Open-access Hipertensão arterial na cidade de São Paulo: prevalência referida por contato telefônico

Resumos

FUNDAMENTO: Pouco se conhece sobre a prevalência da hipertensão arterial na cidade de São Paulo, SP, Brasil. OBJETIVO: Identificar a prevalência da hipertensão referida na cidade de São Paulo. MÉTODOS: Realizaram-se 613 entrevistas por telefone, a partir das listas residenciais do sistema de telefonia fixa. A amostra foi calculada com prevalência estimada de hipertensão em 20,0%. RESULTADOS: A prevalência referida de hipertensão foi de 23,0% e 9,0% dos entrevistados referiram que o valor de sua última medida da pressão foi maior que 140/90 mmHg, porém não tinham conhecimento de que eram hipertensos, totalizando uma prevalência de 32,0%. Os hipertensos referiram que: 89,0% fazem tratamento e 35,2% estavam controlados; 27,0% faltam às consultas; 16,2% deixam de tomar os remédios; 14,8% apresentam história de acidente vascular encefálico, 27,8% cardiopatia e 38,7% hipercolesterolemia; 71,2% receberam orientação para diminuir sal, 64,6% para realizar atividade física, 60,0% para perder peso e 26,2% para controlar estresse; e 78,9% mediam a pressão regularmente. Houve relação estatisticamente significante (p < 0,05) para: 1) faltar às consultas com maior tempo de tratamento e acompanhamento irregular de saúde; 2) deixar de tomar os remédios com tabagismo, etilismo e a não realização de acompanhamento de saúde; 3) realizar tratamento para hipertensão com dislipidemia, idade mais elevada e maior tempo de uso de anticoncepcional, no caso das mulheres; e 4) índice de massa corporal alterado com presença de diabete, hipercolesterolemia, pressão sistólica não controlada e uso de mais de um anti-hipertensivo. CONCLUSÃO: A prevalência referida de hipertensão na cidade de São Paulo assemelha-se à prevalência identificada em outros estudos.

Hipertensão; prevalência; São Paulo; Brasil; telefone


BACKGROUND: Little is known about the prevalence of hypertension in São Paulo, Brazil. OBJECTIVE: To identify the prevalence of self-reported hypertension in the city of São Paulo. METHODS: There were 613 telephone interviews using directories of household landlines. The sample was calculated with an estimated prevalence of hypertension in 20.0%. RESULTS: The prevalence of self-reported hypertension was 23.0% and 9.0% of respondents reported that the value of their last pressure measurement was greater than 140/90 mmHg, but they were unaware that they were hypertensive, with a total prevalence 32.0%. Hypertensive patients reported that: 89.0% were under treatment and 35.2% were controlled; 27.0% miss medical appointments; 16.2% stop taking drugs; 14.8% have a history of stroke; 27.8% had heart disease and 38.7% had hypercholesterolemia; 71.2% received advice to reduce salt, 64.6% to perform physical activity, 60.0% to lose weight loss and 26.2% to control stress; and 78.9% measured pressure regularly. There was a statistically significant relation (p < 0.05) for: 1) missing medical appointments with longer treatment and irregular health monitoring; 2) stop taking the drugs with smoking, alcohol and failure to monitore health; 3) carry out treatment for hypertension with dyslipidemia, higher age and longer use of contraceptives for women; and 4) body mass index changed with diabetes, hypercholesterolemia, uncontrolled systolic blood pressure and use of more than one anti-hypertension drug. CONCLUSION: The prevalence of self-reported hypertension in the city of São Paulo resembles the prevalence found in other studies.

Hypertension; prevalence; São Paulo; Brazil; telephone


FUNDAMENTO: Poco se conoce sobre la prevalencia de la hipertensión arterial en la ciudad de São Paulo, SP, Brasil. OBJETIVO: Identificar la prevalencia de la hipertensión referida en la ciudad de São Paulo. MÉTODOS: Se realizaron 613 entrevistas por teléfono, a partir de las listas residenciales del sistema de telefonía fija. La muestra fue calculada con prevalencia estimada de hipertensión en 20,0%. RESULTADOS: La prevalencia referida de hipertensión fue de 23,0% y 9,0% de los entrevistados refirieron que el valor de su última medición de la presión fue mayor que 140/90 mmHg, sin embargo no sabían que eran hipertensos, totalizando una prevalencia de 32,0%. Los hipertensos refirieron que: 89,0% hacen tratamiento y 35,2% estaban controlados; 27,0% faltan a las consultas; 16,2% dejan de tomar los remedios; 14,8% presentan historia de accidente cerebro vascular, 27,8% cardiopatía y 38,7% hipercolesterolemia; 71,2% recibieron orientación de disminuir la sal, 64,6% de realizar actividad física, 60,0% para perder peso y 26,2% de controlar el stress; y 78,9% medían la presión regularmente. Hubo relación estadísticamente significativa (p < 0,05) para: 1 - faltar a las consultas con mayor tiempo de tratamiento y acompañamiento irregular de salud; 2 - dejar de tomar los remedios con tabaquismo, etilismo y la no realización de acompañamiento de salud; 3 - realizar tratamiento para hipertensión con dislipidemia, edad más elevada y mayor tiempo de uso de anticonceptivo, en el caso de las mujeres; y 4 - índice de masa corporal alterado con presencia de diabetes, hipercolesterolemia, presión sistólica no controlada y uso de más de un antihipertensivo. CONCLUSIÓN: La prevalencia referida de hipertensión en la ciudad de São Paulo se asemeja a la prevalencia identificada en otros estudios.

Hipertensión; prevalencia; São Paulo; Brasil; teléfono


ARTIGO ORIGINAL

HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA

Hipertensão arterial na cidade de São Paulo: prevalência referida por contato telefônico

Décio Mion Jr.; Angela MG Pierin; Isabela M. Bensenor; Júlio César M. Marin; Karla Ryuko Abe Costa; Luiz Fernando de Oliveira Henrique; Natália de Pinho Alencar; Rodrigo do Carmo Couto; Tales Eduardo Laurenti; Thiago Arthur Oliveira Machado

Universidade de São Paulo, São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Angela Maria Geraldo Pierin Rua Heitor Penteado, 250 ap. 63 - Sumaré 05438-000 - São Paulo, SP - Brasil E-mail: pierin@usp.br

RESUMO

FUNDAMENTO: Pouco se conhece sobre a prevalência da hipertensão arterial na cidade de São Paulo, SP, Brasil.

OBJETIVO: Identificar a prevalência da hipertensão referida na cidade de São Paulo.

MÉTODOS: Realizaram-se 613 entrevistas por telefone, a partir das listas residenciais do sistema de telefonia fixa. A amostra foi calculada com prevalência estimada de hipertensão em 20,0%.

RESULTADOS: A prevalência referida de hipertensão foi de 23,0% e 9,0% dos entrevistados referiram que o valor de sua última medida da pressão foi maior que 140/90 mmHg, porém não tinham conhecimento de que eram hipertensos, totalizando uma prevalência de 32,0%. Os hipertensos referiram que: 89,0% fazem tratamento e 35,2% estavam controlados; 27,0% faltam às consultas; 16,2% deixam de tomar os remédios; 14,8% apresentam história de acidente vascular encefálico, 27,8% cardiopatia e 38,7% hipercolesterolemia; 71,2% receberam orientação para diminuir sal, 64,6% para realizar atividade física, 60,0% para perder peso e 26,2% para controlar estresse; e 78,9% mediam a pressão regularmente. Houve relação estatisticamente significante (p < 0,05) para: 1) faltar às consultas com maior tempo de tratamento e acompanhamento irregular de saúde; 2) deixar de tomar os remédios com tabagismo, etilismo e a não realização de acompanhamento de saúde; 3) realizar tratamento para hipertensão com dislipidemia, idade mais elevada e maior tempo de uso de anticoncepcional, no caso das mulheres; e 4) índice de massa corporal alterado com presença de diabete, hipercolesterolemia, pressão sistólica não controlada e uso de mais de um anti-hipertensivo.

CONCLUSÃO: A prevalência referida de hipertensão na cidade de São Paulo assemelha-se à prevalência identificada em outros estudos.

Palavras-chave: Hipertensão/epidemiologia, prevalência, São Paulo, Brasil, telefone/utilização.

Introdução

As doenças cardiovasculares são importante causa de morbimortalidade, tanto em países desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento. Nas últimas décadas, muitos estudos epidemiológicos confirmaram a hipertensão arterial como fator de risco para esse grupo de doenças1-4.

Dentre elas, destacam-se a doença coronariana, o acidente vascular encefálico e a insuficiência cardíaca congestiva. No Brasil, tem havido uma diminuição da mortalidade por doenças cardiovasculares, porém elas persistem como a causa mais frequente de mortalidade5.

A prevalência da hipertensão arterial varia amplamente de população para população, dependendo de fatores de ordem biológica, demográfica, social e ambiental, presentes em cada uma delas. Estudos recentes em nosso meio indicam índices de 23,6% a 41,4%6-8. Porém, esses estudos analisaram a prevalência identificada através da medida da pressão arterial.

Uma estratégia que pode ser útil, por ser de baixo custo, fácil exequibilidade e cujos dados têm reconhecimento, seria a obtenção de dados por meio de inquéritos realizados através de entrevistas telefônicas, em amostras probabilísticas da população residente em domicílios com linhas fixas de telefone, justificando seu uso em estudos e sistemas de vigilância como a realizada em São Paulo9. Esse tipo de modelo também tem sido utilizado em outros países com bastante sucesso10,11 e, em nosso meio, adotado pelo Ministério da Saúde como forma de vigilância de doenças crônicas12.

A hipertensão arterial é uma doença crônico-degenerativa. É preciso manter os pacientes hipertensos sob tratamento com a pressão arterial controlada para evitar complicações cardiovasculares, cérebro-vasculares, renais e cardíacas. Ao chegar a este ponto, depara-se com a grande ironia da hipertensão, porque a maior parte dos pacientes não se beneficia do tratamento devido à baixa adesão. Vários são os fatores que interferem na adesão, tais como as características pessoais, conhecimentos, valores, crenças, experiências, expectativas, suporte social e recursos financeiros13,14.

Frente à alta prevalência da hipertensão arterial e à sua condição de ser um dos principais fatores de risco para as doenças cardiovasculares e níveis de controle pouco satisfatórios, é fundamental conhecer a prevalência de hipertensão e aspectos relacionados ao tratamento e na população da maior cidade do país.

Métodos

População alvo

O estudo foi realizado na cidade de São Paulo, sendo a população alvo da pesquisa os indivíduos moradores das residências sorteadas para o estudo, maiores de 18 anos e que deram consentimento verbal para o uso em pesquisa das informações obtidas. Para o cálculo da amostra, considerou-se a proporcionalidade dos domicílios das 5 regiões da cidade de São Paulo (Norte, Sul, Centro, Leste e Oeste). Foi utilizada a técnica de determinação da amostra para variáveis dicotômicas em estudos transversais. Para esse cálculo, estimou-se a prevalência de hipertensão na população em 20,0%, baseando-se nos resultados médios dos estudos populacionais para hipertensão realizados no Brasil. A precisão desejada do intervalo de confiança foi 10,0% (15-25,0%) e o intervalo de confiança foi de 99,0%. Utilizando-se esses parâmetros, obteve-se o número da amostra de 426 residências. Esse número foi arredondado para 500 e multiplicado por dois, estimando-se uma perda de 50%, e totalizando 1.000 residências. Na realização da pesquisa, houve 38,7% de recusas, resultando em uma amostra de 613 indivíduos entrevistados. A seleção dos números dos telefones a serem contatados foi feita por meio de sorteio a partir de lista fornecida pela empresa "Telefonica", obedecendo à densidade demográfica das diferentes regiões da cidade de São Paulo.

Coleta dos dados

Os dados foram coletados por entrevista via telefone, utilizando-se um formulário construído para atender os objetivos da pesquisa. As entrevistas foram realizadas por alunos de graduação de enfermagem e medicina, treinados pelos coordenadores da pesquisa.

Dentro de cada domicílio, a seleção do entrevistado atendeu a uma tabela de randomização que correlacionou o último dígito do número telefônico com a pessoa da casa a ser entrevistada, de maneira a evitar viés de seleção, seja por sexo, idade ou pela presença de hipertensão arterial. Para a realização da randomização, foi considerado o número de pessoas maiores de 18 anos, residentes há pelo menos 6 meses no domicílio. Caso a pessoa sorteada não estivesse presente no momento da ligação, foi perguntado quais o melhor horário e o melhor dia para encontrá-la. Uma só pessoa foi sorteada para responder o questionário, de forma que, para cada residência selecionada, somente um morador fosse entrevistado. Se a linha escolhida correspondesse a mais de uma família residente na moradia, selecionou-se a família da pessoa que atendeu a ligação.

Para a realização das entrevistas, foram feitas três tentativas para localizar alguém na residência. Caso não fosse possível contatar a pessoa selecionada aleatoriamente, ela não foi substituída. Se a pessoa selecionada não pudesse realizar a entrevista no momento do contato, foram marcados data e horário de melhor conveniência para a entrevista. Se o número sorteado fosse de uma linha comercial, ele era descartado e escolhido o número imediatamente a seguir da lista telefônica. As ligações telefônicas ocorreram todos os dias da semana e em diferentes períodos do dia.

Inicialmente, o instrumento de coleta de dados usado para a entrevista tinha as seguintes perguntas: 1) O Sr/Sra tem ou já teve problema de pressão alta? 2) Algum profissional da área de saúde já disse que você tem problema de pressão alta? 3) Você toma algum remédio para tratar pressão alta? 4) Faz acompanhamento em serviço de saúde para tratar a pressão alta? No caso de resposta positiva a qualquer uma dessas questões, considerava-se a pessoa como portadora de hipertensão arterial.

O instrumento de coleta dos dados era dividido em duas partes. Na primeira, direcionada tanto a hipertensos como não hipertensos, as perguntas eram sobre dados de identificação pessoal (sexo, idade, peso, altura e cor da pele); condições socioeconômicas (profissão, escolaridade, renda salarial da família, moradia); hábitos de vida (tabagismo, etilismo, atividade física); antecedentes pessoais e familiares para hipertensão arterial, diabete, problema cardíaco, colesterol elevado e acidente vascular encefálico; hábito de medir a pressão arterial e valor da última medição; e conhecimento e crenças sobre hipertensão arterial e seu tratamento. A segunda parte do instrumento, direcionada apenas aos hipertensos, avaliou a realização e tipos de tratamento anti-hipertensivo medicamentoso e não medicamentoso; comparecimento às consultas; e dificuldades na realização do tratamento.

Aspectos éticos

Por se tratar de entrevista realizada por telefone, o consentimento livre e esclarecido foi substituído pelo consentimento verbal obtido por ocasião dos contatos telefônicos com os entrevistados. Foi esclarecido que os dados obtidos seriam utilizados exclusivamente para fins de pesquisa. Os entrevistados foram também esclarecidos sobre a possibilidade de desistir de participar do estudo a qualquer momento da entrevista e sobre a garantia do sigilo das informações obtidas. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

Análise de dados

Os dados foram armazenados em um banco, analisados estatisticamente pelo programa SAS e apresentados nas formas de figuras e tabelas, por meio de índices absolutos e percentuais. Foi avaliada a prevalência referida da hipertensão arterial na amostra estudada. As características dos participantes foram avaliadas de acordo com a presença ou não de hipertensão referida. As variáveis categóricas foram analisadas por testes não paramétricos e as variáveis contínuas por análise de variância (ANOVA). Os valores de p < 0,05 foram considerados significantes.

Resultados

A prevalência referida para hipertensão obtida neste estudo foi de 23,0%. Conforme os dados da Tabela 1, houve diferenças significativas (p < 0,05) entre os hipertensos e os normotensos referidos, com os hipertensos apresentando uma maior frequência de aposentados, menor escolaridade, maior frequência de tabagistas e ex-tabagistas, menor uso de pílulas anticoncepcionais, média mais elevada de idade, média do índice de massa corpórea mais elevada e maior tempo de tabagismo, etilismo e uso de contraceptivos orais. Apesar da maioria das pessoas estudadas pertencer ao sexo masculino, fato totalmente aleatório, essa variável não se relacionou com a referência de hipertensão arterial.

Dentre as doenças referidas pela totalidade dos entrevistados, a mais citada foi a hipercolesterolemia (15,0%). A Figura 1 mostra que os hipertensos apresentaram índices significativamente mais elevados (p < 0,05) de história de hipercolesterolemia, doenças do aparelho circulatório e acidente vascular encefálico.


Pelos dados da Tabela 2, observa-se que os hipertensos referidos tinham o hábito de medir a pressão arterial com maior frequência e utilizavam mais sua casa, ou o posto de saúde, para esse fim, em relação aos não hipertensos. Também lembraram mais de quando foi a última vez que mediram a pressão arterial e o valor da última medida em relação aos não hipertensos (p < 0,05).

Quanto aos conhecimentos sobre a doença, quando comparada a um simples resfriado, os hipertensos consideraram a hipertensão uma doença de menor gravidade. Ao contrário, os não hipertensos consideravam a hipertensão uma doença mais grave (p < 0,05). Por outro lado, os hipertensos tinham mais informação sobre o acidente vascular encefálico ser uma das complicações da hipertensão, e que o tratamento para hipertensão é para toda vida. Apesar da maioria dos hipertensos referir saber o valor a partir do qual a pressão é considerada alta, pouco menos de um quarto (23,7%) informou o valor correto (Tabela 2).

Quanto ao tratamento anti-hipertensivo, pouco mais da metade dos hipertensos indicou que recebeu orientação de serviços de saúde sobre as formas de tratamento não medicamentoso, e também cerca da metade informou adotá-las. A Figura 2 mostra que as medidas mais citadas foram controle do sal na alimentação, prática de exercícios físicos e controle do peso corporal.


Dos hipertensos entrevistados, 16,8% informaram que, nas duas últimas semanas, deixaram de tomar os remédios algumas vezes e 30,6% referiram ter dificuldades para realizar o tratamento medicamentoso. A Figura 3 evidencia os motivos que mais contribuíram para os hipertensos deixarem de tomar os remédios: esquecimento, custo, efeitos indesejáveis e que só tomam quando se sentem mal.


O controle da pressão arterial foi avaliado de acordo com a informação do valor da última medida. Verificou-se elevado índice de falta de controle da pressão arterial (45,8%). Aproximadamente 9,0% dos que referiram ser normotensos informaram valores da pressão arterial compatíveis com hipertensão, e uma grande parcela deste grupo não soube informar o valor da última medida da pressão arterial (Tabela 3).

A maioria expressiva dos entrevistados que referiu hipertensão citou realizar tratamento. A realização do tratamento se associou (p < 0,05) com idade mais avançada, maior tempo de uso de anticoncepcional, o fato de tomar remédios para hipertensão arterial e aumento de colesterol. Daqueles que informaram realizar tratamento para hipertensão, 88,1% citaram realizar somente o tratamento medicamentoso, e apenas 5,5% realizavam também tratamento não medicamentoso. Deixar de tomar os remédios nas últimas duas semanas relacionou-se (p < 0,05) com a maior quantidade de cigarros fumados por dia, ao consumo de etanol e a não realização de acompanhamento em serviço de saúde. Entre os hipertensos, 18,0% deixaram de comparecer a alguma consulta no último ano. A falta às consultas, apontada por 27,0%, relacionou-se (p < 0,05) com maior tempo de tratamento e com o fato de não realizar acompanhamento em serviço de saúde (Tabela 4).

O índice de massa corpórea nas faixas de sobrepeso e obesidade associou-se com uma maior prevalência de fatores de risco cardiovascular, como o diabete, a hipercolesterolemia, a pressão arterial sistólica não controlada, além de uso de mais de um medicamento anti-hipertensivo (Figura 4).


Discussão

O principal achado do presente estudo foi que a prevalência referida, de 23,0%, obtida por meio de entrevista por contato telefônico, apresentou valor intermediário entre as prevalências identificadas em outros estudos. Mesmo havendo diferença entre as duas formas de identificação da doença, esse tipo de método pode ser de grande utilidade pela facilidade de execução e baixo custo, além de possibilitar planejamento e direcionamento de ações de saúde. Acrescenta-se ainda que 9,0% referiram que o valor de sua última medida da pressão arterial foi acima de 140/90 mmHg, porém não tinham conhecimento de que eram hipertensos. Esse montante, agrupado à prevalência referida de 23,0%, de acordo com os critérios de inclusão do presente estudo, eleva a prevalência para 32,0%.

Considerando a forma indireta de avaliação da prevalência da hipertensão, ou seja, referida, os dados evidenciados estão bem próximos dos obtidos pelo VIGITEL12 (Vigilância de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), em 2006, em levantamento realizado em todas as capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal. A frequência de adultos que referiu diagnóstico médico de hipertensão arterial variou entre 13,8% em Palmas e 26,9% no Rio de Janeiro.

O Ministério da Saúde, por meio do VIGITEL, tem como objetivo monitorar a frequência e a distribuição de fatores de risco e proteção para doenças crônicas não transmissíveis, por meio de entrevistas telefônicas realizadas em amostras probabilísticas da população adulta residente em domicílios servidos por linhas fixas de telefone em cada cidade. Por meio da vigilância em saúde, é possível monitorar e analisar o perfil das doenças e de seus fatores determinantes e condicionantes, bem como detectar mudanças nas suas tendências no tempo, no espaço geográfico e em grupos populacionais, contribuindo também para o planejamento de ações na área de saúde.

A avaliação dos hipertensos entrevistados revelou predomínio de condições sociais pouco favorecidas, exemplificadas pela baixa escolaridade e por pessoas desempregadas. Por se constituírem em elementos dificultadores no acesso ao diagnóstico e adesão ao tratamento anti-hipertensivo, essas variáveis podem influenciar não só na prevalência da hipertensão, mas também no controle da doença.

Nos hipertensos, ainda se destaca a presença de forma significante dos referidos estilos de vida inadequados, como o tabagismo e o índice de massa corporal mais elevado. Quanto ao etilismo, apesar da quantidade de etanol ingerida por dia apresentar-se na faixa mediana de tolerância para os hipertensos, observou-se que os mesmos têm esse hábito há muito mais tempo do que os não hipertensos, o que pode estar relacionado com a idade mais elevada. Sabe-se que, junto com a obesidade e o consumo de sal, o consumo alcoólico é fator de risco para a hipertensão.

Estudos têm evidenciado a importância das características socioeconômicas e hábitos de vida no contexto da hipertensão arterial. Investigação13 realizada em Porto Alegre mostrou que abandono ao tratamento associou-se com baixa escolaridade, tabagismo e menor tempo da doença. Outros dois estudos mostraram que a prevalência da hipertensão tinha relação inversa com a escolaridade14,15.

O inquérito VIGITEL12 revelou que a referência do diagnóstico de hipertensão arterial aumentou com a idade e foi máxima para indivíduos com até 8 anos de escolaridade. O tabagismo é uma dependência química que expõe o indivíduo a inúmeras substâncias tóxicas, além de aumentar a morbimortalidade por doenças coronarianas, hipertensão arterial, acidente vascular encefálico, bronquite e enfisema pulmonar. Os índices de tabagismo identificados pelo VIGITEL, 16,25%, estão bem abaixo dos encontrados no presente estudo, principalmente entre os hipertensos. Em relação à bebida alcoólica, estudos16-19 indicam frequências variadas de ingestão de bebidas alcoólicas entre populações específicas, dependentes de influência cultural e social nas populações. O inquérito domiciliar do VIGITEL indicou prevalência de consumo abusivo, que variou de 22,1% a 12,0%.

A presença de hipertensão arterial, de diabete melito, de obesidade e de dislipidemias guardam entre si uma complexa relação, tendo em comum em sua etiologia o estilo de vida e a herança genética. Este estudo também verificou associação do índice de massa corporal elevado com outros fatores de risco cardiovasculares. Estudos têm revelado a importância dessas associações com a hipertensão arterial e o aumento do risco cardiovascular20-22.

Tal dado assume maior importância quando se verifica que, no presente estudo, os hipertensos referidos apontaram de forma também significante a presença de acidente vascular encefálico, cardiopatia e hipercolesterolemia.

Outras variáveis, como hábito de medir a pressão, influenciaram na condição de hipertensão referida. Porém, as atitudes positivas reveladas não foram suficientes para garantir controle efetivo da doença, tendo em vista que apenas pouco mais de um terço estava com os níveis da pressão arterial controlados. Os baixos níveis de controle podem ser justificados pelo não comparecimento às consultas e pelo uso irregular do tratamento medicamentoso.

Algumas características do tratamento medicamentoso podem influenciar na adesão, ressaltando-se o custo, efeitos indesejáveis, esquemas terapêuticos complexos e tratamento por toda vida. Destaca-se ainda que comportamentos negativos, como o tabagismo, etilismo e acompanhamento irregular em serviços de saúde, associaram-se de forma relevante com o fato de deixar de tomar os medicamentos anti-hipertensivos. Acrescenta-se ainda que maior tempo de tratamento e menos acompanhamento em serviços de saúde contribuíram para a falta às consultas. Por outro lado, fazer tratamento para a hipertensão foi influenciado pela presença de comorbidade, como a hipercolesterolemia e idade mais avançada.

O conhecimento sobre a doença e o tratamento também é uma variável a ser considerada no contexto da adesão ao tratamento. De um modo geral, observa-se que os hipertensos possuem a informação sobre sua problemática de saúde, porém não estão devidamente controlados. A discrepância entre ter informação a respeito da doença e tratamento e conseguir controlar a pressão arterial aponta para a diferença essencial entre conhecimento e adesão. Enquanto o conhecimento é racional, adesão é um processo complexo, envolvendo fatores emocionais e barreiras concretas, de ordem prática e logística23-26.

Conclusão

A avaliação da hipertensão arterial referida por meio de contatos telefônicos na cidade de São Paulo revelou prevalência próxima à identificada por outros estudos, além de possibilitar identificar dados relativos ao tratamento, principalmente no tocante aos aspectos dificultadores, que podem contribuir para o controle pouco satisfatório dos níveis pressóricos. Pode-se identificar ainda a presença de outros fatores de risco cardiovasculares, comorbidades e atitudes e comportamentos de saúde.

Destaca-se a possível limitação do estudo em avaliar a prevalência apenas pela informação e não por meio da medida da pressão arterial como realizada em outros inquéritos populacionais. Porém, os dados obtidos por meio desse tipo de estudo podem ser úteis no planejamento de ações de saúde, estabelecendo diretrizes para priorizar a promoção da saúde, prevenção e atenção com redução de fatores de risco cardiovasculares e consequente morbimortalidade.

Apesar da pontualidade do presente estudo, estudos de vigilância podem ser extremamente relevantes por permitirem o monitoramento e análise das doenças e respectivos fatores condicionantes e determinantes, visando implementação de políticas de saúde em uma determinada área geográfica. Outro ponto a ressaltar relaciona-se ao desempenho do sistema de monitoramento, avaliado a partir da representatividade e confiabilidade das estimativas obtidas e do custo por entrevista realizada.

Um outro estudo, também realizado no município de São Paulo, mostrou que o custo por entrevista realizada foi 8 vezes inferior ao custo estimado por sistemas semelhantes existentes em países desenvolvidos e de 4-8 vezes inferior ao custo de inquéritos domiciliares tradicionais realizados no mesmo município9.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 29/12/08; revisado recebido em 25/08/09; aceito em 02/01/10.

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  • Correspondência:
    Angela Maria Geraldo Pierin
    Rua Heitor Penteado, 250 ap. 63 - Sumaré
    05438-000 - São Paulo, SP - Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Jul 2010

    Histórico

    • Revisado
      25 Ago 2009
    • Recebido
      29 Dez 2008
    • Aceito
      02 Jan 2010
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