Resumos
RACIONAL: As anemias ferropriva, perniciosa e megaloblástica são comuns após procedimentos bariátricos como o bypass e as derivações biliopancreáticas. As principais causas devem-se ao desvio duodenal e do jejuno proximal do trânsito alimentar e, em menor grau, às úlceras anastomóticas. Entretanto a dieta pobre em nutrientes, a suplementação vitamínica inadequada, medicamentos, uso de álcool e neoplasias devem ser lembrados. RELATO DOS CASOS: Os autores relatam dois casos de pacientes pós-procedimentos bariátricos com anemia severa sem controle clínico e cuja investigação identificou melanoma metastático em um caso e neoplasia colônica no segundo, ambos tratados cirurgicamente com bons resultados. CONCLUSÃO: Anemias são comuns após procedimentos bariátricos, porém causas atípicas como neoplasias devem ser suspeitadas nos pacientes mais idosos e principalmente naqueles refratários ao controle clínico.
Anemia; Cirurgia bariátrica; Neoplasias; Deficiência de ferro
BACKGROUND: Iron deficiency anemia, pernicious and megaloblastic are common after gastric bypass and biliopancreatic diversion. The main causes are due to duodenal exclusion and anastomotic ulcers. However, low protein diet, vitaminic supplementation, medicines, alcohol and tumors must be remembered. CASES REPORT: The authors relate two cases of severe anemia after bariatric procedures that were diagnosed as metastatic melanoma in small bowel and a colorectal cancer treated surgically with good results. CONCLUSION: Anemias are common after bariatric surgery, however unusual causes like tumors must be suspected in the elderly and in those patients that clinical treatment didn't have good results.
Anemia; Bariatric surgery; Tumors; Iron deficiency
RELATO DE CASO
Anemia pós-cirurgia bariátrica: as causas nem sempre são relacionadas à cirurgia
Anemia after bariatric surgery: the causes sometimes are not related to the surgery
Giorgio Alfredo Pedroso Baretta; João Batista Marchesini; João Caetano Dallegrave Marchesini; Sérgio Brenner; Maria Elize Rocha Sanches
Hospital Vita Batel e Clínica Marchesini - Curitiba, Paraná, Brasil
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Giorgio Alfredo Pedroso Baretta E-mail: giorgio.baretta@gmail.com
RESUMO
RACIONAL: As anemias ferropriva, perniciosa e megaloblástica são comuns após procedimentos bariátricos como o bypass e as derivações biliopancreáticas. As principais causas devem-se ao desvio duodenal e do jejuno proximal do trânsito alimentar e, em menor grau, às úlceras anastomóticas. Entretanto a dieta pobre em nutrientes, a suplementação vitamínica inadequada, medicamentos, uso de álcool e neoplasias devem ser lembrados.
RELATO DOS CASOS: Os autores relatam dois casos de pacientes pós-procedimentos bariátricos com anemia severa sem controle clínico e cuja investigação identificou melanoma metastático em um caso e neoplasia colônica no segundo, ambos tratados cirurgicamente com bons resultados.
CONCLUSÃO: Anemias são comuns após procedimentos bariátricos, porém causas atípicas como neoplasias devem ser suspeitadas nos pacientes mais idosos e principalmente naqueles refratários ao controle clínico.
Descritores: Anemia. Cirurgia bariátrica. Neoplasias. Deficiência de ferro.
ABSTRACT
BACKGROUND: Iron deficiency anemia, pernicious and megaloblastic are common after gastric bypass and biliopancreatic diversion. The main causes are due to duodenal exclusion and anastomotic ulcers. However, low protein diet, vitaminic supplementation, medicines, alcohol and tumors must be remembered.
CASES REPORT: The authors relate two cases of severe anemia after bariatric procedures that were diagnosed as metastatic melanoma in small bowel and a colorectal cancer treated surgically with good results.
CONCLUSION: Anemias are common after bariatric surgery, however unusual causes like tumors must be suspected in the elderly and in those patients that clinical treatment didn't have good results.
Headings: Anemia. Bariatric surgery. Tumors. Iron deficiency
INTRODUÇÃO
A anemia ferropriva é afecção comum após operações para obesidade mórbida como o bypass gástrico em Y de Roux e as derivações biliopancreáticas. Isso se deve ao desvio do duodeno. A segunda causa mais comum são as úlceras pépticas justa-anastomóticas. Outras causas são o uso de anti-inflamatórios, de álcool, infecção por H. Pylori, diarréia crônica, dieta carente, suplementação inadequada e neoplasias. Os autores relatam dois casos de anemia crônica severa por melanoma em intestino delgado e outro por adenocarcinoma colônico em pacientes pós-gastroplastia redutora.
RELATOS DOS CASOS
Caso 1: Paciente feminina, 45 anos, submetida a procedimento de Capella convencional seis anos antes devido à obesidade mórbida (IMC=38,7Kg/m2) associado à diabetes tipo II, dislipidemia e hipertensão arterial. Iniciou com quadro de emagrecimento, anemia severa com múltiplas transfusões sanguíneas. Realizou colonoscopia e endoscopia digestiva alta sem anormalidades. Em enteroscopia foram visualizadas duas lesões úlcero-infiltrativas. Submetida à laparotomia exploradora foi constatada a presença das duas lesões na alça alimentar, uma na biliopancreática e um linfonodo volumoso de mesentério (Figuras 1). Foram realizadas enterectomias e retirada do linfonodo (Figura 2). Exame anátomo-patológico foi conclusivo para neoplasia maligna pleomórfica epitelióide nas quatro peças e exame imunohistoquímico confirmou melanoma. Na evolução, tomografia de crânio foi sem alterações e de tórax apresentou nódulo em face posterior de lobo inferior direito medindo 23 X 13 mm. Tomografia de abdômen mostrou alterações compatíveis com status pós-cirúrgico e pet-scan evidenciou lesões hipermetabólicas que correspondiam a linfonodo periaórtico e nódulo pulmonar não calcificado no lobo inferior direito. Paciente foi re-operada para ressecção do lobo inferior pulmonar direito, de linfonodo de mesentério jejunal, de linfonodo de mesossigmóide e cinco linfonodos de íleo. Os laudos anátomo-patológico e imunohistoquímico das três primeiras lesões confirmaram melanoma. No momento a paciente apresenta-se bem, sem indícios de recidiva da doença e em acompanhamento oncológico.
Caso 2: Paciente masculino, 52 anos, submetido a procedimento de Scopinaro quatro anos antes devido à obesidade mórbida (IMC=46,65Kg/m2) associado à hipertensão arterial, apnéia do sono e dislipidemia. Iniciou com quadro de diarréia incoercível (10 a12 episódios ao dia), fissura anal aguda e anemia severa. Realizou colonoscopia e enema opaco que evidenciaram lesão úlcero-infiltrativa, friável e endurecida em cólon sigmóide (Figura 3). O diagnóstico anátomo-patológico foi de adenocarcinoma moderadamente diferenciado, ulcerado e invasor. A tomografia computadorizada mostrou espessamento em fossa ilíaca e flanco esquerdos que poderiam corresponder à lesão úlcero-infiltrante observada na colonoscopia. Paciente foi submetido à laparotomia exploradora e colectomia esquerda ampliada com anastomose primária e alongamento da alça comum ("Kissing X") por apresentar tumor de cólon transverso distal. No momento o paciente encontra-se sem diarréia, sem indícios de anemia e de recidiva da neoplasia.
DISCUSSÃO
As anemias ferropriva, perniciosa e megaloblástica podem ocorrer após a gastroplastia, tanto na derivação biliopancreática quanto como no bypass em Y de Roux. A maior causa de anemia é a deficiência de ferro (63%), deficiência de vitamina B12 (33%) e de folato (4%). A deficiência de ferro ocorre em 50% dos pacientes ao longo do tempo e a de cobalamina é inevitável em todos os pacientes não tratados profilaticamente9. Essas afecções são freqüentes e explicam-se devido à exclusão do duodeno e jejuno proximal do trânsito alimentar, local onde acontece a absorção de ferro. Muitas vezes a hemoglobina se encontra em níveis normais e a transferrina está baixa, denotando a absorção deficiente de ferro.
A ferritina sérica representa os estoques de ferro corporal, por isso o seu valor diminuído em pacientes pós bypass gástrico em Y de Roux sugere depleção dos estoques de ferro como conseqüência da inadequada ingestão oral ou má absorção5,6.
Outra causa de anemia pós-gastroplastias são as úlceras pépticas. Elas podem ser decorrentes de granulomas na linha de grampo ou de sutura ou, podem ser justa-anastomóticas decorrentes de isquemia local. Outras causas mais raras são o uso de antinflamatórios não hormonais, infecção pelo Helicobacter pylori, alcoolismo, dieta carente e suplementação inadequada no pós-operatório. Segundo Schauer et al.10, a incidência de úlceras pós-operatórias é de 0,7% quando se utiliza a técnica de Wittgrove e Clark.
Com o grande avanço tecnológico recente, principalmente na área da videocirurgia, e o aumento das indicações cirúrgicas para o tratamento da obesidade mórbida, muitos pacientes já apresentam longo seguimento e idade avançada, o que os torna mais susceptíveis a certas doenças como as neoplasias. Os locais mais comuns de desenvolvimento de neoplasias são o cólon e reto, aparelho genital feminino (mama, endométrio, colo uterino e ovários), estômago excluso, rim, próstata e vesícula biliar2,3,4,11,13.
Neoplasias raras podem afetar o trato digestivo tanto na forma primária quanto na metastática. Embora o intestino raramente seja local de desenvolvimento primário do melanoma, ele pode ser sede oriunda de metástases via hematogênica8, sincronicamente ou em décadas após o diagnóstico do sítio primário.
A incidência de melanoma cutâneo é de 4 a 5% de todas as lesões de pele. Suas metástases envolvem o pulmão, pele, tecidos moles, fígado, ossos, cérebro e 20 a 30% dos pacientes desenvolvem metástases para o trato gastrintestinal. Os sinais e sintomas podem incluir dor abdominal, obstrução, sangramento digestivo, perfuração, emagrecimento e até mesmo anemia. A apresentação clínica mais freqüente é a anemia (60%) e a dor abdominal (59%)1.
O diagnóstico pode ser realizado através de endoscopia digestiva alta, enteroscopia e colonoscopia. Dentre os exames de imagem a tomografia por emissão de pósitrons (pet-scan) apresenta os melhores resultados com sensibilidade de 95% e especificidade de 97%12.
A sobrevida média para os pacientes submetidos à ressecção curativa é de aproximadamente 49 meses, comparado com apenas 5,4 e 5,7 meses naqueles submetidos a procedimentos paliativos e intervenções não-cirúrgicas respectivamente. Os dois fatores mais importantes no prognóstico de sobrevida são a completa ressecção das metástases do trato digestivo e o fato do aparelho digestivo ser o sítio primário destas metástases7. A sobrevida média em cinco anos varia de 18 a 28.3% dos casos1.
Tratamentos adjuvantes como quimioterapia e interferon não têm mostrado bons resultados a longo prazo.
A pesquisa de sangue oculto nas fezes, retossigmoidoscopia e principalmente a colonoscopia são os principais métodos de rastreamento e diagnósticos para pacientes com risco de carcinoma colorretal. A magnificação de imagem e cromoscopia endoscópica aumentou o índice de detecção de lesões precoces e, consequentemente, a sobrevida dos pacientes.
CONCLUSÃO
Anemias são comuns após procedimentos bariátricos, porém causas atípicas como neoplasias devem ser suspeitadas nos pacientes mais idosos e principalmente naqueles refratários ao controle clínico.
Fonte de financiamento: não há
Conflito de interesse: não há
Recebido para publicação: 30/10/2007
Aceito para publicação: 18/12/2007
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Set 2010 -
Data do Fascículo
Jun 2008
Histórico
-
Recebido
30 Out 2007 -
Aceito
18 Dez 2007