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Análise computacional do isolamento térmico de ambientes de escadas pré-moldadas em alvenaria estrutural em situação de incêndio

Computational analysis of thermal insulation in the environment of precast stairs in structural masonry under fire conditions

Resumo

Escadas pré-moldadas leves de concreto podem ser fixadas na alvenaria com chumbadores metálicos, cuja estabilidade depende da integridade dos pontos de ancoragem. O ambiente em que está fixada a escada tem papel vital na desocupação de um edifício em situação de incêndio, o que justifica estudar o comportamento desses elementos durante um incêndio. Este trabalho apresenta estratégia numérica para realizar simulações com o código computacional ABAQUS com vistas a melhor entender o comportamento de escadas pré-moldadas e seu sistema de ancoragem em alvenaria estrutural de blocos de concreto em ambiente sob incêndio. A evolução da temperatura foi determinada nos pontos de ancoragem e na viga denteada da escada em resposta ao incêndio-padrão ISO 834-1:1999 apenas na face oposta à parede em que a escada está fixada. Os resultados mostram que as elevações de temperatura no chumbador e na viga denteada não atingem níveis que reduzam significativamente a resistência do aço, quando a cavidade do bloco está grauteada, e da resistência do concreto respectivamente. Tais resultados sinalizam aspectos importantes em contexto construtivo de sistemas de alvenaria estrutural e segurança ao incêndio.

Palavras-chave:
Segurança contra incêndio; Escada; Alvenaria; Chumbador; Simulação computacional

Abstract

Lightweight precast concrete stairs can be fastened to the masonry using metal anchors, whose stability depends on the integrity of these discrete anchor points. The stairwell environment plays a vital role in the evacuation of a building in fire conditions, which justifies the study of the behavior of these elements under such conditions. Considering the information above, this work presents a numerical strategy adopted to perform simulations using the ABAQUS computational code in order to better understand the behavior of precast stairs and their anchoring system in structural masonry of concrete in fire conditions. The temperature evolution was determined at the anchor points and in the indented beam of the staircase while facing a standard fire ISO 834-1:1999 only on the opposite side of the wall to which the stairs are fixed. The results show that the temperature rise in the metallic anchor and in the indented beam does not reach levels that impose significant reduction in the steel strength, when the block cavity is grouted, and in the concrete, respectively. These results indicate important aspects in the constructive context of structural masonry systems and fire safety.

Keywords:
Fire Safety; Stairs; Masonry; Fastening; Computational Simulation

Introdução

O desempenho de edificações em situação de incêndio é tema de relevância em segurança estrutural. Incêndios importantes na história mundial e brasileira mostram que a desconsideração de efeitos térmicos na estrutura pode levar a rupturas prematuras e, consequentemente, a perdas econômicas e humanas. Existe uma preocupação sobre o desempenho da alvenaria estrutural em situação de incêndio, pois pesquisas recentes mostram que pode haver grande redução de resistência da alvenaria estrutural pós-fogo (DUPIM, 2019DUPIM, R. H. Resistência residual de compressão de blocos, prismas e pequenas paredes de alvenaria estrutural de blocos de concreto submetidos à situação de incêndio. 2019. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil (Estruturas)) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2019.). Deve-se levar em conta também seu uso crescente em edifícios altos, situação na qual há grande necessidade de avaliação do desempenho estrutural em incêndio. A ausência de normas de projeto brasileiras que contemplem a ação do fogo nas estruturas de alvenaria estrutural evidencia a lacuna existente nessa temática.

Por outro lado, o uso de elementos pré-moldados de concreto em conjunto com a alvenaria estrutural potencializa sua característica de obra com maior grau de racionalização. Entre os elementos pré-moldados utilizados em conjunto com a alvenaria estrutural podem ser citadas as escadas, as vergas e as lajes. Nesse contexto, incluem-se as escadas pré-moldadas leves de concreto definidas como aquelas compostas de degraus e vigas denteadas pré-moldadas com peso adequado para manuseio in loco. Elas podem ser fixadas na alvenaria por meio de chumbadores metálicos, razão pela qual a estabilidade da escada depende da integridade desses pontos discretos de ancoragem.

O ambiente da escada tem um papel vital na desocupação de um edifício o que justifica o interesse em estudar o seu comportamento em situação de incêndio. O conceito de escada enclausurada já é bem estabelecido como mecanismo de segurança em edifícios altos, o que demanda que paredes cumpram determinados critérios de isolamento térmico, estanqueidade e resistência mecânica (SEITO, 2008SEITO, A. I. et al. (ed.). A Segurança contra incêndio no Brasil. São Paulo: Projeto Editora, 2008.). Por outro lado, também é preciso considerar que a transmissão de calor pode ocorrer no interior da parede para os pontos de ancoragem dos lances da escada, especialmente aquelas que se ancorem em pontos discretos, no caso, os chumbadores. Assim, é preciso desenvolver critérios para a análise da segurança de tais escadas.

Até onde vai o conhecimento aqui investigado, nota-se que os trabalhos que consideram o desempenho de chumbadores em alvenaria em situação de incêndio ainda são escassos. Certamente trabalhos experimentais na área são bem-vindos, embora apresentam alto custo. Uma alternativa é a utilização de simulações computacionais de forma a estudar os mecanismos de transferência de calor e degradação do material para assim planejar ensaios experimentais de forma mais eficiente. No entanto, a própria simulação computacional tem seus desafios para que represente adequadamente o fenômeno físico desejado.

Como o sistema de fixação por chumbadores é um elemento importante de uma escada leve pré-moldada, este trabalho avança sobre as lacunas apresentadas nos estudos anteriores ao buscar métodos de simulação adequados e resultados que auxiliem no entendimento desses elementos em incêndio, e, não menos importante, no planejamento de futuros estudos experimentais para melhor avaliar o desempenho em situação de incêndio. Por meio da simulação da transferência de calor, estima-se o campo de temperatura no sistema de fixação de uma escada leve pré-moldada ancorada em alvenaria estrutural de blocos de concreto. A análise dos resultados permite realizar estimativas quanto à degradação que o material poderá sofrer, bem como avaliar os mecanismos de transferência de calor envolvidos no processo.

Referencial teórico

Uso de pré-moldados em escadas e a segurança contra incêndio

De acordo com pesquisas realizadas pela Fundação João Pinheiro (2021), FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Deficit habitacional no Brasil - 2016-2019. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2021.em 2019 o déficit habitacional no Brasil atingiu 5.876.698 unidades. Só para a região Sudeste foi identificado valor igual a 2.287.122 unidades, correspondente a aproximadamente 39%, o que indica a necessidade de produção em grande escala de habitações para amenizar esse déficit, principalmente devido ao fato de que grande parte desse déficit atinge uma faixa da população com renda entre 1 e 3 salários mínimos.

Do ponto de vista de tecnologias construtivas que podem contribuir para a produção em grande escala, destacam-se os sistemas pré-moldados e de alvenaria estrutural, principalmente aplicados para edifícios de apartamentos. Segundo a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (COMPANHIA...,2016COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO. CDHU 50 anos: promovendo a Habitação Social no Estado de São Paulo. São Paulo: KPMO, 2016.), no estado de São Paulo foram construídos, em 50 anos de existência da Companhia, 3.700conjuntos habitacionais e 510 mil unidades. Entre esse conjunto de unidades construídas pela CDHU estão inseridos os conjuntos habitacionais de tipologia de prédios de apartamentos cujo método construtivo é de alvenaria estrutural, onde se empregam elementos pré-moldados como as escadas do tipo “jacaré”, indicadas nas Figuras 1 a 3.

Figura 1
Tipologia de escada leve pré-moldada (“jacaré”) aplicada em alvenaria estrutural

Figura 2
Elementos da escada leve pré-moldada

Figura 3
Elementos pré-moldados fixados por chumbadores em alvenaria estrutural

Elementos pré-moldados em prédios facilitam e tornam a obra mais rápida, com custos otimizados, mas deve-se também considerar que, quando esses elementos são usados em escadas utilizadas em rotas de fuga em caso de incêndio, conforme preconiza a IT 11 - Saídas de emergência (CORPO..., 2019aCORPO DE BOMBEIROS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO. Instrução técnica no 11/2019: saídas de emergência. São Paulo, 2019a.), devem ser constituídos de materiais incombustíveis e apresentar resistência ao fogo adequada.

Segundo dados do Sistema de Dados Operacionais do Corpo de Bombeiros (http://www.ssp.sp.gov.br/estatistica/corpobombeiro.aspx), no ano de 2021 foram registradas 4.001 ocorrências em edificações não sujeitas ao Regulamento de Segurança Contra Incêndio (RSCI) e 2.471 em edificações sujeitas ao RSCI, em que se enquadram os prédios de apartamentos em geral, incluindo os produzidos pela CDHU.

Como exemplo de ocorrência de sinistro, na Figura 4 são apresentadas imagens de acidente registrado em uma das escadas pré-moldadas levesde um prédio do CDHU em 2008 (SOUFEN JUNIOR; RODRIGUES, 2008SOUFEN JUNIOR, J.; RODRIGUES, A. Prédio explode na zona leste e fere 24 pessoas. Folha de S. Paulo, São Paulo, 8 mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0803200825.htm . Acesso em: 27 maio 2021.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidi...
), localizado na Zona Leste de São Paulo, em que se registrou explosão seguida de focos de incêndio. Ao analisar as imagens ilustradas na Figura 4, é possível perceber que não houve dano significativo na viga denteada da escada, a qual permanece fixada por meio de chumbadores na parede de alvenaria estrutural. Por outro lado, diferentemente das vigas denteadas, é possível notar o deslocamento dos degraus pré-moldados que estavam apoiados nas vigas denteadas, ocasionado por efeito de explosão, que tornou a escada inutilizável, em particular, com vistas à desocupação no caso do incêndio. Portanto, nesse caso, ainda que tenha sido identificada a ocorrência de temperaturas elevadas, os efeitos dinâmicos provocados por explosão causaram a inutilização plena desse ambiente, previsto para a desocupação do edifício.

Figura 4
Escada após explosão seguida de incêndio, com vistas

Com base no exposto, a realização de estudo e análise do comportamento das escadas leves pré-moldadas em situação de aquecimento é de extrema importância, tanto para garantir a não ocorrência de colapso estrutural em caso de incêndio, como para fins de manutenção de suas caraterísticas de resistência às cargas incidentes, visto que na situação de incêndio essas escadas são muitas vezes o único caminho pelo qual os usuários da edificação podem sair com segurança, bem como a atuação adequada do corpo de bombeiros na extinção do fogo, evitando a perda de vidas.

Simulação computacional aplicada a segurança estrutural contra incêndio

Idealmente, o estudo de estruturas em situação de incêndio deve ser feito de modo experimental, de forma a avaliar a degradação dos materiais e a perda da capacidade resistente do sistema estrutural. Métodos experimentais mais tradicionais consistem em submeter o elemento estrutural a uma curva de elevação de temperatura padronizada em fornos apropriados. Assim, a depender dos recursos disponíveis, avalia-se o desempenho durante ou após o incêndio padronizado. No entanto, tal método experimental apresenta quase sempre elevado custo operacional, o que, na maioria das vezes, inviabiliza tal caminho.

Por outro lado, os métodos de análise numérica de estruturas, tal como o Método dos Elementos Finitos, são importantes aliados para diminuir custos e avançar racionalmente nas pesquisas. O uso de simulações numéricas fornece flexibilidade e velocidade, permitindo, assim, a análise de um maior número de variáveis. Apesar de as simulações tratarem de modelos simplificados da realidade, seus resultados permitem ao analista entender melhor o comportamento de um sistema estrutural, bem como quais parâmetros têm maior influência na resposta. Assim, o uso de simulações numéricas tem se mostrado um grande aliado, inclusive em planejamento de programas experimentais racionais que priorizem a avaliação de parâmetros importantes para o sistema.

A simulação numérica de estruturas em situação de incêndio depende de duas etapas: transferência de calor e resposta estrutural. Devido à natureza controlada dos ensaios em fornos, é possível realizar as simulações de transferência de calor sem a necessidade de considerar a fluidodinâmica envolvida. Nesse caso, condições de contorno apropriadas são definidas na estrutura (ou no elemento estrutural) para representar o fluxo de calor recebido no ambiente do forno. Os coeficientes de transferência de calor aplicados nas condições de contorno são descritos em normas técnicas, as quais foram calibradas utilizando ensaios em fornos. Assim, é possível estimar a temperatura ao longo de dado elemento estrutural pela Lei de Fourier, a qual pode ser aproximada, numericamente, pelo Método dos Elementos Finitos. Desse modo, o isolamento térmico proporcionado por uma laje ou parede pode ser estimado.

Por outro lado, a simulação estrutural busca estimar o efeito da degradação mecânica do material em temperaturas elevadas na resistência do elemento estrutural. Nessa tarefa, modelos não lineares dependentes da temperatura e modelos simplificados baseados em isotermas podem ser utilizados tal como aquele descrito na EN 1992-1-2 (EUROPEAN..., 2004EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1992-1-2: Eurocode 2: design of concrete structures: part 1.2: general rules: structural fire design. Brussels, 2004.). Em todo o caso, o campo de temperatura no interior do elemento estrutural é fundamental para realizar tal estimativa. Nessa abordagem, ao analisar estruturas com cavidades internas como um bloco de alvenaria, ilustrado na Figura 5, é preciso considerar parcelas adicionais à condução do calor no interior do sólido.

A diferença de temperatura entre as superfícies da cavidade faz com que haja transferência de calor por radiação e por convecção. Uma abordagem possível é considerar apenas a condução de calor no ar da cavidade, mas utilizando uma condutividade equivalente que leve a uma boa concordância entre a simulação e os resultados experimentais. Dessa forma, a transferência de calor por radiação e convecção não é considerada explicitamente. Apesar de tal calibração do modelo levar a resultados satisfatórios para isolamento térmico, ao considerar um mecanismo de transferência de calor diferente do real, perde-se generalidade do modelo. Nesse caso, é possível que haja dificuldade em replicar o campo de temperatura de forma adequada, especialmente em modelos de geometria diferentes daquele utilizado na calibração.

Buscando superar tais limitações, em Assis e Munaiar Neto (2020)ASSIS, E. B. de; MUNAIAR NETO, J. Analysis of heat transfer mechanisms on hollow concrete masonry units under standardized fire conditions. In: IBERO-LATIN-AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 41., Foz do Iguaçu, 2020. Proceedings [...] Foz do Iguaçu, 2020. foi abordado esse problema por meio da simulação da transferência de calor acoplada entre fluido e sólido. Nas simulações realizadas considera-se explicitamente a transferência de calor por radiação entre as faces da cavidade. Além disso, utiliza-se fluidodinâmica computacional para simular a transferência por convecção do ar no interior das cavidades. A última referência sinaliza que no interior das cavidades de blocos de alvenaria de concreto a transferência de calor por radiação contribui em maior parcela quando comparada à transferência por convecção, cujos resultados das simulações de blocos isolados, considerando a transferência por radiação nas cavidades, apresentaram boa concordância com resultados experimentais da literatura.

Figura 5
Ilustração da transferência de calor por radiação (q rad ) na cavidade de um bloco de alvenaria com chumbador

Diversos autores utilizam a simulação computacional para extrapolar resultados experimentais e para compreender melhor os mecanismos de degradação estrutural em situação de incêndio. Cabe destacar que atualmente há um esforço da comunidade técnica para normalizar o projeto de estruturas de alvenaria em situação de incêndio. Assim, resultados de simulação de alvenaria em situação de incêndio como os apresentados em Santos et al. (2017)SANTOS, C. F. R. et al.Thermo-structural modeling of clay units masonry walls under fire conditions. In: IBERIAN-LATIN AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 38., Florianopolis, 2017. Proceedings[...] Florianopolis, 2017., em Rodovalho e Corrêa (2019)RODOVALHO, F. S.; CORRÊA, M. R. S. Thermal simulation of prisms with concrete blocks in a fire situation. Revista IBRACON de Estruturas e Materiais, v. 12, n. 3, p. 638-657, jun. 2019., em Oliveira et al. (2021)OLIVEIRA, R. G. et al. Experimental and numerical analysis on the structural fire behaviour of three-cell hollowed concrete masonry walls. Engineering Structures , v. 228, p. 111439, fev. 2021., em Carvalho, Leal e Munaiar Neto (2021)CARVALHO, P. R. de O.; LEAL, D. F.; MUNAIAR NETO, J. Análise numérica térmica da alvenaria estrutural em situação de incêndio: isolamento térmico entre ambientes. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 21, n. 4, p. 65-87, out./dez. 2021., entre outros, são relevantes na medida em que complementam os resultados experimentais e contribuem para o entendimento dos mecanismos de propagação de calor e degradação da alvenaria estrutural.

De forma semelhante, apenas recentemente houve a oficialização de uma normativa europeia de sistemas de fixação, a EN 1992-4 (EUROPEAN..., 2018EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1992-4: Eurocode 2: design of concrete structures: part 4: design of fastenings for use in concrete. Brussels, 2018. ). Já em contexto brasileiro, cita-se a recomendação técnica de fixações publicada pela Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural (ASSOCIAÇÃO..., 2019ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENGENHARIA E CONSULTORIA ESTRUTURAL. Recomendações ABECE 005: projeto de fixações com chumbadores químicos em elementos de concreto (revisão 1). São Paulo: ABECE, 2019.). Ainda assim, existe a preocupação na comunidade técnica quanto ao desempenho de fixações em situação de incêndio, especialmente fixações pós-instaladas por adesão química sob tração. Em Al-Mansouri et al. (2019)AL-MANSOURI, O. et al. Influence of testing conditions on thermal distribution and resulting load-bearing capacity of bonded anchors under fire. Engineering Structures, v. 192, p. 190-204, ago. 2019. foram realizados ensaios de chumbadores por adesão química submetidos à tração e expostos ao incêndio-padrão ISO 834-1 (INTERNATIONAL..., 1999INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 834-1: fire-resistance tests: elements of building construction: part 1: general requirements. Geneve, 1999.), em que se analisa a influência dos métodos experimentais na distribuição de temperatura e na resistência ao arrancamento. Em Lahouar et al. (2018LAHOUAR, M. A. et al. Fire design of post-installed bonded rebars: full-scale validation test on a 2.94 × 2 × 0.15 m3 concrete slab subjected to ISO 834-1 fire. Engineering Structures , v. 174, p. 81-94, nov. 2018.) foi realizado um ensaio de uma laje de concreto armado em balanço, sendo as armaduras negativas do engaste ancoradas com um adesivo químico. A laje é exposta ao incêndio-padrão ISO 834-1 (INTERNATIONAL..., 1999INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 834-1: fire-resistance tests: elements of building construction: part 1: general requirements. Geneve, 1999.) em sua face inferior. Em Tian et al. (2018aTIAN, K. et al. Concrete edge failure of single headed stud anchors exposed to fire and loaded in shear: experimental and numerical study. Fire Safety Journal, v. 100, p. 32-44, set. 2018a., 2018bTIAN, K. et al. Experimental study on concrete edge failure of single headed stud anchors after fire exposure. Fire Safety Journal , v. 96, p. 176-188, mar. 2018b.) foi estudado o cisalhamento de chumbadores em borda de elementos de concreto através de uma campanha experimental e simulações de chumbadores em situação de incêndio. Na última referência, nota-se que a simulação representa papel bastante relevante na medida em que evidencia os efeitos de confinamento gerado devido à expansão do concreto, a qual foi parcialmente confinada devido à geometria e às condições de contorno do corpo de prova. Além disso, tanto os resultados experimentais quanto a simulação mostram que o estado frio (pós-fogo) é o mais crítico para o concreto, enquanto o estado quente (durante incêndio) é o mais crítico para o aço.

Percebe-se que, no que se refere a sistemas de fixação ou ancoragem de barras, há prevalência de estudos focados em concreto armado ou pré-moldado, bem como estruturas mistas de aço e concreto. Os trabalhos desse tema no contexto da alvenaria ainda são escassos, bem como ainda mais escassas as análises desses sistemas em situação de incêndio.

Descrição do método adotado

Abordagem numérica e geometria do modelo

A abordagem referente à simulação computacional considerou a micromodelagem detalhada, em que o modelo numérico foi construído de forma tridimensional, representando fielmente os blocos, as juntas e o graute. Para a construção do modelo de alvenaria estrutural foi utilizado bloco vazado de concreto da família 15 x 40. Tal geometria foi utilizada em Assis e Munaiar Neto (2020)ASSIS, E. B. de; MUNAIAR NETO, J. Analysis of heat transfer mechanisms on hollow concrete masonry units under standardized fire conditions. In: IBERO-LATIN-AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 41., Foz do Iguaçu, 2020. Proceedings [...] Foz do Iguaçu, 2020. para validar a estratégia de simulação térmica, baseada em Carvalho (2019)CARVALHO, P. R. de O. Análise numérica de pequenas paredes de alvenaria estrutural de blocos de concreto em situação de incêndio: ênfase no comportamento térmico e termoestrutural. 2019. 313 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil (Estruturas)) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2019., calibrada por meio de experimentos realizados em Dupim (2019)DUPIM, R. H. Resistência residual de compressão de blocos, prismas e pequenas paredes de alvenaria estrutural de blocos de concreto submetidos à situação de incêndio. 2019. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil (Estruturas)) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2019., adotando uma simplificação da geometria do bloco. Ainda que o bloco de alvenaria de concreto apresente vazados verticais com formato troncocônico e mísulas nos septos, foram aqui adotados vazados prismáticos e ausência da mísula, como simplificação, com base na igualdade de áreas das seções transversais, conforme procedimento proposto em Carvalho (2019)CARVALHO, P. R. de O. Análise numérica de pequenas paredes de alvenaria estrutural de blocos de concreto em situação de incêndio: ênfase no comportamento térmico e termoestrutural. 2019. 313 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil (Estruturas)) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2019.. A Figura 6a mostra as dimensões adotadas para o bloco. O modelo utilizado consiste em um painel mínimo para caracterizar a alvenaria, o qual é constituído por 3 blocos e 3 meios-blocos, conforme ilustrado na Figura 6 b.

Figura 6
Algumas características geométricas do modelo

Assim, devido às dimensões do bloco, o painel apresenta dimensões de 590 mm x 590 mm. A cavidade do bloco em que o chumbador está localizado recebe grauteamento. A Figura 7 ilustra o detalhe da malha do chumbador no bloco grauteado. Foi utilizado um chumbador composto de barra roscada com Dnom = 1/2”. Considerando a área efetiva do chumbador, utilizou-se Def = 10,796 mm no modelo. O comprimento de embutimento do chumbador foi de 100 mm. Foi criada uma chapa de carregamento com 4 cm de espessura, a qual representa a viga denteada da escada. Foram utilizados elementos finitos hexaédricos lineares de 8 nós (DC3D8) e elementos de cunha lineares de 6 nós (DC3D6).

Propriedades dos materiais

As propriedades térmicas do bloco, graute e argamassa foram consideradas iguais e calculadas de acordo com a EN 1992-1-2 (EUROPEAN..., 2004EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1992-1-2: Eurocode 2: design of concrete structures: part 1.2: general rules: structural fire design. Brussels, 2004.). Foram utilizadas as propriedades aplicadas na validação da estratégia de simulação apresentada em Assis e Munaiar Neto (2020)ASSIS, E. B. de; MUNAIAR NETO, J. Analysis of heat transfer mechanisms on hollow concrete masonry units under standardized fire conditions. In: IBERO-LATIN-AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 41., Foz do Iguaçu, 2020. Proceedings [...] Foz do Iguaçu, 2020.. Essas propriedades estão descritas na Figura 8. Nota-se que o calor específico, conforme a Figura 8c, depende da umidade presente no concreto, em que foi assumido 1,5% de umidade. Assim, utilizou-se a abordagem apresentada em Wickström (2016)WICKSTRÖM, U. Temperature calculation in fire safety engineering. New York: Springer International, 2016., em que se considera o calor específico do concreto seco em conjunto com o calor latente de vaporização do conteúdo de água.

Por outro lado, a massa específica do aço pode ser considerada como independente da temperatura, a qual é definida como ρ a = 7850 kg/m3. Já a condutividade térmica e o calor específico dependem da temperatura, como ilustrado na Figura 9.

Características da análise térmica

A simulação de transferência de calor transiente é realizada por meio do método dos elementos finitos com auxílio do software ABAQUS v. 6.14. A curva de elevação de temperatura dos gases dada pela ISO 834-1 (INTERNATIONAL..., 1999INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 834-1: fire-resistance tests: elements of building construction: part 1: general requirements. Geneve, 1999.) foi adotada para um período de exposição de 120 min apenas na face oposta ao chumbador, ou seja, o modelo representa a condição de incêndio fora do ambiente da escada, mas ainda interno à edificação (quartos, salas, por exemplo). A temperatura inicial e a temperatura do ar interno à escada são constantes e iguais a 20 ºC.

Figura 7
Discretização de parte da malha do modelo analisado

Figura 8
Propriedades do concreto

Figura 9
Propriedades térmicas do aço

A transferência de calor do ambiente aquecido para a alvenaria ocorre através de convecção e radiação. Pode-se simular esse fenômeno de maneira simplificada, através de condições de contorno que dependem de características do material e do fenômeno de transferência de calor em si. Para calcular o fluxo de calor convectivo atravésdo contorno é necessário definir o coeficiente de transferência de calor por convecção (α c ). Adotou-se a recomendação da EN 1991-1-2 (EUROPEAN..., 2002EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1991-1-2: eurocode 1: actions on structures: part 1-2: general actions: actions on structures exposed to fire. Brussels, 2002.), de α c = 25 W/m²K, para a superfície exposta àcurva de incêndio-padrão, bem como α c = 4 W/m²K para a superfície nãoexposta. Já para o cálculo do fluxo de calor no contorno devido àradiação é necessário definir a emissividade da superfície. Esse é um parâmetro que depende de inúmeros fatores, tais como as características da superfície, a temperatura da superfície e as características das ondas eletromagnéticas envolvidas na transferência de calor (ÇENGEL, 2008ÇENGEL, Y. Introduction to thermodynamics and heat transfer. Dubuque: McGraw-Hill, 2008.). Para as superfícies expostas ao incêndio adotou-se ε = 0,7 constante para todas as temperaturas, conforme recomendado pela EN 1992-1-2 (EUROPEAN..., 2004EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1992-1-2: Eurocode 2: design of concrete structures: part 1.2: general rules: structural fire design. Brussels, 2004.). Já para a superfície oposta ao incêndio, considerou-se ε = 0,95 com uma temperatura ambiente constante de 20 ºC.

Conforme Assis e Munaiar Neto (2020)ASSIS, E. B. de; MUNAIAR NETO, J. Analysis of heat transfer mechanisms on hollow concrete masonry units under standardized fire conditions. In: IBERO-LATIN-AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 41., Foz do Iguaçu, 2020. Proceedings [...] Foz do Iguaçu, 2020., a consideração do ar no interior das cavidades do bloco tem pouca influência nos resultados. Dessa forma, optou-se por desconsiderar o ar nas cavidades, levando em conta apenas a transferência de calor por radiação entre as superfícies. No modelo de elementos sólidos é possível definir a transferência de calor por radiação entre as superfícies que compõem uma cavidade, e o Abaqus calcula os fatores de configuração de cada elemento de superfície em relação aos demais, utiliza as emissividades e considera reflexão difusa para calcular o fluxo de calor por radiação entre as faces. Nesse caso, adota-se ε = 0,95 para a emissividade da superfície de concreto na cavidade. Destaca-se que a superfície exposta do graute em que o chumbador é ancorado também participa da troca de calor por radiação. A Figura 10 ilustra as diferentes condições de contorno adotadas.

Considera-se ainda a prumada de cavidade do bloco totalmente fechada, como ilustra a Figura 6b, com as superfícies inferior e superior com reflexão total (ε = 0) do calor. Essa condição resulta verdadeira para os ensaios de blocos isolados e pequenas paredes no forno, os quais têm suas superfícies inferior e superior isoladas termicamente. Trata-se também de aproximação razoável em paredes de alvenaria em escala natural devido à continuidade das cavidades e à exposição uniforme nas superfícies externas.

Resultados e discussões

A Figura 11 mostra o campo de temperatura na alvenaria e chumbador para vários períodos de aquecimento via incêndio-padrão. É interessante notar o efeito do chumbador e das cavidades no campo de temperatura. O chumbador, por ser feito de aço, apresenta condutividade térmica muito maior que o concreto, influenciando no campo de temperatura, ainda que moderadamente.

Essa influência é mais significativa perto da face sujeita ao incêndio, ou seja, para maiores profundidades de embutimento do chumbador. Por outro lado, a influência da transferência de calor por radiação na cavidade é perceptível em todos os tempos analisados. Tomando pontos nos septos situados à mesma distância da face sob incêndio, aqueles pontos situados na superfície das cavidades apresentam temperaturas maiores do que os pontos internos. Além disso, o ponto de maior temperatura na face nãoexposta ao fogo é aquele mais distante dos septos, alinhado ao centro da cavidade.

Figura 10
Condições de contorno e emissividades (ε) e coeficientes de convecção (α c ) nas diferentes superfícies ilustradas em uma seção transversal do modelo

Figura 11
Campo de temperatura (ºC) para diferentes tempos de incêndio

Esses resultados mostram como um comprimento de embutimento muito grande pode levar a maiores temperaturas do chumbador, uma vez que apresenta condutividade térmica maior que o concreto, como já mencionado. Além disso, a transferência de calor por radiação tem papel relevante no aquecimento dos septos que não estão diretamente expostos ao incêndio, evidenciado pelo fato de o ponto de máxima temperatura no lado oposto ao incêndio ser o centro da cavidade.

A Figura 12 apresenta a evolução de temperatura ao longo do tempo em uma seção transversal que passa pela superfície do chumbador. Percebe-se que em 120 min de incêndio-padrão a temperatura máxima no chumbador resulta inferior a 350 ºC. Isso indica que os efeitos da temperatura no aço podem ser limitados, uma vez que até 300 ºC considera-se que o aço mantém suas resistências ao escoamento e à ruptura iguais àquelas em temperatura ambiente. Nessa temperatura o principal efeito é certa perda de rigidez devido à redução do módulo de elasticidade. Além disso, a condutividade térmica elevada do aço faz com que a temperatura na interface aço-concreto se eleve de maneira mais rápida e uniforme ao longo do comprimento do chumbador.

Tal fato é evidenciado pela brusca mudança de inclinação no gráfico, o que é consequência da elevada condutividade térmica do aço em comparação ao concreto. Por fim, a placa de carregamento, que representa a viga denteada da escada, apresenta temperatura inferior a 120 ºC aos 120 min de incêndio. Tal temperatura não é suficiente para promover mudanças de resistência significativas no concreto.

Por outro lado, é interessante analisar o comportamento na região da cavidade do bloco. A Figura 13 mostra a evolução da temperatura em uma seção transversal que passa pela cavidade. Como era esperado, a temperatura do bloco na região da cavidade é maior se comparada àquela na região grauteada. A análise das curvas nos permite identificar alguns resultados importantes. Aos 45 min de incêndio, mais de um terço do septo exposto ao fogo apresenta temperatura superior a 600 ºC, assim caracterizando elevado nível de deterioração do concreto. A temperatura na face não exposta ao fogo atinge 149,8 ºC em 68,3 min e 192,8 ºC em 84,4 min, o que representa um incremento de 129,8 ºC e de 172,8 ºC respectivamente.

Como referência, a EN 1996-1-2 (EUROPEAN..., 2005EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 1996-1-2: Eurocode 6: design of masonry structures: part 1-2: general rules: structural fire design. Brussels, 2005.) e a NBR 14432 (ABNT, 2001ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14432: exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações: procedimento. Rio de Janeiro, 2001.) definem como isolamento térmico a capacidade de um elemento construtivo de impedir a ocorrência na face que não está exposta ao incêndio de incrementos de temperatura maiores que 140 ºC na média dos pontos de medida ou maiores que 180 ºC em qualquer ponto de medida. A Instrução Técnica 08/2019 (IT-08) do Corpo de Bombeiros de São Paulo (2019b)CORPO DE BOMBEIROS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO. Instrução técnica no 08/2019: segurança estrutural contra incêndio. São Paulo, 2019b. traz no Anexo C resultados experimentais de paredes de blocos de concreto e, para o caso correspondente àsimulação apresentada, indica um tempo de atendimento ao critério de isolamento térmico de 90 min. Isso mostra que as temperaturas e tempo calculados na simulação estão em concordância com resultados experimentais disponíveis na literatura. Como o objetivo deste trabalho é avaliar o chumbador, não foi realizada avaliação da média das temperaturas na face oposta. No entanto, tal resultado, além daqueles apresentados em Assis e Munaiar Neto (2020)ASSIS, E. B. de; MUNAIAR NETO, J. Analysis of heat transfer mechanisms on hollow concrete masonry units under standardized fire conditions. In: IBERO-LATIN-AMERICAN CONGRESS ON COMPUTATIONAL METHODS IN ENGINEERING, 41., Foz do Iguaçu, 2020. Proceedings [...] Foz do Iguaçu, 2020., contribui para a validação e a demonstração da adequabilidade do modelo.

Por fim, a Figura 14 mostra que a diferença de temperatura entre as superfícies da cavidade inicialmente aumenta, atinge seu máximo e começa a diminuir. Aos 120 min de incêndio, a diferença de temperatura é de aproximadamente 100 ºC. Cabe lembrar que o fluxo de calor por radiação é proporcional a (T1 −T2)4, onde T1 e T2 são as temperaturas das superfícies envolvidas. Assim, a diferença de temperatura é um indicativo de que há um forte aumento de transferência de calor por radiação, e, com isso, o septo oposto tem um incremento de temperatura. Esse fato, por fim, leva à diminuição da parcela de calor transferido por radiação.

Figura 12
Temperatura em função da distância da face sob incêndio - Seção no chumbador

Figura 13
Temperatura em função da distância da face sob incêndio - Seção na cavidade

Figura 14
Diferença de temperatura entre as faces da cavidade ao longo do tempo

Considerações finais

Os resultados da análise de transferência de calor em situação de incêndio no painel de alvenaria com chumbador ancorado mostraram que a presença do graute na cavidade de ancoragem do chumbador limita a elevação de temperatura. Em 120 min de incêndio-padrão ISO 834-1 (INTERNATIONAL..., 1999INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 834-1: fire-resistance tests: elements of building construction: part 1: general requirements. Geneve, 1999.), a temperatura no aço permaneceu abaixo de 350 ºC. A presença do chumbador tem influência pouco significativa no campo de temperatura nos blocos e graute. Por outro lado, a consideração da transferência de calor por radiação no interior das cavidades faz com que, para uma mesma distância da face sob incêndio, os pontos na superfície da cavidade apresentem temperaturas superiores àquelas no interior dos septos. Dessa forma, o ponto com maior temperatura na face oposta ao incêndio é aquele mais distante dos septos, alinhado ao eixo central da cavidade do bloco. Os resultados da análise térmica também mostram que a temperatura na viga denteada após 120 min é menor do que 125ºC. Tal temperatura é insuficiente para levar a diminuições significativas de resistência na viga denteada.

Assim, de acordo com as simulações, para o incêndio no ambiente atrelado à face oposta a escada (mas interno à edificação), pode-se considerar a alvenaria como proteção térmica à viga denteada e aos degraus, ambos localizados no ambiente oposto ao incêndio. Tal resultado é corroborado pela observação do acidente retratado na Figura 4, no qual a temperatura do incêndio não causou danos significativos na viga denteada, mas, sim, efeito dinâmico da explosão, que causou deslocamento dos degraus pré-moldados. O exemplo analisado foi escolhido por apresentar características comuns às escadas presentes em edifícios de alvenaria estrutural no Brasil. No entanto, destaca-se que é importante realizar o estudo de outras configurações que envolvam outros tipos de bloco, revestimento e chumbador. Além disso, é importante que trabalhos futuros estudem os efeitos dinâmicos nos degraus devido a explosões.

A metodologia de simulação utilizada se mostrou adequada na medida em que apresentou resultados em linha com resultados experimentais presentes na literatura. Isso mostra que a simulação da transferência de calor por radiação no interior da cavidade representa um importante mecanismo nesse tipo de estrutura. A simulação permitiu evidenciar esse mecanismo, uma vez que é possível avaliar a diferença de temperatura entre as faces da cavidade ao longo do tempo. Aanálise mostrou que, para o exemplo estudado, há um pico (diferença) de temperatura de aproximadamente 250 ºC em torno de 30 min de incêndio, o que representa o instante com a máxima transferência de calor por radiação na cavidade. Após esse pico, há diminuição da diferença de temperatura entre as faces de, aproximadamente, 100 ºC em 120 min de incêndio. Esse fato evidencia o mecanismo de aquecimento da superfície oposta da cavidade por meio da radiação.

Espera-se que a metodologia apresentada subsidie trabalhos futuros para avaliar outras configurações geométricas e de material do sistema de fixação de escada em alvenaria. Em um segundo momento, simulações termomecânicas aliadas com ensaios experimentais poderão ser utilizadas para estimar a degradação mecânica em ambiente com alta temperatura. Por fim, o estudo do comportamento de tal sistema pode levar a recomendações de projeto que promovam segurança adequada ao incêndio de escadas fixadas por chumbadores.

Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer ao conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pelo financiamento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2023

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2022
  • Aceito
    19 Ago 2022
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