Resumos
FUNDAMENTO: Polimorfismos em genes relacionados ao desenvolvimento da aterosclerose, angiogênese e metabolismo da homocisteína (Hcy) podem ser fatores de risco para a doença arterial coronariana (DAC). OBJETIVO: Avaliar o efeito dos polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T na DAC e a associação desses polimorfismos com a gravidade e a extensão das lesões ateroscleróticas e concentrações de Hcy. MÉTODOS: 244 indivíduos foram avaliados através de angiografia coronariana e incluídos no estudo (145 com DAC e 99 indivíduos-controle). Os polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T foram investigados através das técnicas de PCR-SSCP e PCR-RFLP, respectivamente. Os níveis de homocisteína plasmática foram mensurados através de cromatografia líquida/espectrometria de massa seqüencial (CL/EMS). RESULTADOS: Não houve diferença significante em relação à distribuição de alelos e genótipos entre os grupos, para ambos os polimorfismos. A análise univariada mostrou uma freqüência maior do genótipo VEGF -2578AA no grupo com doença em três vasos (p=0,044). Além disso, o genótipo VEGF -2578CA foi observado mais freqüentemente entre indivíduos com <95% de estenose (p=0,010). Após ajuste para outros fatores de risco para DAC em um modelo multivariado, observou-se que o polimorfismo VEGF C-2578A não era um correlato independente da DAC (p=0,688). O polimorfismo MTHFR não mostrou qualquer relação com a extensão e/ou gravidade da DAC. O polimorfismo MTHFR C677T não mostrou uma associação direta com hiperhomocisteinemia ou aumento das concentrações médias de Hcy no plasma. CONCLUSÃO: Embora haja uma aparente associação entre o polimorfismo VEGF C-2578A e o desenvolvimento de aterosclerose coronariana, essa associação não é independente dos fatores de risco cardiovasculares convencionais.
Doença de artéria coronariana; aterosclerose; polimorfismo genético; homocisteína
BACKGROUND: Polymorphisms in genes involved in the atherosclerosis development, angiogenesis, and homocysteine (Hcy) metabolism could be risk factors for coronary artery disease (CAD). OBJECTIVE: To evaluate the effect of the VEGF C-2578A and MTHFR C677T polymorphisms on CAD, and the association of these polymorphisms with the severity and extension of atherosclerotic lesions and Hcy concentrations. METHODS: Two hundred and forty-four subjects were evaluated by coronary angiography and included in the study (145 with CAD and 99 controls). The VEGF C-2578A and MTHFR C677T polymorphisms were investigated by the PCR-SSCP and PCR-RFLP techniques, respectively. Plasma Hcy was quantified by liquid chromatography/sequential mass spectrometry (LC-MS/MS). RESULTS: There was no significant difference in allele and genotype distribution between the groups, for both polymorphisms. The univariate analysis showed a higher frequency of the VEGF -2578AA genotype in the group with three-vessel disease (p=0.044). In addition, the VEGF -2578CA genotype was observed more frequently among individuals with <95% stenosis (p=0.010). After adjustment for other risk factors for CAD in a multivariate model, the VEGF C-2578A polymorphism was not found to be an independent correlate of CAD (p=0.688). The MTHFR polymorphism did not show any association with the extension and/or severity of the CAD. The MTHFR C677T polymorphism showed no direct association with hyperhomocysteinemia or increased mean plasma concentrations of Hcy. CONCLUSION: Although there is an apparent association between VEGF C-2578A and the development of coronary atherosclerosis, this association is not independent of conventional cardiovascular risk factors.
Coronary artery disease; atherosclerosis; polymorphism, genetic; homocysteine
FUNDAMENTO: Polimorfismos en genes relacionados al desarrollo de la aterosclerosis, la angiogénesis y el metabolismo de la homocisteína (Hcy) pueden ser factores de riesgo para la enfermedad arterial coronaria (EAC). OBJETIVO: Evaluar el efecto de los polimorfismos VEGF C-2578A y MTHFR C677T en la EAC y la asociación de esos polimorfismos con la severidad y la extensión de las lesiones ateroscleróticas y concentraciones de Hcy. MÉTODOS: Se evaluaron a 244 individuos por medio de angiografía coronaria y se les incluyeron en el estudio (145 con EAC y 99 individuos-control). Los polimorfismos VEGF C-2578A y MTHFR C677T se investigaron mediante las técnicas de PCR-SSCP y PCR-RFLP, respectivamente. Se midieron los niveles de homocisteína plasmática por medio de cromatografía líquida/espectrometría de masa secuencial (CL/EMS). RESULTADOS: No hubo diferencia significante en relación con la distribución de alelos y genotipos entre los grupos, para ambos polimorfismos. El análisis univariado reveló una frecuencia mayor del genotipo VEGF-2578AA en el grupo con enfermedad en tres vasos (P=0,044). Además de ello, se observó el genotipo VEGF-2578CA con más frecuencia entre individuos con <95% de estenosis (p=0,010). Tras ajuste para otros factores de riesgo para EAC en un modelo multivariado, se evidenció que el polimorfismo VEGF C-2578A no era un correlato independiente de la EAC (p=0,688). El polimorfismo MTHFR no mostró cualquier relación con la extensión y/o severidad de la EAC. El polimorfismo MTHFR C677T no evidenció una asociación directa con hiperhomocisteinemia o aumento de las concentraciones promedio de Hcy en el plasma. CONCLUSIÓN: Si bien existe una aparente asociación entre el polimorfismo VEGF C-2578A y el desarrollo de aterosclerosis coronaria, esa asociación no es independiente de los factores de riesgo cardiovasculares convencionales.
Enfermedad de arteria coronaria; aterosclerosis; polimorfismo genético; homocisteína
ARTIGO ORIGINAL
BIOLOGIA MOLECULAR
Homocisteína e polimorfismos dos genes MTHFR e VEGF: impacto na doença arterial coronariana
Alexandre Rodrigues GuerzoniI; Patrícia Matos BiselliI; Moacir Fernandes de GodoyI; Doroteia Rossi Silva SouzaI; Renato HaddadII; Marcos Nogueira EberlinII; Erika Cristina Pavarino-BertelliI; Eny Maria Goloni-BertolloI
IFaculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FAMERP, São José do Rio Preto, SP
IIFaculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Campinas, SP - Brasil
Correspondência Correspondência: Patrícia Matos Biselli Av. Brigadeiro Faria Lima, 5416 São Pedro, 15.090-000 São José do Rio Preto, SP - Brasil E-mail: patriciabiselli@famerp.br
RESUMO
FUNDAMENTO: Polimorfismos em genes relacionados ao desenvolvimento da aterosclerose, angiogênese e metabolismo da homocisteína (Hcy) podem ser fatores de risco para a doença arterial coronariana (DAC).
OBJETIVO: Avaliar o efeito dos polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T na DAC e a associação desses polimorfismos com a gravidade e a extensão das lesões ateroscleróticas e concentrações de Hcy.
MÉTODOS: 244 indivíduos foram avaliados através de angiografia coronariana e incluídos no estudo (145 com DAC e 99 indivíduos-controle). Os polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T foram investigados através das técnicas de PCR-SSCP e PCR-RFLP, respectivamente. Os níveis de homocisteína plasmática foram mensurados através de cromatografia líquida/espectrometria de massa seqüencial (CL/EMS).
RESULTADOS: Não houve diferença significante em relação à distribuição de alelos e genótipos entre os grupos, para ambos os polimorfismos. A análise univariada mostrou uma freqüência maior do genótipo VEGF -2578AA no grupo com doença em três vasos (p=0,044). Além disso, o genótipo VEGF -2578CA foi observado mais freqüentemente entre indivíduos com <95% de estenose (p=0,010). Após ajuste para outros fatores de risco para DAC em um modelo multivariado, observou-se que o polimorfismo VEGF C-2578A não era um correlato independente da DAC (p=0,688). O polimorfismo MTHFR não mostrou qualquer relação com a extensão e/ou gravidade da DAC. O polimorfismo MTHFR C677T não mostrou uma associação direta com hiperhomocisteinemia ou aumento das concentrações médias de Hcy no plasma.
CONCLUSÃO: Embora haja uma aparente associação entre o polimorfismo VEGF C-2578A e o desenvolvimento de aterosclerose coronariana, essa associação não é independente dos fatores de risco cardiovasculares convencionais.
Palavras-chave: Doença de artéria coronariana, aterosclerose, polimorfismo genético, homocisteína.
Introdução
O gene que codifica o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) tem sido estudado no desenvolvimento de doenças coronarianas1-3. O VEGF, presente nas paredes dos vasos, promove a proliferação das células endoteliais vasculares e a angiogênese, mas seu papel na aterosclerose ainda é pouco entendido. Há estudos que apontam o VEGF como um fator de proteção no desenvolvimento da placa aterosclerótica, ao agir como um regulador da integridade endotelial da parede arterial coronariana4,5. Por outro lado, há estudos mostrando que a neovascularização, mediada pelo VEGF, influencia a patogênese das doenças arteriais6.
Alterações das concentrações de VEGF podem ser mediadas por polimorfismos genéticos7,8. Vários polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs) foram descritos no gene VEGF. Renner e cols.7 descreveram três polimorfismos do gene VEGF (C702T, C936T e G1612A) e observaram níveis significantemente mais baixos de VEGF no plasma em carreadores do alelo 936T, quando comparados com não-carreadores. Os polimorfismos C702T e G1612 não mostraram associação com os níveis de VEGF. Níveis elevados também foram associados com o alelo G no nucleotídeo VEGF -11548. Em um estudo com pacientes submetidos à angiografia coronariana, o polimorfismo C-2578A foi considerado um fator de risco para o desenvolvimento de aterosclerose1. Essa variação genética já foi associada com uma menor expressão do VEGF8.
A hiperhomocisteinemia, isto é, aumento da concentração de homocisteína (Hcy) no sangue, é considerada um fator de risco independente para a aterosclerose e doença arterial coronariana (DAC)9. O aumento das concentrações de Hcy é encontrado em 40% dos pacientes com doença arterial coronariana, arterial cerebral ou arterial periférica e em apenas 15% de indivíduos saudáveis10.
O mecanismo através do qual a hiperhomocisteinemia induz o desenvolvimento de lesões vasculares ainda é pouco conhecido. Evidências experimentais sugerem que a Hcy pode estar envolvida na aterogênese e trombogênese, levando à hiperplasia da célula muscular e fibrose10,11. Concentrações anormais de Hcy podem resultar da interação de fatores genéticos e nutricionais12. A enzima metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR), que tem um papel importante no metabolismo da Hcy, apresenta diminuição da atividade como resultado do polimorfismo na posição 677 do gene MTHFR e leva ao aumento das concentrações de Hcy13. A variante alélica MTHFR 677T tem sido encontrada com alta freqüência em pacientes com doenças vasculares14-17.
No presente estudo, analisamos a freqüência dos polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T em pacientes com DAC e em um grupo de indivíduos sem sinais angiográficos da doença e avaliamos a associação entre esses polimorfismos e a gravidade e extensão das lesões ateroscleróticas e as concentrações plasmáticas de Hcy.
Métodos
Sujeitos do estudo
O presente estudo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa - CONEP, DF, Brasil. Após a obtenção do Consentimento Livre e Informado, 244 indivíduos caucasóides foram incluídos no estudo (145 com DAC e 99 sem a doença). O diagnóstico de DAC foi confirmado ou eliminado através de angiografia coronariana, analisada por dois observadores independentes em uma análise cega quantitativa feita no Laboratório de Cateterismo. Indivíduos que haviam sido submetidos à cirurgia cardíaca e aqueles com prótese coronária foram excluídos do estudo. Embora a miscigenação no Brasil seja disseminada, consideramos como Caucasóides aqueles indivíduos que não apresentavam outros grupos étnicos nas três gerações precedentes18.
A extensão da DAC foi determinada de acordo com o número de vasos coronários envolvidos (0 a 3) e a gravidade através do grau de obstrução arterial (estenose <50%, >50-75%, >75-95%, e >95%). A fração de ejeção (FE) < 40% foi considerada como dano ventricular. Angina típica foi considerada como presente ou ausente. Os fatores de risco clássicos para DAC também foram investigados. Os critérios para a definição de diabetes foram o uso de agentes hipoglicemiantes orais ou tratamento com insulina, ou níveis glicêmicos >126 mg/dl; para hipertensão, o uso de medicação anti-hipertensiva ou pressão arterial >140/90 mmHg; para sedentarismo, a ausência de exercícios regulares e controlados; para alcoolismo, a ingestão de álcool com uma freqüência definida sem uma análise quantitativa; indivíduos que haviam fumado >100 cigarros durante a sua vida e no momento fumavam todos os dias ou em alguns dias, foram considerados fumantes.
Análise bioquímica
Amostras de sangue periférico dos pacientes foram coletadas durante o exame angiográfico, após jejum de 12 horas. A separação do plasma foi feita em até uma hora após a coleta do sangue para a mensuração da Hcy, de acordo com o método de cromatografia líquida/espectrometria de massa seqüencial (CL/EMS)19. As concentrações de Hcy >15µmol/ml foram consideradas como caracterizadoras de hiperhomocisteinemia20. Os procedimentos para determinação do perfil lipídico foram Feitos No Laboratório de Análises Clínicas do Hospital de Base da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.
Triglicérides (TG), colesterol total (CT), lipoproteínas de alta densidade (HDLc) e lipoproteínas de baixa densidade (LDLc) foram mensurados pelo método colorimétrico enzimático.
Determinação de genótipo
DNA genômico foi extraído de leucócitos de sangue periférico21. O polimorfismo VEGF C-2578A foi investigado através do método de Reação de Polimerase em Cadeia - Polimorfismo Conformacional de Fita Simples (PCR-SSCP), de acordo com Brogan e cols.22. Trinta ciclos de amplificação (95ºC por 30s, 62ºC por 30s, e 72ºC por 60s) foram feitos para amplificar um produto de 309 pb. Então, 6 µl do produto da PCR foram denaturados a 95ºC por 5 minutos com 6 µl de solução corante para eletroforese (80% v/v formamida; 10mM NaOH; 1 mM EDTA, pH 8,0; 0,1% w/v de azul de bromofenol e 1,1% xilenocianol). Os produtos denaturados foram analisados por eletroforese em gel de poliacrilamida e visualizados após coloração com nitrato de prata.
A genotipagem para o polimorfismo MTHFR C677T foi feita através de PCR, seguida por digestão enzimática16. Trinta e cinco ciclos (94ºC por 60s, 58ºC por 60s, e 72ºC por 60s) foram executados para amplificar um produto de 198 pb. Os produtos de PCR forma digeridos com a enzima de restrição Hinf I e os fragmentos foram analisados em gel de poliacrilamida a 9,6% após coloração com nitrato de prata. O alelo C não foi digerido, enquanto o alelo T foi cortado em dois fragmentos de 175 e 23 pb, respectivamente.
Análise estatística
Os dados são apresentados como médias ± desvios-padrão (DP) ou números (porcentagens). A comparação entre os grupos foi feita utilizando-se o teste de Qui-quadrado, teste t de Student ou teste de Mann-Whitney, como apropriado. A análise de dependência foi utilizada para examinar as diferenças das freqüências de genótipo entre os grupos com uma, duas ou três artérias afetadas, e entre grupos com diferentes graus de estenose. Os valores de Hcy foram modelados baseando-se em uma distribuição normal na escala logarítmica. A concentração de Hcy em relação ao polimorfismo MTHFR foi avaliada através de análise de variância (ANOVA). A relação independente dos polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T com os fatores de risco na presença de DAC foi testada através de análise de regressão logística múltipla. Um valor de p < 0,05 foi utilizado para estabelecer a significância estatística.
Suporte financeiro
Fundação de Apoio à Pesquisa do estado de São Paulo (FAPESP).
Resultados
As características da população estudada são apresentadas na Tabela 1. Os resultados significantemente diferentes obtidos para indivíduos com e sem DAC estão de acordo com os fatores de risco cardiovascular previamente estabelecidos.
Polimorfismo do gene do fator de crescimento endotelial vascular (VEGF)
Não houve diferença significante entre os grupos em relação às freqüências de alelos (p=0.995) e genótipo (p=0.254) do polimorfismo VEGF C-2578A. Os cálculos para o teste de equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW) mostraram que a distribuição genotípica observada foi similar à esperada, no grupo com DAC e no grupo controle (x21=3,12; p=0,077 e x21=0,46; p=0,496, respectivamente).
As freqüências genotípicas de acordo com o número de vasos envolvidos e o grau de obstrução arterial são apresentadas nas Tabelas 2 e 3, respectivamente. Uma freqüência significantemente mais alta do genótipo VEGF -2578AA foi observada em indivíduos com três artérias afetadas (p=0,044). Em relação ao grau de obstrução arterial, o genótipo VEGF -2578CA foi observado mais freqüentemente em indivíduos com < 95% de estenose (p=0,010).
Polimorfismo do gene da metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR) e concentrações de homocisteína
Não houve diferença significante entre os grupos em relação às freqüências de alelos (p=0,895) e genótipo (p=0,884) do polimorfismo MTHFR C677T. A distribuição genotípica observada foi similar à esperada no grupo controle (x21=2,23; p=0,135), mas no grupo com DAC, mostrou desequilíbrio de Hardy-Weinberg, com uma diferença significante entre as freqüências observada e esperada (x21=5,76; p=0,016).
Nenhuma associação foi observada entre o polimorfismo MTHFR C677T e o número de vasos envolvidos e/ou o grau de obstrução arterial (Tabelas 2 e 3). A concentração média de Hcy não diferiu significantemente entre os grupos (p=0,222), bem como a presença de hiperhomocisteinemia (p=0,266). A média da concentração de Hcy não apresentou nenhuma associação com o número de vasos envolvidos (p= 0,793) ou o grau de obstrução arterial (p=0,700).
O polimorfismo MTHFR C677T não mostrou relação direta com a hiperhomocisteinemia (p=0,860) ou aumento da concentração média de Hcy (p=0,758).
Análise multivariada
A regressão logística múltipla foi utilizada para testar os correlatos independentes para a presença de DAC. O modelo incluiu: fumo, hipertensão, diabetes, níveis de HDLc e os polimorfismos VEGF C-2578A e MTHFR C677T. Fumo (p=0,006), diabetes (p=0,041), e níveis de HDLc <40 mg/dL (p=0,0008) foram correlatos independentes da presença de DAC. A hipertensão mostrou uma tendência à associação com DAC (p=0,061). Os polimorfismos VEGF C-2578A (p=0,688) e MTHFR C677T (p=0,981) não foram preditores independentes de DAC.
Discussão
No presente estudo, a freqüência alélica e a genotípica do polimorfismo VEGF C-2578A não diferiram entre pacientes com e sem DAC. Entretanto, uma maior freqüência do genótipo VEGF-2578AA foi observada em indivíduos com três artérias afetadas. Este resultado corrobora os achados de um estudo recente de Howell e cols.1 no qual o genótipo VEGF-2578AA foi considerado um fator de risco para o desenvolvimento de aterosclerose, enquanto o genótipo VEGF -2578CC mostrou ter um efeito protetor. De acordo com esse estudo, a freqüência do genótipo VEGF -2578AA aumentou gradualmente com o número de vasos envolvidos, quando comparada com o genótipo selvagem (wild-type) VEGF -2578CC, sugerindo que a redução da expressão do VEGF resultante do genótipo VEGF-2578AA poderia promover o desenvolvimento de aterosclerose. A maior freqüência do genótipo VEGF -2578CA entre indivíduos com <95% de estenose sugere uma associação entre esse genótipo e a progressão mais lenta da lesão aterosclerótica, possivelmente devido à presença do alelo selvagem. Entretanto, nenhuma associação foi encontrada em relação ao genótipo selvagem VEGF -2578CC, possivelmente devido ao número reduzido de indivíduos na amostra.
Embora nossos resultados em relação ao polimorfismo do VEGF e a gravidade e extensão da DAC sejam significantes, após o ajuste para outros fatores de risco em um modelo multivariado, a associação positiva entre o polimorfismo VEGF C-2578A e a gravidade da DAC perdeu significância estatística. Já que o polimorfismo VEGF C-2578A não foi um fator de risco independente para a DAC, esses dados não confirmam a ligação casual entre o polimorfismo VEGF C-2578A e aterosclerose coronariana.
O papel do VEGF na aterosclerose é motivo de debate na literatura. Alguns estudos mostraram que a administração de VEGF humano recombinante em animais aumenta a progressão das placa aterosclerótica23, enquanto outros observaram que ele age como um fator anti-aterosclerótico, promovendo a re-endotelização, reduzindo o espessamento da camada íntima e prevenindo a formação de coágulos5.
As correlações entre genótipos e expressão não foram analisadas em nosso estudo. Entretanto, um estudo feito por Shahbazi e cols.8 com receptores de transplante renal, encontrou uma associação entre o alelo selvagem VEGF 2578C e o aumento das concentrações de VEGF. Outros polimorfismos do gene VEGF já foram associados com variações na expressão da proteína7,8. De acordo com Howell e cols.1, o genótipo VEGF -2578AA poderia ser considerado um fator de risco para aterosclerose devido à redução da expressão da proteína. Esse resultado é consistente com a ação do VEGF na regulação endógena da integridade endotelial da parede da artéria coronariana4. Por outro lado, a neovascularização da placa aterosclerótica, mediada pelo VEGF, disponibiliza nutrientes e componentes da placa, aumentando seu volume. Em paredes arteriais com oclusão total por placas ateroscleróticas, como observado em estudo prospectivo, microvasos chamados vasa vasorum foram correlacionados, em sua anatomia e quantidade, ao grau de inflamação da placa intimal24. Moulton e cols.25 observou uma redução na progressão da aterosclerose secundária à inibição da neovascularização mediada pelo VEGF. Assim, mais estudos são necessários para esclarecer o verdadeiro papel do VEGF na DAC.
Nesse estudo, as freqüências alélica e genotípica do polimorfismo MTHFR C677T não foram diferentes entre pacientes e controles. Entretanto, no grupo com DAC, a distribuição genotípica observada foi diferente da esperada de acordo com o equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW). Estudos de caso-controle com análise de SNPs mostraram fuga do EHW em pacientes, em controles ou em ambos os grupos26-28. Esse desequilíbrio pode ser esperado para várias doenças genéticas, considerando que provavelmente haja uma contribuição genética significante em doenças complexas29. Embora alguns estudos tenham encontrado evidência de associação entre o alelo polimórfico MTHFR 677T e doenças vasculares, aterosclerose carotídea, doença arterial oclusiva e infarto do miocárdio15-17,30-32, outros não confirmaram essas hipóteses11,33.
Cerca de 40% dos pacientes com DAC apresentavam hiperhomocisteinemia34. Em nosso estudo, 49,7% dos pacientes com DAC e 45,2% dos controles apresentavam concentrações de Hcy >15 µmol/l, e essa diferença não foi significante. Outro estudo brasileiro mostrou uma diferença significante em concentrações de Hcy entre o grupo controle e o grupo com ateromatose grave. Esses autores também observaram uma correlação positiva entre níveis mais altos de Hcy e DAC35. Em nosso estudo, concentrações médias mais altas de Hcy foram encontradas no grupo com DAC quando comparados com o grupo controle, mas a diferença não foi significante (dados não mostrados), o que está de acordo com os achados de Yilmaz e cols.36.
Estudos clínicos envolvendo tratamentos para reduzir os níveis de homocisteína têm demonstrado que a suplementação com folato não reduziu o risco de complicações e morte por causas cardiovasculares, apesar de uma redução substancial nos níveis plasmáticos totais de Hcy37,38. Embora estudos observacionais tenham demonstrado que o nível plasmático total de Hcy é um preditor de eventos cardiovasculares39, nenhum papel causativo da Hcy foi substanciado pelos resultados de estudos de intervenção envolvendo tratamento para redução de níveis de homocisteína.
No estudo prospectivo de Frederiksen e cols.40, a concentração média de Hcy era mais alta em portadores do genótipo MTHFR 677TT quando comparados a outros genótipos; entretanto, o polimorfismo MTHFR C677T não foi associado com doença isquêmica cardiovascular ou tromboembolismo. Observações similares foram relatadas por Huh e cols.41 e Yilmaz e cols.36 em estudos de DAC. Nas populações estudadas por nós, o polimorfismo MTHFR C677T não apresentou uma relação direta com a hiperhomocisteinemia ou aumento das concentrações médias de Hcy, nos grupos com DAC ou controle. Uma correlação entre a presença dessa mutação e a hiperhomocisteinemia também foi observada por Lima e cols.35, em um estudo brasileiro.
O tamanho da amostra é um fator importante em estudos de caso-controle, principalmente em investigações de polimorfismos genéticos com alta freqüência na população em geral. Embora o número de indivíduos avaliados nesse estudo seja suficiente para demonstrar uma diferença estatística na distribuição do genótipo entre os subgrupos com diferentes graus de obstrução arterial e número de artérias envolvidas, nenhuma diferença foi observada entre o grupo com DAC e o grupo controle. Os estudos na literatura utilizam amostras maiores, principalmente para avaliar a associação entre polimorfismos e DAC ou Hcy. Além disso, a investigação de alterações em outras enzimas envolvidas no metabolismo da Hcy e nas concentrações plasmáticas de folato e vitaminas B6 e B12, e ingestão de vitaminas, poderia fornecer dados mais consistentes para a discussão sobre o efeito dos polimorfismos nas concentrações de Hcy.
Em resumo, há uma aparente associação entre o polimorfismo VEGF C-2578A e o desenvolvimento de aterosclerose; entretanto, essa associação não é independente dos fatores de risco cardiovascular convencionais.
Agradecimentos
Os autores agradecem a Celso Pereira Reis Filho pelo gerenciamento do banco de dados e ao Prof. Dr. José Antônio Cordeiro pela análise estatística e reconhecem o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo foi financiado por FAPESP e CNPq.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Alexandre Rodrigues Guerzoni pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FAMERP.
Artigo em 15/06/07; revisado recebido 17/10/07; aceito 27/01/08.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
23 Jun 2009 -
Data do Fascículo
Abr 2009
Histórico
-
Recebido
15 Jun 2007 -
Revisado
17 Out 2007 -
Aceito
27 Jan 2008