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Caso 5 / 2014 - Homem de 26 Anos, com Estenose Moderada da Valva Aórtica Bivalvulada e Dilatação da Aorta Ascendente

Estenose da Valva Aórtica; Aorta / anormalidades; Aneurisma Aórtico

Dados clínicos: O paciente é acompanhado desde o nascimento com diagnóstico de estenose discreta da valva aórtica bivalvulada. Permaneceu até há dois anos com gradiente de pressão transvalvar aórtico entre 30 a 40 mmHg e sem limitação física. Cansaço aos esforços é notado há dois anos, coincidindo com aumento do gradiente de pressão transvalvar para 60 mmHg além da evidência de discreta hipertrofia do ventrículo esquerdo pelo ecocardiograma (septo interventricular e parede posterior = 12 mm).

Exame físico: Eupneico, acianótico, pulsos normais. Peso: 86 Kg, Altura: 180 cm, PA: 120/80 mmHg, FC: 82 bpm, saturação O2 = 96%. A aorta era discretamente palpada na fúrcula.

No precórdio, ictus cordis não era palpado e não havia impulsões sistólicas. As bulhas cardíacas eram normofonéticas e auscultava-se sopro sistólico discreto, +/++ de intensidade, timbre rude, na área aórtica, fúrcula, vasos do pescoço e na borda esternal esquerda, acompanhado de frêmito. Havia estalido protossistólico nítido em todo o precórdio. O fígado não era palpado.

Exames complementares

Eletrocardiograma: (Figura 1) mostrava ritmo sinusal e morfologia normal das ondas P, QRS e T, sem sinais de sobrecarga cavitária. A repolarização ventricular era normal. AP: +40º, AQRS: 0º, AT: 20º.

Figura 1
Eletrocardiograma normal e radiografia de tórax mostra área cardíaca normal com morfologia arredondada por hipertrofia e dilatação do arco superior esquerdo decorrente da dilatação da aorta ascendente

Radiografia de tórax: mostra área cardíaca e trama vascular pulmonar normais em radiografia expirada. Havia dilatação discreta do arco superior direito demonstrativo de dilatação da aorta ascendente (Figura 1).

Ecocardiograma: Bi-Doppler mostrou cavidades cardíacas de tamanho e função normais. Havia discreta hipertrofia ventricular esquerda tendo 12 mm de espessura o septo ventricular e a parede posterior. O anel aórtico era de 35 mm, a aorta ascendente de 45 mm e o gradiente máximo de pressão transvalvar aórtico era de 60 mmHg, e o médio, de 45 mmHg. As outras medidas corresponderam a AE = 40, VD = 20, VE = 59, FE = 70%, delta D = 40%, PSVD = 25 mmHg (Figura 2).

Figura 2
Ecocardiograma salienta a turbulência na altura da valva aórtica em projeção apical de 5 câmaras à esquerda, e a aorta ascendente dilatada em corte longitudinal na borda esternal esquerda, à direita

Diagnóstico clínico: Estenose moderada da valva aórtica bivalvulada com dilatação da aorta ascendente, em paciente adulto em classe funcional II.

Raciocínio clínico: Os elementos clínicos eram compatíveis com o diagnóstico de estenose valvar aórtica de moderada repercussão, com sopro sistólico na área aórtica, cansaço aos esforços, corroborado pela dilatação discreta da aorta ascendente mostrada claramente na radiografia de tórax e confirmada pelo ecocardiograma. A confirmação dos dados foi estabelecida pelo gradiente de pressão transvalvar e pela hipertrofia de ventrículo esquerdo mostrados pelo ecocardiograma. A ausência de alterações da repolarização ventricular no ECG induz a que o gradiente de pressão não excede a 60 mmHg.

Diagnóstico diferencial: Os achados clínicos de exames complementares característicos de estenose valvar aórtica devem ser diferenciados de outros locais obstrutivos como em região supra ou subvalvar aórtica. A presença de nítido estalido de abertura valvar orienta para a obstrução a nível valvar, além da localização alta do sopro sistólico.

Conduta: A indicação operatória para troca valvar aórtica foi estabelecida em face de sintomas de cansaço aliados a sinais de agravamento evolutivo como do aumento do gradiente aórtico, da hipertrofia miocárdica e da dilatação da aorta ascendente. Não se cogitou de tratamento intervencionista percutâneo por se tratar de valva aórtica bivalvulada, com dilatação do anel aórtico, em face de riscos nítidos de surgimento de insuficiência aórtica. À operação foi ressecada a valva aórtica bivalvular espessada e realizada a operação de Bentall e De Bono com tubo plástico na aorta ascendente, recolocação das artérias coronarianas e implante de valva mecânica n. 23, com evolução favorável.

Comentários: A estenose aórtica valvar congênita quando discreta na criança e no jovem, com gradiente de pressão abaixo de 30 mm Hg, sofre acentuação na metade dos casos na idade adulta. Em presença de estenose por valva aórtica bivalvulada acresce ainda a maior possibilidade para dilatação mais acentuada da aorta ascendente. Acredita-se que essa dilatação seja dependente de jatos de fluxo anormal em direção ao vaso. No entanto, há defensores da alteração genética como sua causa. O tratamento intervencionista percutâneo não é recomendado nesses casos em vista do desabamento valvar após a dilatação por balão. A colocação de stent valvulado também encontra dificuldades, particularmente de ancoramento desse, em face da dilatação do anel aórtico. A indicação cirúrgica nesse caso se mostrou evidente em face do agravamento dos sintomas, do aumento do gradiente transvalvar, do surgimento da hipertrofia miocárdica, além da maior dilatação da aorta ascendente. Com a indicação operatória mais precoce se previnem os fenômenos adquiridos envolvidos com a estenose valvar que certamente colocam em maior risco evolutivo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2013
  • Revisado
    23 Jul 2013
  • Aceito
    30 Jul 2013
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