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CARTA AO EDITOR

CARTA AO EDITOR

Prezados Senhores,

Lendo os Anais Brasileiros de Dermatologia, Vol. 79, número 4, Julho-Agosto/2004, encontrei erros de estatística no artigo "Aspectos epidemiológicos da hanseníase na cidade de Recife, PE, em 2002", conforme a seguir: na Tabela 2 e na Tabela 4 o teste Qui-quadrado foi empregado de maneira incorreta, pois o mesmo exige um máximo de 20% das caselas menores do que cinco. Na Tabela 2, que deveria ter apenas 4 desses valores, tem 14!!! Na Tabela 4, que deveria ter apenas dois, tem seis valores. E mais agravante ainda, foi considerado a categoria "Sem dados" como número de lesões. Portanto, os testes dessas duas tabelas estão empregados de maneira errada. Isso invalida as conclusões.

Afirmo isso com procedência, pois sou Estatístico, Mestre em Bioestatística pela USP e doutor em Saúde Pública pela USP. Desde 1996 participo dos Programas de Pós-Graduação em Enfermagem e Saúde Pública da UFC e do mestrado em Saúde Pública da UECE, onde leciono e oriento. Espero que possa ter contribuído para o melhoramento dessa revista tão importante. Coloco-me ao seu dispor para colaborações futuras.

Atenciosamente,

Prof. Paulo César de Almeida

Em função do e-mail acima, recebido em 26 de outubro de 2004,os editores científicos deram o seguinte encaminhamento:

Rio de Janeiro, 22 de novembro de 2004.

Ilmos. Srs.

Drs. S.L Hinrichsen, M.R.S. Pinheiro, M.B. Jucá, H. Rolim, G.J.N. Danda e D.M.R. Danda

Ref.: Artigo publicado nos An Bras Dermatol 2004; 79(4):413-21.

Senhores,

Recebemos do Prof. Paulo César Almeida, da Universidade Federal do Ceará, e-mail em que faz críticas relativas à análise estatística dos resultados obtidos no trabalho acima referido.

Como consta das novas normas para publicação nos Anais Brasileiros de Dermatologia (vide editorial do fascículo 4, volume 79), a partir de então os trabalhos de investigação passam previamente por avaliação metodológica e estatística, antes mesmo da avaliação pelos editores e pareceristas. Como o trabalho referido já se encontrava aprovado para publicação antes da instituição das novas normas, o mesmo não foi submetido a parecer estatístico.

Sendo assim, achamos prudente ouvir a opinião do estatístico contratado pelos Anais e enviamos o artigo para avaliação (vide parecer).

Tendo em vista as considerações acima, entendemos que as críticas merecem resposta, que deveria ser publicada como ‘Correspondência’, o que vimos solicitar aos autores o mais breve possível.

Atenciosamente.

Os Editores/Coordenadores Médicos.

AVALIAÇÃO ESTATÍSTICA

Aspectos epidemiológicos da hanseníase na cidade de Recife, PE em 2002, An Bras Dermatol, 2004; 79(4):413-21.

OBJETIVO: avaliar as características da hanseníase em Recife, PE em 2002.

DESENHO: transversal / observacional

TÉCNICAS ESTATÍSTICAS: tabelas de freqüência e teste do qui-quadrado.

AVALIAÇÃO:

1. O teste do qui-quadrado para tabelas de contingência (freqüência) somente deve ser utilizado se: as freqüências esperadas de todas as caselas forem maior que 1 e pelo menos 80% delas forem maiores que 5 (Fienberg, 1987, The Analysis of Cross-classified Data). Nós podemos observar que esta suposição não é atendida em nenhuma da cinco tabelas apresentadas no artigo. Desta forma, os testes do qui-quadrado apresentados nestas tabelas não podem ser validados. A solução para este dilema é utilizar o teste exato de Fisher (Fienberg, 1987)

2. A categoria "Sem Dados" da Tabela 4 não deveria ser incluída na análise. Outra sugestão seria juntar as categorias apenas uma lesão com sem lesão pois esta última apresenta somente um caso.

3. Os autores afirmam que "A distribuição dos casos por sexo mostrou diferença significativa". Veja o final da p. 415. No entanto, ao compararmos 43% de mulheres contra 57% de homens em uma amostra de tamanho 100 obtemos um valor-p > 0,05. Os autores deveriam esclarecer quais as hipóteses deste teste ou corrigi-lo se isto for o caso.

4. No final da Seção Casuística, os autores afirmam que "assegurando margem de segurança de 95% de confiabilidade". Acreditamos que o correto é "assegurando um nível de significância inferior a 0,05".

PARECER

A análise estatística utilizando o teste qui-quadrado está seriamente comprometida pois os dados não atendem às suas suposições.

Data: 10/11/2004

Responsável: Enrico Antônio Colosimo (enricoc@est.ufmg.br)

Resposta do autor:

Recife, 08 de dezembro de 2004

Ilmos. Srs.

Drs. Bernardo Gontijo, Everton Carlos Siviero do Vale, e Silvio Alencar Marques

Ref. Artigo publicado nos An Bras Dermatol. 2004; 79(4): 413-21

"Aspectos epidemiológico da hanseníase na cidade do Recife – PE, em 2002".

Prezados Senhores

Em referência à carta enviada por Vs. Sas., datada de 22 novembro de 2004, temos a dizer o seguinte:

Primeiro agradecer o empenho do corpo editorial dos Anais Brasileiros de Dermatologia em procurar manter no mais alto padrão possível os artigos por ela publicados e agradecer também aos colaboradores que verificaram a inadequação da aplicação do teste estatístico usado (testes X_ em tabelas de contingência com número insuficiente de observações em um número excessivo de caselas), além do uso da expressão "margem de segurança", ao invés de níveis de significância. O lapso passou despercebido por vários pareceristas.

Segundo, informar que nenhuma das conclusões e observações do artigo perdeu a validade, pois fizemos outros testes para que houvesse um efetivo apoio estatístico.

Acompanhe-se o raciocínio, observando as cinco tabelas do artigo.

TABELA 1 DO ARTIGO

A afirmação:

"A distribuição dos casos por sexo mostrou diferença significativa, sendo 43 (43%) doentes do sexo feminino, e 57 (57%) doentes do sexo masculino (p < 0,001)."

Não está com o valor de p correto. De fato tem-se p> 0,05, ou seja, não há significância, mas tem-se também p< 0,50. Diversos autores relataram que, em relação às características da hanseníase segundo o sexo, há predomínio do sexo masculino nos hansenianos de todas as faixas etárias (Sehgal VN – 1970; Sehgal VN – 1988; Sehgal VN – 1977; Viries JL – 1985; Albuquerque MFPM – 1987; Sehgal VN – 1993). Os resultados da nossa amostra não conflitam, portanto, com esse conhecimento a priori. Afinal de contas esse é um resultado conhecido e não é o foco central do artigo.

A afirmação:

"Quando se analisou a variável sexo segundo a faixa etária, evidenciou-se que nos casos com mais baixa idade, ou seja, de zero a 11 anos e de 12 a 17 anos, houve predominância do sexo masculino, com 71,4% e 55,6%, respectivamente, conforme demonstrado na tabela 1. No entanto essa diferença entre os sexos não foi estatisticamente significante... "

Continua válida. O teste, ou testes, podem ser feitos na tabela 1 desta correspondência. Os resultados destes testes estão apresentados na tabela 2.

Pensando-se apenas em duas faixas etárias, a saber: de 0 a 17 anos e de 18 a 99 anos, a tabela seria (tabela 3 deste texto):

Portanto, para faixas etárias diferentes não houve diferenças significantes quanto ao sexo, na nossa amostra.

TABELA 2 DO ARTIGO

A afirmação referente à Tabela 2 do artigo foi:

"Quando se analisaram as formas clínicas segundo a faixa etária, observou-se que, para as tuberculóide e virchowiana, o número de casos guardava relação direta com a idade, à exceção da faixa etária de 65 a 69 anos (Tabela 2) ".

Há que se considerar então apenas a tabela 5 desta correspondência. Um teste para verificar essa relação direta seria o Gamma correlations. Os resultados estão na tabela 6 e 7. A afirmação tem pois apoio estatístico (p<0,05).

TABELAS 3

A afirmação referente à Tabela 3 do artigo foi:

"A análise dos casos segundo as variáveis sexo e forma clínica revelou que entre o sexo feminino prevaleceu a forma tuberculóide seguida da dimorfa, enquanto no sexo masculino a dimorfa foi a mais freqüente, com a forma tuberculóide aparecendo em segundo lugar (Tabela 3) ".

O teste, ou testes, podem ser efeitos na tabela 8 desta correspondência.

Os resultados dos testes estão na tabela 9, onde aparecem os p – values, todos menores do que 0,05.

Usando-se diretamente a tabela 3 do artigo (tabela 10), o teste exato de Fisher para tabelas r x c apresentou uma significância p < 0,001.

A afirmação tem, pois, apoio estatístico (p<0,05).

TABELA 4

A afirmação referente à Tabela 4 do artigo foi:

"Em relação à quantidade de lesões e forma clínica, agrupando-se em forma paucibacilar (T e I ) e multibacilar (V e D), observou-se que as formas paucibacilares apresentavam lesão única ou variando de duas a cinco lesões em 55,4% e 37,5%, respectivamente, enquanto as multibacilares possuíam mais de cinco lesões em 40,9% dos casos (Tabela 4). Essas diferenças foram estatisticamente significantes... . "

A afirmação deixa clara a preocupação apenas com os casos que tiveram pelo menos uma lesão. Unindo-se os casos de apenas uma lesão e de 2 a 5 lesões ("apresentavam lesão única ou variando de duas a cinco lesões"), pode-se pensar então na tabela 11 desta correspondência:

O teste exato de Fisher, tanto o monocaudal quanto o bicaudal, revela uma significância de p< 0,0001. A afirmação, na acepção explicitada novamente aqui (foi a do texto do artigo), tem, pois, apoio estatístico.

Poder-se-ia, seguindo a sugestão do estatístico contratado pelos Anais, considerar a tabela 12 desta correspondência, que inclui o caso sem lesão, na casela dos casos de baciloscopia paucibacilar com até cinco lesões:

Também aqui, o teste exato de Fisher, tanto o monocaudal quanto o bicaudal, revela uma significância de p< 0,0001.

TABELA 5

"Quanto à baciloscopia, todos (100%) os pacientes realizaram o exame. Avaliando-se o resultado da baciloscopia em relação às formas clínicas, observou-se que, entre os pacientes com baciloscopia negativa, a maioria apresentava a forma tuberculóide (75%). Os pacientes com baciloscopia positiva em sua maioria portavam os tipos dimorfo e virchowiano (68,2% e 29,5%, respectivamente) (Tabela 5). "

O teste exato de Fisher para tabelas r x c aplicado na tabela 13 apresentou uma significância p< 0,05. A afirmação tem, pois, apoio estatístico.

Os níveis de significância dos testes apresentados nesta correspondência foram todos de p<0,05 (com exceção da distribuição dos casos por sexo).

Agradecendo mais uma vez subscrevemo-nos,

Atenciosamente

Sylvia Lemos Hinrichsen

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Fev 2005
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