RESUMO
Objetivo Comparar o desempenho de adultos jovens e idosos do Distrito Federal com os dados normativos.
Métodos Sessenta participantes hígidos responderam aos testes de fluência verbal semântica, livre e ortográfica da Bateria Montreal de Avaliação da Comunicação.
Resultados Participantes do Distrito Federal obtiveram médias menores (<0,001), comparados à média normativa. Não houve diferença no desempenho entre os grupos etários, exceto ao compará-los com indivíduos com maior escolaridade.
Conclusão Na amostra do Distrito Federal avaliada, o processo de envelhecimento típico não prejudicou a fluência verbal para indivíduos que concluíram o ensino fundamental. As médias menores, em relação aos dados normativos, evidenciaram a importância de padrões normativos regionais.
Palavras-chave: Linguagem; Envelhecimento; Testes de linguagem; Testes neuropsicológicos; Normas; Cognição
ABSTRACT
Purpose To compare the performance of younger and older adults from the Federal District (FD) against normative data.
Methods Sixty healthy participants completed the unconstrained, phonemic and semantic verbal fluency tests of the Montreal Communication Assessment Battery.
Results The FD participants obtained lower mean scores (<0.001) compared to the normative average. There was no difference in performance between the age groups, except on the comparison with high-educated individuals.
Conclusion In the FD, the typical aging process did not impact verbal fluency for individuals who were educated to primary level. The lower mean scores relative to normative data highlight the importance of regional normative standards.
Keywords: Language; Aging; Language tests; Neuropsychological tests; Standards; Cognition
INTRODUÇÃO
Para compreender se ocorrem mudanças no perfil linguístico-cognitivo com o processo de envelhecimento típico, o teste de fluência verbal tem sido muito utilizado(1-5). No Brasil, a população com mais de 65 anos está crescendo rapidamente e dados demográficos demonstram um aumento significativo na expectativa de vida associada a uma diminuição na taxa de natalidade(6).
O teste de fluência verbal avalia a capacidade de busca e produção espontânea de palavras, em condições de busca restritas(7). Sua aplicação consiste em solicitar que o sujeito gere o maior número de palavras possível em um determinado período de tempo(8). Os resultados podem predizer alterações de linguagem e cognição em casos de doenças neuromusculares tradicionalmente caracterizadas por não cursarem com alteração cognitiva(9) e, de modo mais consolidado, em casos de lesões frontais e demências(8,10), bem como diferentes padrões de desempenhos associados ao uso de substâncias químicas(11).
O teste está presente nas duas baterias de avaliação da comunicação, validadas e normatizadas no português do Brasil: a Bateria Montreal de Avaliação da Comunicação (Bateria MAC)(12) e a Bateria Montreal-Toulouse de avaliação da linguagem (MTL-Brasil)(13). Além de avaliar a habilidade verbal, o teste de fluência verbal avalia a função executiva e a velocidade de processamento(2) e, por isso, também está presente em várias baterias de avaliação neuropsicológica(14,15). Nestes instrumentos, a evocação de palavras é avaliada a partir dos critérios semântico(12,13) e fonológico-ortográfico(12,13) e, na ausência de critério, por meio do teste de fluência verbal livre(12). As versões brasileiras dos testes de fluência verbal têm duração de 60(15), 90(13) ou 120-150 segundos(12). A Bateria MAC é a que apresenta o maior tempo de tarefa, por avaliar os processamentos comunicativos e sua associação com o hemisfério direito, não dominante para o processamento da linguagem, mas que participa da tarefa de produção de palavras(12).
Compreender o perfil linguístico-cognitivo do envelhecimento típico é um desafio no Brasil devido a sua rica diversidade demográfica. Os estudos brasileiros têm indicado boa sensibilidade e especificidade do teste de fluência verbal(16). A necessidade de instrumentos de avaliação de linguagem padronizados que permitem a classificação diagnóstica e prognóstica em diferentes contextos socioculturais foi referida pelos autores da MTL-Brasil(17). No campo da avaliação neuropsicológica e para a interpretação dos testes, os profissionais são explicitamente encorajados a considerar a validade dos instrumentos para a população avaliada, bem como as características culturais e linguísticas do examinado(18).
Quanto ao desempenho nos testes de fluência verbal, conforme o processo de envelhecimento típico brasileiro, estudos desenvolvidos nas regiões Sul e Sudeste do Brasil evidenciaram resultados mistos. Isto é, alguns autores relataram melhor desempenho de jovens, comparado ao de idosos, em relação ao número de palavras geradas(3,5), enquanto outros estudos não encontraram diferenças significativas entre as faixas etárias(1,4,6).
Cabe indicar que alguns dos estudos citados relataram diferenças associadas à idade, mas diferenças qualitativas, não estudadas em nossa pesquisa(1,3,5).
Visto que o estudo normativo da Bateria MAC foi desenvolvido com participantes da região Sul do Brasil e que não foram encontrados estudos sobre o perfil de fluência verbal do adulto no Distrito Federal (DF), ou na região Centro-Oeste do país, nas bases de dados de publicações científicas, a análise do desempenho de fluência verbal auxiliará na compreensão do desempenho de produção de palavras durante o processo de envelhecimento nessa região.
Assim, considerou-se importante analisar a fluência verbal semântica, ortográfica e livre de uma amostra do DF e comparar o desempenho de um grupo de idosos em relação a um grupo de adultos jovens desta região, conforme a escolaridade de cada grupo etário. Além disso, foi realizada comparação do desempenho de fluência verbal dos voluntários do DF com os dados normativos da região Sul do país. Espera-se que haja diferença entre adultos jovens e idosos e entre os dados do DF e do Sul. Na presença destas diferenças, este estudo também pretendeu apresentar uma proposta de dados normativos para os três subtestes de fluência verbal da Bateria MAC.
MÉTODOS
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Ceilândia, sob CAAE número 56190716.0.0000.0030 e parecer número 1.657.122. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aprovado pelo CEP.
A amostra por conveniência foi composta por 30 idosos de 60 a 75 anos e 30 adultos jovens de 19 a 39 anos, recrutados, predominantemente, em Ceilândia e região pelos membros da equipe universitária intitulada “FortaleçaMente”, que desenvolve ações de pesquisa e extensão. Para cada faixa etária, 15 voluntários tinham de dois a sete anos de escolaridade e os demais apresentavam mais de oito anos de estudo.
Os critérios de inclusão estabelecidos foram: idosos e adultos jovens com quadro de saúde típico e estável, sem histórico de doença neurológica ou psiquiátrica e que residissem no DF há mais de dez anos.
Foram excluídos da pesquisa os indivíduos que apresentaram história prévia ou atual de alcoolismo ou uso de drogas ilícitas; doenças graves neurológicas ou psiquiátricas prévias; alterações visuais ou auditivas não corrigidas; uso de prótese dentária mal adaptada, que comprometesse o desempenho nas tarefas realizadas; uso de benzodiazepínicos ou outros medicamentos que pudessem interferir no desempenho linguístico-cognitivo.
Além disso, foram excluídos aqueles que apresentaram, na avaliação breve para a seleção da amostra, desempenho sugestivo de alteração cognitiva, escore sugestivo de depressão ou dependência nas atividades de vida diária. Estes critérios foram verificados por meio da aplicação da versão brasileira dos testes: Escala de Depressão Geriátrica (EDG)(19), Mini Exame do Estado Mental (MEEM)(20) e avaliação da realização de atividades instrumentais da vida diária, por meio do Índice de Lawton e Brody(21).
Inicialmente, os voluntários responderam a um questionário sobre a idade, escolaridade, uso de medicamentos ou outras drogas e presença de doenças.
Para analisar o desempenho de fluência verbal de uma amostra do DF, foram aplicados os três subtestes de fluência verbal da Bateria MAC(12):
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Subteste de fluência verbal com critério semântico, no qual o participante deve dizer o máximo possível de palavras que representam roupas ou vestimentas, em dois minutos;
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Subteste de fluência verbal com critério ortográfico, no qual a ordem dada ao voluntário é a de dizer o maior número de palavras que comecem com a letra “p”, exceto nomes próprios, em dois minutos;
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Subteste de fluência verbal livre, que requer do participante a nomeação do maior número possível de palavras, exceto nomes próprios e números, em dois minutos e 30 segundos.
A aplicação da avaliação da pesquisa ocorreu em ambientes silenciosos de associações de idosos, ou em suas residências, e a sequência de questionamentos e testes foi a mesma para todos os voluntários.
Para comparação dos dados demográficos e de escolaridade entre os grupos etários, foram aplicados os testes Qui-Quadrado e Mann-Whitney. Para a comparação do desempenho de fluência verbal entre os idosos e os adultos jovens do DF, foi aplicado o teste Mann-Whitney. Para estas análises, os participantes foram divididos em grupos etários, de idosos e adultos jovens, ou grupos conforme a escolaridade, voluntários de maior escolaridade e voluntários de menor escolaridade. Para a comparação entre os dados do DF e os dados normativos da Bateria MAC, foi realizada análise das diferenças entre duas médias, por meio do teste t de Student, sendo que foram levadas em conta as classificações etárias e de escolaridade propostas pelo instrumento de avaliação da comunicação. A probabilidade (p) menor que 0,05 foi considerada para indicar significância estatística. Para a apresentação dos dados normativos, foi considerado o décimo percentil dos valores alcançados em cada grupo e, a partir disso, obtido o ponto de alerta do DF. Os dados foram analisados no software estatístico IBM SPSS Statistics 22 (Statistical Package for the Social Science).
RESULTADOS
Os 30 idosos selecionados tinham média de idade de 66,77 anos (desvio padrão de 4,57) e de escolaridade de 7,57 anos de estudo (desvio padrão de 3,73), sendo 90% do sexo feminino. Os 30 adultos jovens apresentaram média etária de 28,70 anos (desvio padrão de 7,93) e de escolaridade de 8,17 anos de estudo (desvio padrão de 4,06), sendo 87% do sexo feminino. Não houve diferenças demográficas estatisticamente significativas para as variáveis sexo, idade e escolaridade, exceto quando estas variáveis diferenciavam os grupos. Além disso, houve diferença estatisticamente significativa de classe econômica apenas ao se comparar participantes de maior e menor escolaridade. A Tabela 1 apresenta os dados demográficos dos participantes.
Em relação às características clínicas da amostra, no MEEM, os idosos obtiveram média de desempenho 26,20 (desvio padrão de 2,68) e os adultos jovens 26,47 (desvio padrão de 2,66). Já na EDG, os valores obtidos foram 1,53 (desvio padrão de 2,03) para o grupo de idosos e 1,87 (desvio padrão de 2,27) para os jovens.
Na comparação dos desempenhos nos subtestes de fluência verbal semântica, ortográfica e livre entre os grupos etários de adultos jovens e idosos e entre os voluntários, conforme a escolaridade, com maior e menor tempo de estudo, não houve diferença entre os dois grupos etários. Houve diferença apenas ao dividir os grupos conforme a escolaridade, uma vez que as pontuações de fluência verbal livre e ortográfica foram maiores para grupos voluntários com maior escolaridade (Tabela 2).
Comparação dos desempenhos de fluência verbal entre os grupos e subgrupos do Distrito Federal
Ao dividir os grupos conforme as duas variáveis demográficas, de idade e escolaridade, e comparar o desempenho de fluência verbal, houve diferença apenas na fluência verbal semântica, em que os adultos jovens com maior escolaridade obtiveram pontuação melhor do que os idosos de mesma escolaridade (Tabela 2).
Na comparação do desempenho de fluência verbal entre os voluntários do DF e as médias normativas brasileiras, conforme a divisão etária e de escolaridade proposta na Bateria MAC, foram encontrados os seguintes resultados: diferença entre os subgrupos de idosos com maior escolaridade para o subteste de fluência verbal semântica, sendo a média do DF menor do que a média normativa; diferença entre os subgrupos de adultos jovens, tanto com maior, quanto com menor escolaridade, para os subtestes de fluência verbal ortográfica e semântica, sendo a média do DF menor, em relação à média normativa (Tabela 3).
Comparação do desempenho de fluência verbal entre as amostras do Distrito Federal e as médias normativas brasileiras
A partir da comparação dos dados normativos propostos pela Bateria MAC e dos dados normativos propostos neste estudo para a população do DF (Tabela 4), sugere-se que, no DF, o ponto de alerta seja maior para fluência verbal livre e menor para fluência verbal ortográfica e semântica, para todos os subgrupos (Tabela 4).
Décimo percentil e ponto de alerta para os subtestes de fluência verbal do Distrito Federal e do Sul do Brasil
DISCUSSÃO
No estudo sobre a fluência verbal desenvolvido no DF, houve diferença da quantidade de palavras geradas entre os grupos com diferentes escolaridades, mas não houve entre os grupos com diferentes idades, exceto quando foram comparados os grupos etários com maior escolaridade. Ainda, houve diferença na comparação da fluência verbal entre os participantes do DF e a média normativa obtida no Sul do país, o que determinou proposta normativa piloto para o DF, distinta das normas brasileiras propostas na Bateria MAC.
Quanto à comparação de desempenho de fluência verbal entre grupos etários, não foi observada diferença entre os resultados de idosos e adultos jovens do DF, resultados que confirmaram a pesquisa de Rodrigues et al.(4), que encontrou ausência de diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, em relação ao número total de palavras geradas em um minuto, nas versões semântica e ortográfica. Os resultados deste estudo também concordaram com os de outros, que relataram escores totais similares entre os grupos, em intervalos de 60 segundos, no teste de fluência verbal semântica(1), assim como ausência de significância em relação à idade para o teste de fluência verbal ortográfica(6).
Em concordância com os resultados desta pesquisa, alguns estudos internacionais relataram ausência de diferenças estaticamente significativas entre os grupos etários nas tarefas de fluência verbal semântica e ortográfica(22), assim como no teste de fluência verbal ortográfica(2).
Contrariamente, um amplo número de estudos mostrou diminuição relacionada à idade no número total de palavras geradas nas tarefas de fluência verbal semântica, ortográfica e livre(5), nas versões semântica e ortográfica(23) e na versão livre(3).
As diferenças dos achados deste estudo, em relação aos outros artigos, podem se relacionar às diferenças sociais, econômicas, culturais, educacionais e de vocabulário das amostras estudadas, devido à diversidade de origens. Cabe indicar que diferenças culturais, por exemplo, na organização de categorias semânticas, têm sido relatadas quando analisado o desempenho de participantes de diferentes culturas(18). Adicionalmente, estudos apontaram que o ambiente também pode influenciar o vocabulário dos falantes da mesma língua que vivem em diferentes áreas do mesmo país(1,18). Neste sentido, estudos salientaram que experiências associadas ao desenvolvimento cognitivo infantil podem explicar o desempenho cognitivo na idade adulta. Por exemplo, o status socioeconômico baixo pode ser associado a funções cognitivas mais pobres no final da idade adulta(18).
Assim, apesar do estudo de Pekkala et al.(18) ter evidenciado que variáveis sociodemográficas modificam o desempenho da fluência verbal, estas variáveis, controladas na seleção da amostra, não justificam, por exemplo, a diferença entre adultos idosos e jovens de maior escolaridade (Tabela 2).
É interessante observar que houve diferença de desempenho de fluência verbal entre adultos jovens e idosos apenas ao comparar o processamento semântico dos voluntários com maior escolaridade. Este achado concorda com o estudo que mostrou que a idade está mais relacionada ao número de palavras geradas na fluência semântica, do que na fluência fonológica(24). Ainda, quanto ao potencial do teste de fluência verbal, o estudo de Canning et al.(8) mostrou que o teste semântico pode detectar precocemente características de demência. Os resultados do presente estudo, que evidenciaram diferença entre grupos etários apenas para a amostra com maior tempo de estudo, mostram o impacto das variáveis demográficas e sugerem que a análise do desempenho no teste de fluência verbal semântica deve ser diferente, conforme a escolaridade.
No presente estudo, para reduzir o impacto das variáveis demográficas, a seleção da amostra estabeleceu os critérios de pareamento do adulto jovem com o idoso, de acordo com a escolaridade. Assim, no DF, pode-se concluir que, ao controlar o perfil educacional, o processo de envelhecimento neurologicamente típico não interfere no desempenho comunicativo-linguístico no que tange à fluência verbal livre e ortográfica. No entanto, ao considerar apenas os voluntários com maior escolaridade, o processo de envelhecimento típico pode reduzir o número de palavras resgatadas, quando o critério do teste é semântico.
Considerando aspectos neurobiológicos, ambas as tarefas de fluências verbal (semântica e fonológica) envolvem a habilidade de acessar a memória semântica e o adequado funcionamento dos lobos frontais(24). Entretanto, enquanto o processamento semântico envolve uma ampla rede de áreas cerebrais, especificamente, o grau de ativação da região cerebral temporal medial parece ser maior(25-27).
Os resultados deste estudo quanto ao pior desempenho de fluência verbal semântica de idosos com maior escolaridade, em relação aos jovens com maior escolaridade, sugerem que estas regiões, associadas ao processamento semântico, podem sofrer maiores prejuízos decorrentes do envelhecimento típico, do que as regiões associadas ao processamento fonológico.
Observou-se, também, que o nível de escolaridade influenciou o desempenho de fluência verbal, visto que, ao comparar os participantes com menor e maior escolaridade, sem dividi-los por idade, aqueles que apresentavam maior nível de escolaridade obtiveram pontuação maior para os subtestes de fluência verbal livre e ortográfica. Este resultado foi apresentado em outros estudos(4) e, provavelmente, ocorre em razão do vocabulário mais restrito dos que possuem menor tempo de estudo(4).
Ao comparar os resultados de fluência verbal dos subgrupos estudados com os dados normativos da Bateria MAC (Tabela 3), verificou-se diferença quanto à fluência verbal ortográfica e semântica para os adultos jovens e quanto à fluência semântica para os idosos de maior escolaridade. Novamente, observa-se, especialmente, o envolvimento funcional das habilidades semânticas na diferença do desempenho quantitativo de fluência verbal entre amostras de diferentes regiões brasileiras. A semelhança de desempenho de fluência verbal entre grupos etários do DF e as diferenças de desempenho, ao comparar a amostra do DF com os dados normativos do Sul do país, evidenciaram o papel das diversas variáveis demográficas no desempenho da fluência verbal, além da idade e da escolaridade. Ao observar os resultados de estudos desenvolvidos em várias regiões do mundo, constatou-se diversidade no desempenho de fluência verbal(18).
Diante das diferenças nas regiões do Brasil, o presente estudo propôs um ajuste para o ponto de alerta para a população do DF, conforme apresentado na Tabela 4. Os autores do instrumento original, Protocole MEC(28,29), e do instrumento brasileiro traduzido, adaptado, validado e normatizado no Brasil, Bateria MAC(12), propuseram a apresentação do ponto de alerta que consideram ser o resultado que o avaliador deve supor de que as alterações comunicativas encontradas estão relacionadas com a lesão e estabeleceram este ponto de alerta, conforme o décimo percentil(28,29). Ressalta-se que, neste estudo, foi adotado o mesmo critério usado no estudo normativo brasileiro para arredondamento(30). Os resultados apresentados na Tabela 4 mostram que o ponto de alerta da amostra do DF foi melhor para fluência verbal livre e pior para os subtestes semânticos e ortográfico/fonológico, em relação aos dados normativos obtidos na região Sul do país.
É fundamental referir que este estudo apresentou limitações, pois se baseou na análise quantitativa das palavras evocadas pelos voluntários, ou seja, não foram realizadas análises das estratégias de exploração lexical. A bateria de avaliação utilizada orienta sobre o método de interpretação dos resultados qualitativos, como as estratégias utilizadas para evocar as palavras, o número de campos semânticos explorados, o número de palavras pronunciadas por campo semântico, a presença e os tipos de erros, a estratégia de exploração do conhecimento semântico, a distribuição de palavras no campo e a velocidade de evocação(12). No entanto, para o estudo normativo, a bateria considera apenas o escore total e a análise qualitativa inclui informações complementares para a interpretação do desempenho de exploração da memória léxico-semântica(12). Assim, destaca-se a relevância das análises qualitativas na interpretação dos resultados das avaliações individuais, conforme já evidenciado em diversas pesquisas anteriores(1,3,5). Contudo, considera-se importante que futuros estudos realizem a caracterização dos tipos de erros nas diferentes condições de fluência, informação que pode ser de grande relevância na análise das contribuições distintas de processos verbais, ou executivos no acesso lexical. Além disso, deve-se levar em conta que a amostra foi composta, predominantemente, por voluntários do sexo feminino, assim como no estudo normativo, aspecto neste último conhecido como feminização do envelhecimento. Apesar disso, a amostra brasileira que compôs a versão original da Bateria MAC não evidenciou diferença de fluência verbal entre homens e mulheres(30).
CONCLUSÃO
No DF, o desempenho de fluência verbal dos idosos foi semelhante ao dos adultos jovens, portanto, o processo de envelhecimento típico não prejudicou a fluência verbal.
As médias menores do DF, em relação aos dados normativos do Sul do país, tanto no subteste de fluência verbal semântica para o grupo de idosos com maior escolaridade, quanto no subteste de fluência verbal ortográfica e semântica para o grupo de adultos jovens, evidenciaram a necessidade de estudos normativos que estabeleçam padrões, conforme o perfil demográfico local.
Não houve diferença estatisticamente significativa para fluência verbal livre, tanto na comparação de desempenho entre idosos e adultos jovens do DF, quanto na comparação das amostras do DF com as médias normativas.
Em relação à amostra normativa brasileira obtida no Sul do país, os pontos de alerta do DF foram melhores para fluência verbal livre e piores para fluência verbal semântica e ortográfica/fonológica.
Agradecimentos
Aos membros e à Universidade de Brasília (UnB), especialmente à Faculdade de Ceilândia (FCE), pela oportunidade e por proporcionar as ferramentas e recursos necessários para a elaboração deste estudo. Aos voluntários do Distrito Federal que aceitaram participar deste estudo.
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Trabalho realizado no Curso de Fonoaudiologia, Faculdade de Ceilândia – FCE, Universidade de Brasília – UnB – Brasília (DF), Brasil.
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Financiamento:
Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), processo número 193.001.519/2017.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
10 Ago 2020 -
Data do Fascículo
2020
Histórico
-
Recebido
13 Abr 2020 -
Aceito
23 Maio 2020