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INFLUÊNCIA DO TABACO, ÁLCOOL E DIABETE SOBRE A INTERAÇÃO CÉLULA-COLÁGENO EM MÚSCULO CREMASTER DE HUMANOS COM HÉRNIAS INGUINAIS

RESUMO

Racional:

Estudos recentes sinalizam que o mecanismo de formação das hérnias pode estar relacionado aos tecidos colagenosos, sob a ação de agentes agressores como o tabaco, o álcool e o diabete.

Objetivo:

Avaliar o colágeno presente no músculo cremaster em pacientes com hérnias inguinais enfocando o efeito do tabaco, álcool e diabete.

Métodos:

Foram estudados 15 pacientes com hérnias inguinais divididos em: grupo I (n=5) controles; grupo II (n=5) indivíduos fumantes e/ou etilistas; e grupo III (n=5) indivíduos que apresentavam diabete melito. Todos foram submetidos à correção cirúrgica das hérnias inguinais obedecendo às mesmas condições pré, intra e pós-operatórias. Durante o procedimento cirúrgico, amostras do músculo cremaster foram coletadas para análises em microscopia de luz polarizada, morfometria do colágeno e de proteínas.

Resultados:

A área ocupada por tecido conjuntivo foi maior nos grupos II e III (p<0,05). O tecido colágeno ocupou a maior parte das amostras analisadas, em comparação à área ocupada pelas células musculares. O conteúdo de proteínas totais foi maior nos grupos II e III, quando comparado com o grupo controle (p<0,05).

Conclusão:

O tabaco, o álcool e o diabete ocasionam remodelação no músculo cremaster, levando à perda de suporte ou alteração estrutural nesta região, podendo intensificar as ocorrências e os danos relacionados às hérnias inguinais.

DESCRITORES :
Músculo cremaster; Colágeno; Hérnia inguinal; Bebidas alcoólicas; Tabagismo; Diabetes.

ABSTRACT

Background:

New findings point out that the mechanism of formation of the hernias can be related to the collagenous tissues, under activity of aggressive agents such as the tobacco, alcohol and diabetes.

Aim:

To analyze the collagen present in the cremaster muscle in patients with inguinal hernias, focusing the effect of tobacco, alcohol, and diabetes.

Methods:

Fifteen patients with inguinal hernia divided in three groups were studied: group I (n=5) was control; group II (n=5) were smokers and/or drinkers; and group III (n=5) had diabetes mellitus. All subjects were underwent to surgical repair of the inguinal hernias obeying the same pre, intra and postoperative conditions. During surgery, samples of the cremaster muscle were collected for analysis in polarized light microscopy, collagen morphometry and protein.

Results:

The area occupied by the connective tissue was higher in groups II and III (p<0.05). The collagen tissue occupied the majority of the samples analyzed in comparison to the area occupied by muscle cells. The content of total protein was higher in groups II and III compared to the control group (p<0.05).

Conclusion:

The tobacco, alcohol and diabetes cause a remodel the cremaster muscle, leading to a loss of support or structural change in this region, which may enhance the occurrences and damage related to inguinal hernias.

HEADINGS:
Muscle cremaster; Collagen; Inguinal hérnia; Alcoholic beverages; Smoking; Diabetes

INTRODUÇÃO

O uso abusivo de álcool está relacionado aos problemas sociais, acidentes e lesões traumáticas, dor, sofrimento e mortalidade, impondo grande peso econômico à sociedade, e se tornando atualmente problema de saúde pública11. Bingöl-Kologlu M, Tanyel FC, Akçören Z, Topaloglu H, Gögüs S, Büyükpamukçu N, Hiçsönmez A. A comparative histopathologic and immunohistopathologic evaluation of cremaster muscles from boys with various inguinoscrotal pathologies. Eur J Pediatr Surg. 2001;11(2):110-5.. Além do álcool, o vício de fumar, que tem crescido muito principalmente entre jovens, é responsável por quatro milhões de mortes anualmente no mundo, sendo que isto se deve aos fatores culturais, fácil acesso, influência familiar e marketing industrial. Nos EUA 2.200 jovens experimentam cigarro diariamente pela primeira vez, e aproximadamente 830 tornam-se usuários regulares2929. Prokhorov AV, Winickoff JP, Ahluwalia JS, Ossip-Klein D, Tanski S, Lando HA, Moolchan ET, Muramoto M, Klein JD, Weitzman M, Ford KH. Youth Tobacco Use: A Global Perspective for Child Health Care Clinicians. Pediatrics 2006;118(3): e890-e903..

Mais de 4.000 substâncias tóxicas podem ser isoladas do cigarro, sendo a nicotina responsável pela sua dependência, tudo isso podendo ser potencializado pelo uso do álcool, predispondo à ocorrência de lesões pré-cancerígenas e cancerígenas2929. Prokhorov AV, Winickoff JP, Ahluwalia JS, Ossip-Klein D, Tanski S, Lando HA, Moolchan ET, Muramoto M, Klein JD, Weitzman M, Ford KH. Youth Tobacco Use: A Global Perspective for Child Health Care Clinicians. Pediatrics 2006;118(3): e890-e903.. Outros inúmeros problemas também relacionados ao uso do tabaco em tecidos no sistema digestório são descritos2323. Neville BW, Day TA. Oral cancer and precancerous lesions. Cancer J Clin. 2002;52(4): 195-215.,2727. Prabhu A, Obi KO, Rubenstein JH. The synergistic effects of alcohol and tobacco consumption on the risk of esophageal squamous cell carcinoma: a meta-analysis. Am J Gastroenterol. 2014;109(6):822-7.,3030. Roerecke M, Rehm J. Cause-specific mortality risk in alcohol use disorder treatment patients: a systematic review and meta-analysis. Int J Epidemiol. 2014;43(3):906-19.. Estudos clínicos e experimentais demonstraram os efeitos tóxicos dessas substâncias, que levam às alterações na pele e subcutâneo, do pH da urina, obliterações vasculares, vasoespasmos, além de processos inflamatórios66. Caldeira EJ, Carvalho CA, Padovani CR, Camilli JA, Garcia PJ.Cagnon VH. Morphological alterations in the epithelium of the oral mucosa of rats (Rattus norvegicus) submitted to long-term systemic nicotine treatment. Arch Oral Biol. 2007;52(1): 83-9.,88. Chang CM, Corey CG, Rostron BL, Apelberg BJ. Systematic review of cigar smoking and all cause and smoking related mortality. BMC Public Health. 2015;15:390.,2727. Prabhu A, Obi KO, Rubenstein JH. The synergistic effects of alcohol and tobacco consumption on the risk of esophageal squamous cell carcinoma: a meta-analysis. Am J Gastroenterol. 2014;109(6):822-7..

A região inguinal é caracterizada anatomicamente pelo canal inguinal, a região mais comum de ocorrência das hérnias inguinais. A parede anterior, seu teto, parede posterior e assoalho são formados, respectivamente, pela aponeurose do músculo oblíquo externo do abdome, pelos músculos oblíquo interno e transverso do abdome, pela fáscia transversal e peritônio parietal e pela aponeurose do músculo oblíquo externo do abdome. E neste canal está o funículo espermático envolvido pelo principal músculo desta região, o músculo cremaster, formado principalmente por musculatura estriada3,10,18,25,. Todos os tecidos, inclusive os musculares, apresentam compartimento de suporte, que contém vasos sanguíneos, linfáticos e nervos, contendo tecidos conjuntivos em que o colágeno tipo I é o predominante, apesar de outros tipos também estarem presentes. Em condições normais, o colágeno apresenta-se regular entre as células; contudo, em condições adversas estes constituintes podem estar aumentados1212. Ferragur JM, Da Cunha MR, Carvalho CA, Isayama RN, Caldeira EJ. Epithelial-stromal interactions in salivary glands of rats exposed to chronic passive smoking. Arch Oral Biol. 2011;56(6):580-7.,1616. Henriksen NA, Mortensen JH, Sorensen LT, Bay-Jensen AC, Ågren MS, Jorgensen LN, Karsdal MA. The collagen turnover profile is altered in patients with inguinal and incisional hernia. Surgery 2015;157(2):312-21.,2020. Krishnamoorthy RV, Srihari K, Rahaman H. Increased collagen and glycoprotein contents of the denervated cremaster muscle of the bonnet monkey, Macaca radiata. Experientia. 1975;31(12):1408-10..

Novos achados sinalizam que o mecanismo de formação das hérnias pode estar relacionado aos tecidos colagenosos, sob ação de agentes agressores como o tabaco, o álcool e o diabete; mas, ainda existe a necessidade de resultados quantitativos que demonstrem as reais alterações teciduais, principalmente no músculo cremaster99. Dunne JR, Malone DL, Tracy JK, Napolitano LM. Abdominal wall hernias: risk factors for infection and resource utilization. J Surg Res. 2003;111(1):78-84.,1010. Esteban RM, Cueva C, Sánchez BV, Mariscal MG, Vargaas JR, Garcia AL, Ruiz MG. Histological alterations of the muscle cremaster in certain inguinal-scrotal anomalies. Cir Pediatr. 2007;20(1):44-8.,1313. Flichi J, Alfonso JL, Delgado F, Prado MJ, Cortina P. Inguinal hernia and certain risk factors. Eur J Epidemiol. 1992;8(2):277-82.. Bingöl-Koloğlu et al., avaliando as alterações do músculo cremaster em pacientes com hérnia inguinal, não conseguiram dados que suportassem a real relação das alterações com a ocorrência de hérnias, sugerindo a necessidade de mais estudos sobre este tema11. Bingöl-Kologlu M, Tanyel FC, Akçören Z, Topaloglu H, Gögüs S, Büyükpamukçu N, Hiçsönmez A. A comparative histopathologic and immunohistopathologic evaluation of cremaster muscles from boys with various inguinoscrotal pathologies. Eur J Pediatr Surg. 2001;11(2):110-5..

O objetivo do presente estudo foi avaliar o colágeno presente no músculo cremaster, principal músculo inguinal, em pacientes com hérnias, relacionando a ocorrência destas lesões com o tabagismo, alcoolismo e diabete.

MÉTODOS

Coleta das amostras teciduais

Foram avaliados 15 pacientes masculinos e brancos submetidos à herniorrafia inguinal no Hospital Universitário da Faculdade de Medicina de Jundiaí, SP, Brasil, divididos em três grupos: grupo I (n=5) controles; grupo II (n=5) indivíduos fumantes e/ou etilistas; e grupo III (n=5) indivíduos que apresentavam diabete melito. A Tabela 1 mostra a variação de idade e índice de massa corpórea dos pacientes incluídos.

TABELA 1
Faixa etária e o índice de massa corpórea (IMC) dos grupos de estudo

A pesquisa recebeu aprovação do Comitê de Ética da Faculdade de Medicina de Jundiaí, n° 625.555 e todos os doentes preencheram o Termo de Consentimento Informado. Os indivíduos incluídos foram submetidos às mesmas condições pré, intra e pós-operatórias, e durante a herniorrafia foram coletadas amostras do músculo cremaster, com aproximadamente 1,5 cm, dissecando com lâmina de bisturi cirúrgico, tomando como referência os limites da hérnia e as paredes do canal inguinal. A região foi fotografada com máquina digital para arquivo hospitalar. É importante destacar que, possíveis alterações nos tecidos como coloração, textura e consistência foram observadas macroscopicamente caso fossem aparentes entre os grupos.

Microscopia de luz polarizada

As amostras foram coletadas de cada paciente, fixadas em Bouin (solução aquosa saturada de ácido pícrico - 75 ml, formol - 25 ml e ácido acético glacial - 5 ml) por 12 h para posterior processamento e inclusão em parafina. Para inclusão os tecidos foram lavados em álcool 70% e, a seguir, sofreram desidratação em uma série crescente de alcoóis (álcool 80 % - 2 vezes, álcool absoluto - 3 vezes; 1 a 2 h cada). Em seguida, os fragmentos foram diafanizados em xilol durante 1 a 2 h até que se tornem translúcidos e incluídos em parafina e polímeros plásticos (Paraplast Plus) a 560 C durante aproximadamente 1 h e depois posicionados cuidadosamente no fundo das formas plásticas, visando a obtenção dos cortes histológicos transversais. Os blocos foram trimados para obtenção de superfícies planas e seccionados com cinco micrômetros de espessura. A seguir, os fragmentos foram colocados sobre as lâminas albuminizadas e levadas para a estufa a 600 C. Após a preparação dos cortes eles foram corados com o método histoquímico de Picrosirius (solução aquosa saturada de ácido pícrico adicionada de 0,1 g de vermelho da Síria F3b, Sírius red F3B-Bayer) para avaliação dos constituintes fibrilares da matriz extracelular1919. Junqueira LCU, Bignolas G.; Brentani R R. Picrosirius staining plus polarization microscopy, a specific method for collagen detection in tissue sections. Histochem J. 1979;11: 447-455.. Os achados foram fotografados no microscópio de luz Nikon Eclipse E100 para microscopia com o sistema de lentes polarizadas, acoplado ao sistema de aquisição de imagens SD-CCD 3.3, do Departamento de Morfologia e Patologia Básica da mesma faculdade, e todas as observações empregando objetivas 40x.

Morfometria dos constituintes colagenosos

Os fragmentos separados para microscopia de luz polarizada foram utilizados para a quantificação dos componentes colagenosos. A densidade de volume destes componentes foi calculada pela média de quatro regiões de cada corte histológico pelo método de contagem de pontos, utilizando a seguinte fórmula:

Nela, P estrutura o número de pontos sobre a área estudada e o P sistema teste o número total de pontos do retículo de integração quadrilátero utilizado. Em seguida, foi realiza a mensuração da área total relativa ocupada pelas fibras musculares e pelos componentes colagenosos empregando sistema de análises de imagens Image J 1.39 (Image Processing and Analysis in Java, National Institute of Health, Maryland, USA)3535. Webel ER. Steriological principles for morphometry in electron microscopic cytology. Int Rev Cytol. 1979;26:235-302..

Análise bioquímica

Outros fragmentos dos tecidos coletados foram armazenados, separados (80° C) e homogeneizados em tampão de extração (150 mM cloreto de sódio, 1% NP-40 ou Triton x-100, 0,5% sodium deoxycholate, 0,1% SDS, 50mM Tris, pH 8.0) a 4°C em "Polytron PTA 20S generator" (Brinkmann Instruments mode PT 10/35) na velocidade máxima por 30 s. O tecido homogeneizado foi centrifugado a 11000 rpm por 30 min para remoção de material insolúvel e a concentração de proteína total contida no sobrenadante foi determinada utilizando-se o método de Bradford44. Bradford MM. A rapid and sensitive method for the quantitation of microgram quantities of protein utilizing the principle of protein-dye binding. Anal Biochem. 1976;72: 248-54..

Análise estatística

O estudo estatístico foi realizado para as seguintes variáveis: área relativa das fibras musculares (%), área relativa e densidade de volume das fibras colágenas (%) e níveis de proteínas totais (mg/dl) pela técnica de análise de variância (ANOVA), complementado com o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis ao nível de 5% de significância.

RESULTADOS

Durante o procedimento cirúrgico foram avaliados todos os tecidos quanto à coloração, textura e consistência, e macroscopicamente não foi observada nenhuma diferença significativa entre as amostras coletadas.

Análise bioquímica

A análise do conteúdo de proteínas totais nas amostras do tecido cremastérico mostrou que houve aumento significativo no grupo II e III quando comparado com o grupo I, com nível de significância de p<0,05 (Tabela 2).

TABELA 2
Níveis de proteína (mg/dl) entre os grupos estudados

Microscopia de luz polarizada

No grupo I (controle) foi observado predominância de células musculares. Entretanto, nos grupos II e III foi visto predomínio da área ocupada pelo tecido conjuntivo e diminuição da ocupada pelas células musculares, sendo a diferença significante (p< 0,05, Figura 1 e Tabela 3).

FIGURA 1
Fotomicrografia do músculo cremaster dos pacientes dos grupos I, II e III: A) no grupo I nota-se na coloração de Sirius Red a área ocupada pelo tecido conjuntivo (C) e a área negra ocupada pelas células musculares (M); B) no grupo II a área ocupada pelo tecido conjuntivo (C) e a área negra ocupada pelas células musculares (M); C) no grupo III observa-se a área ocupada pelo tecido conjuntivo (C) e a área negra ocupada pelas células musculares (M) (coloração Picrosirius Red -300x)

TABELA 3
Área relativa ocupada pelas células musculares (%) e pelo tecido conjuntivo (%) de acordo com os grupos estudados

DISCUSSÃO

O tecido conjuntivo é composto por três grupos de proteínas extracelulares: os proteoglicanos, as glicoproteínas e os colágenos. Os proteoglicanos têm funções na regulação da estrutura e permeabilidade do tecido conjuntivo. As glicoproteínas desempenham papel nas interações célula-célula. Os colágenos são os principais responsáveis pela matriz, estrutura e suporte do tecido conjuntivo, sendo que entre os vertebrados e invertebrados existem cerca de 28 tipos de colágenos conhecidos, designados por numerais romanos (I - XXVIII), em ordem cronológica de seu descobrimento2222. Mienaltowski MJ, Birk DE. Structure, physiology, and biochemistry of collagens. Adv Exp Med Biol. 2014;802:5-29..

A quantidade de colágeno varia conforme o tecido, sendo que o colágeno tipo I está presente principalmente na estrutura dos tendões, ligamentos e fibras musculares estriadas2222. Mienaltowski MJ, Birk DE. Structure, physiology, and biochemistry of collagens. Adv Exp Med Biol. 2014;802:5-29..

Estudos clínicos e experimentais que utilizam as técnicas morfológicas vêm demonstrando que diferentes fatores podem comprometer tanto o tecido conjuntivo, como seu compartimento de suporte promovendo intensos danos morfofuncionais2020. Krishnamoorthy RV, Srihari K, Rahaman H. Increased collagen and glycoprotein contents of the denervated cremaster muscle of the bonnet monkey, Macaca radiata. Experientia. 1975;31(12):1408-10.,2222. Mienaltowski MJ, Birk DE. Structure, physiology, and biochemistry of collagens. Adv Exp Med Biol. 2014;802:5-29.. Portanto, análises morfológicas quantitativas dos tecidos colagenosos do músculo cremaster se fazem necessárias e podem contribuir principalmente para o entendimento dos efeitos do tabaco, do álcool e do próprio diabetes na ocorrência de hérnias na região inguinal.

A microscopia de polarização tem sido tradicionalmente utilizada como ferramenta importante no estudo destas estruturas fibrilares, dentre outras funções. Schmidt (1924)3131. Schmidt WT. Die Bausteine des Tierkorpers in polarisiertem Lichte. Cohen, Bonn. Apud: Oldenbourg R. Analysis of edge birefringence. Biophys J. 1924;60: 629-41. foi um dos autores pioneiros a aplicar a microscopia de polarização no estudo de estruturas biológicas e desde então, diversos trabalhos enfatizam o uso de tal técnica com o intuito de observar morfologicamente materiais biológicos e obter respostas importantes sobre estas estruturas2424. Oldenbourg R. Analysis of edge birefringence. Biophys J. 1991;60:629-41.,2828. Pinto H, Jones R. Theory of the birefringence due to dislocations in single crystal CVD diamond. J Phys Condens Matter. 2009;21(36):364220..

O diabete melito, além do tabaco e o álcool, pode também estar relacionados com as alterações estruturais em diferentes tecidos, comprometendo inclusive suas funções66. Caldeira EJ, Carvalho CA, Padovani CR, Camilli JA, Garcia PJ.Cagnon VH. Morphological alterations in the epithelium of the oral mucosa of rats (Rattus norvegicus) submitted to long-term systemic nicotine treatment. Arch Oral Biol. 2007;52(1): 83-9.,88. Chang CM, Corey CG, Rostron BL, Apelberg BJ. Systematic review of cigar smoking and all cause and smoking related mortality. BMC Public Health. 2015;15:390.,3030. Roerecke M, Rehm J. Cause-specific mortality risk in alcohol use disorder treatment patients: a systematic review and meta-analysis. Int J Epidemiol. 2014;43(3):906-19.. Neste sentido, alguns estudos relacionam que pacientes com hérnias da parede abdominal são portadores de diabete, associados ou não ao uso de tabaco ou álcool. Entretanto, são estudos que apenas enfocam estes elementos como sendo fatores de risco para a ocorrência de hérnias, mas não detalham quais alterações ocorrem nos tecidos1212. Ferragur JM, Da Cunha MR, Carvalho CA, Isayama RN, Caldeira EJ. Epithelial-stromal interactions in salivary glands of rats exposed to chronic passive smoking. Arch Oral Biol. 2011;56(6):580-7.,1616. Henriksen NA, Mortensen JH, Sorensen LT, Bay-Jensen AC, Ågren MS, Jorgensen LN, Karsdal MA. The collagen turnover profile is altered in patients with inguinal and incisional hernia. Surgery 2015;157(2):312-21..

Os tecidos musculares como outros, apresentam compartimento de suporte que é fundamental para a homeostasia celular. Nestes compartimentos encontram-se os tecidos conjuntivos que em condições normais, apresentam-se entre as células estruturando a arquitetura do órgão, bem como dando subsídios para sua manutenção. Contudo, em condições adversas estes constituintes podem estar alterados1212. Ferragur JM, Da Cunha MR, Carvalho CA, Isayama RN, Caldeira EJ. Epithelial-stromal interactions in salivary glands of rats exposed to chronic passive smoking. Arch Oral Biol. 2011;56(6):580-7.,2121. Lamber B, Grossi JVM, Manna BB, Montes JHM, Bigolin AV, Cavazzola LT. May polyester with collagen coating mesh decrease the rate of intraperitoneal adhesions in incisional hérnia repair. Arq Bras Cir Dig. 2013;26(1)13-17,2222. Mienaltowski MJ, Birk DE. Structure, physiology, and biochemistry of collagens. Adv Exp Med Biol. 2014;802:5-29.,2626. Peres MAO, Nieri TM, Barcelos Neto HS, Andreollo NA. Lichtenstein hernia repair in primary and recurrent inguinal hernias - ambulatory surgery in a university hospital. Arq Bras Cir Dig. 2007;20(4):221-224.,3333. Wagh PV, Leverich AP, Sun CN, White HJ, Read RC. - Direct inguinal herniation in men: a disease of collagen. J Surg Res, 1974, 17(6): 425-33..

O tabagismo e o etilismo acarretam inúmeros danos, predispondo os usuários à diferentes doenças. A literatura ainda não registra elementos suficientes para comprovar quanto a exposição a estes agentes pode realmente estar relacionada às alterações celulares em diferentes tecidos, e sugerem que mais estudos sejam realizados8,27,30 .

O diabete melito também está associado com alterações estruturais em diferentes órgãos e tecidos, comprometendo inclusive suas funções55. Burcharth J, Pommergaard HC, Bisgaard T, Rosenberg JPatient-related risk factors for recurrence after inguinal hernia repair: a systematic review and meta-analysis of observational studies. Surg Innov. 2015;22(3):303-17,77. Caldeira EJ, Alves VHC. IGF-I and INS receptor expression in the salivary glands of diabetic Nod mice submitted to long-term insulin treatment. Cell Biol Int. 2008;32(1):16-21.. Alguns autores relatam que pacientes com hérnia da parede abdominal são portadores de diabete em 8,4% dos casos e descrevem que 43% fazem uso de tabaco e 7,4% são alcoolistas. E relatam que os pacientes fumantes têm alterações no metabolismo dos tecidos da região inguinal, contribuindo assim para a maior ocorrência dessas hérnias55. Burcharth J, Pommergaard HC, Bisgaard T, Rosenberg JPatient-related risk factors for recurrence after inguinal hernia repair: a systematic review and meta-analysis of observational studies. Surg Innov. 2015;22(3):303-17,99. Dunne JR, Malone DL, Tracy JK, Napolitano LM. Abdominal wall hernias: risk factors for infection and resource utilization. J Surg Res. 2003;111(1):78-84.,1313. Flichi J, Alfonso JL, Delgado F, Prado MJ, Cortina P. Inguinal hernia and certain risk factors. Eur J Epidemiol. 1992;8(2):277-82..

A ocorrência de outras doenças e associação com variações do colágeno também tem sido descrito na literatura. Bonduki et al., (2009) estudaram 15 pacientes com sintomas de infertilidade e relacionaram o colágeno presente na musculatura uterina com os tumores nesta região22. Bonduki CE, Dornelas GDE Junior, Bernardo A, Simões MDE, Castro RDE, , Gomes MT, Girão MJ, et al. Collagen histomorphometric evaluation in uterin tissue samples before and after treatment of uterine fibroids with arterial embolization. Rev Bras Ginecol Obstet. 2009;31(12):598-603.. Wang et al., (2009) estudando pacientes com fibrose hepática, também observaram que na maioria deles existem alterações nos componentes fibrilares deste órgão3434. Wang MH, Palmeri ML, Guy CD, Yang L, Hedlund LW, Diehl AM, Nightingale KR. In vivo quantification of liver stiffness in a rat model of hepatic fibrosis with acoustic radiation force. Ultrasound Med Biol. 2009;35(10):1709-21.. Por outro lado, Gudiene et al., avaliando o diâmetro de vasos sanguíneos mostraram que idade dos indivíduos pode alterar o colágeno tecidual1515. Gudiene D, Valanciute A, Velavicius J. Collagen network changes in basilar artery in aging. Medicina (Kaunas). 2007;43(12):964-70..

Embora os pacientes incluídos neste estudo tivessem variação da faixa etária, todos eram masculinos, brancos e com índice de massa corpórea muito semelhantes. Os resultados mostraram em indivíduos considerados saudáveis e com hérnias inguinais, maior área ocupada pelas células musculares e menor parte formada por tecido conjuntivo. Diferentemente, nos indivíduos dos grupos II e III, formado por pessoas tabagistas, etilistas ou diabéticos, a maior parte das amostras do músculo cremaster mostrou intenso acúmulo de tecido conjuntivo.

A quantificação de proteínas totais nestes tecidos, pelas análises bioquímicas, foram similares aos resultados obtidos na microscopia de luz polarizada, demonstrando também aumento significativo destes níveis nas amostras obtidas nos indivíduos dos grupos II e III, quando apresentavam relação com tabagismo, etilismo ou diabete.

Estes resultados foram considerados uniformes; portanto, os agentes agressores podem promover aumento da área ocupada pelo compartimento colagenoso, podendo alterar assim a estrutura e a função do tecido.

Estes achados corroboram a relação das hérnias com os agentes agressores e estão em concordância com a literatura corroboram com esta literatura agregando a quantificação dos tecidos colagenosos e a possível predisposição destes indivíduos de terem as lesões herniais.

Wagh et al. registraram em homens que as alterações no metabolismo do colágeno mais intensas foram encontradas na bainha anterior do músculo reto abdominal de pacientes com hérnia inguinal direta, que nos pacientes com hérnia inguinal indireta e no grupo controle, sem diferença estatisticamente significante. Entretanto, os autores não mencionaram a faixa etária dos pacientes, nem associação com diabete, tabagismos ou etilismo3333. Wagh PV, Leverich AP, Sun CN, White HJ, Read RC. - Direct inguinal herniation in men: a disease of collagen. J Surg Res, 1974, 17(6): 425-33..

Fachinelli e Maciel Trindade estudando pacientes com hérnias epigástricas, umbilicais e incisionais constataram que quanto maior a sua incidência, menor quantidade de tecido colagenoso eles apresentavam nestas áreas1111. Fachinelli A, Maciel Trindade MR. Qualitative and quantitative evaluation of total and types I and III collagens in patients with ventral hernias. Langenbecks Arch Surg. 2007;392(4):459-64..

Gonçalves et al. analisaram amostras da fáscia transversal e da bainha anterior do músculo reto abdominal de 40 homens portadores de hérnia inguinal tipo II e IIIA de Nyhus e de 10 controles constituídos por cadáveres frescos, na mesma faixa etária, sem hérnia, utilizando imunoistoquímica nos estudos do colágeno I, colágeno III e fibras elásticas. A pesquisa concluiu que a quantidade dos componentes fibrilares da matriz extracelular não se alterou nos pacientes com e sem hérnia inguinal1414. Gonçalves, RO, De Moraes e Silva E, Lopes Filho GJ. Immunohistochemical evaluation of fibrillar components of the extracellular matrix of transversalis fascia and anterior abdominal rectus sheath in men with inguinal hernia. Rev Col Bras Cir 2014;41(1):23-29..

Henriksen et al. avaliaram pacientes com três diferentes tipos de hérnias: hérnia inguinal unilateral, múltiplas hérnias (mais que três tipos) e hérnias incisionais. Pacientes sem hérnias submetidos à colecistectomia serviram como grupo controle. Os autores analisaram os colágenos tipo I, III, IV e V e concluíram que os com hérnias apresentam metabolismo do colágeno alterado, e que o estudo do turnover do colágeno tipo IV pode predizer a presença de hérnias inguinais e incisionais. Portanto, a regulação do turnover do colágeno tipo IV pode ser fator crucial para a ocorrência de hérnias1616. Henriksen NA, Mortensen JH, Sorensen LT, Bay-Jensen AC, Ågren MS, Jorgensen LN, Karsdal MA. The collagen turnover profile is altered in patients with inguinal and incisional hernia. Surgery 2015;157(2):312-21.. Os mesmos autores, em revisão sistemática recente analisando 55 artigos originais, avaliaram as alterações do tecido conjunto em doentes com hérnias de parede abdominal. Concluiram que pacientes com hérnias inguinais diretas e recidivadas apresentam colágenos tipos I e III diminuídos nas biópsias de fáscias e pele1717. Henriksen NA. Systemic and local collagen turnover in hernia patients. Dan Med J. 2016;63(7). pii: B5265..

Concluindo, todos estes achados mostram a complexidade que envolve a formação de hérnias e sua relação com a parede abdominal. É importante destacar que no presente estudo não foi abordada a gravidade das lesões herniárias, nem tão pouco foi avaliada a evolução pós-operatória dos casos estudados, sendo essas questões merecedoras de novas pesquisas. É importante destacar que a quantificação deste compartimento tecidual poderá contribuir para o entendimento da formação e da incidência das hérnias, complementando os resultados obtidos até o momento.

CONCLUSÕES

O tabaco e o álcool, em conjunto com o diabete melito ocasionam remodelação no músculo cremaster, levando à perda de suporte ou alteração estrutural nesta região, podendo intensificar as ocorrências e os danos relacionados às hérnias inguinais

REFERENCES

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  • Fonte de financiamento:

    não há

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Maio 2016
  • Aceito
    18 Ago 2016
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