BIOLOGIA E DANOS DE OLIGONYCHUS YOTHERSI (MCGREGOR) (ACARI: TETRANYCHIDAE) EM ILEX PARAGUARIENSIS^*

BIOLOGY AND DAMAGE OF OLIGONYCHUS YOTHERSI (MCGREGOR) (ACARI: TETRANYCHIDAE) ON ILEX PARAGUARIENSIS

RESUMO

O estudo da biologia do ácaro vermelho (Oligonychus yothersi) foi realizado no Laboratório de Zoologia da UNIOESTE, Campus de Cascavel, utilizando ácaros provenientes de uma criação de manutenção mantida a 26º C e 14 horas de fotofase. Todas as características biológicas do ácaro foram obtidas em folhas de erva-mate (Ilex paraguariensis), coletadas em lavoura comercial. Discos foliares com 2,2 cm² contendo apenas um ovo do ácaro-vermelho foram mantidos a 26º C e fotofase 14 horas. As avaliações foram feitas duas vezes ao dia até a morte do indivíduo. Constatou-se que a duração média do estágio imaturo foi de aproximadamente 11 dias para machos e de 10 dias para fêmeas, havendo uma diferença significativa entre ambos os sexos, sendo esta mesma tendência observada em relação à duração do ciclo total (incluindo-se a longevidade dos adultos). Nas observações no campo, verificou-se que os ácaros são encontrados na superfície adaxial das folhas e, em relação aos danos, contatou-se uma evolução gradativa de pontos necróticos arroxeados, evoluindo para manchas escuras. As folhas danificadas se tornaram encarquilhadas e com os bordos voltados para baixo. Surgiram depressões na superfície adaxial, onde se concentravam os ácaros. Além disso, verificou-se retardamento no desenvolvimento foliar e sua queda precoce coincidindo com o aumento gradativo da população de ácaros nas folhas.

PALAVRAS-CHAVE:
Biologia; ácaro; erva-mate; Oligonychus yothersi.

ABSTRACT

The biology of the red spider mite Oligonychus yothersi (McGregor) was studied at Laboratório de Zoologia, Unioeste, Cascavel, State of Paraná, Brazil. Mites were taken from a laboratory stock colony on Paraguay tea leaves (Ilex paraguariensis) (St. Hil.). Leaf-discs were infested with adult females for oviposition, and after 24 hours only one egg was left on each disc. The study was carried out at 26º C and 14:10 hours of light:dark. Mites were evaluated twice daily. The duration of the immature phase was significativaly longer for males (11 days) than for females (10 days). Damage assessment was conduced on plants of a commercial area, where attacked leaves showed initially small purple spots on the dorsal surface along the central leaf vein but mostly at its base. The spots later coalesced, forming necrotic areas. The damaged leaves became wrinkled with the border turning down. Great numbers of mites at all life stages, exuviae and webbing were observed at scattered depressions on the upper leaf surface. The infestation affected leaf development; most of the infested leaves remained smaller than non-infested ones and dropped off prematurely.

KEY WORDS:
Biology; mite; tea; Oligonychus yothersi.

INTRODUÇÃO

A erva-mate, Ilex paraguariensis St. Hil. (Aquifoliaceae) é uma planta umbrófila típica das regiões subtropicais e temperadas da América do Sul, encontrada no Brasil principalmente nos estados da região Sul, ocorrendo nas formações vegetais naturais, principalmente florestas de araucária (ANUÁRIO BRASILEIRO DA ERVA-MATE, 1999; MAZUCHOWSKI et al., 2000).

As folhas e hastes desta planta são beneficiadas para o preparo da "erva" utilizada no chimarrão e tererê, chás, pós-solúveis e refrescos e, com potencial de uso como matéria-prima para a indústria de vernizes, desinfetantes etc. (MAZUCHOWSKI et al., 2000).

O Brasil, segundo maior produtor mundial, possui uma área cultivada com erva-mate de aproximadamente 700.000 ha, sendo o Estado do Paraná o maior produtor. Sua exploração constitui-se em uma atividade agrícola de grande importância econômica, sociocultural e ambiental, pois é a principal atividade econômica de muitos municípios, gerando milhares de empregos diretos e indiretos em toda a cadeia produtiva (ANUÁRIO BRASILEIRO DA ERVA-MATE, 1999).

Após a década de 1970, a expansão das fronteiras agrícolas na região Sul do Brasil fez com que as formações naturais fossem substituídas e muitos ervais nativos desapareceram, levando à escassez de matériaprima. Isso fez com que a erva-mate se transformasse em uma cultura intensiva, em regime de monocultura, diferente do ambiente no qual evoluiu e se adaptou. Dessa forma, as características naturais do seu ecossistema foram alteradas, sendo a densidade de plantas aumentada e a diversidade biológica diminuída nas regiões de plantio (IEDE, 1985; PENTEADO, 1995).

Nesta nova condição, sob constante desequilíbrio, muitos problemas de ordem fitossanitária passaram a ocorrer nas lavouras, com destaque para os insetos e ácaros. Em função do agravamento da situação, os estudos entomológicos avançaram, sendo conhecidas diversas espécies de pragas que ocorrem praticamente em todas as regiões produtoras. Especificamente, em relação aos ácaros fitófagos, destacam-se três espécies na cultura: ácaro-do-bronzeado (Dichopelmus notus Keifer, 1960; Eryophiidae), ácaro-vermelho (Oligonychus yothersi (McGregor, 1914); Tetranychidae) e ácaro-branco (Polyphagotarsonemus latus (Banks, 1904; Tarsonemidae). Os dois primeiros são mais comumente encontrados no campo, enquanto último é mais freqüente nos viveiros de mudas (SANTANA et al., 1997).

De acordo com FLECHTMANN (1979) e SANTANA et al. (2000), os ácaros danificam as plantas durante a alimentação, quando destroem os tecidos ou inoculam toxinas nas folhas. Além disso, no caso específico da erva-mate, CHIARADIA & MILANEZ (1998) sugeriram a possibilidade de entrada de fungos fitopatogênicos nas áreas danificadas, visto que isolaram tais microrganismos das áreas necróticas de folhas desta planta.

No Brasil, a despeito da importância da cultura e também das pragas, poucos estudos detalhados sobre tais espécies de ácaros têm sido realizados. Neste sentido, foi desenvolvido um estudo visando conhecer alguns aspectos da biologia do ácaro-vermelho, em condições de laboratório, e acompanhar a sintomatologia dos danos na planta de erva-mate no campo.

MATERIAL E MÉTODOS

Biologia sobre folhas de erva-mate

A biologia de O. yothersi foi conduzida no Laboratório de Zoologia da UNIOESTE, Campus de Cascavel, adaptando-se a metodologia utilizada por OLIVEIRA et al. (2002), partindo-se de uma criação estoque do ácaro mantida a 25 ± 1º C e 14 horas de fotofase. Originalmente, os ácaros foram obtidos de folhas de erva-mate coletadas cerca de 5 meses antes do início deste trabalho, de lavoura comercial não pulverizada localizada próximo ao Campus da UNIOESTE.

Grupos de 15 fêmeas adultas e acasaladas foram transferidos para a superfície adaxial de cada 1 de 100 discos foliares de erva-mate com 2,2 cm² colocados em caixas de acrílico de 3 cm de diâmetro contendo água destilada. Os discos com as fêmeas foram mantidos em câmara B.O.D. (25 ± 1º C e 14 horas de fotofase) durante 24 horas para oviposição. Em seguida, as fêmeas e os ovos foram retirados, deixando apenas um deles em cada disco. Diariamente procedeu-se à observação dos ovos às 8h e às 17h, até que ocorresse a eclosão das larvas.

Estas foram então transferidas para novos discos foliares, sendo observadas diariamente nos horários mencionados para determinar a duração dos períodos de desenvolvimento e o processo de reprodução. A cada 4 dias os ácaros foram transferidos para novos discos foliares.

Os dados obtidos foram analisados quanto à variância, por meio do teste F e as médias foram comparadas entre si pelo teste de Tukey, ambos com 5% de significância, utilizando-se o programa estatístico SANEST.

Descrição dos danos

Este estudo foi realizado em um erval comercial localizado próximo a UNIOESTE, Campus de Cascavel, formado por plantas com porte baixo e médio (1,5 a 2,5 m de altura) e com idade entre 3 e 5 anos, onde nenhuma aplicação de produtos fitossanitários era realizada.

As observações tiveram início em setembro de 1999, logo após a brotação da primavera, sendo realizadas diariamente no período da manhã, durante 30 dias.

Para tal estudo, foram escolhidas quatro plantas semelhantes entre si quanto ao porte. Em cada uma das plantas foram marcadas algumas folhas que foram observadas com uma lupa de mão de 20 vezes de aumento, em busca da presença do ácaro, além de se acompanhar a evolução da sintomatologia dos danos no limbo foliar.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Biologia

Os ovos de O. yothersi são vermelhos e globosos e, conforme a descrição de DE COLL & SAINI (1992), apresentam-se pedicelados. A duração média do período de incubação foi de aproximadamente 4,9 dias não havendo diferença significativa neste parâmetro entre machos e fêmeas (Tabela 1).

As larvas recém-eclodidas são de coloração uniforme vermelho-alaranjada, passando ao vermelho na fase ninfal com manchas escuras na parte final do idiossoma, que se acentuam na fase adulta, sendo a duração desta fase significativamente maior para os machos (2,7 dias) que para as fêmeas (2,1 dias).

Não houve diferença significativa entre machos e fêmeas, quanto à duração da fase de protoninfa, mas o estágio de deutoninfa foi significativamente maior para as fêmeas (2,1 dias).

O adulto apresenta coloração vermelhoalaranjada, com a porção final do corpo mais escura, tendendo ao roxo. Os machos são mais ativos que as fêmeas.

Constatou-se que a duração média da fase imatura foi de 11 dias para os machos e de 16 dias para as fêmeas. Além disso, a longevidade, tanto de machos com de fêmeas foi próxima de 6 dias, não havendo diferença estatística entre ambos.

Tabela 1
Duração em dias, dos estágios de desenvolvimento do ácaro vermelho da erva-mate, Oligonychus yothersi, em folha de erva-mate (25 ± 1° C e fotofase de 14 horas)

Parâmetro Biológico	macho1,2	n3	fêmea1,2	n3
Ovo	4,9 ± 0,2a	32	4,9 ± 0,2 a	48
Larva	2,8 ± 0,7 a	32	2,1 ± 0,7 b	48
protoninfa	1,8 ± 0,5 a	32	1,8 ± 0,5 a	48
deutoninfa	1,7 ± 0,5 a	32	2,1 ± 0,4 b	47
Adulto	6,1 ± 1,9 a	24	6,1 ± 1,5 a	38

• ¹
  média ± DP;
• ²
  numa mesma linha, médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si ao nível de 5% de significância pelo teste de Tukey;
• ³
  número de observações.

Verificou-se ainda que as fêmeas obtidas nos discos, ainda que virgens, realizaram a oviposição, gerando apenas machos, constatando-se assim a ocorrência de partenogênese arrenótoca.

DE COLL & SAINI (1989) estudaram na Argentina a biologia desta espécie de ácaro em folhas de erva-mate e constataram que em condições controladas (sem mencionar os valores) a duração média do período de desenvolvimento de larva a adulto foi de 14 dias. Por outro lado, OROZCO-HOYOS et al. (1990) encontraram para a mesma espécie de ácaro, porém em folhas de café, uma duração de 12,9 dias para o ciclo de ovoadulto na temperatura de 25º C e de 11,7 dias para desenvolvimento a 30º C.

A ocorrência de partenogênese arrenótoca também foi constatada por CALZA & SAUER (1952) em um estudo de biologia de O. ilicis. Contudo, HEINRICH (1972) observou que a progênie de fêmeas nãoacasaladas da mesma espécie foi constituída apenas por fêmeas (partenogênese telítoca). FLECHTMANN & FLECHTMANN (1982) observaram a ocorrência dos dois tipos de partenogênese, para diferentes fêmeas de O. ilicis de uma mesma população. Mais recentemente, REIS et al. (1997) realizaram um estudo da biologia de O.ilicis, obtendo resultados semelhantes aos deste trabalho, no que se refere à duração das diferentes fases de desenvolvimento. Entretanto, estes mesmos autores verificaram apenas a ocorrência de partenogênese telítoca em O. ilicis.

Descrição dos danos

Os primeiros danos observados nas folhas foram pontuações de coloração roxo-avermelhado na face adaxial, próximas à base da nervura central. Com o passar do tempo, estas pontuações se coalesceram e estes danos se estenderam ao longo de toda a nervura central e das nervuras adjacentes, indicando o surgimento de necrose nos tecidos. Foram observadas também deformações nos bordos das folhas, que se tornaram retorcidas.

Após 30 dias, a população do ácaro era visivelmente maior, concentrada na superfície adaxial. Observou-se então a dispersão do ácaro para outras partes não atacadas das plantas, assim como para outras plantas vizinhas, não atacadas, bem como foi crescente o número de folhas danificadas, as quais apresentavam-se com muitas manchas e teias na superfície adaxial, indicando o crescimento populacional do ácaro.

SILVA et al. (2001), estudando, em condições de laboratório o comportamento de O. yothersi, observaram que esta espécie apresenta significativa preferência pela superfície adaxial, aí se concentrando para alimentação e oviposição.

As folhas atacadas continuavam a crescer, embora encarquilhadas e algumas com os bordos voltados para baixo. Os ácaros passaram a concentrar-se nas depressões formadas na superfície das folhas, onde era possível observar indivíduos em diferentes estágios de desenvolvimento, exúvias e teia produzida pelo ácaro, uma característica comum das espécies de Oligonichus (Reckiella) (JEPPSON et al., 1975).

Quando chegam próximo à maturação, as folhas danificadas apresentam-se escuras e geralmente caem precocemente, antes de sua senescência natural.

AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr. Noeli Juarez Ferla, UNIVATES, pela motivação e leitura crítica do texto. À Fundação Araucária, pelo auxílio financeiro para a execução deste trabalho.

• *
  Trabalho realizado com auxílio financeiro da Fundação Araucária

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Jun 2024
• Data do Fascículo
  Apr-Jun 2004

Histórico

• Recebido
  17 Mar 2004
• Aceito
  27 Abr 2004