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Homing miocárdico após infusão intrapericárdica de Células Mononucleares de Medula Óssea

COMUNICAÇÃO BREVE

Homing miocárdico após infusão intrapericárdica de Células Mononucleares de Medula Óssea

Érika BrancoI; Emerson Ticona FiorettoII; Rosa CabralIII; Carlos Alberto Sarmento PalmeraIV; Guilherme Buzon GregoresIV; Angelo João StopigliaIV; Paulo César MaiorkaIV; Pedro Alves LemosV; Carlos CamposV; Celso TakimuraV; José Antônio Franchini RamiresV; Maria Angelica MiglinoIV

IFaculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural da Amazônia – UFRA, Belém, PA

IIUniversidade Federal do Sergipe –UFS, Aracajú, SE

IIIUniversidade Feral do Piauí – UFPI, Teresina, PI

IVFaculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia FMVZ/USP, São Paulo, SP, Brasil

VInstituto do Coração – Incor, São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Érika Branco Av. Pte. Tancredo Neves, 2501 – Montese Caixa Postal: 917 66077-530 - Belém – PA - Brasil E-mail: erika.branco@ufra.edu.br

Palavras chave: Células-Tronco, Infarto do Miocárdio, Pericárdio.

Introdução

Células-tronco têm sido utilizadas no tratamento de doenças cardíacas, estando relacionadas à possível neovascularização e formação de tecido1. O transplante de células-tronco tem sido realizado através das técnicas intracoronária, intramiocárdica, e de infusão retrógrada2-4; entretanto, ela apresenta limitações e tem aplicação reduzida na prática clínica.

Estudos anteriores testaram o espaço pericárdico para administração de fármacos5. Em teoria, a abordagem transpericárdica apresenta vantagens potenciais para a administração de células, incluindo a característica não-vascular do saco pericárdico, o que pode permitir procedimentos repetidos. O espaço pericárdico pode servir como um compartimento de armazenagem, dessa forma aumentando a biodisponibilidade local das células infundidas. Entretanto, a abordagem transpericárdica para terapia de células-tronco tem sido pouco explorada.

Este estudo preliminar avalia se a administração de Células Mononucleares de Medula Óssea (CMMO) autólogas no saco pericárdico resulta em homing das células miocárdicas nos casos controle e com infarto do miocárdio induzido.

Métodos

Desenho do Estudo

O presente estudo objetivou avaliar se o homing das células miocárdicas ocorre após a injeção de CMMO autólogas no espaço pericárdico. Sete porcas domésticas foram divididas em dois grupos: infarto do miocárdio induzido (n=3) e não-infarto do miocárdio (n=3). Um animal do grupo infarto do miocárdio induzido morreu antes da injeção de CMMO. Os animais foram sacrificados para exame do coração 21 dias após a injeção de CMMO. Os protocolos do estudo foram aprovados pelo Comitê de Bioética local.

Coleta da Amostra de Medula Óssea e Separação e Marcação de Células

Os animais foram pré-medicados com cloridrato de quetamina intramuscular (5mg/kg) e Midazolan (0,5 mg/kg). A indução foi realizada com propofol IV (5mg/kg) e a manutenção com isofluorano. Uma amostra de 60 mL de aspirado de medula óssea foi obtida utilizando-se uma agulha para punção óssea introduzida na crista ilíaca.

O aspirado de medula óssea foi diluído em solução salina e as CMMO foram separadas por gradiente de densidade utilizando-se Ficoll-PaqueTM Plus® (Amersham Pharmacia). Após 20 minutos de centrifugação a 2.000 rpm (20ºC), formou-se um halo de CMMO. As células da medula óssea foram aspiradas e adicionadas à solução salina para posterior centrifugação (7 minutos a 2.000 rpm e 20ºC). O aglomerado de células foi suspenso em solução salina e filtrado em um Mesh de Aço Inoxidável. O filtrado foi re-suspenso em solução salina e re-centrifugado como descrito acima. Uma alíquota da solução foi submetida à coloração com azul-de-tripan e avaliada em uma câmara de Neubauer para determinar viabilidade. Separamos um total de 108 células, as quais foram marcadas com 1µl Hoechst 33342 (Invitrogen/H1399, Brasil) e incubadas em banho-maria por 30 minutos a 37ºC.

Técnica de Infusão Intrapericárdica

O espaço pericárdico foi acessado através da região sub-xifóide usando uma agulha de epidural (Figura 1). A agulha foi avançada sob orientação fluoroscópica até ultrapassar o pericárdio parietal. A posição da extremidade da agulha no saco pericárdico foi radiograficamente confirmada através da infusão de contraste iodado diluído. Uma vez no espaço pericárdico, um total de 108 de CMMO coradas com Hoechst® diluídas em 10 ml de solução salina foi injetado.


Infarto Agudo do Miocárdio Experimental

Segundo as descrições anteriores6, um infarto agudo do miocárdio foi induzido em 3 animais imediatamente antes da injeção de CMMO. Após o acesso da artéria femoral através de dissecção romba, um cateter-guia 6F de Judkins foi manipulado sob orientação fluoroscópica até a coronária esquerda e seletivamente canulado. Um fio guia de 0,014" foi inserido na artéria descendente anterior esquerda, sobre o qual um cateter-balão foi posicionado exatamente distal à origem do primeiro ramo diagonal. Um infarto agudo do miocárdio da parede anterior foi induzido através da oclusão total da artéria por um período de 45 minutos.

Os animais foram sacrificados após 21 dias. O coração foi removido e os ventrículos separados dos átrios no nível do sulco atrioventricular. Os ventrículos foram fatiados e os fragmentos coletados para análise das regiões basal, medial e apical. As amostras foram processadas para microscopia ótica padrão e análise imunohistoquímica. Os fragmentos utilizados na análise imunohistoquímica foram embebidos em uma solução de 3 partes de PBS e 7 partes de glicerol e crio-preservadas em nitrogênio e armazenadas em um freezer a -80ºC. As análises foram realizadas em fatias congeladas usando-se um microscópio epifluorescente (microscópio Leica® DM 50). O homing miocárdico das CMMO foi estimado pelo número total de células coradas por Hoechst® presentes no miocárdio ventricular.

Análise estatística

Variáveis contínuas são apresentadas como média ± desvio-padrão e variáveis discretas como quantidades e porcentagens. O teste T de Student foi utilizado para comparar a contagem de células entre os grupos do estudo.

Resultados

Resultados agudos

Uma morte experimental ocorreu no grupo de infarto induzido devido à fibrilação ventricular durante o inflar do balão. O animal morreu antes da administração das CMMO e não foi considerado na análise. Todos os outros 6 animais completaram o procedimento sem complicações.

O acesso ao espaço pericárdico foi realizado sem intercorrências e a dose completa das CMMO foi administrada em todos os casos. Não houve complicações decorrentes da punção, perfuração da câmara cardíaca, arritmia ou instabilidade hemodinâmica durante a manipulação intrapericárdica e infusão das células.

Seguimento de 21 dias

Não houve mortes pós-procedimento. Todos os animais sobreviveram ao procedimento índex, completando o protocolo de 21 dias do estudo sem eventos adversos ou sinais de insuficiência cardíaca.

Em todos os animais, a superfície pericárdica parecia normal à inspeção visual, sem depósitos de fibrina, fibrose, aderências ou neovascularizações visíveis. Nos animais com infarto induzido, uma cicatriz miocárdica era claramente identificável na parede anteroapical.

Em ambos os grupos (infartado e não-infartado), a avaliação microscópica mostrou uma média de 109.494 ± 46.505 CMMO em homing miocárdico. Além disso, o homing miocárdico era significantemente mais pronunciado no grupo com infarto do que no grupo sem infarto (150.342±22.456 vs. 68.645±19.421; p<0,01). Os graus de penetração das CMMO no miocárdio variaram no coração inteiro. Uma maior penetração de CMMO no miocárdio ocorreu na área infartada. As CMMO foram observadas aderidas ao epitélio da parede de pequenos vasos na área infartada (Figura 2). Pequenas quantidades de CMMO foram vistas no epicárdio e miocárdio nos animais do grupo controle (Figura 2).


Discussão

Em nosso estudo preliminar, demonstramos que a administração intrapericárdica é capaz de induzir o homing miocárdico de CMMO em suínos. Além disso, após 21 dias, o homing das células foi mais extenso nos animais com infarto agudo do miocárdio induzido.

Nossos resultados sugerem que as CMMO são capazes de penetrar no miocárdio, através do pericárdio visceral, após a sua administração no espaço pericárdico. Nossos achados são similares àqueles descritos para as técnicas intracoronária, retrógrada e intramiocárdica6,7. Entretanto, a injeção intrapericárdica apresenta características que podem traduzir-se em vantagens para o uso clínico, relacionadas à sua natureza minimamente invasiva e a não-necessidade de entrada arterial. A segurança do acesso transpericárdico foi relatada anteriormente para outras aplicações, muito embora o treinamento em punção cardíaca seja altamente necessário. Entretanto, a abordagem transpericárdica pode teoricamente ser pelo menos tão segura quanto a administração intramiocárdica de células comumente relatada8. Além disso, os custos da aplicação da técnica transpericárdica são mais baixos do que as técnicas intracoronária, retrograda e intramiocárdica3,9.

Tem sido relatado que o fluido pericárdico tem uma baixa taxa de turnover, indicando a potencialidade do espaço pericárdico em funcionar como um reservatório para a liberação retardada de agentes farmacológicos, que podem ser administrados em altas concentrações sem efeitos sistêmicos5,10. Consequentemente, a capacidade de armazenagem do espaço pericárdico pode se mostrar benéfica para a terapia celular, pois prolonga a biodisponibilidade das célula viáveis para penetração miocárdica.

Em nosso estudo, observamos uma penetração difusa das CMMO através do miocárdio, o que contrasta com a natureza mais localizada das técnicas intracoronária, intramiocárdica ou retrógrada3,7,8. É possível, portanto, prever possíveis aplicações da abordagem transpericárdica para formas difusas de cardiomiopatia. Por outro lado, a concentração de células foi significantemente mais alta nas regiões com infarto agudo do miocárdio. Esse achado sugere que fatores locais na região infartada podem interagir para aumentar a migração e/ou sobrevivência celular no miocárdio lesionado.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo foi financiado por FAPESP e Incor-SP.

Vinculação Acadêmica

Este artigo é parte de tese de Doutorado de Érika Renata Branco pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo - FMVZ/USP - Departamento de Cirurgia

Artigo recebido em 09/07/08; revisado recebido 21/10/08; aceito em 21/10/08.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Out 2009
    • Data do Fascículo
      Set 2009
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