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Qualidade de vida do paciente submetido à cirurgia videolaparoscópica para tratamento para doença do refluxo gastroesofágico

Resumos

RACIONAL: A doença do refluxo gastroesofágico é afecção crônica de elevada prevalência nos países ocidentais e com efeitos negativos sobre a qualidade de vida. O tratamento cirúrgico é indicado para pacientes que necessitam usar medicamentos ininterruptamente, intolerantes ao controle clínico prolongado e nas formas complicadas da doença. OBJETIVO: Avaliar a qualidade de vida de indivíduos submetidos à correção cirúrgica por videolaparoscopia, para tratamento da doença do refluxo gastroesofágico. MÉTODOS: Foram avaliados 43 pacientes com idade média de 51,4 anos, de ambos os gêneros nos últimos dez anos, utilizando-se o questionário Escala de Qualidade de Vida Relacionada à Saúde para doença do refluxo gastroesofágico (1996), traduzido e validado para a língua portuguesa. Os dados foram analisados pelo programa estatístico Epi Info versão 3.5.1, com auxilio do teste de Duncan e do coeficiente de correlação de Pearson, fixando-se o valor de 5% para a hipótese de nulidade (p<0,05). RESULTADOS: Mais de 50% dos participantes demonstraram boa qualidade de vida (escores<5 do questionário); 95,3% indicaram satisfação com seu estado de saúde. Observou-se correlação positiva significativa entre a maioria das variáveis referentes à pirose e ao tempo após a operação (p<0,05). CONCLUSÃO: Os pacientes apresentaram boa qualidade de vida e elevado grau de satisfação com sua condição pós-operatória.

Doença do refluxo gastroesofágico; Qualidade de vida; Cirurgia; Laparoscopia


BACKGROUND: Gastroesophageal reflux disease is a chronic disease of high prevalence in Western countries, with negative effects on quality of life. Surgery is indicated for patients with intolerance to continuous medication, prolonged treatment or control, or in complicated forms of the disease. AIM: To evaluate the quality of life of patients undergoing surgery by videolaparoscopy for gastroesophageal reflux disease treatment. METHODS: Sample comprised 43 patients of both genders (mean age = 51.4 years). For quality of life evaluation was made using the questionnaire Gastroesophageal Reflux Disease Health Related Quality of Life, translated and validated into Portuguese. Data were analyzed by Epi Info version 3.5.1, using Duncan test and Pearson's correlation coefficient, with 5% for null hypothesis (p < 0.05). RESULTS: Over 50% of participants showed good quality of life (scores <5 of the questionnaire), more than 90% indicated satisfaction with their health. A significant positive correlation between most variables related to heartburn and the time after surgery was observed (p < 0.05). CONCLUSION: Patients presented good quality of life and high level of satisfaction with their postoperative condition.

Gastroesophageal reflux disease; Quality of life; Surgery; Laparoscopy


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade de vida do paciente submetido à cirurgia videolaparoscópica para tratamento para doença do refluxo gastroesofágico

Francisco José Cavalcante AndradeI, III; Eliete Rodrigues de AlmeidaIII; Maria Teresa Botti Rodrigues dos SantosIII; Eurípedes Soares-FilhoII; João Batista LopesII; Roberto Cavalcante Veras e SilvaII

IHospital Aliança Casamater

IIUniversidade Federal do Piauí, Terezina, PI

IIIPrograma de Pós-Graduação da Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, SP. Brasil

Endereço para correspondênciaEndereço para correspondência: Francisco José Cavalcante Andrade, e-mail: fjcavalcante@hotmail.com

RESUMO

RACIONAL: A doença do refluxo gastroesofágico é afecção crônica de elevada prevalência nos países ocidentais e com efeitos negativos sobre a qualidade de vida. O tratamento cirúrgico é indicado para pacientes que necessitam usar medicamentos ininterruptamente, intolerantes ao controle clínico prolongado e nas formas complicadas da doença.

OBJETIVO: Avaliar a qualidade de vida de indivíduos submetidos à correção cirúrgica por videolaparoscopia, para tratamento da doença do refluxo gastroesofágico.

MÉTODOS: Foram avaliados 43 pacientes com idade média de 51,4 anos, de ambos os gêneros nos últimos dez anos, utilizando-se o questionário Escala de Qualidade de Vida Relacionada à Saúde para doença do refluxo gastroesofágico (1996), traduzido e validado para a língua portuguesa. Os dados foram analisados pelo programa estatístico Epi Info versão 3.5.1, com auxilio do teste de Duncan e do coeficiente de correlação de Pearson, fixando-se o valor de 5% para a hipótese de nulidade (p<0,05).

RESULTADOS: Mais de 50% dos participantes demonstraram boa qualidade de vida (escores<5 do questionário); 95,3% indicaram satisfação com seu estado de saúde. Observou-se correlação positiva significativa entre a maioria das variáveis referentes à pirose e ao tempo após a operação (p<0,05).

CONCLUSÃO: Os pacientes apresentaram boa qualidade de vida e elevado grau de satisfação com sua condição pós-operatória.

Descritores: Doença do refluxo gastroesofágico. Qualidade de vida. Cirurgia. Laparoscopia.

ABSTRACT

BACKGROUND: Gastroesophageal reflux disease is a chronic disease of high prevalence in Western countries, with negative effects on quality of life. Surgery is indicated for patients with intolerance to continuous medication, prolonged treatment or control, or in complicated forms of the disease.

AIM: To evaluate the quality of life of patients undergoing surgery by videolaparoscopy for gastroesophageal reflux disease treatment.

METHODS: Sample comprised 43 patients of both genders (mean age = 51.4 years). For quality of life evaluation was made using the questionnaire Gastroesophageal Reflux Disease Health Related Quality of Life, translated and validated into Portuguese. Data were analyzed by Epi Info version 3.5.1, using Duncan test and Pearson's correlation coefficient, with 5% for null hypothesis (p < 0.05).

RESULTS: Over 50% of participants showed good quality of life (scores <5 of the questionnaire), more than 90% indicated satisfaction with their health. A significant positive correlation between most variables related to heartburn and the time after surgery was observed (p < 0.05).

CONCLUSION: Patients presented good quality of life and high level of satisfaction with their postoperative condition.

Headings: Gastroesophageal reflux disease. Quality of life. Surgery. Laparoscopy.

INTRODUÇÃO

A doença do refluxo gastresofágico (DRGE) é uma das afecções crônicas mais frequentes na prática médica, com elevada prevalência e morbidade, determinando limitações importantes no cotidiano de seus portadores, com prejuízo na qualidade de vida (QV)1. Constitui-se em tema de crescente interesse para estudo, visto o elevado número de publicações na literatura. Não obstante, existe controvérsia sobre vários aspectos da afecção, do ponto de vista diagnóstico e terapêutico20.

Uma metanálise de estudos internacionais encontrou prevalência de 10-20% em países ocidentais e até 5% no mundo oriental, quando utiliza como critério diagnóstico para DRGE a presença de pirose pelo menos uma vez por semana, nos últimos 12 meses8. No Brasil observou-se prevalência em torno de 11,8% para pirose uma vez por semana e 7,3% para pirose mais que uma vez por semana19.

Pode não haver critério padrão para definir a DRGE, uma vez que o limiar entre o refluxo fisiológico e patológico em última análise é arbitrário. Um consenso recente (consenso de Montreal) definiu a DRGE como "uma condição que se desenvolve quando o refluxo de conteúdos do estômago causa sintomas perturbadores e ou complicações"29.

As medidas terapêuticas buscam corrigir as alterações fisiopatológicas da doença, como melhorar a função motora do esôfago, elevar a pressão do EEI, acelerar o esvaziamento gástrico e minimizar o potencial danoso do conteúdo gástrico neutralizando ou mesmo suprimindo a agressão representada pelo ácido clorídrico do suco gástrico. Pode-se dividir a abordagem terapêutica em medidas comportamentais e farmacológicas, que deverão ser implementadas concomitantemente20. A grande dificuldade do tratamento clínico não consiste em controlar os sintomas, mas sim em manter os pacientes assintomáticos ao longo do tempo22.

Com o advento da cirurgia laparoscópica, houve maior anuência do paciente para a terapêutica cirúrgica. A menor morbidade pós-operatória nesta técnica não deve modificar suas indicações, porém esta opção tem-se tornado mais atrativa10. Contudo, sintomas pós-operatórios incluindo disfagia, dificuldade para eructar, flatulência e diarréia podem estar presentes, causando ansiedade e inquietação em pacientes e médicos17.

Desta forma, deve-se considerar o impacto da operação sobre a QV dos pacientes a ela submetidos. QV é assunto que vem sendo largamente debatido nas últimas décadas despertando o interesse da sociedade moderna. Tradicionalmente era conceito partilhado por cientistas sociais, filósofos e políticos, mas atualmente suscita crescente interesse de médicos e pesquisadores. A expressão QV na esfera da saúde está vinculada ao impacto do estado de saúde sobre a capacidade do indivíduo viver plenamente12. A Organização Mundial de Saúde reuniu especialistas, que definiram, em 1995, qualidade de vida como a "percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações".

As mudanças nos paradigmas da assistência a saúde nas últimas décadas, colocam o indivíduo como um ser biopsicossocial, e não apenas como um organismo biológico que deve ser reparado. Conduzem a um cuidar mais humanizado, despertando para perspectiva da QV, levando em consideração a integralidade da pessoa humana4.

Assim, QV tem se tornado um conceito cada vez mais valorizado e utilizado em pesquisa clínica, bem como tem norteado decisões dos profissionais da saúde. A qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) tem sido utilizada para avaliar o impacto das doenças crônicas no cotidiano das pessoas e, também, para avaliar pacientes com a mesma doença, mas que apresentam critérios diferentes ao mesmo tratamento14.

O objetivo do presente estudo é analisar os resultados da utilização do questionário específico Gastroesophageal Reflux Disease Health Related Quality of Life (GERD-HRQL) para mensuração da QVRS de pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico videolaparoscópico da DRGE.

MÉTODOS

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Cruzeiro do Sul (UNICSUL) sob o número 159/2009. Todos os participantes leram, consentiram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Foram atendidos 43 indivíduos adultos, de ambos os gêneros, submetidos à operação por videolaparoscopia para tratamento da DRGE, no hospital Casamater, na cidade de Teresina, PI, Brazil nos últimos 10 anos.

Os critérios de inclusão foram: pacientes de ambos os gêneros, acima de 18 anos de idade submetidos à operação para tratamento de DRGE nos últimos dez anos operados pela mesma equipe cirúrgica utilizando a técnica de Nissen-Rossetti (fundoplicatura de 360º).

Foram excluídos os pacientes submetidos à outras operações abdominais após o tratamento cirúrgico da DRGE.

Todos foram avaliados mediante a utilização de questionários, a partir de entrevistas individuais realizadas em ambiente apropriado. Os questionários foram:

1) Dados Sócio-Demográficos (elaborado especialmente para este estudo) e 2) GERD-HRQL em português (Escala de Qualidade de Vida Relacionada à Saúde para Doença do Refluxo Gastroesofágico - DRGE-QVRS).

Análise e interpretação dos dados

A criação do banco de dados e as análises estatísticas foram realizadas com auxílio do programa Epi Info versão 3.5.1.

Os dados foram analisados de forma descritiva através de frequência relativa (%) e absoluta (n) para as variáveis categóricas. As variáveis quantitativas e os escores das variáveis de mensuração da escala de QV foram expressos através de média, desvio-padrão, valores mínimos e máximos.

Para comparar as médias das diversas variáveis estudadas, em função da faixa etária e do tempo pós-operatório e para verificar a relação linear significativa entre os parâmetros do questionário GERD-HRQL, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson. Fixou-se o valor de 5% para as hipóteses de nulidade (p< 0,05).

RESULTADOS

A média de idade dos pacientes foi de 51,4 anos, com variação de 23-81 anos (Tabela 1). Apenas um paciente (2,3%) era sem estudos, enquanto 41,9% tinham ensino superior completo. Com relação à etnia, de acordo com critérios do IBGE onde o indivíduo diz a que classe pertence, encontrou-se 67,4% de brancos e 32,6% de pardos (Tabela 1).

O escore no questionário DRGE-QVRS foi calculado pela soma das cifras assinalados pelos pacientes, variando entre 0 e 50 (0 a melhor resposta e 50, a pior). Entre os resultados obtidos, observou-se predominância de escores baixos, onde o escore mínimo (zero) estava presente em 16,3% dos pacientes. Vale ainda ressaltar que mais da metade dos pacientes apresentou escores abaixo de 5 e somente um exibiu escore de 18, máximo alcançado neste estudo (Figura 1).


As Tabelas 2 e 3 apresentam as médias dos escores quanto aos parâmetros avaliados, a faixa etária e tempo decorrido da operação.

A última questão do GERD-HRQL avaliou a percepção do paciente quanto ao seu estado de saúde atual em seis níveis de satisfação. As respostas muito satisfeito e satisfeito foram assinaladas, respectivamente, por 25 (58,1%) e 16 (37,2%) dos pacientes estudados. Notou-se que a maioria dos pacientes muito satisfeitos concentravam-se entre dois e sete anos decorridos da operação (Figura 2).


A Tabela 4 apresenta a análise estatística entre as variáveis estudadas e o desfecho - qualidade de vida, utilizando-se o teste de correlação Pearson.

DISCUSSÃO

As últimas décadas contemplaram um momento importante nos estudos referentes ao manejo da DRGE, decorrentes dos incrementos diagnósticos e terapêuticos. Fator relevante a ser considerado neste manejo é a crescente aceitação de que a QV dos pacientes é amplamente afetada pelos sintomas relacionados à doença, tornando sua avaliação importante na condução dos pacientes6.

Apesar do advento dos inibidores de bomba de prótons (IBP), alguns pacientes continuam a experimentar sintomas persistentes de DRGE. Alternativas não-cirúrgicas para tratamento desses pacientes são atualmente limitadas18,20.

O presente estudo apresentou os escores da QVRS de pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para DRGE, a partir da utilização do instrumento de GERD-HRQL.

Algumas limitações devem ser ressaltadas, notadamente relacionadas às peculiaridades metodológicas relativas ao desenho do estudo, o qual não permite confrontar a QV passada e atual de cada participante da amostra, por não se tratar de estudo longitudinal.

Os escores totais baixos para o GERD-HRQL, obtidos na amostra, indicaram boa qualidade de vida, sugerindo que o tratamento cirúrgico foi eficaz para os pacientes estudados. Devido à particularidade de delineamento deste estudo, não é cabível afirmar que o tratamento cirúrgico promoveu melhora na qualidade de vida dos indivíduos pesquisados. A qualidade de vida aqui relatada alude-se ao momento da coleta dos dados.

As alterações no estilo de vida impostas pela necessidade de controle dos sintomas, como modificações nos hábitos alimentares, elevação da cabeceira da cama e um dormir desconfortável, podem afetar a sensação de bem estar físico e a capacidade de convivência dos pacientes alterando suas relações sociais e afetando seu status psicológico, podendo levar a impacto negativo sobre sua qualidade de vida. Todos estes aspectos de bem estar podem ser melhorados pela operação6.

A perspectiva do paciente diante dela é livrar-se dos sintomas da DRGE e não adquirir efeitos colaterais incômodos. A QV será melhorada pelo desaparecimento dos sintomas de refluxo e a ausência de novos sintomas como disfagia. Além disto, deve ser possível regressar à normalidade dos hábitos alimentares. Embora a operação possa determinar melhorias anatômicas e funcionais no esfincter esofágico inferior, ela pode não ser satisfatória para o controle dos sintomas da DRGE, quando avaliada sobre o ponto de vista dos pacientes.

No grupo estudado, a idade dos pacientes variou de 23 a 81 anos, com média de 51,8 anos, que não se mostrou diferente dos dados da literatura, cuja média de idade de pacientes com DRGE varia de 39,6 a 59,75,19,21.

Quanto ao gênero, observou-se certa discordância com a população de pacientes com DRGE descrita em vários trabalhos da literatura, com maior prevalência de mulheres e variação de 57- 61,8%19,21.

Na amostra deste estudo, encontrou-se 48,8% do gênero feminino, dados semelhantes aos de Ciovica et al.5, em estudo sobre QV apos operação laparoscópica anti-refluxo, com prevalência de 48,4% do gênero feminino. A DRGE não assume clara preferência por sexo, como já foi demonstrado na literatura, apesar da associação conhecida entre sintomas de DRGE e gravidez8. As diferenças encontradas, podem ser atribuídas à maior probabilidade de diagnóstico entre pacientes do gênero feminino com níveis mais elevados de cuidados médicos.

Sonnenberg e El-Serag24 referiram que as formas mais severas da DRGE caracterizadas por esofagite erosiva e úlceras esofágicas são mais comuns entre os homens.

Com relação à escolaridade, observou-se predominância de indivíduos com ensino superior (41,9%), baixa proporção de indivíduos com ensino fundamental (16,3%) e apenas uma pessoa sem estudos (2,3%). Estes dados estão em desacordo com um estudo populacional brasileiro realizado no Rio Grande do Sul, o qual demonstrou maior prevalência de DRGE em faixa de baixa escolaridade21. Contudo estes resultados não causaram estranheza e poderiam ser explicados, pelo fato de que o trabalho foi realizado em unidade hospitalar da capital do estado, que atende planos de saúde, portanto população com melhor posição socioeconômica, onde se espera melhor escolaridade.

Como mencionado anteriormente, para avaliar a QVRS dos pacientes, foi utilizado o questionário DRGE-QVRS, onde o escore é calculado pela soma das notas assinaladas pelos pacientes. A maior parte (69,9%) apresentou escores baixos (0 a 5) indicando eficácia do tratamento estabelecido no que se refere à QV dos pacientes estudados. Na literatura especializada a maioria dos trabalhos faz comparação entre escores de QV em momentos pré e pós-operatórios, assim como checagens com tratamento clínico prolongado, indicando melhora após o tratamento cirúrgico. Isso sugere que esta modalidade terapêutica é melhor que a terapia medicamentosa quando se considera qualidade de vida e satisfação dos pacientes5,6,15,27.

Conquanto este estudo não confrontasse os dados pré e pós-tratamento cirúrgico e devido à característica de seu delineamento, não é permitido afirmar se houve melhora na QV dos pacientes estudados. Os dados apontam boa qualidade de vida da amostra estudada no ato do questionamento. Vários autores têm demonstrado, claramente, melhora na QV após a operação, embora admitindo a persistência de alguns sintomas, como plenitude e distensão abdominal, os quais, em geral, são bem tolerados pelos pacientes2,7,26.

Neste estudo, ao analisar a resposta para a nona pergunta do questionário, sobre inchaço ou sensação de gases, observou-se anuência com a afirmação da literatura sobre a presença dos sintomas, com tolerância relativamente boa por parte dos pacientes.

A última questão do GERD-HRQL avaliou a percepção do paciente quanto ao seu estado de saúde atual em seis níveis de satisfação. Entre os casos estudados, 58,1% indicaram estar muito satisfeitos, 37,2% estavam satisfeitos e 4,7% referiram o grau de satisfação como neutro, nenhum paciente assinalou as respostas: insatisfeito, muito insatisfeito ou incapacitado. De forma semelhante Tucker et al.27 reportaram 73,1% pacientes completamente satisfeitos, 22,8% pouco satisfeitos e apenas 5,3% insatisfeitos com a cirurgia.

Quando avaliadas as respostas dos pacientes em função do tempo decorrido da operação, foi observado que a maioria muito satisfeita concentravam-se entre dois e sete anos decorridos da operação. Estes dados vão ao encontro de Hamdy et al.15 que evidenciaram abrandamento de sintomas, como odinofagia, disfagia e distensão gasosa, ao longo do tempo pós-operatório, melhorando o grau de satisfação do paciente com o procedimento.

As questões 1-6 do GERD-HRQL trataram da pirose, sintoma típico da DRGE que afeta negativamente a QV dos pacientes. Neste estudo, as respostas assinaladas variaram de zero (sem sintomas) a quatro (sintomas afetam atividades diárias). A grande maioria assinalou zero (sem sintomas), o que poderia ser explicado pela efetividade da operação no controle dos sintomas, com consequente melhora da QV. Ao comparar as médias destas questões, em função do tempo decorrido do pós-operatório, estas não diferiram entre si pelo teste de Duncan a 5% de probabilidade de diferenças entre as médias.

Os itens 7-9 do instrumento utilizado no estudo referiram-se aos sintomas de disfagia, odinofagia e meteorismo, considerados efeitos colaterais do procedimento. Nesta série, estes itens são as principais respostas que elevam os escores finais, diminuindo QV e grau de satisfação dos pacientes. Porém, como mencionado anteriormente, estes sintomas são geralmente bem tolerados pelos pacientes e apresentam melhoria ao longo do tempo após a operação conforme exposto na literatura2,15,26. Observou-se diferença apenas nas médias da pergunta sobre disfagia, com tendência de diminuição deste sintoma com tempo mais prolongado.

Spechler et al.25 comparando fundoplicatura laparotômica e tratamento medicamentoso, mostraram que dez anos após a operação, 62% dos pacientes usavam drogas anti-refluxo regularmente. Contudo, 86% estavam satisfeitos com os resultados do procedimento.

O item 10 do questionário GERD-HRQL, tratou do uso de medicação. Neste estudo, 79,1% dos pacientes assinalaram zero (sem sintomas) para esta questão, 18,6% marcaram 1 (nota-se sintomas, mas não incomodo) e apenas um paciente apontou nota 3 (sintomas incômodos todos os dias), revelando baixa necessidade do uso de medicação contínua e, consequentemente, pequeno impacto sobre sua QV. Dallemagne et al.7 relataram que menos de 10% dos pacientes necessitavam usar medicação anti-refluxo de forma contínua, dez anos após a operação laparoscópica, dado mais aproximado ao que se encontrou nas respostas para o item 10.

Observou-se correlação positiva significativa entre a maioria das variáveis que se referiam à pirose e ao tempo após a operação. Por outro lado houve correlação negativa, porém não significativa, entre a 'dificuldade de engolir e empachamento' com 'pirose e tempo decorrido da operação', sugerindo que o melhor controle da pirose poderia determinar maiores efeitos colaterais pós-operatórios, como disfagia, sensação de plenitude e certa tendência a recorrência de azia ao longo do tempo.

A QV é ponto importante, que deve ser analisado ao indicar o tratamento para DRGE. Habitualmente, as pessoas portadoras dessa entidade clínica têm QV ruim quando comparados com indivíduos saudáveis, justificando a satisfação com relação à operação, apesar de alguns sintomas ainda presentes, conforme relatados pelos pacientes deste estudo e em outros já publicados.

O instrumento de avaliação utilizado neste estudo GERD-HRQL, apresentou fácil entendimento pelos pacientes, baseado em escala de sintomas típicos da DRGE, utilizando-se o sintoma pirose, considerando suas influências sobre alimentação, sono e a necessidade do uso de medicações como marcadores das repercussões sobre a QV dos pacientes com DRGE. O questionário apresenta também itens sobre flatulência, distensão abdominal e disfagia, que permitem avaliar pacientes submetidos à operação anti-refluxo com possíveis efeitos colaterais pós-operatórios que poderiam repercutir negativamente sobre a QV. Observou-se a falta de questões sobre manifestações extra-esofágicas (globo faríngeo, halitose, asma, tosse e rouquidão), que podem afetar a qualidade de vida dos pacientes. Contudo estes não são sintomas típicos da DRGE.

Instrumento específico de avaliação da QV aqui utilizado foi constituído e validado por Velanovich30 baseado em uma escala de sintomas típicos para a DRGE. Ele foi traduzido e validado para a língua portuguesa por Pereira22.

CONCLUSÃO

Os pacientes nos últimos 10 anos, apresentaram baixos escores referentes ao GERD-HRQL (pós-operatório), apresentando boa QV. Notou-se menor queixa do sintoma 'disfagia pós-operatória' em pacientes com mais tempo de pós-operatório. Na faixa etária mais avançada (68 a 83 anos) observaram-se escores mais elevados, com menor impacto do tratamento cirúrgico sobre a qualidade de vida ao longo dos anos. Independentemente do escore do GERD-HRQL observado, os pacientes apresentaram elevado grau de satisfação com sua condição pós-operatória.

Aceito para publicação: 08/06/2012

Fonte de financiamento: não há

Conflito de interesses: não há

Trabalho realizado no 1Hospital Aliança Casamater e 2Universidade Federal do Piauí, Terezina, PI, e 3Programa de Pós-Graduação da Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, SP. Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    Francisco José Cavalcante Andrade,
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      06 Mar 2012
    • Aceito
      08 Jun 2012
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