Open-access PATOGENICIDADE DE METARHIZIUM ANISOPLIAE (METSCH.) SOROKIN SOBRE AS FASES DO DESENVOLVIMENTO DE TIBRACA LIMBATIVENTRIS STAL (HEMIPTERA: PENTATOMIDAE) EM CONDIÇÕES DE LABORATÓRIO

PATOGENICITY OF METARHIZIUM ANISOPLIAE (METSCH.) SOROKIN ON THE PHASES OF THE DEVELOPMENT OF TIBRACA LIMBATIVENTRISSTAL (HEMIPTERA: PENTATOMIDAE) UNDER LABORATORY CONDITIONS

RESUMO

Visando selecionar um isolado de Metarhizium anisopliae promissor para o controle microbiano de Tibraca limbativentris e avaliar sua virulência sobre as fases do desenvolvimento desse inseto, realizaram-se dois bioensaios. Cinco isolados de M. anisopliae foram aplicados usando-se em suspensões fúngicas de 108 conídios/mL, sendo definidos os tratamentos: 1) testemunha, 2) isolado CG 041, 3) CG 144, 4) CG 167, 5) CG 835 e 6) CG 891. Para avaliar a virulência sobre as fases do desenvolvimento preparou-se uma suspensão 108 conídios/mL do isolado CG 891 aplicando-a sobre ovos, ninfas pequenas (2º e 3º instares), ninfas grandes (4º e 5º instares) e adultos. No primeiro experimento, os valores de TL50 calculados mostraram que o isolado CG 891 foi o mais virulento, sendo necessários cerca de 11 dias para controlar 50% da população testada. No segundo experimento, para ovos, o TL50 foi de 5,53 dias, quando se observou 83% de contaminação, e nenhuma das ninfas eclodidas atingiu o segundo instar. Nos outros tratamentos, os valores de TL50 foram de 6,61, 8,76 e 8,82 dias para ninfas pequenas, ninfas grandes e adultos. Ovos, ninfas e adultos de T. limbativentris são suscetíveis de M. anisopliae (isolado CG 891).

PALAVRAS-CHAVE Insecta; percevejo-do-colmo; fungo entomopatogênico; arroz irrigado

ABSTRACT

In order to select an isolate of Metarhizium anisopliae promising for the microbial control of Tibraca limbativentris and to evaluate its virulence in all stages of development of this insect, two bioassays were carried out. Five isolates of M. anisopliae were applied using fungal suspension with 108 conidia/mL, in the following treatments: 1) control, 2) isolate CG 041, 3) CG 144, 4) CG 167, 5) CG 835 and 6) CG 891. To evaluate the virulence in the stages of development, a suspension with 108 conidia/mL from the isolate CG 891 was prepared and applied over the eggs, small nymphs (2nd and 3rd instars), large nymphs (4th and 5th instars) and adults. In the first experiment, the calculated TL50 values showed that the isolate CG 891 was the most virulent, and about 11 days were necessary to control 50% of the tested population. In the second experiment, designed for eggs, the TL50 value was 5.53 days, when 83% of contamination was observed, and none of the hatched nymphs reached the second instar. In the other treatments, the TL50 values were 6.61, 8.76 and 8.82 days for small nymphs, large nymphs and adults. Eggs, nymphs and adults of T. limbativentris were susceptible to M. anisopliae (isolate CG 891).

KEY WORDS Insecta; rice stem bug; entomopathogenic fungus; irrigated rice

INTRODUÇÃO

Tibraca limbativentris, Stal, percevejo-do-colmo do arroz, caracteriza-se como um inseto-praga de grande importância para a cultura, sendo sua ocorrência nas regiões de cultivo do arroz irrigado crescente nos últimos anos, devido ao sistema oferecer condições de clima e abrigo muito favoráveis à proliferação e manutenção do inseto nos arrozais. Com a irrigação permanente e a implantação de lavouras em terrenos inclinados, como nos planaltos da Campanha Riograndense, onde há uma expressiva quantidade de plantas crescendo sobre as taipas, grandes populações têm sido registradas anualmente (MARTINS et al., 2004a). A biologia e estudos comportamentais de T. limbativentris foram realizados em condições de laboratório por PRANDO et al. (1993) e SILVA et al. (2004) e em condições de semicampo por BOTTON et al. (1996).

A condição micrometereológica de alta umidade relativa, associada à elevada temperatura ocorrente nas lavouras de arroz irrigado, torna-se favorável também ao desenvolvimento de doenças fúngicas. Estudos têm relatado a ocorrência natural de doenças sobre insetos de diferentes ordens, sendo os fungos Beauveria bassiana (Bals.) Vuill. e Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorokin entomopatógenos amplamente utilizados no manejo de insetos-praga de importância na agricultura. Trabalhos de seleção de isolados realizados em condições de laboratório, visando o controle microbiano da cigarrinha Mahanarva fimbriolata (Stal) (Hemiptera: Cercopidae) na cana-de-açúcar, demonstraram que isolados de M. anisopliae ocasionaram 70% de mortalidade de ninfas desse inseto em seis dias após a pulverização (LOUREIRO et al., 2005).

O controle biológico de insetos-praga da cultura do arroz utilizando fungos entomopatogênicos tem sido citado na literatura para o controle do percevejo-do-colmo. Estudos realizados por MARTINS; LIMA (1994) demonstraram a eficiência de um isolado de M. anisopliae para o controle desse inseto. Posteriormente, outros isolados de M. anisopliae e B. bassiana foram avaliados quanto à virulência para T. limbativentris em condições de laboratório (MARTINS et al., 1997); esse estudo demonstrou novamente a maior eficiência de M. anisopliae para o controle desse inseto da cultura do arroz. Em 2004, um ensaio em condições de campo foi realizado por MARTINS et al. (2004b), com o objetivo de avaliar a eficiência de M. anisopliae sobre o percevejodo-colmo nos arrozais. Os autores observaram que a permanência do fungo viável nos arrozais é baixa e que a disseminação do fungo para favorecer o aparecimento de epizootias, conseqüentemente, ficaria reduzida. Dessa forma, novos estudos seriam necessários para compreender melhor a dinâmica comportamental da população, visando delinear uma estratégia de controle microbiano que garanta a introdução e estabelecimento do patógeno no ambiente das lavouras de arroz.

Além dos aspectos relacionados ao inseto-praga, faz-se necessário considerar aqueles aspectos relacionados ao entomopatógeno de interesse. Existe uma alta diversidade genética dentro dos isolados de uma mesma espécie de fungo. Portanto, faz-se necessário selecionar o isolado mais eficiente no controle de uma determinada espécie de inseto, através do levantamento de incidências naturais e/ou bioensaios para determinação da virulência sobre o inseto-praga (SANTOS et al., 2002; LOUREIRO et al., 2005). De acordo com TIGANO-MILANI et al. (1995), a utilização de bioensaios prévios, com condições controladas ou semicontroladas, é fundamental para compreender os parâmetros que governam a eficácia e persistência do patógeno no ambiente, quando se objetiva introduzir organismos no controle biológico de pragas.

Com o aumento de infestações de T. limbativentris, principalmente em lavouras na região Sul, torna-se necessária à adoção de estratégias que permitam otimizar o controle do inseto, visando minimizar o uso de agrotóxicos convencionais e potencializar o manejo com fungos entomopatogênicos. Nesse sentido, a compatibilidade entre fungos e agrotóxicos tem sido demonstrada em estudos realizados em outras culturas. BATISTA FILHO et al. (2001) relatam a importância da interação entre inseticidas químicos e fungos entomopatogênicos; segundo os autores, o controle do inseto-praga poderia ser ainda mais eficiente se existisse compatibilidade entre o inseticida e o fungo, já que o agrotóxico desempenha sua capacidade estressora facilitando a ação rápida e fácil dos fungos entomopatogênicos. Esta ação, provavelmente, seria facilitada nos estágios de desenvolvimento de ovo e ninfa, onde o fungo teria melhores condições de estabelecer-se. Nas fases iniciais do desenvolvimento, uma maior vulnerabilidade quanto às barreiras físicas e químicas pode ser observada comparando-as à fase adulta. No entanto, pouco é conhecido sobre a ação de fungos entomopatogênicos nas diferentes fases do desenvolvimento de T. limbativentris.

Esse trabalho teve por objetivo selecionar um isolado de M. anisopliae virulento no controle de T. limbativentris e avaliar seu efeito entomopatogênico sobre as diferentes fases do desenvolvimento desse inseto, visando delinear uma estratégia de manejo eficiente e adequada para a cultura do arroz irrigado.

MATERIAL E MÉTODOS

Dois bioensaios foram conduzidos. O primeiro, para a seleção de um isolado promissor no controle de T. limbativentris, foi realizado ao final da safra 2004/ 2005 no laboratório de Microbiologia de Solos da Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, e o segundo bioensaio para determinar a patogenicidade de M. anisopliae sobre as fases do desenvolvimento do inseto, foi realizado durante a safra de arroz 2005/2006 no laboratório de Produção de Beauveria na Estação Experimental de Itajaí da Epagri, SC.

Bioensaio para seleção do isolado: para selecionar um isolado de M. anisopliae promissor no controle microbiano de T. limbativentris testou-se, in vitro, cinco isolados desse fungo, provenientes do banco de germoplasma de microrganismos da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Brasília, DF. Os isolados foram selecionados de acordo com seu histórico de ocorrência sobre hemípteros (Tabela 1). Os conídios puros do fungo foram transferidos para placas de Petri contendo meio BDA (batata dextrose ágar) e incubados a 27 ± 1º C com 12h de fotofase por 10 dias. Após o crescimento e esporulação, os isolados de M. anisopliae foram armazenados a 10º C. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com 10 repetições contendo cinco insetos cada. Os tratamentos foram: 1) testemunha; 2) isolado CG 041; 3) CG 144, 4) CG 167; 5) CG 835, e, 6) CG 891.

Tabela 1
Identificação dos isolados de Metarhizium anisopliae avaliados quanto à virulência sobre adultos de Tibraca limbativentris.

As suspensões utilizadas nos tratamentos foram preparadas a partir uma nova repicagem dos isolados. Os conídios produzidos foram coletados por raspagem com alça de platina e transferidos para sete mL de uma solução Tween 80 (0,1%), sendo padronizada para 108 conídios/mL, realizando-se a contagem em microscópio óptico com auxílio da câmara de Neubauer.

Os insetos utilizados nesse bioensaio foram adultos de segunda geração anual obtidos de uma criação de pesquisa em casa-de-vegetação, com condições sanitárias necessárias para manter um grupo controle livre de patógenos. No dia anterior à implantação do bioensaio, os insetos foram retirados da criação e levados ao laboratório para realizar uma lavagem em hipoclorito de sódio (1%) por 5 segundos, seguida da lavagem em água destilada e secagem em papel filtro, permanecendo em recipiente estéril até o momento da aplicação dos tratamentos.

Tabela 2
Descrição dos grupos e seus respectivos tratamentos para as diferentes fases do desenvolvimento de Tibraca limbativentris, tratadas com o isolado CG 891 de Metarhizium anisopliae.

As unidades experimentais (UE) constaram de uma placa de Petri de nove cm de diâmetro contendo em seu interior papel filtro e algodão umedecido. Em cada UE foram colocados 5 adultos de T. limbativentris, os quais receberam 10 μL da respectiva suspensão fúngica aplicados na região dorsal, sobre o escutelo; para a testemunha, foram aplicados 10mL de solução de Tween 80 (0,1%). Em adição, uma alíquota de cada suspensão foi plaqueada em meio BDA, para verificação da viabilidade dos conídios com 24h de incubação. Após a aplicação dos tratamentos, as UE foram incubadas em câmara de crescimento a 27± 1º C, com 12h de fotofase.

As avaliações eram diárias, e os insetos mortos coletados e colocados em câmaras úmidas para confirmar a contaminação pelo fungo. O critério adotado para confirmar a contaminação foi a análise visual da exteriorização dos micélios e esporulação do fungo sobre o cadáver do inseto. Os dados obtidos foram submetidos à análise de probit, usando-se o programa Polo-PC (CORPORATION HOUSTON, 1988) para determinação dos TL50.

Efeito de M. anisopliae sobre as fases do desenvolvimento de T. limbativentris: a partir dos resultados obtidos no bioensaio anterior. O fungo mantido no laboratório foi transferido para placas contendo BDA, as quais foram incubadas em câmara de crescimento a 27± 1º C com 12h de fotofase durante 12 dias. Os esporos obtidos foram utilizados para preparar uma suspensão com 108 esporos mL-1, utilizando a metodologia descrita no bioensaio anterior.

As fases do desenvolvimento do inseto utilizadas foram: ovos, ninfas (pequenas: 2º e 3º instares e grandes: 4º e 5º instares) e adultos, sendo determinados quatro grupos e oito tratamentos (Tabela 2). Cada grupo constou de um tratamento controle (fase de desenvolvimento sem aplicação do fungo) e um tratamento teste (fase de desenvolvimento com a aplicação do fungo).

Ovos: nos tratamentos que utilizaram o ovo de T. limbativentris para avaliar a infecção pelo fungo, as UE constaram de placas de Petri com papel filtro e algodão umedecidos. Ovos do dia (24h) foram coletados em criação de T. limbativentris mantida em casa-de-vegetação. Esses ovos foram levados ao laboratório onde se procedeu uma assepsia com os seguintes passos: uma lavagem em hipoclorito de sódio (0,1%) por 10 seg e duas lavagens em água destilada, sendo os ovos secados sobre papel de filtro. Separaram-se as posturas em grupos de aproximadamente 10 ovos. No tratamento 1 (controle), as posturas foram mergulhadas por cinco segundos em uma solução de Tween 80 (0,1%) e no tratamento 2 mergulhadas na suspensão do isolado CG 891. Posteriormente, as posturas foram colocadas sobre o papel filtro nas UE e incubadas a 27 ± 1º C com 12h de fotofase. O delineamento foi inteiramente casualizado, com 10 repetições de 10 ovos cada. Realizaram-se avaliações diárias para verificar a contaminação das posturas e/ ou ninfas de 1º instar pelo fungo. Os valores de contaminação foram submetidos a análise de probit para determinação do TL50, nesta fase do desenvolvimento de T. limbativentris.

Ninfas e adultos: nos tratamentos 3 a 8 (Tabela 2), utilizando ninfas e/ou adultos (da primeira geração anual) de T. limbativentris, as UE constaram de 1 tubo de ensaio (3 cm de diâmetro por 20 cm de altura) contendo 3 colmos de arroz e algodão embebido em 2 mL de água destilada estéril; os tubos foram cobertos com tecido voal preso por elástico. Os insetos foram retirados do local de criação acima citado e uma assepsia foi realizada de acordo com a metodologia descrita no bioensaio de seleção de isolados.

Os insetos dos tratamentos 4, 6 e 8 receberam 10 μL da suspensão com 108 conídios/mL do isolado CG 891 aplicados na região dorsal, sobre o escutelo; para as testemunhas (tratamentos 3, 5 e 7), foram aplicados 10 μL de solução de Tween 80 (0,1%). Após o tratamento os insetos foram transferidos para as unidades experimentais e mantidos em condições controladas com 27 ± 1º C e 12h de fotofase. A viabilidade dos conídios foi verificada de maneira semelhante à descrita no ensaio de seleção de isolados. Os insetos utilizados em ambos os bioensaios eram aparentados.

Avaliações foram realizadas diariamente para coletar os insetos mortos, que foram colocados em câmaras úmidas para confirmação da infecção. O critério de avaliação usado foi o mesmo adotado no bioensaio de seleção dos isolados. Os dados obtidos foram submetidos à análise de probit pelo programa Polo-PC (CORPORATION HOUSTON, 1988) para determinar os valores de TL50 para cada tratamento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Seleção dos isolados de M. anisopliae: os valores de TL50 para os cincos isolados testados encontram-se na Tabela 3, onde se pode constatar também a viabilidade dos conídios, que variaram de 83 a 95%. A menor viabilidade foi observada para o isolado CG 041, o qual apresentou um valor de TL50 de 30,74 dias. A baixa viabilidade dos conídios desse isolado estaria diretamente relacionada com a baixa eficácia sobre T. limbativentris, já que o valor de TL50 foi bastante alto. De acordo com ALVES (1998) a baixa viabilidade de conídios refletiria a perda de virulência do isolado ou a presença de condições desfavoráveis para o início do processo germinativo dos conídios. Como as avaliações foram realizadas apenas em um momento (24h), não foi possível determinar se o tempo de incubação poderia influenciar no valor da viabilidade dos conídios.

Tabela 3
Viabilidade de conídios e TL50 para adultos deTibraca limbativentris tratados os isolados de Metarhizium anisopliae.

Os resultados da análise de probit mostraram que CG 891 foi o isolado mais virulento para os adultos de T. limbativentris, visto que 11,7 dias foram necessários para se controlar 50% dos insetos. Este isolado foi obtido sobre cadáveres de T. limbativentris hibernantes em Itajaí, SC, sendo indexado no banco de germoplasma da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Brasília, DF. Para os demais isolados observou-se um prolongamento no tempo para obter 50% de controle. Esses resultados podem ser justificados pela origem de cada isolado em relação a sua especificidade com a população utilizada na realização deste bioensaio. Por exemplo, para CG 167, isolado de T. limbativentris em Goiânia, GO, o valor de TL50 observado foi de 27,46 dias, mais que o dobro para o isolado proveniente de Itajaí.

O TL50 para o isolado CG 835, obtido de Scaptocoris castanea (Perty) (Hemiptera: Cydnidae), foi de 45,4 dias, sendo o maior valor obtido nesse trabalho e o único tratamento onde o valor de t não foi significativo. MARTINS et al. (1997) testaram isolados obtidos de S. castanea e Deos flavopicta (Stal) (Hemiptera: Cercopidae) sobre T. limbativentris e também observaram menores índices de controle; os melhores resultados foram obtidos para isolados provenientes de T. limbativentris, evidenciando a relação entre o patógeno e hospedeiro. ALVES (1998) ressaltou a importância dessas relações, considerando para isso aspectos da biologia, genética e comportamento de cada organismo em relação ao ambiente em que está inserido.

As interações entre o agente de controle biológico e o hospedeiro determinam a especificidade e conseqüentemente a virulência do entomopatógeno sobre o inseto. A capacidade adaptativa dos fungos é alta, e a existência de grande variabilidade genética permite a adaptação para diferentes condições de clima e hospedeiros (AZEVEDO; PIZZIRANI-KLEINER, 2002). WANG et al. (2002) relataram a importância de determinadas enzimas de M. anisopliae na virulência do fungo sobre o hospedeiro, demonstrando por meio de estudos moleculares que os distintos isolados de M. anisopliae podem apresentar deficiências na ativação de genes ligados a virulência para determinados hospedeiros, principalmente quando esses isolados são mantidos sobre meio artificial. A habilidade de um patógeno de produzir enzimas capazes de penetrar a cutícula dos insetos sugere mudanças de metabolismo que permitem a diferenciação metabólica e reconhecimento do substrato. A produção e regulação de enzimas podem estar associadas diretamente com a virulência ou espécie-especificidade entre fungos e hospedeiros (VALADARES-INGLIS et al., 2002). Apesar das evidências sugerirem a interação patógeno/hospedeiro, VESTERGAARD et al.(1995) citaram que a patogenicidade dos isolados independe do hospedeiro ou do local de origem do entomopatógeno, estando as variações nos índices de mortalidade relacionadas apenas à variabilidade genética de cada isolado do fungo.

Tabela 4
Tempo Letal (TL50), porcentagem de ovos infectados e da eclosão de ninfas de Tibraca limbativentris tratados com Metarhizium anisopliae isolado CG 891.

LOUREIRO et al. (2005) testaram 79 isolados de M. anisopliae em M. fimbriolata, observando resultados bastante variáveis para a mortalidade ocasionada pelo fungo. De acordo com os autores, a maioria dos isolados testados apresentaram mortalidade superior a 40%, estando a variação nos percentuais de controle relacionados às diferenças existentes entre a produção de enzimas e toxinas, a velocidade de germinação dos conídios e a atividade mecânica do fungo na penetração e colonização do corpo do inseto, reflexos da variabilidade genética existente entre os isolados testados.

Efeito de M. anisopliae sobre as fases do desenvolvimento de T. limbativentris: o valor de TL50 para ovos foi de 5,53 dias (Tabela 4). Os resultados obtidos para os tratamentos 1 e 2 mostraram que 83% dos ovos e 82% das ninfas de 1º ínstar foram contaminadas pelo fungo, sendo que nenhuma destas atingiu o 2º instar ninfal. Já no tratamento controle observou-se 99% de eclosão e transformação em ninfas de 2º instar. O isolado CG 891 de M. anisopliae mostrou-se altamente virulento para ovos de T. limbativentris, pois em cerca de seis dias após o tratamento observou-se a contaminação plena de ovos e ninfas de 1º instar. Uma alta viabilidade dos conídios (91%) foi observada 24h de incubação.

SAMUELS et al. (2002) testaram o efeito de isolados de M. anisopliae e B. bassiana sobre o inseto-praga Blissus antillus, Leonard, (Hemiptera: Lygaeidae), constatando que os seus ovos são altamente suscetíveis à infecção por fungos entomopatogênicos. Em trabalho realizado para Diatraea saccharalis (Lepidoptera: Pyralidae) foi observado valores de TL50 de 3,72 e 3,48 dias para ovos deste inseto tratados duas formulações de M. anisopliae (ALMEIDA et al. (1984). Apesar de serem poucas as citações na literatura sobre o efeito de entomopatógenos sobre ovos de artrópodes de importância agrícola, os resultados obtidos para B. antillus e D. saccharalis e os aqui relatados, para T. limbativentris, demonstraram que é viável o controle de insetos utilizando como hospedeiro, para o entomopatógeno, ovos do inseto de interesse.

Os resultados para os tratamentos com ninfas e adultos demonstraram que as ninfas de 2º e 3º instar são mais suscetíveis à infecção do que as ninfas de 4º e 5º instar e adultos, sendo os valores de TL50 calculados de 6,61, 8,76 e 8,82 dias após o tratamento, respectivamente (Tabela 5). Ao analisar os dados obtidos para todos os tratamentos em conjunto pode-se observar que as fases iniciais do desenvolvimento de T. limbativentris são mais suscetíveis à infecção pelo isolado testado (Tabelas 4 e 5).

Tabela 5
Tempo Letal (TL50) para ovos, ninfas e adultos de Tibraca limbativentris tratados com isolado CG 891 de Metarhizium anisopliae.

O isolado CG 891 de M. anisopliae mostrou-se promissor para o controle de T. limbativentris. Segundo os valores de TL50 calculados, observa-se que, sob condições de laboratório, cerca de 9 dias são necessários para controlar desde ovos até adultos desse inseto. Cabe relembrar que em condições controladas a exposição do inseto ao patógeno é máxima, sendo a contaminação garantida e as condições de temperatura e umidade favoráveis ao estabelecimento da infecção.

Dados citados na literatura demonstram o efeito de entomopatógenos sobre adultos de T. limbativentris em condições de laboratório, semicampo e campo. Entre os diferentes isolados de B. bassiana e M. anisopliae testados em laboratório, CP 172 de M. anisopliae foi mais promissor no controle do inseto-praga de interesse (MARTINS; LIMA, 1994). Em estudos posteriores, utilizando condições de semicampo, esse isolado continuou sendo aquele com maior virulência no controle do percevejo-do-colmo (MARTINS et al., 1997). Nesse mesmo trabalho, diferentes formas de aplicação foram testadas, sendo a pulverização de conídios ou a distribuição manual de grãos de arroz com fungo em desenvolvimento eficientes no controle de T. limbativentris. Esse aspecto é de fundamental importância no delineamento de uma estratégia eficiente para o controle microbiano, pois os fungos entomopatogênicos são bastante sensíveis à umidade relativa, temperatura e incidência de luz, sendo a metodologia de aplicação importante para garantir a eficácia do controle (ALVES, 1998).

Mesmo com resultados positivos obtidos em condições controladas, a realização de bioensaios em campo é necessária para se confirmar a real viabilidade do uso do entomopatógeno no controle do insetopraga de interesse. MARTINS et al. (2004b) realizaram um ensaio em campo com o isolado CP 172 de M. anisopliae, que havia demonstrado controle eficiente em laboratório e casa-de-vegetação, e observaram uma infecção reduzida para adultos de T. limbativentris, demonstrando assim a dificuldade de utilização desse patógeno para o controle do insetopraga na cultura do arroz irrigado.

Os resultados deste trabalho demonstram que ovos, ninfas e adultos de T. limbativentris são suscetíveis à infecção pelo isolado CG 891 de M. anisopliae, sendo esse entomopatógeno um promissor agente de controle biológico da praga na cultura do arroz irrigado. A eficiência desse isolado será confirmada pela realização de bioensaios em condições de semicampo e campo, onde o patógeno deverá sofrer a influência dos fatores bióticos e abióticos existentes nas lavouras de arroz.

Novas propostas para o manejo de T. limbativentris utilizando o fungo M. anisopliae necessitam ser avaliadas. Aplicações sobre as populações durante a hibernação e sobre os insetos pós hibernantes seriam algumas das estratégias a serem testadas, considerando que nesses períodos os insetos adultos estariam mais vulneráveis à atuação do fungo. Aplicações na primeira geração anual poderiam atingir ovos e ninfas, favorecendo a disseminação do patógeno através da dispersão de insetos contaminados e garantindo a permanência do fungo sobre hospedeiros naturais no ambiente.

AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa de estudos à primeira autora e a Epagri pelas facilidades concedidas quando da realização dessa pesquisa em seus laboratórios.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2007

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2006
  • Aceito
    06 Jun 2007
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