Open-access A REIFICAÇÃO DO CORPO NA IMAGINARIZAÇÃO

Body reification in imaginarization

RESUMO:

Propõe-se uma relação entre a reificação do corpo e o processo de imaginarização. Imaginarização é uma noção apenas aludida na obra de Lacan. Propõe-se uma leitura acerca de apresentações clínicas nas quais prevalece um estado depressivo neurótico. Hipótese: nessas situações, o sujeito parece reduzir-se ao próprio corpo, como resposta a certas exigências da cultura contemporânea. Busca-se lançar luz sobre o automatismo do gozo do corpo no circuito pulsional. Por meio da noção de imaginarização, destaca-se um enquadramento particular que o sujeito dá ao gozo, ao invés de posicionar-se como faltante na relação com o Outro.

Palavras-chave: imaginarização; reificação do corpo; clínica psicanalítica; Jacques Lacan

Abstract:

We propose a relationship between the reification of the body and the process of imaginarization. Imaginarization is a notion only alluded to in Lacan’s work. We propose a reading about clinical presentations in which a neurotic depressive state prevails. The hypothesis: in these situations, the subject seems to be reduced to his own body, in response to certain demands of contemporary culture. Thus, we seek to shed light on the automatism of the jouissance of the body in the drive circuit. Through the notion of imaginarization, it is possible to highlight a particular framework that the subject gives to jouissance, instead of positioning themselves as lacking in the relationship with the Other.

Keywords: imaginarization; body reification; psychoanalytic clinic; Jacques Lacan

INTRODUÇÃO

Nos seminários A relação de objeto (LACAN, 1957/1995) e A angústia (LACAN, 1963/2005), assim como no texto Subversão do sujeito e dialética do desejo no inconsciente freudiano, Lacan (1960/1998) alude, muito brevemente, e sem oferecer uma definição, à noção de imaginarização.

Propomos aqui uma relação entre reificação do corpo e o processo de imaginarização, visando chamar atenção para uma observação clínica: em situações de estado depressivo neurótico, o sujeito parece reduzir-se ao próprio corpo, como resposta a exigências da contemporaneidade. Nossa hipótese é a de que a noção de imaginarização é crucial para entender como o sujeito, ao ser “capturado pela imagem de seu corpo” (LACAN, 1975/1985, p. 3), pode encontrar maneiras de fixar o gozo. Ancorando-se, fundamentalmente, no imaginário, o sujeito encontra no corpo modos de fixar o gozo, por meio da “revelação do gozo específico que há na sua fixação” (LACAN, 1975/1985, p. 18).

Para elaborar esta complexa questão que a clínica nos apresenta, utilizamos a noção de imaginarização: uma peculiar relação do sujeito com o objeto a, na tentativa de eliminar a falta, elemento estrutural na neurose. Buscamos também lançar luz sobre o automatismo do “gozo do corpo” (LACAN, 1973/1985) no circuito pulsional. Trata-se de uma busca para estar “no lugar marcado como I” (LACAN, 1963/2005, p. 50). Esta posição indica a tentativa de preservar a imagem especular, uma suposta unidade referente ao momento precedente à castração. A imaginarização sinaliza a busca de preservar o lugar constituído como Eu, no campo do imaginário, ao invés de assumir-se como faltante na relação com o Outro. Se, porventura, isso fosse possível, o sujeito “[...] teria relação com o que se trata de buscar na brecha da imagem especular original, i(a), ou seja, o objeto de seu desejo, a” (LACAN, 1963/2005, p. 50).

A dimensão que o corpo assume no processo de imaginarização é relativa a um modo de gozo que “só se situa a partir do mais-de-gozar” (LACAN, 1974/1993, p. 58), por estar consonante com um excesso de gozo no corpo. O mais-de-gozar que corresponde, primordialmente, à inserção do sujeito no campo da linguagem através da perda de gozo, diz respeito também ao resto de gozo, que se torna excedente por não encontrar articulação simbólica no processo de subjetivação.

Partimos das elaborações freudiana e lacaniana sobre o corpo pulsional que ultrapassa a dimensão biológica sem, no entanto, dissociar-se dela. Primeiro, destacamos o processo de imaginarização por meio dos impasses do sujeito perante o desejo e o gozo, na neurose. Em seguida, abordamos a topologia do gozo , visando circunscrever a relação do gozo com o corpo, posto que a emergência do gozo ocorre no processo de constituição do sujeito. Por fim, delineamos a articulação lacaniana sobre “gozo do corpo do Outro” - também denominado de “gozo do corpo” - (LACAN, 1973/1985). A ênfase aqui é o corpo pulsional, submetido ao processo de imaginarização.

Corpo e imaginarização

Desde Freud (1905/2016), a teoria e a clínica trabalham com a ideia de que o conceito de pulsão inclui o corpo, tornando psíquico e somático indissociáveis. O conceito possibilita compreender processos psíquicos que envolvem o embate do sujeito com a falta. Freud ressalta que a pulsão não tem objetivo fixo, uma vez que o corpo é constituído por zonas erógenas, conforme sua “predisposição polimorficamente perversa” (FREUD, 1905/2016, p. 98), no que diz respeito à satisfação, ou seja, na relação com o Outro, mediada pelo objeto a, a partir da proposta lacaniana.

A ação do objeto a na dinâmica psíquica está alinhada à relação que o sujeito estabelece com o Outro, na qual o objeto a é resto da operação de castração, sendo a pulsão delineada pela possibilidade de representação parcial da sexualidade no psiquismo (FREUD, 1915/2010). Ganha evidência no circuito pulsional a conexão sexualidade e morte, sendo o sujeito resultado de uma perda, em decorrência de sua entrada na linguagem, mas também pela tendência à agressão e à destruição (FREUD, 1923/2011), conforme indica o conceito de pulsão de morte.

A pulsão de morte (FREUD, 1920/2010) caracteriza-se pela compulsão à repetição, cuja fonte é indicada por sua vinculação à “região ou zona do corpo da qual obtinha sua excitação” (FREUD, 1923/2011, p. 303). Assim, a repetição articula-se a um efeito da perda de objeto em decorrência da castração. A dinâmica da repetição deve-se ao “fato de que o gozo é almejado num esforço de reencontro” (LACAN, 1969/2008, p. 119) através do regime do mais-de-gozar que, ao assinalar a pulsão parcial como efeito de discurso, indica “uma produção significante, a do S1”. Isto quer dizer que “a pulsão, a pulsão parcial, é fundamentalmente pulsão de morte, e representa em si mesma a parte da morte no vivo sexuado” (LACAN, 1964/2008, p. 195).

Trata-se de um rastro de gozo ligado à linguagem, pois “a dimensão do gozo, para o corpo, é a dimensão da descida para a morte” (LACAN, 1972/2011, p. 28). Ao ratificar a elaboração freudiana sobre a repetição, Lacan assinala que aquilo de que se trata na repetição é “[...] um traço de gozo ligado à existência de um traço unário da linguagem” (SOLER, 2019, p. 20). Toda pulsão, portanto, ao ter a morte como princípio e finalidade, é instituída como pulsão de morte, cabendo ao sujeito saber lidar com seu gozo.

O conceito de pulsão é útil para compreender a articulação sobre o corpo pulsional como parte do processo de constituição do sujeito. A linguagem, à qual o sujeito deve submeter-se para existir socialmente, deixa marcas. Tal constituição nos conduz a entender o sujeito em sua natureza borromeana, de um fora e dentro na mesma superfície que não faz desaparecer o organismo, mas lhe acrescenta o corpo pulsional, que demarca o campo da clínica psicanalítica.

Lacan (1975/1991) elabora a topologia do nó borromeano, a partir da clínica, assinalando a aproximação do gozo ao real, o que permite ir além da dimensão imaginária. Ele apresenta “a angústia, enquanto partindo do real, que vai dar sentido à natureza do gozo” (LACAN, 1975/1991, p. 10). O recurso à topologia dos nós mostra as três dimensões - imaginário, simbólico e real - enlaçadas, cada registro incidindo sobre os outros dois. A escrita borromeana permite a leitura da atividade dos três registros com suas respectivas sobreposições. O objeto a é o buraco central dos três elos, demarcando o vazio da ausência. Ele torna possível conjugar três superfícies que se entrelaçam, permitindo acrescentar três outros pontos que se definem: pelo sentido, pelo gozo fálico e pelo gozo do Outro. “No imaginário, mas também no simbólico, inscrevo a função dita do sentido. As duas outras funções a serem definidas com relação ao ponto central são dois gozos” (LACAN, 1975/1991, p. 9). Nessa direção, Lacan introduz modalidades de gozo através dos efeitos das ultrapassagens de um registro sobre o outro, no nó, circunscrevendo o processo de imaginarização, conforme veremos adiante.

Tomando a disposição dos pontos definidos na topologia dos nós, o sentido está inscrito no furo que o simbólico faz no imaginário. Lacan (1975/1991) destaca que esse furo tem relação de ex-sistência com o real. Assim, a ligação do sentido com o real é de exterioridade: o real é o que ex-siste. Este, por sua vez, intervém nos campos do gozo fálico e do gozo do Outro. O gozo fálico é constituído pelo furo do simbólico no real que estabelece uma ligação de exterioridade com o imaginário, isto é, fora do corpo. É a partir do gozo fálico, do Outro do significante, que a falta estrutural é instituída por meio da castração. O gozo do Outro “interessaria não ao Outro do significante, mas ao Outro do corpo” (LACAN, 1975/1991, p. 19). Situado na conjunção do real com o imaginário, o gozo do Outro estabelece relação de exterioridade com o simbólico.

A partir da escritura do nó borromeano, propomos a seguinte hipótese: a dinâmica do gozo do Outro é o que parece prevalecer em decorrência do processo de imaginarização - em certas apresentações clínicas de estado depressivo - na contemporaneidade. Isto decorreria da intensificação imaginária, na busca pelo objeto como índice de uma suposta apropriação do Eu, que pode indicar a suplantação do gozo do corpo na economia psíquica. Ou seja, a tentativa de imaginarizar o objeto a, para tamponar a falta, ao fazer frente ao Outro do significante, seria um modo específico de gozo. Só que, ao tentar eliminar a falta, o sujeito sucumbe à angústia. Na incidência do real sobre o imaginário, à medida que o sujeito tenta fazer frente à castração por meio de uma negação, surge a angústia. Como o registro do “imaginário é o lugar onde toda verdade se enuncia, e uma verdade negada tem tanto peso imaginário quanto uma verdade confessada” (LACAN, 1975/1991, p. 79), a intensificação imaginária, que constitui, para nós, o processo de imaginarização, parece elucidar a relação do sujeito com o objeto a ao indicar seu embaraço com o desejo e o gozo. É na medida em que o sujeito atende ao gozo do Outro, como meio de elidir a divisão, que ele não mais se diferencia do objeto.

Seguindo a topologia borromeana, Lacan introduz os termos inibição, sintoma e angústia. Em Freud (1926/2014), esses termos sinalizam possibilidades de o sujeito se defender do desejo. Na leitura lacaniana, a inibição resulta da invasão do imaginário no simbólico, circunscrevendo a relação do sujeito com o desejo pelo sentido. A inibição “é sempre assunto de corpo, ou seja, de função” (LACAN, 1975/1991, p. 10), relativa ao efeito de paralização de funcionamento pela intrusão do imaginário no campo do simbólico, sinalizando um embotamento afetivo. O sintoma é definido por meio da conjunção do simbólico com o real, demarcando a bricolagem do significante com o real. Temos aí a satisfação pulsional que implica o corpo. “Eu defino o sintoma pela maneira pela qual cada um goza do inconsciente, na medida em que o inconsciente o determina” (LACAN, 1975/1991, p. 55).

Já a angústia é deslocada do campo do desejo para o domínio do gozo, na incidência do real sobre o imaginário. A partir da compreensão de que o real é irredutível à representação, assim como impossível de articular, é através do corpo, ou seja, do imaginário, que podemos ter uma dimensão do efeito do real (LACAN, 1977) por meio da economia do gozo, conforme indica a imaginarização. Ressaltamos a relevância do processo de imaginarização para melhor compreender a relação que o sujeito estabelece com o corpo, na economia psíquica do gozo. Tal processo, além de sinalizar modos de gozo que surgem na clínica contemporânea, pode nos ajudar a compreender uma via possível para o manejo da análise.

Embora se situe no registro imaginário, não há corpo sem simbólico - sem que seja habitado por significantes, - tampouco sem real, no qual o objeto a está localizado como impossível e irredutível. Ou seja, “que nosso corpo tenha três dimensões, é algo de que não se tem nenhuma dúvida” (LACAN, 1975/1991, p. 26). O corpo, situado na dimensão imaginária, tem consistência, constituído que é pelos orifícios (LACAN, 1976/2007) que apontam para a dimensão do real.

Freud (1905/2016) já indicara tanto os furos do discurso por meio dos atos falhos, lapsos, deslizes, como os furos no corpo, com as zonas erógenas. Lacan (1976/2007) acrescenta que o fato de o registro imaginário referir-se à forma do corpo, como ponto de partida, não significa dizer que “um saco vazio permanece um saco, ou seja, isso que só é imaginável pela ex-sistência e pela consistência que o corpo tem, de ser pote. É preciso apreender essa ex-sistência e essa consistência como reais” (LACAN, 1976/2007, p. 19), posto que a ex-sistência, assim como a consistência do corpo, respondem ao campo das pulsões, limitado pelo furo fundamental proveniente do simbólico. Só que a consistência, diferentemente da ex-sistência, tem correspondência com a ordem do imaginário, “a consistência é o que se fabrica e se inventa” (LACAN, 1975/1991, p. 46). Já o imaginário se relaciona com o real através da dinâmica do gozo. Desse modo, o real, ao ex-sistir ao significante, não deixa de tornar-se determinante na constituição do sujeito, uma vez que o gozo está imbricado na emergência do significante através da dinâmica do mais-de-gozar.

A relação que o sujeito mantém com o Outro, circunscrita pela pulsão, demonstra as consequências da entrada na sexualidade. Essa relação envolve a falta com a qual o sujeito é instituído em relação ao Outro pelo fato de estar alienado ao significante. Assim, é por meio dessa dialética que se vai constituindo o campo do desejo. Por uma outra via, a tentativa de reduzir-se ao corpo, através da imaginarização, ou seja, a partir da relação com o objeto a, assinala o processo de intensificação imaginária e de desinvestimento da palavra, visando escamotear a falta. Dito de outra forma, o objeto a causa de desejo deixa de funcionar como objeto suplementar na economia psíquica para servir de complemento no processo de imaginarização. Vemos aí a operação de obliteração da função propulsora do desejo advinda da falta.

Em consonância com Lacan, Soler distingue dois estratos da angústia que dizem respeito à forma pela qual o sujeito relaciona-se com o objeto a: “a angústia do Outro e a da falta do Outro” (SOLER, 2018, p. 26). O primeiro diz respeito à angústia de castração frente à demanda do Outro. Já a angústia da falta do Outro refere-se ao gozo do corpo que esvazia o valor do significante. Ao deixar de situar o objeto a como suplemento da falta estrutural, o sujeito produz uma relação imaginária de complemento com o Outro, na qual imaginariza o objeto a elidindo sua divisão, tentando fugir da angústia diante do Outro. No entanto, esse manejo subjetivo pode conduzi-lo a subjugar-se ao gozo próprio, intensificando a angústia diante da ausência do Outro.

Ao articular o corpo ao imaginário no texto sobre o narcisismo, Freud (1914/2010) já chamara atenção sobre como o aprisionamento à própria imagem pode ser mortífero, posto que o caráter de fixidez da imagem, além de apontar a deflação do valor de alteridade, indica a função de automatismo do gozo. Desse modo, é através da imagem que o corpo se introduz na economia do gozo (LACAN, 1974). Ainda, “o corpo, enquanto imagem, serve para delimitar, conter, localizar o gozo do sujeito” (COPPUS, 2013, p. 21).

Segundo Lacan, “só há Outro se o dizemos” (LACAN, 1975/1991, p. 18), no sentido de nomeação, reconhecimento do campo do simbólico. Para um corpo ser constituído, é imprescindível que o sujeito, ao identificar-se com uma imagem, possa ser representado pelo significante, ordenando o objeto a como causa de desejo no campo pulsional (LACAN, 1976/2007). Contudo, o processo de imaginarização, em direção oposta à dinâmica do desejo, sinaliza a tentativa de ordenar o objeto a como complemento da falta.

Se o sujeito pode se servir da falta como motor propulsor na economia psíquica ao suportar um lugar desejante, a tentativa de eliminar a falta, deflacionando o valor do significante, pode conduzi-lo a reduzir-se ao corpo, frente à demanda do Outro. Na medida em que o sujeito reconhece o lugar de alteridade, pode remeter-se ao campo do simbólico por meio do laço identificatório, esvaziando sua relação com o gozo próprio. Caso contrário, a tentativa de lidar com a angústia, por meio da abolição da divisão no processo de imaginarização, pode levá-lo a afirmar-se através do gozo, aumentando a angústia. Esses dois caminhos estão apontados pelo caráter de ex-sistência e consistência do corpo que respondem ao campo do real.

Topologia do gozo

A proposta lacaniana de uma topologia do gozo remete ao processo de imaginarização, indicando a função do gozo em relação ao corpo. Tal atividade do gozo na relação com o corpo “baseia-se numa exclusão que é, ao mesmo tempo, uma inclusão” (LACAN, 1969/2008, p. 112) em decorrência da castração. É somente a partir do mais-de-gozar que podemos compreender tanto o processo de exclusão como o de inclusão do gozo na economia psíquica. Inicialmente, a dinâmica do mais-de-gozar indica a perda de gozo, que imprime o lugar da falta. Ademais, a topologia do gozo sinaliza, pela dinâmica do mais-de-gozar, rastros de gozo.

A entrada do sujeito na linguagem é compreendida por Lacan como crucial, na medida em que “não surte ali outro efeito senão o da estrutura em que se motiva essa incidência do real” (LACAN, 1972/2003, p. 492). Há um retorno do gozo, como parte do processo de inclusão. Nesse sentido, o efeito da inserção do sujeito na linguagem indica acesso ao gozo, frente à castração. É sobretudo essa posição diante da perda de gozo que pode permitir o acesso retroativamente, só-depois, à sua estruturação, visto que a perda de gozo não significa ausência de gozo.

A perda de gozo torna possível atribuir valor ao gozo, na dinâmica do mais-de-gozar. Indica também práticas de recuperação de gozo. A atividade do desejo decorre da operação de castração, mas “o desejo só nos conduz à visada da falha, quando se demonstra que Um só se aguenta pela essência do significante” (LACAN, 1973/1985, p. 14) ao representar o sujeito para um outro significante. Portanto, “a falha exprime a vida da linguagem” (LACAN, 1976/2007, p. 144) e aponta para a divisão do sujeito. O desejo entra em atividade devido à perda de gozo, permitindo sua ação propulsora em função da castração. Embora desejo e gozo pareçam antinômicos, não há um sem o outro. O gozo que antecede à castração é o que permite o surgimento do desejo por meio da incidência do significante sobre o campo do real. Por sua vez, a dinâmica do desejo é o que pode circunscrever, assim como comandar ou delimitar, a ação do gozo.

Ao afirmar que a topologia do gozo é a topologia do sujeito, Lacan (1969/2008) enfatiza que é necessário “partir de que todo acesso ao gozo, de qualquer modo, é comandado pela topologia do sujeito” (LACAN, 1969/2008, p. 112). É no processo de subjetivação que o sujeito tenta recuperar a perda de gozo, efeito de linguagem. Só que “a função do gozo é, essencialmente, uma relação com o corpo” (LACAN, 1969/2008, p. 112). A relação do gozo com o corpo pode ser entendida pelo modo como “o efeito de linguagem se impõe ao corpo, pelo que cabe ao ideal, por um lado, e ao objeto a, por outro” (LACAN, 1970/2003, p. 310). Dito de outro modo, a relação do gozo com o corpo provém do efeito colonizador da linguagem sobre o sujeito. Ao instaurar a falta, deixa um resto de operação, o objeto a.

Essa hiância inscrita no estatuto mesmo do gozo enquanto diz-mansão do corpo, no ser falante, aí está o que torna a brotar com Freud por esse teste - não preciso dizer mais nada - que é a existência da fala. Aonde isso fala, isso goza. (LACAN, 1973/1986, p. 156).

A incidência do significante sobre o corpo, além de permitir a estruturação do sujeito, torna possíveis práticas de recuperação de gozo, pois é através do “objeto a que o gozo retorna” (LACAN, 1970/2003, p. 310). O objeto a torna-se assim a chave para compreender a tentativa do sujeito de buscar um complemento para sua falta no processo de imaginarização, afastando-se do campo do desejo. A dinâmica do gozo do corpo pode sinalizar o encaminhamento que o sujeito dá a seu gozo, esvaziando o desejo. Desse modo, “no que se refere ao gozo do corpo, enquanto ele é gozo da vida, a coisa mais espantosa é que esse objeto, pequeno a, separe esse gozo do corpo do gozo fálico” (LACAN, 1974, p. 9).

Queremos sublinhar a hipótese de que o gozo do corpo decorre da imaginarização, pois esse processo implica uma intensificação imaginária frente à demanda do Outro. “O inconsciente, é que o ser, falando, goze e, acrescento, não queira saber de mais nada” (LACAN, 1973/1985, p. 143). A conexão entre corpo e linguagem pode veicular uma fração de gozo que “se basta” (LACAN, 1963/2005, p. 140), que não se constitui como “um apelo ao Outro, não é aquilo que mostra ao Outro” (LACAN, 1963/2005, p. 140), esvaziando assim o valor do significante. Um gozo que se basta, ao não incluir o Outro do significante, parece destinar-se ao corpo próprio, determinando um lugar de objeto ao corpo: “[...] de um lado, o gozo é marcado por esse furo que não lhe deixa outra via senão a do gozo fálico. Do outro lado, será que algo pode ser atingido, que nos diria como aquilo que até aqui é só falha, hiância, no gozo, seria realizado?” (LACAN, 1973/1985, p. 16).

O fato de o gozo ser marcado por um furo proveniente do significante, o gozo fálico, não impede que haja uma tentativa de suprimir a falta; neste caso, por meio da imaginarização. Lacan ressalta “a passagem de um sujeito à sua própria divisão no gozo, e que ele o é ainda menos quando, essa divisão, ele a determina em disjunção” (LACAN, 1973/1985, p. 37). Com base nesse pensamento, podemos dizer que “o sujeito do inconsciente não é o único objeto em jogo” (BROUSSE, 2003), porque “o corpo falante também joga sua partida” (BROUSSE, 2003), na busca por se posicionar disjunto da divisão, quando há predomínio da imaginarização. O processo de imaginarização sinaliza a tentativa de eliminar a divisão. Ao imaginarizar o objeto a, torna-o uma suposta imagem de objeto de desejo, sendo o sujeito “causado por um objeto que não é aquilo que ele conhece - que ele imagina conhecer” (LACAN, 1975/1991, p. 32).

Inicialmente, “o corpo dever ser compreendido ao natural, como desenodado desse real, que por ex-sistir a ele, a título de fazer seu gozo, não lhe fica menos opaco” (LACAN, 1974, p. 9). Embora desenodado do real no momento precedente à entrada na linguagem, há um real êxtimo que conjuga “o íntimo com a exterioridade radical” (LACAN, 1969/2008, p. 241), indicando uma imbricação com o gozo do Outro corpo. Assim, “o importante é apreender como o organismo vem a ser apanhado na dialética do sujeito” (LACAN, 1960a/1998, p. 863) a partir da relação com o gozo.

O processo de imaginarização, tal como circunscrevemos aqui, parece útil na medida em que pode sinalizar o que acontece quando há predomínio do registro do imaginário no modo como o sujeito apreende seu organismo ou corpo vivente, indicando, sobretudo, como o sujeito lida com o traço de gozo ligado ao traço unário da linguagem. Isto porque “a marca como tal, o traço unário, aponta um suporte típico, isto é, imaginário” (LACAN, 1972/2012, p. 161). Uma vez que “o sujeito se reflete no traço unário, e no qual é somente a partir daí que ele se repete como eu ideal, tudo isso insiste justamente em que a identificação imaginária se efetua por uma marca simbólica” (LACAN, 1972/2012, p. 161). A intensificação imaginária, presente na noção de imaginarização, sinaliza um mal-estar que conduz o sujeito a sustentar-se no gozo do corpo. O processo de imaginarização pode evidenciar como o gozo do corpo do Outro repercute na dinâmica psíquica, em especial na contemporaneidade.

Gozo do corpo

A articulação de Lacan sobre o “corpo falante” (LACAN, 1973/1985), no último período de seu ensino, aponta para modos de gozo que se descortinam frente ao empobrecimento da ordem simbólica. A modalidade de gozo do corpo do Outro, por exemplo, pode lançar luz sobre o mal-estar com a falta, no processo de imaginarização, que surge travestido de pregnância imaginária na relação do sujeito com as demandas do Outro.

Desse modo, sublinhamos que a inserção do sujeito no campo da linguagem desvela tanto o que há de vida como o que o que há de morte, devido à perda sofrida na operação de castração. Nesse sentido, o corpo porta a marca do “incorpóreo” (LACAN, 1970/2003, p. 406) ao ser habitado pela fala, que aponta para o campo do significante.

Ao pensar o corpo em relação ao significante, demarcando as zonas erógenas como ilhas de gozo, Lacan (1970/2003) destaca a relação com a perda. Se o corpo pulsional é esvaziado de gozo em decorrência da castração, há acesso do corpo ao gozo como efeito da dinâmica do mais-de gozar, na tentativa de restituir o gozo perdido. Desse modo, “o sujeito busca um objeto que lhe reponha a perda de vida que lhe é própria, por ele ser sexuado” (LACAN, 1960a/1998, p. 863). No entanto, ao buscar repor a perda de vida por meio do processo de imaginarização, o sujeito pode creditar ao objeto perdido o objeto de desejo, que não diz respeito ao falo como significante representativo da falta, e sim ao objeto tomado como índice de preenchimento - complemento - da falta.

Em decorrência da imaginarização, o sujeito tenta uma “[...] relação com o que se trata de buscar na brecha da imagem especular original, i(a), ou seja, o objeto de seu desejo, a” (LACAN, 1963/2005, p. 50) ao deflacionar o significante, destituindo o Outro do significante. No entanto, “o a, suporte do desejo na fantasia, não é visível naquilo que constitui para o homem a imagem do seu desejo” (LACAN, 1963/2005, p. 51), tampouco é presentificável, o que pode conduzir ao engano, na medida em que tenta dar “corpo ao que, no objeto desse desejo, representa a imagem especular” (LACAN, 1963/2005, p. 51). Lacan acrescenta que “a é o que causa o desejo, isto quer dizer que ele não é o seu objeto. Ele não é o seu complemento” (LACAN, 1975/1991, p. 33). O manejo subjetivo em busca do objeto como complemento, na tentativa de abolir a divisão no processo de imaginarização, o conduz ao gozo do corpo do Outro.

O gozo do corpo é circunscrito “para além do falo” (LACAN, 1973/1985, p. 100), ou seja, para além da falta produzida pelo significante, e sinaliza um gozo fora da linguagem que responde ao regime do real pela via do imaginário. O gozo do corpo constitui-se assim como “o gozo do duplo, da imagem especular” (LACAN, 1976/2007, p. 55). Posto que o corpo se introduz na economia do gozo pela imagem (LACAN, 1974), como ressaltamos acima, é justamente a pregnância imaginária no discurso que pode indicar um modo de gozo, peculiar e recorrente na contemporaneidade.

Ao colocar em destaque o gozo do corpo, Lacan (1973/1985) sinaliza outra modalidade de gozo que indica o para além do sentido e aponta para o real sexual do inconsciente, a substância gozante, delineando regimes de gozo no discurso contemporâneo. A inscrição do significante, em sua vertente letra, não permite uma leitura através do sentido, posto que é “algo da ordem do escrito. Em muitos casos, não sabemos lê-lo” (LACAN, 1975/1985, p. 16). Desse modo, “tudo se passa como algo que estivesse escrito no corpo” (LACAN, 1975/1985, p. 16), comportando assim um aspecto de enigma. O corpo constitui-se a partir da inscrição da letra, cifra de gozo do Outro, que circunscreve a marca ao sustentar um gozo específico. É “a partir do momento em que se entende o que há de mais vivo ou de mais morto na linguagem, ou seja, a letra, é unicamente a partir daí que temos acesso ao real” (LACAN, 1974, p. 18) através do Um da relação sexual, que diz respeito ao gozo do Outro.

Lacan parte desse pressuposto: “na análise de qualquer um, por mais besta que ele seja, um certo real pode ser atingido” (LACAN, 1973/1985, p. 34), ao visar a substância do corpo naquilo que a define “apenas como aquilo de que se goza” (LACAN, 1973/1985, p. 35), ou seja, aquilo de que serve de gozo para o Outro. Gozar de um corpo que o Outro simboliza, colocando-se em função da substância gozante pela posição que o sujeito ocupa em relação ao objeto a (LACAN, 1973/1985) deve-se ao fato de que o sujeito enquanto tal “é solidário da cadeia significante, quer ele se apresente como uma cadeia articulada na fala ou articulada no sintoma, ou escrita alhures, ele é solidário de modo preciso” (SOLER, 2019, p. 22). O encaminhamento que o sujeito dá a seu gozo tem correspondência com a posição que ocupa em relação ao Outro.

O Outro do significante que surge como limite de gozo na constituição subjetiva também comanda o gozo, “que é marcado com toda ambiguidade significante” (LACAN, 1973/1986, p. 35), uma vez que o significante é também causa de gozo. O gozo pode retornar devido à posição do sujeito frente à fenda que o significante produziu. O significante causa ou comanda o gozo por meio da repetição de um traço de gozo associado ao traço unário, marca da divisão do sujeito pela inserção na linguagem. Contudo, é apenas na medida em que o gozo do Outro está fora da linguagem, fora do simbólico, que o sujeito tem acesso ao que há de morto na linguagem.

Gozar do corpo comporta uma manobra “subjetiva, que diz que em suma é o Outro que goza” (LACAN, 1973/1985, p. 36). “O que pensa, calcula e julga é o gozo, e, sendo o gozo do Outro, exige que o gozo Um, aquele que exerce a função do sujeito” (LACAN, 1972a/2003, p. 548), encarne a impotência pela via da função imaginária. Porém, “o gozo do Outro permanece vazio. Por oposição ao desejo, o gozo se sustenta do Um. Pode-se sonhar o gozo do Outro, mas o gozo está ligado ao corpo próprio, ao corpo do Um” (MILLER, 2003, p. 10). O sujeito torna-se superfície de gozo opaco do Outro pela identificação com o Um-imagem/corpo. O Um traduz a opacidade do gozo, um gozo solitário e impossível de enunciar, atrelado ao corpo próprio. Isto quer dizer que o sujeito se introduz na economia do gozo por meio da relação com seu corpo frente ao Outro e por ele marcado como limite e comando de gozo.

Nessa modalidade de gozo, o sujeito torna-se superfície de gozo do Outro, porque é o Outro que goza. Sublinhamos, então, que o gozo do corpo é tratado a partir de um excesso que reverbera da lógica do feminino ao distinguir-se do gozo fálico, marcado pelo significante da falta. A lógica do feminino é inscritível para “todo ser falante, como se formula expressamente na teoria freudiana, é permitido, qualquer que ele seja, quer ele seja ou não provido dos atributos da masculinidade” (LACAN, 1973/1985, p. ). Em consonância com Lacan, Porge (2006) refere-se às fórmulas da sexuação como modos de declaração da função fálica, afastando a ideia de uma suposta identidade que poderia dar um enquadramento fixo à condição de sujeito.

No texto Joyce, o Sintoma, Lacan (1975/2003) cria o neologismo falasser, tratando-o como provável substituto do inconsciente freudiano. Assim como na elaboração sobre a modalidade do gozo do corpo, Lacan compreende o gozo na articulação com o falasser que ultrapassa o sentido advindo da substituição de um significante por outro, na linguagem. Ele acrescenta que o sintoma do falasser é um “evento corporal” (LACAN, 1975/2003, p. 565), um acontecimento de corpo, um gozo específico decorrente da identificação com um traço de gozo, um significante desarticulado da cadeia

Embora não possamos afirmar que o termo falasser virá substituir o inconsciente freudiano, a noção de imaginarização parece-nos relevante para circunscrever o mecanismo do falasser, do corpo falante, tornando possível delinear o gozo do corpo pelo modo como o sujeito relaciona-se com o objeto a. O que o sujeito busca no corpo são os objetos a, objetos que medeiam sua relação com o Outro.

O “corpo-reifica” (LACAN, 1975/1985, p. 3) na relação que o sujeito mantém com o objeto a, colocando-se refém do gozo do Outro, esvaziando o valor do significante. “Agora, a ordem simbólica é reconhecida como um sistema de semblantes que não comanda o real, mas lhe é subordinada” (MILLER, 2015, p. 134). A partir dessa opacidade simbólica, podemos compreender o processo de apagamento subjetivo na imaginarização, ao ancorar-se na imagem, e, por fim, afirmar-se através do gozo do corpo.

Lacan alerta que o corpo contribui para o mal-estar na civilização (LACAN, 1974). É através do corpo que o sujeito se relaciona com o Outro, seja por meio do reconhecimento da ordem simbólica, na condição de poder assumir seu discurso, ou pela via da sujeição ao gozo do Outro através do apagamento da subjetividade. Ao questionar “de que nós temos medo?”, Lacan é enfático ao responder: “Do nosso corpo!” (LACAN, 1974, p. 16). E acrescenta “a angústia é justamente algo que se situa em outro lugar, em nosso corpo, é o sentimento que surge dessa suspeita que nos vem de nos reduzir ao nosso corpo” (LACAN, 1974, p. 16).

A expressão “em-corpo” [en-corps e encore] (LACAN, 1973/1985, p. 13) traduz a morte do corpo inerente à inserção do sujeito na linguagem e diz respeito ao “mais, ainda”, ao “A inda” do em-corpo, ou seja, o ainda do gozo do Outro por meio da repetição de uma cifra de gozo. Isto quer dizer que o Outro permanece, pela via da subordinação do sujeito ao gozo do corpo. “O corpo leva seus traços. Há traços no amuro” (LACAN, 1973/1985, p. 13). O muro aqui ilustra o corpo como superfície de gozo, “é o que aparece em signos bizarros no corpo” (LACAN, 1973/1985, p. 13) como marcas, cortes, simbolizando uma invasão do gozo do Outro. Com o (a)muro, Lacan (1972/2011) chama atenção para a importância da castração, a presença do objeto a. O em-corpo, além de destacar o efeito de linguagem sobre o corpo vivente, indica a relação do sujeito com o seu corpo (SOLER, 2019), o encaminhamento que o sujeito dá ao gozo.

A linguagem “corpsifica” (LACAN, 1970/2003, p. 407), marcando o lugar da perda de gozo no sujeito. Lacan define a incidência do gozo sobre o corpo como sintoma, o que indica um modo de funcionamento. Ao chamar atenção sobre o tipo de funcionamento do processo da imaginarização, visamos sublinhar a relação sujeito-objeto a, ou seja, a equivalência da imagem do objeto de desejo ao corpo, reificando-o, pois submetida ao imperativo do gozo. “O que o rodeia, ele o corpo-reifica, o faz coisa à imagem de seu corpo. Não tem a menor ideia, certamente, do que acontece neste corpo” (LACAN, 1975/1985, p. 3).

Em decorrência da busca por objetos de satisfação imediata, aparecem “regimes de gozo” (MILLER, 2011, p. 11), aos quais o sujeito adere. “A fragmentação psíquica foi tão incrementada hoje, em decorrência do excesso intensivo, que a conflitualidade, como possibilidade simbólica, não mais se sustenta” (BIRMAN, 2014, p. 133). Nesse contexto, o gozo pelo qual o sujeito se produz como dividido pode servir-lhe de estofo, à medida que se reduz a uma superfície ligada a seu corpo na tentativa de responder às demandas do Outro. A dinâmica do mais-de-gozar, que marca tanto o gozo perdido quanto os rastros de gozo, pode sinalizar a reificação do corpo no processo de imaginarização, conduzindo o sujeito ao excesso de gozo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, destacamos a dimensão que o corpo pode adquirir no processo de imaginarização devido à predominância do imaginário na relação do sujeito com o objeto a. Sublinhamos que o sujeito pode reduzir-se a seu corpo quando, ao tentar elidir a falta estrutural, imaginariza o objeto a, produzindo excesso de gozo. Além disso, chamamos atenção para as sobreposições de registros no nó borromeano, no intuito de recorrer “ao imaginário para se fazer uma ideia do Real” (LACAN, 1977, p. 9) através da circunscrição do gozo. Assinalamos que o corpo ganha destaque na imaginarização ao tornar-se o lugar do gozo do Outro, posto que o sujeito, ao reduzir-se ao corpo, não mais se diferencia do objeto do gozo do Outro.

Abordamos o processo de imaginarização para indicar que a intensificação do imaginário pode apontar para a operação de sujeição ao gozo do Outro, na qual sujeito e objeto se equivalem na redução ao corpo, fazendo desvanecer o sujeito. Ao buscar no objeto o complemento para a falta por meio da intensificação imaginária, característica do processo de imaginarização, elimina-se a função propulsora do objeto a causa de desejo. Essa tentativa de encontrar no objeto a o complemento para a falta pode levar o sujeito a sucumbir ao seu próprio gozo. Abre-se a via de se apresentar como objeto, ou satisfazer o gozo do Outro, levando o sujeito a renunciar a sua posição desejante. Enfatizamos o processo de imaginarização para indicar que o sujeito pode sacrificar sua castração em nome do gozo do Outro, em vez de suportar a posição desejante.

Circunscrever e delimitar a ideia de imaginarização é crucial por permitir articular a relação imaginária de complemento do objeto a à medida que deflaciona o valor do significante. A manobra do sujeito pode indicar a incidência do real sobre a dimensão do imaginário através do gozo, suscetível de produzir angústia. Propusemos uma leitura teórico-clínica que pode ajudar a compreender e manejar estados depressivos neuróticos, enfatizando a noção de imaginarização. Assim, pudemos destacar o enquadramento que o sujeito dá ao gozo, naquilo que ele pode ou não ser rebotalho no corpo.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    25 Abr 2021
  • Aceito
    24 Jan 2023
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