Open-access IMPORTÂNCIA DAS MICOPLASMOSES NA FERTILIDADE DE TOUROS

IMPORTANCE OF MYCOPLASMA BOVIS, M. BOVIGENITALIUM AND UREAPLASMA DIVERSUM IN THE FERTILITY OF BULLS

RESUMO

O estudo das micoplasmoses da reprodução em bovinos tem apresentado resultados indicativos de que estas enfermidades estão presentes na rotina dos veterinários de campo brasileiros e podem estar acarretando perdas econômicas significativas aos produtores rurais. Micoplasmas e ureaplasmas podem causar orquite, vesiculite seminal, balanopostite e epididimite em touros com conseqüente perda da qualidade seminal e capacidade de fertilização. Esta revisão apresenta informações específicas sobre o assunto, favorecendo a pesquisa dos interessados na área.

PALAVRAS-CHAVE:  Mycoplasma ; Ureaplasma ; micoplasmoses; touros; bovinos; fertilidade.

ABSTRACT

The study of the reproductive mycoplasmosis in cattle has been presenting results wich indicate that these illnesses are present in the routine of the Brazilian field veterinarians and that it can be resulting in significant economic losses for the producers. Mycoplasmas and ureaplasmas can cause orchitis, seminal vesiculitis, balanoposthitis and epididymitis in bulls with consequent loss of the seminal quality and fertilization capacity. This review presents specific information on the subject, favoring research in the area.

KEY WORDS:  Mycoplasma ; Ureaplasma ; mycoplasmosis; bulls; bovine; fertility.

Várias são as doenças infecciosas que afetam o desempenho reprodutivo de bovinos: brucelose, leptospirose, campilobacteriose, rinotraqueite infecciosa bovina, diarréia viral bovina e tricomoníase, estão entre as mais freqüentemente associadas à distúrbios reprodutivos (KIRKBRIDE, 1987; EAGLASOME et al., 1992). Ao lado destas doenças, várias outras, menos conhecidas e conseqüentemente, pouco divulgadas, como as micoplasmoses, deveriam ser investigadas, pois resultam em quadro sintomatológico semelhante aquelas citadas acima, além de constar da Lista B da Organização Internacional de Epizootias (OIE) como doenças suscetíveis de serem transmitidas pela Inseminação Artificial (THIBIER & GUERIN, 2000).

A reprodução animal dos dias de hoje é programada para propiciar retorno econômico ao proprietário rural. Várias técnicas têm sido implementadas e implantadas para aumentar a produtividade individual e, paralelamente, o desempenho do conjunto de animais em fase de reprodução. Técnicas como Inseminação Artificial (IA), Transferência de Embriões (TE), Fecundação In Vitro (FIV) e o desenvolvimento de drogas e metodologias cada vez mais eficientes para sincronização de cio, são exemplos da tecnologia desenvolvida para melhorar a produtividade dos rebanhos. A presença de microrganismos causadores de doenças infecciosas pode atingir diretamente esta produtividade (CARDOSO, 2003).

Uma contaminação bacteriana maciça do sêmen congelado pode afetar a fertilidade. Neste caso, quando microrganismos patogênicos são veiculados por meio da inseminação artificial, eles não têm que atravessar a mucosa vaginal ou cervical, que agem como barreiras para bactérias, mas são introduzidos diretamente no útero (FLATSCHER & HOLZMANN, 1981).

A utilização da inseminação artificial (IA) tornou possível o intercâmbio de material genético de melhor qualidade e, através dessa tecnologia, uma melhora da produção de leite e carne, em nível nacional e internacional. Entretanto, as possibilidades da contaminação do sêmen por agentes patogênicos e a sua disseminação através do mesmo converteram-se em uma das principais preocupações para criadores e autoridades sanitárias dos países onde se emprega essa tecnologia (AFSHAR & EAGLESOME, 1990). A tudo isso se deve, também, acrescentar o risco do uso do sêmen infectado nos processos de transferência de embriões (BIELANSKI & DUBUC, 1994). Este alarme crescente está relacionado às implicações epizootiológicas da presença de microrganismos no sêmen, implicações estas que não só se centram na infecção exclusiva da fêmea receptora ou do coletivo da exploração pecuária, como também na possível introdução de doenças exóticas no país importador (SILVA, 2003).

Os fatores mais importantes que desencadeiam perdas econômicas devido à presença de micoplasmas e ureaplasmas em propriedades agropecuárias são: diminuição do número de gestações, ocorrência de perdas fetais ou partos prematuros com conseqüente diminuição do número de serviços por animal, perdas na qualidade do sêmen e aumento dos custos com veterinários e drogas para tratamento das infecções (HUFFMAN et al., 1985; MILLER et al., 1994).

Ocorrência

ALBERTSEN (1955), na Dinamarca, aventou a possibilidade de que microrganismos resistentes à antibióticos seriam responsáveis pela baixa fertilidade persistente em touros. Com o intuito de esclarecer esta hipótese, detectou 89% (76/85) de amostras positivas para microrganismos do gênero Mycoplasma em sêmen. A partir deste período, o isolamento de micoplasmas e ureaplasmas em sêmen e amostras coletadas de trato reprodutivo de touros tem sido relatado.

A contaminação de sêmen e muco prepucial por U. diversum foi verificada em 1969, na Inglaterra, quando dez culturas de muco prepucial e 84% de 32 amostras de sêmen in natura foram positivas para o agente (TAYLOR-ROBINSON et al., 1969). Posteriormente, ONOVIRAN et al. (1975), no Canadá, observarm 35% de 132 amostras de mucos prepuciais, 24% de 140 amostras de sêmen in natura e 14% de 42 amostras de sêmen processado, positivas para U. diversum. Na Tchecoslováquia, em 1978, foram observados 46,5% de positivos em 202 amostras de sêmen de touros de centrais de inseminação (DOIG, 1981a).

POUMARAT & MARTEL (1987) relataram que a freqüência de contaminação de sêmen por micoplasmas e ureaplasmas variou de acordo com as pesquisas em sêmen in natura e sêmen industrializado. A variação também pode ser encontrada entre propriedades, centrais de inseminação e de acordo com as estações do ano. Aproximadamente, 40 a 80% dos espermas são infectados por microrganismos da Classe Mollicutes e as associações entre espécies é freqüente. A taxa de isolamento em touros é muito variável: 6 a 67%. De 60 a 100% dos micoplasmas isolados são M. bovigenitalium enquanto que M. bovis representa aproximadamente 3% dos isolados.

A maior taxa de isolamento de Mycoplasma (71%) foi conseguida em vacas com baixa fertilidade comparado com 24% de vacas descartadas por outras razões (GOURLAY, 1973).

FISH et al. (1985), no Canadá, observaram que 28% dos touros utilizados para inseminação artificial apresentavam o sêmen contaminado por espécies de micoplasma, porém nenhuma estirpe de M. bovis foi isolada. GARCIA et al. (1986), no Canadá, processaram 2.950 amostras e nenhum M. bovis foi detectado.

BALL et al. (1987) examinaram 332 amostras de sêmen fresco e detectaram 46% de contaminação por Mycoplasma spp., destas, 32% também estavam contaminadas por Ureaplasma diversum.

RUHNKE (1994), no Canadá, reportou uma variação de 23 a 84% de touros positivos para U. diversum em sêmen fresco; contudo, as amostras de muco prepucial e secreção de uretra distal apresentaram uma variação de 29 a 100% de positivos sendo que a presença de ureaplasmas nestes sítios geralmente não está associada a sinais clínicos.

LE GRAND et al. (1995), na França, isolaram U. diversum em 74% (37/50) das amostras de sêmen analisadas. Os sorogrupos B e C foram predominantes em machos.

O Mycoplasma bovis foi identificado pela primeira vez no Brasil por ROSSINI, (1978) em bezerros com pneumonia em uma propriedade localizada no Estado de São Paulo. Posteriormente, LIBERAL et al. (1982) relataram o isolamento de Mycoplasma spp. em casos de pneumonia bovina no Estado do Rio de Janeiro.

TERAZAKI et al. (1991) relataram a presença de algumas espécies do gênero Mycoplasma em sêmen bovino processado em Centrais de Inseminação e em sêmen colhido em propriedades rurais do Estado de São Paulo.

NASCIMENTO et al. (1998), no Estado do Rio de Janeiro, isolaram Mycoplasma spp. a partir de sêmen in natura de 7 touros mestiços Charolês x Nelore, em rebanho que apresentava infertilidade e abortamentos e que era comprovadamente livre de brucelose, campilobacteriose e tricomonose.

O primeiro registro da presença de Ureaplasma diversum em bovinos no Brasil foi efetuado por CARDOSO et al. (1997), a partir de muco vaginal de fêmeas que apresentavam Vulvovaginite Granular (VVG). Posteriormente, em levantamento realizado em 7 propriedades da macro região de Itapetininga, Estado de São Paulo, de 152 amostras colhidas de 59 vacas com sintomatologia clínica de VVG, houve 54 (91,5%) positivas para U. diversum (CARDOSO et al., 2000).

Etiologia

Quando NOCARD & ROUX (1898) isolaram micoplasmas pela primeira vez em meio artificial, estes microrganismos passaram a ser conhecidos como "Pleuropneumonia Like Organisms" (PPLO) ou organismos semelhantes aos causadores da Pleuropneumonia, primeira patologia reconhecidamente por tais agentes.

Os micoplasmas e ureaplasmas pertencem à classe Mollicutes, ordem Mycoplasmatales, família Mycoplasmataceae, gêneros Mycoplasma, com 85 espécies descritas, e Ureaplasma, cinco espécies (TULLY et al., 1993). A principal característica da família é a necessidade de esteróis para o seu desenvolvimento (RAZIN & TULLY, 1983; BERGEY et al., 1994).

Micoplasmas e ureaplasmas são os menores procariontes conhecidos, auto-replicantes, com tamanho variando de 0,3 até 0,8 µm, formam colônias de aproximadamente 1 mm de diâmetro e se caracterizam pela ausência de parede celular (KIRKBRIDE, 1987). A ausência de parede celular determina a morfologia colonial em meio sólido em forma de “ovo-frito”. Estes agentes necessitam de atmosfera com concentração de 5 a 15% de dióxido de carbono para apresentar crescimento satisfatório em meios de cultura artificiais.

Os Mollicutes apresentam metabolismo e vias biossintéticas limitadas em função do reduzido genoma (580 à 2200 kb) da maioria das espécies. Desta maneira o seu cultivo exige meios enriquecidos, contendo precursores para a biossíntese do ácido nucléico, proteínas e lipídios (ROSEMBUSH, 1994).

Ureaplasma diversum é a única espécie do gênero descrita em bovinos (HOWARD, 1984) e inclui 3 sorotipos (A, B e C) aos quais são atribuídos graus distintos de patogenicidade (HOWARD et al., 1973; RUHNKE et al., 1984). Os sorotipos também podem ser caracterizados como Ureaplasma diversum A417 (sorotipo A), D48 (sorotipo B) e T44 (sorotipo C).

Patogenia

As doenças desencadeadas por Mycoplasma spp. e U. diversum são conhecidas genericamente por micoplasmoses. Estes agentes ocorrem predominantemente na cavidade oral, tratos respiratório e urogenital de várias espécies animais e de humanos.

Algumas espécies de Mycoplasma, assim como Ureaplasma diversum, estão comprovadamente envolvidas em casos de vesiculite seminal, balanopostite, epididimite (PILASZEK & TRUSZCYNSKI, 1988) e outras patologias responsáveis por alterações morfológicas e funcionais dos espermatozóides em bovinos (EAGLESOME et al., 1992; PANANGALA et al., 1981), como diminuição da motilidade que resulta em baixa qualidade do sêmen (DOIG, 1981b; HALL & MCENTEE, 1981; FISH et al., 1985; HUFFMAN et al., 1985; JASPER, 1987; KIRKBRIDE, 1987; EAGLASOME et al., 1992; RAE et al., 1995).

A inflamação da vesícula seminal ocasionalmente resulta em sinais sistêmicos que podem ser confundidos com peritonite de outras origens (TIMONEY et al., 1998). Touros de qualquer idade podem desenvolver a doença, porém a incidência da infecção é maior em animais jovens criados em grupos devido à atividade de monta freqüentemente observada entre eles, o que permite a contaminação do prepúcio e do pênis, que pode resultar em infecção ascendente.

Ureaplasmas colonizam as membranas celulares (espermatozóides, zona pelúcida embrionária, célula endometrial) e interferem com a espermatogênese, transporte espermático e capacidade de fecundação (EAGLESOME et al., 1992; KIRKBRIDE, 1987). Estas manifestações apresentam reconhecida importância quando do controle reprodutivo em propriedades economicamente exploradas, pois podem causar redução em diferentes níveis da produção com conseqüente prejuízo econômico (RUHNKE & ROSENDAL, 1994).

Um dos mecanismos de patogenicidade de micoplasmas e ureaplasmas é o alto grau de especificidade e capacidade de aderência às células do hospedeiro, com preferência pelas células mesenquimatosas que revestem as cavidades serosas, articulações e membranas dos sistemas respiratório, digestivo e urogenital (HOWARD, 1984). Ureaplasmas exercem seu poder lesivo tecidual por meio da produção de amônia (MILLER et al., 1994) que leva a perda da atividade ciliar e a destruição das células do oviduto e do endométrio (THORNBER, 1982).

Micoplasmas e ureaplasmas modificam rapidamente a natureza e estrutura dos componentes de sua membrana de superfície. Esta rápida modificação deve-se ao mecanismo de expressão dos genes codificadores de antígenos, que determina a variabilidade nas proteínas de superfície. Esta característica lhes confere resistência à tentativa de destruição pelos sistemas de defesa do hospedeiro (POUMARAT et al., 1997) e pode ser este, um dos fatores relacionados à cronificação da doença. Além desta característica de resistência, sabe-se que o exsudato fibrinoso presente nas infecções os protege da ação dos anticorpos e das drogas antimicrobianas, permitindo a instalação e manutenção da doença, que muitas vezes torna-se crônica (EICHWALD et al., 1973).

Diferentes espécies de micoplasmas apresentam mecanismos distintos de patogenicidade. Causam uma série de reações imunológicas que conduzem a alterações imunopatológicas.

M. bovis é reconhecido patógeno e causa endometrite, salpingite, ooforite, abortamento e vesiculite seminal. É também um importante agente de mastite, artrite e pneumonia (RUHNKE & ROSENDAL, 1994). HIRTH et al. (1966), observaram que 10 de 12 novilhas inseminadas com sêmen contaminado pelo agente, apresentaram vários episódios de repetição de cio e à necropsia, em 4 de 8 animais, foram observados graus variados de salpingite supurativa crônica, endometrite crônica e adesão ovariana.

Mycoplasma bovigenitalium é uma espécie freqüentemente encontrada no trato genital bovino e causa infertilidade, endometrite necrotizante, vesiculite seminal e problemas na motilidade espermática (RUHNKE & ROSENDAL, 1994). As infecções genitais causadas pelo agente em fêmeas são caracterizadas por vulvovaginite granular, com descarga vaginal mucopurulenta, podendo ou não apresentar infertilidade. Mastite e abortamento também são relatados (EAGLESOME et al., 1992). O microrganismo, como comensal do trato reprodutivo posterior, pode ser introduzido no útero através da inseminação artificial ou monta natural e causar endometrite, interferindo com a implantação do embrião ou mesmo resultando em sua morte (MILLER et al., 1994).

A transmissibilidade venérea dos micoplasmas e ureaplasmas para fêmeas sãs, através de partidas de sêmen contaminado, é de relevante importância. Quando 2 touros naturalmente infectados com M. bovigenitalium foram utilizados para servir 17 novilhas não infectadas previamente, 14 fêmeas tornaram-se positivas à cultura em um intervalo de 21 dias (KIRKBRIDE, 1987).

Mycoplasma spp. e U. diversum têm distribuição mundial e podem ser disseminados por meio do comércio internacional de animais, sêmen industrializado e recentemente, de produtos de transferência de embriões (BRITTON et al., 1988; DOIG et al., 1981b; MILLER et al., 1994).

O estudo do gênero Ureaplasma tem grande importância na medicina humana. Ureaplasma urealyticum é agente de sérias patologias urogenitais: uretrites não-gonocócicas, cistites, abortamentos, placentites, diminuição da capacidade reprodutiva e alterações na qualidade seminal, são problemas observados freqüentemente (QUINN et al., 1983; TAYLOR-ROBINSON & MCCORMACK, 1980). O Ureaplasma diversum, até o momento encontrado somente em bovinos, é habitante dos tratos respiratório e genital, participando da etiologia de problemas reprodutivos como: vulvovaginite, salpingite, endometrite, abortamento, retenção de placenta, infertilidade em fêmeas e vesiculite seminal e epididimite em machos (DOIG et al., 1981a; THORNBER, 1982; KIRKBRIDE, 1987; EAGLESOME et al., 1992). Esta espécie também foi citada como responsável por morte neonatal (MILLER et al., 1983; RUHNKE, 1984).

Casos de Vulvovaginite Granular aguda por U. diversum têm sido associados à severa queda nas taxas de concepção no primeiro serviço em rebanhos que utilizam inseminação artificial. O agente pode ser introduzido no útero pelo uso de sêmen contaminado ou ser carreado ao longo da cervix pela pipeta de inseminação (KIRKBRIDE, 1987).

A aderência dos microrganismos interfere na espermatogênese, transporte espermático, capacitação e fecundação. Além disso, espermatozóides podem atuar como vetores na transmissão dos agentes, já que os antibióticos rotineiramente utilizados em Centrais de Inseminação não agem sobre micoplasmas e ureaplasmas (RAE et al., 1995).

As vias de eliminação de micoplasmas e ureaplasmas são secreções orgânicas, especialmente sêmen, mucos prepucial e vaginal, secreção conjuntival e leite. A transmissão ocorre por contágio indireto, por meio de equipamentos contaminados como pipetas de inseminação e teteiras de ordenha. No entanto, a principal forma de transmissão é o contágio direto pelo coito, onde touros infectados disseminam os agentes através da monta natural ou inseminação artificial (KIRKBRIDE, 1987; BRITTON et al., 1988; MILLER et al., 1994).

A cavidade prepucial parece ser o principal ponto para a contaminação do sêmen em touros quando a colheita de sêmen é efetuada com vagina artificial. Entretanto, foi demonstrado que em alguns animais a uretra também é altamente colonizada, sugerindo que os procedimentos instituídos para reduzir o número de organismos no prepúcio, podem não ser totalmente efetivos para eliminar a contaminação do sêmen (DOIG, 1981a).

A transmissão placentária de Mycoplasma foi descrita por STONE et al. (1969). Posteriormente, foi relatado o isolamento de Mycoplasma spp. em fetos abortados e anexos fetais (TRICHARD & JACOBSZ, 1985; KAPOOR et al., 1989).

Usualmente os micoplasmas e ureaplasmas são introduzidos nas propriedades rurais através da compra de animais em rebanhos infectados ou quando do retorno à propriedade de animais que adquiriram a infecção em exposições e leilões (HUFFMAN et al., 1985).

O potencial para difusão internacional destes agentes através da comercialização de material genético deve ser sempre considerado (RUHNKE & ROSENDAL, 1994).

A importância de Mycoplasma spp. e U. diversum em sêmen de touros de campo e de central de inseminação (CI) é caracterizada pela interferência com a maturação espermática e diminuição da resistência do espermatozóide ao choque causado pelo congelamento e descongelamento. Infecções dos testículos ou epidídimo podem resultar em alterações morfológicas (ultra-estrutural) no espermatozóide e a motilidade pré-congelamento pode diminuir (KIRKBRIDE, 1987).

PANANGALA et al. (1981) constataram que após 72 horas de contato com esperma, o M. bovigenitalium adere-se ao acrossomo e à cauda dos espermatozóides, provocando a sua imobilização.

JURMANOVA & STERBOVA, (1977) constataram a existência de associação significante entre baixa motilidade dos espermatozóides e a contaminação do sêmen por Mycoplasma spp., caracterizada por redução da motilidade (ao redor de 60%) e viabilidade de espermatozóides de bovinos como conseqüência da adsorção de micoplasmas ou ureaplasmas.

A associação entre aderência microbiana e motilidade espermática foi observada em homens inférteis, onde infecções genitais por Ureaplasma urealyticum têm sido relacionadas à diminuição de motilidade espermática e anormalidades citológicas. Os ureaplasmas são encontrados principalmente no colo espermático e quando a infecção é debelada, observa-se aumento na motilidade e diminuição da porcentagem de anomalias espermáticas. É possível que em condições naturais, o contato entre esperma e micoplasma não ocorra após a ejaculação, mas no epidídimo. A aderência ao esperma pode interferir com o processo essencial de maturação (FRIBERG, 1980).

Quando o M. bovigenitalium adere-se aos espermatozóides bovinos e anticorpos contra antígenos de micoplasmas estão presentes, a aglutinação espermática pode ocorrer (TIMONEY et al., 1998). A adição de suspensão de Mycoplasma bovigenitalium ao sêmen bovino determinou uma redução na motilidade dos espermatozóides após 48 à 72 horas, e este efeito foi dose dependente (DOIG & RUHNKE, 1986). Algumas estirpes de M. bovigenitalium parecem ser capazes de suprimir a motilidade espermática associado ou não à evidências clínicas de doença.

A presença de sulfoglicolipídicos na membrana espermática foi associada à um receptor específico para U. diversum isolado de bovinos (LINGWOOD et al., 1990).

Diagnóstico

Os métodos utilizados para a detecção de Mycoplasma spp. e U.d iversum estão restritos a técnicas de isolamento e identificação sorológica das estirpes isoladas (Imunoperoxidase, Imunofluorescência e ELISA). No entanto, estes procedimentos são demorados, de difícil padronização e dispendiosos (KUPPEVELD et al., 1992; SIMECKA et al., 1992). Apesar do isolamento ser o método de escolha, pois possibilita a visualização dos microrganismos, o mesmo é afetado pela presença de bactérias oportunistas usualmente presentes quando das colheitas efetuadas a campo. O tempo decorrido entre a colheita e o processamento laboratorial, também pode afetar a viabilidade dos microrganismos, o que prejudica o cultivo em meios artificiais. Estes fatores têm determinado a implementação de técnicas mais rápidas, sensíveis e específicas (CARDOSO et al., 2000).

O isolamento bacteriológico permite a detecção de diferentes estirpes de Mycoplasma spp. e Ureaplasma diversum. No entanto, diversas estirpes de Mycoplasma isoladas não podem ser diferenciadas em espécie através desta técnica, já que a morfologia colonial é muito semelhante. O resultado final é considerado positivo para o gênero Mycoplasma, quando não há disponibilidade para tipificação sorológica ou molecular das estirpes. Já para a espécie Ureaplasma diversum, essa tipagem não se torna necessária, por ser a única espécie de Ureaplasma encontrada em bovinos e sua caracterização através da morfologia colonial ser patente.

As técnicas moleculares, como a PCR (Reação da Polimerase em Cadeia), têm sido um grande avanço para o diagnóstico das micoplasmoses, pois além de detectarem estirpes inviáveis para o isolamento, requerem pequenas quantidades de DNA presentes na amostra clínica a ser analisada (ANDRADE, 1993; FARAH, 1997; GHADERSOHI et al., 1997).

A principal vantagem da PCR é a possibilidade de ser realizado o diagnóstico em pequenas quantidades de DNA. Embora rotineiramente seja utilizado 0,5 µg de DNA genômico na amostra clínica, a técnica pode ser eficaz, mesmo se realizada a partir de uma molécula de DNA proveniente de uma única célula. A possibilidade da amplificação de um gene específico, como os genes de uma bactéria, por meio da PCR, poderá vir a dispensar os métodos diagnósticos clássicos até então utilizados (FARAH, 1997). Esta técnica poderá ser de grande utilidade para o diagnóstico das micoplasmoses, pois cobre as falhas existentes nos métodos convencionais de cultivo bacteriano, através da detecção de células viáveis ou inviáveis, em menor tempo. Estas características poderão agilizar o diagnóstico laboratorial, possibilitando ao clínico de campo a rápida implantação de uma estratégia para o controle da doença.

Combinando-se o primer MGSO selecionado a partir da região 16Sr RNA com o oligonucleotídeo procariótico GPO-1, amplifica-se um fragmento de 715 pares de bases, o qual está presente em todos os organismos da classe Mollicutes (KUPPEVELD et al., 1992).

CARDOSO, (1998) empregou a técnica de PCR, com primers obtidos da região 16S rRNA e condições de estringência específicas, para a pesquisa de U. diversum em muco vulvovaginal bovino. Através da PCR foram classificados como positivos 52,9% de 168 fêmeas estudadas, enquanto que pelo isolamento a taxa de detecção foi de 35,7%.

Um dos poucos trabalhos comparativos enfocando a detecção de micoplasmas através da PCR e de métodos de isolamento utilizando swabs penianos, pré-ejaculados e sêmen de 438 eqüinos, relatou taxa de 80% (352/438) de positivos pela PCR e 29% (125/ 438) pelo isolamento, mostrando uma diferença considerável. No entanto, estas discrepâncias estão de acordo com relatos que descrevem uma baixa sensibilidade para as técnicas de isolamento de micoplasmas a partir de amostras clínicas quando comparadas aos métodos moleculares (SPERGSER et al., 2002).

Tratamento e controle

A ausência de recursos imunoprofiláticos efetivos contra as micoplasmoses genitais, determina que o controle destas enfermidades dependa de medidas de higiene e de procedimentos sanitários, incluindo-se a segregação de animais infectados (PATHAK & GARG, 1988). Após implementação destas medidas, procedimentos que minimizem a transmissão dos agentes devem ser adotados. O uso de pipetas de inseminação duplas e/ou de preservativos de inseminação têm sido preconizados (EAGLESOME et al., 1992)

Os antibióticos têm sido adicionados aos diluentes de sêmen desde a década de 40 e nesse período, foram capazes de destruir Campylobacter no sêmen. Atualmente, esta bactéria passou a ser rara e o processo de congelamento de sêmen está disseminado em todo o mundo, no entanto, a estreptomicina e a penicilina são utilizadas (PAREZ, 1985).

A preocupação com o controle sanitário de partidas de sêmen industrializado, nas centrais de inseminação, tem gerado pesquisas onde novas combinações de antibióticos têm sido testadas com a intenção de controlar Mycoplasma, Ureaplasma, Campylobacter fetus subsp. venerealis e Haemophilus somnus. A associação lincomicina, espectinomicina, tilosina e gentamicina adicionados ao sêmen fresco e também a diluidores tendo o leite não glicerinado como base e, em gema de ovo, foi capaz de controlar M. bovis, M. bovigenitalium e Ureaplasma spp. (SHIN et al., 1988). A lincospectina e a espectinomicina foram adicionados aos conservantes para controlar micoplasmas; esta mesma combinação não se apresentou efetiva contra Ureaplasma spp. (BALL et al., 1987).

VISSER et al. (1995) testaram duas combinações de antibióticos em sêmen congelado contra Haemophilus somnus, Campylobacter fetus spp. venerealis, Mycoplasma bovis e Ureaplasma diversum. A combinação de diferentes concentrações de gentamicina, tilosina, lincomicina e espectinomicina foi comparada com penicilina, estreptomicina, lincomicina e espectinomicina (PELE). A combinação PELE reduziu significativamente o nível de U. diversum após oito dias de congelamento, porém, contra M. bovis, nenhuma das duas combinações apresentou resultados significantes.

A suplementação de conservantes com minociclina para sêmen a base de leite tem sido favorável para o controle de micoplasmas e ureaplasmas, sem prejudicar a qualidade espermática (DOIG, 1981a).

A combinação de lincomicina, espectinimicina e tilosina foi ativa contra ureaplasmas in vitro (TRUSCOTT & RUHNKE, 1984), assim como o tiamulin foi efetivo no controle de ureaplasma em sêmen (AHMAD et al., 1987).

A campo, touros têm sido tratados para micoplasma e ureaplasma com descanso sexual e lavados prepuciais, com a intenção de diminuir a possibilidade de transmissão de micoplasmas e ureaplasma e de melhorar as condições de fertilidade (DOIG, 1981a). Entretanto, até o momento, não é conhecido um tratamento efetivo para eliminar o estado de portador de micoplasmas e ureaplasmas em touros (DOIG, 1981a; KIRKBRIDE, 1987).

Para a implementação de métodos apropriados de tratamento é necessário o conhecimento das características da doença. Desta forma, a falta de dados sobre as micoplasmoses da reprodução pode estar prejudicando o seu controle no país. Os clínicos de campo praticamente desconhecem a presença destes microrganismos nos rebanhos brasileiros, fato que pode estar contribuindo para a sua manutenção nos plantéis.

As formas de controle indicadas para as micoplasmoses reprodutivas são a antibioticoterapia local, preventiva para as infecções genitais nas fêmeas e sistêmica para os casos de infecções em machos. A ausência de parede celular, característica dos Mycoplasmatales, indica a utilização de antibióticos cuja ação seja sobre a síntese protéica. As drogas preconizadas têm sido tartarato de tilosina, oxitetraciclina e fumarato de tiamulin (TRUSCOTT et al., 1975; ALLAN & PIRRIE, 1981; HOLZMANN et al., 1984; PICARD et al., 1984; STIPKOVITS et al., 1984; LORTON et al., 1988). O enrofloxacin foi utilizado com bons resultados práticos (MILLER et al., 1994), porém a sua eficácia específica contra os micoplasmas que habitam o sistema urogenital de bovinos e contra Ureaplasma diversum ainda não foi comprovada.

Tratamentos adequados para as condições brasileiras ainda estão sendo testados. Novas pesquisas devem ser realizadas para elucidar os antibióticos e/ ou quimioterápicos mais adequados às estirpes bacterianas circulantes no país.

Os antibióticos rotineiramente adicionados aos diluentes (penicilina e estreptomicina) não são efetivos para o controle de micoplasmas no sêmen. TRUSCOTT (1983) examinou a atividade de vários outros antibióticos e observou que a minociclina foi efetiva contra Ureaplasma, enquanto que associação de lincomicina (0,3 mg/mL) e espectinomicina (0,6 mg/mL) foi efetiva contra Mycoplasma, sendo que os resultados podem ser prejudicados pelo tempo necessário de contato entre os antibióticos e o sêmen (15 min. a 35º C) e a influência do diluente, já que a minociclina é efetiva somente em diluentes a base de leite (PAREZ, 1985).

AYLING et al. (2000), mostraram uma maior atividade in vitro de danofloxacin contra estirpes de campo de Mycoplasma bovis que florfenicol, oxitetraciclina, espectinomicina e tilmicosin.

STIPKOVITS et al. (2001), testaram a valnemulina na forma de premix, uma pleuromutilina com excelente ação sobre micoplasmas, em animais de campo portando infecção respiratória onde Mycoplasma bovis foi detectado em 80% dos casos. O resultado no grupo tratado foi ganho de peso mais rápido, menores porcentagens de infecção por Mycoplasma, menores taxas de sintomas respiratórios além de menor requerimento de tratamentos com outros antibióticos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2004

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2004
  • Aceito
    18 Ago 2004
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