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INFLUÊNCIA DE GENÓTIPOS DE ALGODOEIRO SOBRE O DESENVOLVIMENTO E CAPACIDADE PREDATÓRIA DE NINFAS DE PODISUS NIGRISPINUS (DALLAS, 1851)1 1 Pesquisa financiada pela FAPESP.

INFLUENCE OF COTTON GENOTYPES ON DEVELOPMENT AND PREDATORY CAPACITY OF PODISUS NIGRISPINUS (DALLAS, 1851) NYMPHS

RESUMO

Estudou-se o desenvolvimento e capacidade predatória de ninfas de Podisus nigrispinus (Dallas, 1851) alimentadas com lagartas de Alabama argillacea (Hübner, 1818) criadas em folhas de algodoeiro dos genótipos CNPA Precoce 1, CNPA 9211-31, CNPA 9211-41 e GL2 GL3. A duração e a sobrevivência dos ínstares de P. nigrispinus não foram influenciadas pelos genótipos de algodoeiro oferecidos como alimento à sua presa A. argillacea. Durante a fase ninfal de P. nigrispinus, o consumo de lagartas de A. argillacea foi maior, 16,5 e 15,9, respectivamente, quando as ninfas foram alimentadas com lagartas criadas em folhas dos genótipos CNPA 9211-41 e CNPA 9211-31. O maior consumo pelo predador P. nigrispinus de lagartas de A. argillacea, criadas em folhas de algodoeiro dos genótipos resistentes, indicou compatibilidade entre a utilização de plantas resistentes e o controle biológico.

PALAVRAS-CHAVE:
Curuquerê-do-algodoeiro; predador; resistência de plantas; controle biológico; interação tritrófica.

ABSTRACT

The development and predatory capacity of Podisus nigrispinus (Dallas, 1851) nymphs fed on Alabama argillacea (Hübner, 1818) larvae reared on cotton genotypes CNPA Precoce 1, CNPA 9211-31, CNPA 9211-41 e GL2 GL3 were studied. The duration and survival of instars of P. nigrispinus nymphs were not influencied by cotton genotypes used to feed for the prey A. argillacea. During the nymphal phase of P. nigrispinus, the highest consumption of A. argillacea larvae, 16.5 and 15.9 was observed when nymphs fed on larvae reared on, respectivelly, CNPA 9211-41 and CNPA 9211-31 genotypes. It was observed compatibility between use of plant resistance and biological control since P. nigrispinus showed the highest consumption rate when was fed on A. argillacea larvae reared on resistant cotton genotypes leaves.

KEY WORDS:
Cotton leafworm; predator; plant resistance; biological control; tritrophic interaction.

INTRODUÇÃO

Na cultura do algodoeiro diversas espécies de predadores têm atuado como agentes no controle de ovos e lagartas de Alabama argillacea (Hübner,1818) merecendo destaque o percevejo Podisus nigrispinus (Dallas, 1851) (Hemiptera: Pentatomidae), considerado um eficiente inimigo natural, principalmente de lepidópteros. Estudos têm demonstrado que A. argillacea é uma presa adequada para o desenvolvimento de P. nigrispinus (SANTOS et al, 1995SANTOS, T.M.; SILVA, E.N.; RAMALHO, F.S. Desenvolvimento ninfal de Podisus connexivus Bergroth (Hemiptera: Pentatomidae) alimentado com curuquerê-do-algodoeiro. Pesq. Agropec. Bras., v.30, p.163-167, 1995., 1996) e de acordo com MEDEIROS et al. (1998)MEDEIROS, R.S. DE; LEMOS, W.P.; RAMALHO, F.S. Efeitos da temperatura no desenvolvimento de Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera, Pentatomidae), predador do curuquerê-do-algodoeiro (Lepidoptera: Noctuidae). Rev. Bras. Entomol., v.42, p.121-130, 1998. o controle de A. argillacea através desse predador, além de ser uma alternativa ecologicamente correta, é uma tática economicamente viável para o cotonicultor.

Em programas de manejo integrado de pragas a associação entre plantas resistentes a insetos e o controle biológico é considerada de importância e aplicabilidade (LARA, 1991LARA, F.M. Princípios de resistência de plantas a insetos. 2. ed. São Paulo: Icone, 1991. 336p.). No entanto, no Brasil poucos são os estudos relacionando a integração dessas duas táticas no controle de pragas. De acordo com TREACY et al. (1985)TREACY, M.F.; ZUMMO, G.R.; BENEDICT, J.H. Interactions of hostplant resistance in cotton with predators and parasites. Agric., Ecos. & Environ., v.13, p.151-157, 1985., no desenvolvimento e avaliação de cultivares resistentes, os pesquisadores deveriam considerar a interação planta-praga-inimigo natural para otimizar a resistência de plantas e estabelecer programas de proteção de plantas ecologicamente perfeitos.

Pesquisas têm demonstrado várias características da planta de algodoeiro que afetam o estabelecimento e o desenvolvimento de pragas, como por exemplo, pilosidade das folhas (CALHOUN et al., 1994CALHOUN, D.S.; JONES, J.E.; CALDWELL, W.D.; BURRIS, B.R.; MOORE, S.H.; AGUILLARD, W. Registration of La. 850082 FN and La. 850075 FHG, two cotton germplasm lines resistant to multiple insect pests. Crop Sci., v.34, p.316317, 1994.), presença de nectários extra-florais (WILSON & WILSON, 1976WILSON, R. L. & WILSON, F. D. Nectariless and glabrous cottons: effect on pink bollworm in Arizona. J. Econ. Entomol., v.69, n.5, p.623-624, 1976.) e teor de aleloquímicos nas várias partes da planta (ZUMMO et al., 1983ZUMMO, G.R.; BENEDICT, J.H.; SEGERS, J.C. No-choice study of plant-insect interactions for Heliothis zea (Boddie) (Lepidoptera: Noctuidae) on selected cottons. Environ. Entomol., v.12, p.1833-1836, 1983.). Essas características morfológicas, fisiológicas e/ou químicas da planta hospedeira podem reduzir ou melhorar a eficiência dos inimigos naturais no controle de suas presas (TREACY et al., 1985TREACY, M.F.; ZUMMO, G.R.; BENEDICT, J.H. Interactions of hostplant resistance in cotton with predators and parasites. Agric., Ecos. & Environ., v.13, p.151-157, 1985.).

O impacto de cultivares de algodoeiro com ausência de nectários extra-florais sobre os inimigos naturais de insetos-praga foi determinado por SCHUSTER et al. (1976)SCHUSTER, M.F.; LUKEFAHR, M.J.; MAXWELLL, F.G. Impact of nectariless cotton on plant bugs and natural enemies. J. Econ. Entomol., v.69, p.400-402, 1976. que observaram uma redução de 17 a 35% na população dos inimigos naturais Chrysoperla carnea (Stephens, 1836), Orius insidiosus Say, Coleomegilla maculata (De Geer) e Hippodamia convergens (Guerin-Meneville), Nabis spp. e sobre uma espécie de Diptera: Tachinidae.

Os efeitos de substâncias antibióticas de uma planta resistente pode passar do inseto fitófago para o predador (FARID et al., 1997FARID, A.; JOHNSON, J.B.; QUISENBERRY, S.S. Compatibility of a coccinellid predator with a Russian wheat aphid resistant wheat. J. Kansas Entomol. Soc., v.70, p.114-119, 1997.). Estudando os efeitos da antibiose sobre quatro níveis tróficos, ORR & BOETHEL (1986)ORR, D.B. & BOETHEL, D.J. Influence of plant antibiosis through four trophic levels. Oecologia, v.70, p.242-249, 1986. observaram que esse mecanismo de resistência influencia a biologia da praga e de seu inimigo natural. Esses autores verificaram que o desenvolvimento pré-imaginal do predador Podisus maculiventris (Say) foi afetado pela antibiose dos genótipos de soja, de maneira similar a sua presa, Pseudoplusia includens (Walker). RICE & WILDE (1989)RICE, M.E. & WILDE, G.E. Antibiosis effect of sorghum on the convergent lady beetle (Colepotera: Coccinellidae), a third-trophic level predator of the greenbug (Homoptera: Aphididae). J. Econ. Entomol., v.82, p.570573, 1989. verificaram maior período larval da joaninha H. convergens quando alimentada com o pulgão Schizaphis graminum (Rondani) criado em sorgo resistente.

Pesquisas têm sido conduzidas demonstrando a compatibilidade de plantas resistentes com o controle biológico. ISENHOUR et al. (1989)ISENHOUR, D.J.; WISEMAN, B.R.; LAYTON, R.C. Enhanced predation by Orius insidiosus (Hemiptera: Anthocoridae) on larvae of Heliothis zea and Spodoptera frugiperda (Lepidoptera: Noctuidae) caused by prey feeding on resistant genotypes. Environ. Entomol., v.18, p.418-422, 1989. determinando a taxa de predação de fêmeas adultas de O. insidiosus sobre as lagartas Spodoptera frugiperda (J. E. Smith) e Helicoverpa zea (Boddie) observaram que o genótipo resistente beneficiou o inimigo natural, causando um aumento na resposta funcional de O. insidiosus. FARID et al. (1997)FARID, A.; JOHNSON, J.B.; QUISENBERRY, S.S. Compatibility of a coccinellid predator with a Russian wheat aphid resistant wheat. J. Kansas Entomol. Soc., v.70, p.114-119, 1997. verificaram que a cultivar PI 137739 resistente ao pulgão Diuraphis noxia (Mordvilko) não causou impacto negativo no seu predador Scymnus frontalis (F.).

Considerando a importância da associação de resistência de plantas e controle biológico como tática no manejo integrado de pragas, os objetivos desta pesquisa foram avaliar o desenvolvimento de P. nigrispinus e a capacidade predatória desse inimigo natural quando alimentado com lagartas de A. argillacea criada em quatro genótipos de algodoeiros.

MATERIAL E MÉTODOS

Esta pesquisa foi desenvolvida no Laboratório de Resistência de Plantas a Insetos do Departamento de Fitossanidade da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal/UNESP, SP. Os predadores foram mantidos em câmaras climatizadas à temperatura de 25 ± 1 oC, 70 ± 10% de UR e 12 horas de fotofase.

Os espécimes do predador P. nigrispinus e lagartas de A. argillacea utilizados no estudo foram oriundos de criação massal seguindo-se a metodologia de SANTOS et al. (1996)SANTOS, T.M.; SILVA, E.N.; RAMALHO, F.S. Consumo alimentar e desenvolvimento de Podisus nigrispinus (Dallas) sobre Alabama argillacea (Huebner) em condições de laboratório. Pesq. Agropec. Bras., v.31, p.699-707, 1996.. Para a criação do predador foram utilizadas como presas larvas de Musca domestica L. e de Tenebrio molitor L.

Os tratamentos foram constituídos pelas lagartas de A. argillacea alimentadas com folhas dos genótipos de algodoeiro CNPA 9211-31 (alto teor de gossipol), CNPA 9211-41 (teor médio de gossipol), CNPA Precoce 1 (média pilosidade) e GL2 GL3 (sem gossipol). Cada parcela foi constituída de um pote plástico branco de 4,5 cm de altura e 7,5 cm de diâmetro, no interior do qual foram colocados as presas: lagartas de A. argillacea, e o predador P. nigrispinus. Na tampa de cada pote, através de um orifício de 1 cm de diâmetro, foi inserido um tubo de vidro de 2,5 mL do tipo anestésico contendo água. A extremidade aberta do tubo voltada para o interior do copo foi fechada com um chumaço de algodão para possibilitar o fornecimento de água aos predadores e manter a umidade relativa.

Na avaliação do desenvolvimento de P. nigrispinus, ninfas de segundo ínstar foram individualizadas e diariamente foram oferecidas como presas, seis lagartas de quarto ínstar de A. argillacea alimentadas com folhas dos genótipos de algodoeiro, avaliando-se o número de ínstares, duração e viabilidade de cada ínstar; peso das ninfas 24 horas após cada ecdise e duração e viabilidade do estádio ninfal.

Para a determinação da capacidade predatória individualizou-se ninfas do predador de segundo ínstar e diariamente foram fornecidas a cada ninfa de P. nigrispinus sete lagartas de A. argillacea de quarto ínstar as quais foram alimentadas com folhas dos quatro genótipos de algodoeiro. Após o período de 24 horas, as lagartas foram retiradas, considerando-se como predadas, aquelas que apresentaram lesões no tegumento, ausência de mobilidade e o conteúdo do corpo total ou parcialmente sugado pelo predador. Determinou-se o número de lagartas de A. argillacea predadas por P. nigrispinus durante cada ínstar e fase ninfal.

Em ambas as avaliações utilizou-se o delineamento experimental inteiramente casualizado, com 20 repetições por tratamento. Os dados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Aspectos biológicos de P. nigrispinus

A duração e sobrevivência das ninfas de P. nigrispinus nos seus ínstares não foram influenciadas pelos genótipos de algodoeiro oferecidos como alimento à sua presa, A. argillacea (Tabela 1).

Tabela 1
Duração (dias) e sobrevivência (%) médias dos instares de P. nigrispinus quando alimentado com lagartas de A. argillacea criadas com folhas de genotipos de algodoeiro à 25 ± 1 °C, UR de 70 ± 10% e fotofase de 12 horas.

O segundo ínstar do predador apresentou intervalo de variação de 3,0 a 3,4 dias. Resultados similares foram obtidos por SANTOS et al. (1995)SANTOS, T.M.; SILVA, E.N.; RAMALHO, F.S. Desenvolvimento ninfal de Podisus connexivus Bergroth (Hemiptera: Pentatomidae) alimentado com curuquerê-do-algodoeiro. Pesq. Agropec. Bras., v.30, p.163-167, 1995. de 3,0 dias e MEDEIROS et al. (1998)MEDEIROS, R.S. DE; LEMOS, W.P.; RAMALHO, F.S. Efeitos da temperatura no desenvolvimento de Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera, Pentatomidae), predador do curuquerê-do-algodoeiro (Lepidoptera: Noctuidae). Rev. Bras. Entomol., v.42, p.121-130, 1998. de 3,7 dias, estudando o desenvolvimento ninfal dessa mesma espécie de percevejo alimentado com lagartas de A. argillacea. No entanto, OLIVEIRA (2000)OLIVEIRA, J.E. DE M. Desenvolvimento e reprodução de Podisus nigrispinus (Heteroptera: Pentatomidae) em plantas de algodão e de tomate e seu potencial para o controle de Alabama argillacea (Lepidoptera: Noctuidae). Recife: 2000. 96p. [Dissertação (Mestrado em Fitossanidade) - Universidade Rural de Pernambuco]. verificou uma duração média de 4,0 dias para esse ínstar quando ninfas de P. nigrispinus foram alimentadas com lagartas de A. argillacea criadas em folhas de algodoeiro do genótipo CNPA Precoce 1. O porcentual de ninfas sobreviventes durante este ínstar foi alto, variando de 90,0 a 100,0% (Tabela 1).

O terceiro ínstar durou em média 2,8 a 3,1 dias, com porcentual de sobrevivência variando de 90,0 e 100,0% (Tabela 1), valores próximos a aqueles observados por SANTOS et al. (1995)SANTOS, T.M.; SILVA, E.N.; RAMALHO, F.S. Desenvolvimento ninfal de Podisus connexivus Bergroth (Hemiptera: Pentatomidae) alimentado com curuquerê-do-algodoeiro. Pesq. Agropec. Bras., v.30, p.163-167, 1995. e MEDEIROS et al. (1998)MEDEIROS, R.S. DE; LEMOS, W.P.; RAMALHO, F.S. Efeitos da temperatura no desenvolvimento de Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera, Pentatomidae), predador do curuquerê-do-algodoeiro (Lepidoptera: Noctuidae). Rev. Bras. Entomol., v.42, p.121-130, 1998. para ninfas de P. nigrispinus alimentadas com lagartas de A. argillacea.

O quarto e quinto ínstares de P. nigrispinus apresentaram intervalo de duração de 3,1 a 3,3 dias e 5,2 a 5,5 dias, respectivamente (Tabela 1). Valores superiores foram observados por OLIVEIRA (2000)OLIVEIRA, J.E. DE M. Desenvolvimento e reprodução de Podisus nigrispinus (Heteroptera: Pentatomidae) em plantas de algodão e de tomate e seu potencial para o controle de Alabama argillacea (Lepidoptera: Noctuidae). Recife: 2000. 96p. [Dissertação (Mestrado em Fitossanidade) - Universidade Rural de Pernambuco]. para a mesma espécie de predador alimentado com lagartas de A. argillacea. Ninfas de quarto ínstar apresentaram 100,0% de sobrevivência quando alimentadas com lagartas de A. argillacea criadas nos algodoeiros de diferentes genótipos.

Durante o quinto ínstar desse predador, o porcentual de sobrevivência foi de 93,8 a 100,0% (Tabela 1). Esses resultados foram semelhantes àqueles verificados por SANTOS et al. (1995)SANTOS, T.M.; SILVA, E.N.; RAMALHO, F.S. Desenvolvimento ninfal de Podisus connexivus Bergroth (Hemiptera: Pentatomidae) alimentado com curuquerê-do-algodoeiro. Pesq. Agropec. Bras., v.30, p.163-167, 1995. estudando a biologia de P. nigrispinus alimentados com lagartas de A. argillacea criadas em folhas de algodoeiro CNPA Precoce 1.

De uma maneira geral o porcentual de sobrevivência de P. nigrispinus (Tabela 1) foi elevado até mesmo quando as ninfas foram alimentadas com lagartas de A. argillacea criadas em folhas de algodoeiro dos genótipos CNPA 9211-41 e CNPA 9211-31, respectivamente, com teores médio e elevado de gossipol, que de acordo com SANTOS (2001)SANTOS, T. M. DOS Influência de genótipos de algodoeiro sobre Alabama argillacea (Hübner, 1818) (Lep.: Noctuidae) e seu predador Podisus nigrispinus (Dallas, 1851) (Hem.: Pentatomidae). Jaboticabal: 2001. 111p.[Tese (Doutorado) - Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias/ UNESP]. são resistentes a A. argillacea. O gossipol ocorre naturalmente nas plantas do gênero Gossypium e tem demonstrado efeito supressor sobre populações de alguns insetos em algodoeiro (MEISNER et al., 1977MEISNER, J.; ZUR, M.; KABONCI, E.; ASCHER, R.S. Influence of gossypol content of leaves of different cotton strains on the development of Spodoptera litoralis larvae. J. Econ. Entomol., v.70, p.714-6, 1977.). Essa substância proporciona resistência do tipo não-preferência contra certas espécies de insetos-pragas (PARROT, 1990PARROT, W.L. Plant resistance to insects in cotton. Fla. Entomol., v.73, p.392-396, 1990.) e antibiose, promovendo aumento da mortalidade de lagartas de algumas espécies de lepidópteros (ZUMMO et al., 1983ZUMMO, G.R.; BENEDICT, J.H.; SEGERS, J.C. No-choice study of plant-insect interactions for Heliothis zea (Boddie) (Lepidoptera: Noctuidae) on selected cottons. Environ. Entomol., v.12, p.1833-1836, 1983.). No entanto, esse aleloquímico não influenciou negativamente o terceiro nível trófico, representado por P. nigrispinus, predador de A. argillacea. Esse fato é um indicativo da possibilidade do uso integrado de plantas resistentes à A. argillacea e o controle biológico efetuado por P. nigrispinus em um programa de manejo integrado de pragas em algodoeiro.

Os genótipos CNPA Precoce 1, CNPA 9211-41, CNPA 9211-31 e GL2 GL3 quando oferecidos como alimento às lagartas de A. argillacea, presa das ninfas de P. nigrispinus, não influenciaram o peso médio desse predador durante o terceiro, quarto e quinto ínstares (Fig. 1). O intervalo de variação para essa variável foi, respectivamente, de 8,1 a 9,2 mg, de 24,7 a 27,1 mg e de 47,8 a 52,9 mg, durante o terceiro, quarto e quinto ínstares de P. nigrispinus. Esses resultados concordam com aqueles obtidos por ORR & BOETHEL (1986)ORR, D.B. & BOETHEL, D.J. Influence of plant antibiosis through four trophic levels. Oecologia, v.70, p.242-249, 1986. que verificaram que o peso cumulativo ganho por ninfas de P. maculiventris alimentadas com lagartas de P. includens criadas com folhas de soja resistente foi significativamente semelhante àquelas ninfas que consumiram lagartas criadas em folhas de soja de genótipo suscetível.

Fig. 1
Peso médio de ninfas de 3o, 4o e 5o ínstares de P. nigrispinus alimentadas com lagartas de A. argillacea criadas com folhas de genótipos de algodoeiro à 25 ± 1 oC, UR de 70 ± 10% e fotofase de 12 horas.

Os genótipos de algodoeiro oferecidos com alimento as lagartas de A. argillacea influenciaram indiretamente a duração da fase ninfal de P. nigrispinus (Fig. 2). Ninfas do predador que consumiram lagartas de A. argillacea criadas em folhas de algodoeiro do genótipo CNPA 9211-41, apresentaram duração da fase ninfal de 15,1 dias, estatisticamente semelhante as ninfas que consumiram lagartas alimentadas com folhas do algodoeiro CNPA 9211-31. No entanto, aquele valor foi superior ao período daquelas ninfas que alimentaram-se de lagartas criadas nos genótipos CNPA Precoce 1 e GL2 GL3 (Fig. 2). Nesse caso, o prolongamento da fase ninfal de P. nigrispinus possibilitou o predador a se alimentar de mais lagartas, favorecendo o controle biológico de A. argillacea.

Fig. 2
Duração (dias) e sobrevivência (%) médias da fase ninfal de P. nigrispinus alimentado com lagartas de A. argillacea criadas com folhas de genótipos de algodoeiro à 25 ± 1oC, UR de 70 ± 10% e fotofase de 12 horas.

O porcentual de ninfas sobreviventes não foi influenciado pelos genótipos de algodoeiro, sendo o percentual mínimo observado de 85,0 e o máximo, de 100,0% (Fig. 2).

Capacidade predatória de P. nigrispinus

O número médio de lagartas de A. argillacea predadas por ninfas de segundo ínstar de P. nigrispinus foi influenciada pelos genótipos de algodoeiro, nos quais foram criadas a sua presa A. argillacea (Fig. 3). As ninfas que alimentaram-se de lagartas criadas em folhas do genótipo CNPA 9211-41 consumiram em média 2,5 lagartas durante o segundo ínstar. Esse valor é semelhante ao consumo (2,3) das ninfas alimentadas com lagartas criadas com folhas do genótipo CNPA 9211-31 e significativamente superior ao consumo das ninfas alimentadas com lagartas criadas em folhas dos genótipos GL2 GL3 e CNPA Precoce 1. As lagartas que se alimentaram dos genótipos CNPA 9211-41 e CNPA 9211-31 eram de tamanho reduzido devido a esses materiais apresentarem teores médio e alto de gossipol, respectivamente. De acordo com ZUMMO et al. (1983)ZUMMO, G.R.; BENEDICT, J.H.; SEGERS, J.C. No-choice study of plant-insect interactions for Heliothis zea (Boddie) (Lepidoptera: Noctuidae) on selected cottons. Environ. Entomol., v.12, p.1833-1836, 1983., essa substância promove redução no desenvolvimento e tamanho larval de alguns lepidópteros. Esse fato explica o maior número de lagartas consumidas pelas ninfas do predador durante esse estágio. O fator de resistência da planta pode ser associado positivamente à ação do inimigo natural, pois o gossipol atuou negativamente apenas sobre a praga, afetando o seu desenvolvimento. O predador em consequência, alimentou-se em maior quantidade daquelas presas que sofreram a ação dos genótipos de algodoeiro resistente (CNPA 9211-31 e CNPA 9211-41).

Fig. 3
Número médio de lagartas de A. argillacea predadas por P. nigrispinus durante o 2o, 3o, 4o e 5o ínstares à 25 ± 1oC, UR de 70 ± 10% e fotofase de 12 horas.

No entanto, durante o terceiro, quarto e quinto ínstares de P. nigrispinus, o número de lagartas predadas não foi influenciado pelos genótipos de algodoeiro (Fig. 3). Esse predador consumiu de 2,0 a 2,5; 2,8 a 3,8 e de 6,9 a 8,0 lagartas de A. argillacea, respectivamente, no terceiro, quarto e quinto ínstares. Esses valores foram semelhantes a aqueles observados por OLIVEIRA (2000)OLIVEIRA, J.E. DE M. Desenvolvimento e reprodução de Podisus nigrispinus (Heteroptera: Pentatomidae) em plantas de algodão e de tomate e seu potencial para o controle de Alabama argillacea (Lepidoptera: Noctuidae). Recife: 2000. 96p. [Dissertação (Mestrado em Fitossanidade) - Universidade Rural de Pernambuco]. para ninfas de terceiro, quarto e quinto ínstares de P. nigrispinus alimentadas com curuquerê-do-algodoeiro criadas em folhas de algodoeiro do genótipo CNPA Precoce 1.

Durante a fase ninfal de P. nigrispinus, o número médio de lagartas predadas por esse percevejo foi influenciado pelos genótipos de algodoeiro (Fig. 4). O consumo médio foi significativamente maior (16,5 e 15,9 lagartas) quando as ninfas foram alimentadas, respectivamente, com lagartas de A. argillacea criadas em folhas de algodoeiro dos genótipos CNPA 9211-41 e CNPA 9211-31, apresentando, respectivamente, teores altos e médios de gossipol. Esse resultado pode ser relacionado ao efeito da antibiose ou não-preferência dos genótipos, que afetaram o desenvolvimento e causaram menores tamanhos das lagartas de A. argillacea. Dessa maneira, as ninfas do predador consumiram maior número de lagartas de A. argillacea criadas com folhas de algodoeiro desses dois genótipos quando comparada àquelas que se alimentaram de lagartas criadas com folhas do genótipo suscetível, GL2 GL3, que têm como característica a ausência de gossipol.

Fig. 4
Número médio de lagartas de A. argillacea predadas por P. nigrispinus durante a fase ninfal à 25 ± 1oC, UR de 70 ± 10% e fotofase de 12 horas.

O maior consumo de lagartas de A. argillacea criadas com folhas de algodoeiro de genótipos resistentes, pelo predador P. nigrispinus, indica compatibilidade entre a utilização de plantas resistentes e o controle biológico, uma vez que o predador complementa o efeito da resistência.

CONCLUSÕES

  1. A sobrevivência durante os ínstares e fase ninfalde P. nigrispinus é elevada quando o predador se alimenta de lagartas de A. argillacea criadas com folhas de algodoeiro dos genótipos CNPA 9211-41, CNPA 921131, CNPA Precoce 1 e GL2 GL3.

  2. Durante a fase ninfal de P. nigrispinus, o consumo médio de lagartas de A. argillacea é maior quando as ninfas são alimentadas com lagartas dessa espécie criadas em folhas dos genótipos CNPA 9211-41 e CNPA 9211-31.

  3. O maior consumo de lagartas de A. argillacea criadas com folhas de algodoeiro de genótipos resistentes, pelo predador P. nigrispinus, indica compatibilidade entre a utilização de plantas resistentes e o controle biológico.

AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela Bolsa de Produtividade em Pesquisa concedida ao primeiro autor e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela concessão da bolsa ao segundo autor.

  • 1
    Pesquisa financiada pela FAPESP.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • CALHOUN, D.S.; JONES, J.E.; CALDWELL, W.D.; BURRIS, B.R.; MOORE, S.H.; AGUILLARD, W. Registration of La. 850082 FN and La. 850075 FHG, two cotton germplasm lines resistant to multiple insect pests. Crop Sci., v.34, p.316317, 1994.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2002

Histórico

  • Recebido
    21 Set 2001
  • Aceito
    20 Jan 2002
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