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VIABILIDADE DE CONÍDIOS E BLASTÓSPOROS DE SPOROTHRIX INSECTORUM (HOOG & EVANS) ARMAZENADOS EM DIFERENTES TEMPERATURAS* * Projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

VIABILITY OF CONIDIUM AND BLASTOPORES OF SPOROTHRIX INSECTORUM (HOOG & EVANS) STORED AT DIFFERENT TEMPERATURES

RESUMO

A viabilidade de blastósporos e conídios do fungo entomopatogênico Sporothrix insectorum (Hoog & Evans), em formulações líquida e sólida, foi avaliada após o seu armazenamento em temperatura ambiente, geladeira e freezer. Observou-se após 24 horas do armazenamento que não ocorreram diferenças estatísticas entre as formulações. A viabilidade foi alterada de maneira acentuada aos 100 dias após o armazenamento e decorridos 120 dias, a formulação líquida armazenada em geladeira apresentou a maior viabilidade dos blastósporos (51,73%). A produção por fermentação líquida apresentou bons resultados quanto à viabilidade de blastósporos, sendo uma alternativa promissora para a produção comercial do fungo em comparação com a formulação sólida. Para tanto, o armazenamento em geladeira foi o melhor método estudado, permitindo o armazenamento do fungo por 2 meses.

PALAVRAS-CHAVE:
Seringueira; controle biológico; Leptopharsa heveae.

ABSTRACT

The viability of blastospores and conidium of Sporothrix insectorum, in liquid and solid formulations, were evaluated after the storage of these propagula at room temperature, refrigerator and in freezer condition. There was no statistical difference among the treatments after 24 hour storage. The viability dropped significatively after 100 days storage. After 120 days storage, the liquid formulation storage in refrigerator showed the highest viability of blastospore (52%). The production in liquid fermentation process showed good results concerning the viability of blastospores, being a promising alternative for the commercial production of this fungus. The best condition to store fungus blastospore was the refrigerator, keeping the fungus viability for 2 months.

KEY WORDS:
Rubber tree; biologic control; Leptopharsa heveae.

INTRODUÇÃO

Com relação à produção de fungos entomopatogênicos, COUCH & IGNOFFO (1981)COUCH, T.L. & IGNOFFO, M. Photoprotection of Bacillus thuringiensis kurstaki from ultraviolet irradition. J. Invertebr. Pathol., v.57, p.343-351, 1981. alertaram que no desenvolvimento de formulações de entomopatógenos a pesquisa deve orientar-se para a manutenção da viabilidade e virulência do microrganismo durante o processo de produção, de forma a obter-se um produto no qual sejam preservadas ou aumentadas estas propriedades. Os componentes presentes nas formulações devem contribuir para o incremento da estabilidade, virulência e eficácia do agente de biocontrole. Os meios de cultura ricos em carbono e nitrogênio podem proporcionar um maior crescimento vegetativo de fungos, enquanto que aqueles deficientes em nitrogênio podem aumentar a conidiogênese (MCCOY & KANAVEL, 1969MCCOY, C.W. & KANAVEL, R.F. Isolation of Hirsutella thompsonii from the citrus rust mite Phyllocoptruta oleivora, and its cultivation on various synthetic media. J. Invertebr. Pathol., v. 14, p.386-390, 1969.; ROMBACH et al., 1988). A maioria dos meios de cultura constitui-se de uma mistura simples de proteína hidrolizada, geralmente extrato de levedura, como fonte de nitrogênio e um açúcar, como fonte de carbono (BARROS et al., 1988; ALVES et al., 1998ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. 1163p.).

A produção de qualquer agente de controle biológico deve levar em consideração também a formulação final do produto (ALVES et al., 1987ALVES, S.B., SILVEIRA NETO, S.; PEREIRA, R.M.P; MACEDO, N. Estudo de formulações de Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. em diferentes condições de armazenamento. Ecossistema, v.12, p.78-87, 1987). Para se formular um produto microbiano é necessário utilizar inertes, conservantes e protetores que facilitem o preparo, a aplicação e o seu armazenamento.

O programa com o fungo Sporothrix insectorum (Hoog & Evans) é um exemplo da utilização de microrganismos entomopatogênicos no controle de pragas. Os agricultores no Estado de São Paulo, o maior produtor de látex do Brasil, pulverizaram 5 mil hectares de seringueira na safra 2000-2001, o que demandou 5 mil litros do bioinseticida líquido. Elaborado com o isolado CB 79 do fungo S. insectorum, o bioinseticida controla uma das pragas mais prejudiciais ao cultivo da seringueira, o percevejo-de-renda Leptopharsa heveae (DRAKE & POOR, 1935), o qual reduz a produção de fotossíntese da planta e, em conseqüência, a produção de látex, matéria-prima natural para a produção de borracha (BATISTA FILHO, 2001 comunicação pessoal).

Segundo ALVES & PEREIRA (1998)ALVES, S.B. & PEREIRA, R.M.P. Produção de fungos entomopatogênicos. In: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.845-867. a produção em meios líquidos utilizando fermentação contínua pode ser empregada quando se deseja produzir grandes quantidades, como vem sendo realizado com Beauveria bassiana comercializado como Boverin, Verticillium lecanii comercializado na Europa como Vertalec e Micotal, e Metarhizium anisopliae na formulação BIO 12020. Nesse processo obtém-se elevadas quantidades de biomassa em um pequeno espaço físico e pouco tempo.

Em seringais de copas mais densas, BERNARDO et al. (1998)BERNARDO, E.R.A.; RODRIGUES, A.M.; CASSETARI NETO, D. Efeito da temperatura e de produtos químicos sobre o ciclo biológico de Sporothrix insectorum. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 1., 1998, Rio de Janeiro, RJ. Resumos. Rio de Janeiro: 1998. p.18. verificaram que a eficiência do fungo S. insectorum foi próxima de 70% com relação ao percevejo de renda. A utilização do fungo S. insectorum no controle de L. heveae traz algumas vantagens tais como a especificidade, a capacidade de dispersão no ambiente, o controle mais duradouro, a possibilidade de associação com outros métodos de controle e uso das mesmas máquinas de aplicação dos defensivos químicos, além da não poluição do ambiente e do baixo risco de intoxicação para homens e animais.

Dessa forma, este trabalho teve como objetivo determinar a viabilidade de blastósporos e conídios de S. insectorum em formulações líquidas e sólidas, respectivamente, ao longo do armazenamento em diferentes temperaturas por até 120 dias.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi realizado no Laboratório de Controle Biológico do Instituto Biológico, sediado em Campinas, SP. O ensaio foi instalado segundo delineamento de blocos ao acaso utilizando-se os seguintes tratamentos: blastósporos produzidos em meio líquido e armazenados em ambiente, geladeira e freezer, e conídios produzidos em meio sólido (arroz) e armazenados em ambiente, geladeira e freezer. Cada tratamento consistiu de 4 repetições, sendo realizada a leitura da viabilidade dos blastósporos em 2 amostras por repetição.

Para os tratamentos do fungo em meio sólido, foram utilizados 210 saquinhos de polietileno contendo 20 g de arroz com fungo produzido pelo processo descrito por ALVES & PEREIRA (1998)ALVES, S.B. & PEREIRA, R.M.P. Produção de fungos entomopatogênicos. In: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.845-867., armazenados em temperatura ambiente (26° C), geladeira (4° C) e freezer (-10° C).

Para os tratamentos do fungo em meio líquido, foram utilizados 70 frascos de plástico contendo 20 mL de fungo, armazenados em ambiente (26° C), geladeira (4° C) e freezer (-10° C).

A avaliação da porcentagem da viabilidade dos conídios e blastósporos foi realizada aos 1, 40, 80, 100 e 120 dias após o armazenamento. Para os conídios, retirou-se 1 g de arroz de 4 amostras, ao acaso, completando com 9 mL de água destilada estéril e agitando-se por 10 segundos. Esta suspensão foi coada em gaze. Foram inoculadas 3 gotas da suspensão de blastósporos em placas de Petri contendo BDA e espalhou-se com alça de Drigalsky. Após 17 horas de incubação a 26° C, em câmara de germinação, foi avaliada a porcentagem da viabilidade dos blastósporos em microscópio óptico (400x de aumento).

Para blastósporos, a metodologia foi a mesma, retirando-se 1 mL da suspensão desse propágulo no meio líquido, seguido da sua diluição em 9 mL de água destilada.

Os dados das médias de viabilidade de blastósporos e conídios obtidos após o armazenamento foram analisados através do teste de Tukey a 5% de probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Verificou-se que, após um período de 24 horas, não houve diferença significativa na viabilidade dos conídios e blastósporos do fungo S. insectorum armazenados nas diferentes temperaturas (Tabela 1).

Tabela 1
Médias da viabilidade (%) dos blastósporos (blas) e conídios (con) de Sporothrix insectorum após 1, 40, 80, 100 e 120 dias de armazenamento dos propágulos em meio líquido e sólido, respectivamente, sob diferentes temperaturas (26, 4 e -10° C).

Após 40 dias do armazenamento, houve uma queda na viabilidade dos blastósporos mantidos em geladeira e conídios mantidos em freezer, não diferindo entre si, porém diferindo dos demais tratamentos. Após 40 dias, ocorreu a diminuição da viabilidade em todos os tratamentos. Após esse período, a formulação líquida armazenada em geladeira foi a que manteve maior viabilidade dos propágulos (62%) até 100 dias após o armazenamento (Tabela 1). MARQUES & ALVES (1995)MARQUES, E.J. & ALVES, S.B. Otimização de formulações na preservação de conídios de Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. e Beauveria bassiana (Bals.) Vuill. em diferentes temperaturas e armazenamento. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENTOMOLOGIA, 15., Caxambu, MG. Resumos. Caxambu: 1995. p.293. estudaram diferentes formulações de B. bassiana e M. anisopliae. Após 180 dias de armazenamento, à temperatura de 20 ± 1° C, os conídios de M. anisopliae + lactose apresentaram 70% de viabilidade. O tratamento conídios de B. bassiana misturados com meio de cultura (arroz), nas mesmas condições, apresentavam 95% de viabilidade. O fungo B. bassiana em óleo de girassol manteve 90% de viabilidade dos conídios após 240 dias de armazenamento. ALVES et al., (1995) descreveram que os conídios de B. bassiana armazenados em geladeira por sete anos germinaram no período de 72 a 96 horas sob temperatura de 26° C, enquanto que os conídios não armazenados ou armazenados em freezer germinaram entre 18 e 24 horas.

Apesar de existirem algumas dificuldades práticas para a produção de fungos em meio líquidos, esse método tem grandes vantagens no que se refere à facilidade de pulverização do fungo junto com o meio, evitando-se os gastos com mão-de-obra para lavagem do material, como é feito quando é produzido em meio sólido a base de arroz. O processo de produção por fermentação líquida permite, também, uma alta e rápida produção de blastósporos desse fungo. LEITE et al. (1997)LEITE, L.G.; BATISTA FILHO, A.; OLIVEIRA, S.M.C. Avaliação de meios de cultura líquidos para a produção do fungo entomopatogênico Sporothrix insectorum Hoog & Evans. In: REUNIÃO ANUAL DO INSTITUTO BIOLÓGICO, 10., 1997, São Paulo. Resumos. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.64, supl., p.80, 1997. estudaram a infectividade de blastósporos do fungo contra adultos do percevejo-de-renda e compararam com a forma de conídios. O fungo na forma de blastósporos proporcionou 59,8% de mortalidade na dose 1,9 x 107 unidades/mL, enquanto que na forma de conídios a mortalidade foi de 73,6%.

A produção em escala comercial de entomopatógenos representa uma etapa crítica e limitante no desenvolvimento de um programa de controle microbiano para uma determinada praga. Novas metodologias de sistema de produção vêm sendo estudadas, procurando tornar o controle microbiano de pragas economicamente viável para ser aplicado em grandes áreas (TANZINI , 2002TANZINI, M.R. Controle do percevejo-de-renda-da-seringueira Leptopharsa heveae com fungos entomopatogênicos. Piracicaba: 2002. 140p.[Tese (Doutorado) - Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Univ. São Paulo].).

A produção por fermentação líquida apresentou bons resultados quanto à viabilidade de blastósporos, sendo uma alternativa promissora para a produção comercial do fungo S. insectorum. Para tanto, o armazenamento do fungo em geladeira foi o melhor método estudado, mantendo a viabilidade dos blastósporos acima de 76% por um período de 2 meses.

CONCLUSÕES

A produção do fungo em meio líquido apresentou melhor viabilidade dos blastósporos.

O armazenamento de blastósporos em geladeira manteve maior viabilidade do fungo, sendo este método de conservação o mais indicado.

  • *
    Projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ALVES, S.B., SILVEIRA NETO, S.; PEREIRA, R.M.P; MACEDO, N. Estudo de formulações de Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. em diferentes condições de armazenamento. Ecossistema, v.12, p.78-87, 1987
  • ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. 1163p.
  • ALVES, S.B. & PEREIRA, R.M.P. Produção de fungos entomopatogênicos. In: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.845-867.
  • BARROS, N.M.; RICARDO, K.R., FACCHIN, I. Estudo do crescimento e germinação conidial de linhagens do fungo Nomuraea rileyi em diferentes substratos. Rev. Cent. Cienc. Rurais, Santa Maria, v.18, p.163-167, 1998.
  • BERNARDO, E.R.A.; RODRIGUES, A.M.; CASSETARI NETO, D. Efeito da temperatura e de produtos químicos sobre o ciclo biológico de Sporothrix insectorum In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 1., 1998, Rio de Janeiro, RJ. Resumos. Rio de Janeiro: 1998. p.18.
  • COUCH, T.L. & IGNOFFO, M. Photoprotection of Bacillus thuringiensis kurstaki from ultraviolet irradition. J. Invertebr. Pathol., v.57, p.343-351, 1981.
  • LEITE, L.G.; BATISTA FILHO, A.; OLIVEIRA, S.M.C. Avaliação de meios de cultura líquidos para a produção do fungo entomopatogênico Sporothrix insectorum Hoog & Evans. In: REUNIÃO ANUAL DO INSTITUTO BIOLÓGICO, 10., 1997, São Paulo. Resumos. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.64, supl., p.80, 1997.
  • MARQUES, E.J. & ALVES, S.B. Otimização de formulações na preservação de conídios de Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. e Beauveria bassiana (Bals.) Vuill. em diferentes temperaturas e armazenamento. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENTOMOLOGIA, 15., Caxambu, MG. Resumos Caxambu: 1995. p.293.
  • MCCOY, C.W. & KANAVEL, R.F. Isolation of Hirsutella thompsonii from the citrus rust mite Phyllocoptruta oleivora, and its cultivation on various synthetic media. J. Invertebr. Pathol., v. 14, p.386-390, 1969.
  • ROMBACH, M.C., AGUDA, R.M.; ROBERTS, D.W. Production of Beauveria bassiana (Deuteromycotina: Hyphomycetes) in different liquid media and subsequent conidiation of dry mycelium. Entomophaga, v.33, n.3, p.315-324, 1998.
  • TANZINI, M.R. Controle do percevejo-de-renda-da-seringueira Leptopharsa heveae com fungos entomopatogênicos Piracicaba: 2002. 140p.[Tese (Doutorado) - Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Univ. São Paulo].

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2003

Histórico

  • Recebido
    11 Nov 2002
  • Aceito
    24 Fev 2003
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