgação, as crianças podem ficar assustadas e surpresas3131. Murphy DA, Armistead L, Marelich WD, Payne DL, Herbeck DM. Pilot trial of a disclosure intervention for HIV+ mothers: the TRACK program. J Consult Clin Psychol. 2011;79(2):203-14..

Empecilho comum era a forma de divulgação, pois os pais não sabiam como abordar o assunto. Sentiam medo de que pudessem ser feitas perguntas que não seriam capazes de responder3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61.3535. Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59. e de não serem capazes de descrever adequadamente a doença3030. Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al. Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.. No que se refere ao modo de desenvolvimento desse processo, o ato de informar se resume ao momento inicial de revelação da doença. Contudo, todas as informações devem estar inseridas na comunicação entre pais e filhos, perpassando os diversos momentos enfrentados por ambos nesse processo de revelação. A comunicação pode, ainda, estar associada ao suporte de profissionais e ao compartilhamento entre os envolvidos.

O medo de perder o poder paternal, de perder o respeito de seus filhos ou que seus próprios filhos formem julgamentos negativos em relação a eles3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.,3333. Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61. se revela como outra causa que leva ao adiamento da revelação. Ao saber que seus pais são soropositivos, algumas crianças podem considerá-los incapazes de assumir suas responsabilidades parentais. Já foi relatado que algumas crianças vieram a ter problemas de relacionamento com os pais após tomarem conhecimento da condição de soropositividade3232. Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.. É possível acreditar que os problemas desencadeados decorrem, predominantemente, de relações paternalistas, com interferência na autonomia da criança e do adolescente.

A discussão acerca da autonomia e do direito das crianças de conhecer o diagnóstico envolve questões éticas, e para cada um dos princípios existem prós e contras. Portanto, as especificidades de cada caso desempenham papéis importantes em equilibrar essas questões. Destaca-se que o princípio da autonomia pode ditar que a criança tem o direito de saber determinado diagnóstico. No entanto, eticamente, são capazes de assentir, mas não consentir, e os pais têm direitos e responsabilidades no cuidado de seus filhos.

O princípio da beneficência aponta que a divulgação poderia aumentar o sentimento de autonomia da criança, potencializando sua capacidade de cuidar de si, além de reduzir a ansiedade diante do desconhecido, minimizar o ressentimento por ter sido mantida na ignorância e possibilitar comunicação franca na família. O princípio da não maleficência indica preocupações, por exemplo, acerca de a criança sentir-se diferente dos demais ou de revelar a terceiros, expondo-se, bem como à sua família, à possibilidade de discriminação. Então, entende-se que, do ponto de vista cognitivo, crianças podem não ter a capacidade de compreender o diagnóstico de HIV e suas implicações, caso em que a divulgação pode causar danos3838. Klitzman R, Marhefka S, Mellins C, Wiener L. Ethical issues concerning disclosures of HIV diagnoses to perinatally infected children and adolescents. J Clin Ethics. 2008;19(1):31-42..

Por fim, resultados obtidos da associação entre o conhecimento do diagnóstico e os escores do Child behavior checklist evidenciaram que a presença de categoria clínica (a sopositividade ao HIV) para problemas de saúde mental e problemas sociais está associada à ocultação do diagnóstico. Esses dados contrapõem a premissa dos cuidadores de adiar a revelação do diagnóstico para evitar danos emocionais3939. Zabtoski KR, Benetti SPC. Características de saúde mental de crianças e adolescentes vivendo com HIV. Aletheia. 2013;41:81-94..

Considerações finais

Os estudos evidenciaram que vários fatores contribuem para revelação do diagnóstico dos pais para seus filhos. Portanto, indicam-se a importância e a necessidade de preparo dos pais para essa revelação, que se torna mais eficaz quando compartilhado com profissionais de saúde. Esse preparo, na concepção de que a revelação é processo que culmina no momento da divulgação propriamente dita, precisa estar revestido de estratégias pautadas na discussão dos benefícios da revelação, de modo a minimizar os fatores negativos e potencializar os atributos da família. Também se recomenda desenvolver estratégias de acompanhamento dos pais e dos filhos, devido às possíveis repercussões pós-revelação do diagnóstico.

As lacunas na produção do conhecimento foram: ausência da descrição do local da revelação, modo como ocorre a relação familiar entre pais e filhos nesse processo, modo como é desenvolvido o preparo dos pais para a revelação e suas repercussões. Diante disso, faz-se necessário investir em pesquisas com delineamentos que apresentem evidências fortes relativas ao tema investigado, especialmente na prática de atenção à saúde. É importante também envidar esforços para capacitar as equipes de saúde a ajudar os pais a vivenciar da melhor forma possível esse processo delicado.

  • Este artigo é parte dos resultados de dissertação em enfermagem apresentada por Pâmela Batista de Almeida, orientada por professor doutor Alberto Quintana e co-orientado pela doutora Cristiane Cardoso de Paula. Da banca participou a professora doutora Stela Maris de Mello Padoin, cujas considerações contribuíram para o aperfeiçoamento do trabalho.

Referências

  • 1
    Costa JSD, Victora CG. O que é “um problema de saúde pública”?. Rev Bras Epidemiol. 2006;9(1):144-51.
  • 2
    Oliveira ADF, Vieira MCA, Silva SPC, Mistura C, Jacobi CS, Lira MOSC. Repercussões do HIV no cotidiano de mulheres vivendo com aids. Rev Pesqui Cuid Fundam. 2015;7(1):1975-86.
  • 3
    Sousa AM, Lyra A, Araújo CCF, Pontes JL, Freire RC, Pontes TL. A política de aids no Brasil: uma revisão de literatura. J Manag Prim Health Care. 2012;3(1):62-6.
  • 4
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Boletim Epidemiológico: HIV Aids. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [acesso 31 maio 2016]. Disponível: http://bit.ly/1Sgwdh4
    » http://bit.ly/1Sgwdh4
  • 5
    Silva RAR, Duarte FHS, Nelson ARC, Holanda JRR. A epidemia da aids no Brasil: análise do perfil atual. Rev Enferm UFPE. 2013;7(10):6039-46.
  • 6
    Galvão MTG, Soares LL, Pedrosa SC, Fiuza MLT, Lemos LA. Qualidade de vida e adesão à medicação antirretroviral em pessoas com HIV. Acta Paul Enferm. 2015;28(1):48-53.
  • 7
    Faria ER, Silva MR, Kessler HP, Gonçalves TR, Carvalho FT, Piccinini CA. Intervenções psicológicas para crianças que vivem ou convivem com HIV/Aids. PsicoUSF. 2013;18(1):65-76.
  • 8
    Gomes GC, Pintanel AC, Strasburg AC, Xavier DM. Face singular do cuidado familiar à criança portadora do vírus HIV/AIDS. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):749-54.
  • 9
    Motta MGC, Ribeiro AC, Poletto PMB, Issi HB, Ribeiro NRR, Padoin SMM. Cuidado familial no mundo da criança e adolescente que vivem com HIV/aids. Cienc Enferm. 2014;20(3):69-79.
  • 10
    Schaurich D, Freitas HMB. O referencial de vulnerabilidade ao HIV/aids aplicado às famílias: um exercício reflexivo. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(4):989-95.
  • 11
    Trombini ES, Schermann LB. Prevalência e fatores associados à adesão de crianças na terapia antirretroviral em três centros urbanos do sul do Brasil. Ciênc. saúde coletiva. 2010;15(2):419-25.
  • 12
    Frota MA, Ramos RP, Mourão SJG, Vasconcelos VM, Martins MC, Araújo MAL. Cuidado à criança com HIV: percepção do cuidador. Acta Sci, Health Sci. 2012;34(1):39-45.
  • 13
    Langendorf TF, Padoin SMM, Paula CC, Silva CB, Rocha FS. Rede de apoio das gestantes e puérperas na profilaxia transmissão vertical do HIV: revisão integrativa. Evidentia. 2013;10(43):1-7
  • 14
    Paula CC, Cabral IE, Souza IEO. O (não) dito da aids no cotidiano de transição da infância para adolescência. Rev Bras Enferm. 2011;64(4):658-64.
  • 15
    Domek GJ. Debunking common barriers to pediatric HIV disclosure. J Trop Pediatr. 2010;56(6):440-2.
  • 16
    Galano E, Marco MAD, Succi RCM, Silva MH, Machado DM. Entrevista com os familiares: um instrumento fundamental no planejamento da revelação diagnóstica do HIV/aids para crianças e adolescentes. Ciênc. saúde coletiva. 2012;17(10):2739-48.
  • 17
    Schaurich D. Revelação do diagnóstico de aids à criança na compreensão de familiares. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(2):480-6.
  • 18
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em crianças e adolescentes. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [acesso 31 maio 2016]. Disponível: http://bit.ly/2bzuBOP
    » http://bit.ly/2bzuBOP
  • 19
    Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2008;17(4):758-64.
  • 20
    Ursi ES, Galvão CM. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura. Rev Latino-Am Enferm. 2006;14(1):124-31.
  • 21
    Fineout-Overholt E, Stillwell SB. Asking compelling, clinical questions. In: Melnyk BM, Fineout-Overholt E. Evidence-based practice in nursing & healthcare: a guide to best practice. Philadelphia: Wolters Kluwer, Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 25-39.
  • 22
    Pilowsky DJ, Sohler N, Susser E. Reasons given for disclosure of maternal HIV status to children. J Urban Health. 2000;77(4):723-34.
  • 23
    Armistead L, Tannenbaum L, Forehand R, Morse E, Morse P. Disclosing HIV status: are mothers telling their children? J Pediatr Psychol. 2001;26(1):11-20.
  • 24
    Lee MB, Rotheram-Borus MJ. Parents’ disclosure of HIV to their children. Aids. 2002;16(16):2201-7.
  • 25
    Nöstlinger C, Jonckheer T, Belder E, Wijngaerden EV, Wylock C, Pelgrom J et al Families affected by HIV: parents’ and children's characteristics and disclosure to the children. Aids Care. 2004;16(5):641-8.
  • 26
    Rwemisisi J, Wolff B, Coutinho A, Grosskurth H, Whitworth J. “What if they ask how I got it?”: dilemmas of disclosing parental HIV status and testing children for HIV in Uganda. Health Policy Plan. 2008;23(1):36-42.
  • 27
    Thomas B, Nyamathi A, Swaminathan S. Impact of HIV/Aids on mothers in southern India: a qualitative study. Aids Behav. 2009;13(5):989-96.
  • 28
    Delaney RO, Serovich JM, Lim JY. Psychological differences between HIV-positive mothers who disclose to all, some, or none of their biological children. J Marital Fam Ther. 2009;35(2):175-80.
  • 29
    Nam SL, Fielding K, Avalos A, Gaolathe T, Dickinson D, Geissler PW. Discussing matters of sexual health with children: what issues relating to disclosure of parental HIV status reveal. Aids Care. 2009;21(3):389-95.
  • 30
    Kennedy DP, Cowgill BO, Bogart LM, Corona R, Ryan GW, Murphy DA et al Parents’ disclosure of their HIV infection to their children in the context of the family. Aids Behav. 2010;14(5):1095-105.
  • 31
    Murphy DA, Armistead L, Marelich WD, Payne DL, Herbeck DM. Pilot trial of a disclosure intervention for HIV+ mothers: the TRACK program. J Consult Clin Psychol. 2011;79(2):203-14.
  • 32
    Kyaddondo D, Wanyenze RK, Kinsman J, Hardon A. Disclosure of HIV status between parents and children in Uganda in the context of greater access to treatment. Sahara J. 2013;10(1):37-45.
  • 33
    Madiba S. The impact of fear, secrecy, and stigma on parental disclosure of HIV status to children: a qualitative exploration with HIV positive parents attending an ART clinic in South Africa. Glob J Health Sci. 2012;5(2):49-61.
  • 34
    Rochat TJ, Mkwanazi N, Bland R. Maternal HIV disclosure to HIV-uninfected children in rural South Africa: a pilot study of a family-based intervention. BMC Public Health. 2013;13:147.
  • 35
    Tiendrebeogo G, Hejoaka F, Belem EM, Compaoré PLG, Wolmarans L, Soubeiga A et al. Parental HIV disclosure in Burkina Faso: experiences and challenges in the era of HAART. Sahara J. 2013;10(1):46-59.
  • 36
    Piaget J. Seis estudos da psicologia. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2012.
  • 37
    Gonçalves SP, Forte IG, Setino JA, Cury PM, Salomão JB Jr, Miyazaki MCOS. Comunicação de más notícias em pediatria: a perspectiva do profissional. Arq Ciênc Saúde. 2015;22(3):74-8.
  • 38
    Klitzman R, Marhefka S, Mellins C, Wiener L. Ethical issues concerning disclosures of HIV diagnoses to perinatally infected children and adolescents. J Clin Ethics. 2008;19(1):31-42.
  • 39
    Zabtoski KR, Benetti SPC. Características de saúde mental de crianças e adolescentes vivendo com HIV. Aletheia. 2013;41:81-94.

Anexo

Quadro 1
Extração de dados dos artigos incluídos, relacionados à revelação do diagnóstico de HIV dos pais para os filhos nas bases Lilacs e Medline, 2015

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    11 Ago 2015
  • Revisado
    10 Jun 2016
  • Aceito
    04 Jun 2016
Conselho Federal de Medicina SGAS 915, lote 72, CEP 70390-150, Tel.: (55 61) 3445-5932, Fax: (55 61) 3346-7384 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: bioetica@portalmedico.org.br