REDESCRIÇÃO DA BOLSA COPULADORA DE VIANELLA HYDROCHOERI (TRAVASSOS, 1914) TRAVASSOS, 1918 COM ÊNFASE NO CONE GENITAL (TRICHOSTRONGYLOIDEA, VIANAIIDAE)¹

REDESCRIPTION OF THE COPULATORY BURSA OF VIANELLA HYDROCHOERI (TRAVASSOS, 1914) TRAVASSOS, 1918 WITH EMPHASIS ON GENITAL CONE (TRICHOSTRONGYLOIDEA, VIANAIIDAE)

RESUMO

Em 27 dissecações de sistemas digestivos de capivaras, Hydrochaeris hydrochaeris Linnaeus, 1766 criadas em cativeiro em Santo Antônio da Patrulha, RS, e abatidas em frigorífico entre março e setembro de 2000, foi encontrado o tricostrongilídeo Vianella hydrochoeri (Travassos, 1914) Travassos, 1918 parasitando o intestino delgado. O cone genital dos machos de V. hydrochoeri foi medido, incluindo o par de papilas "7", com o intuíto de aprimorar o estudo taxonômico deste helminto.

PALAVRAS-CHAVE:
Vianella hydrochoeri; Hydrochaeris hydrochaeris; capivara; bolsa copuladora; cone genital; taxonomia.

ABSTRACT

In 27 dissections of digestive tracts of capybaras, Hydrochaeris hydrochaeris Linnaeus, 1766, raised under captivity on a farm, Santo Antônio da Patrulha, RS, and killed in a slaughterhouse, Viamão, RS, from March to September 2000, the trichostrongylid Vianella hydrochoeri (Travassos, 1914) Travassos 1918 was found in the small intestine. The genital cone of the males of V. Hydrochoeri, including the pair of papillae "7", were measured to improve the taxonomic study of this helminth.

KEY WORDS:
Vianella hydrochoeri; Hydrochaeris hydrochaeris; capybara; copulatory bursa; genital cone; taxonomy.

INTRODUÇÃO

O estudo taxonômico da superfamília Trichostrongyloidea Cram, 1927 pode ser muito difícil, pois além de incluir um grande número de famílias, gêneros e espécies, a maioria apresenta muitas semelhanças morfológicas. Uma estrutura bastante usada na taxonomia dos tricostrongilídeos é a bolsa copuladora com seus lobos, raios e cone genital.

GIBBONS & KHALIL (1983) descreveram o cone genital como sendo composto por um grupo de pequenas estruturas ventrais ao lobo dorsal, circundando a cloaca, e centrais aos lobos laterais. GIBBONS & KHALIL (op. cit) também analisaram o uso do cone genital como caráter taxonômico baseado em trabalhos feitos por outros autores, com espécies das subfamílias Ostertagiinae, Haemonchinae e Cooperiinae, além de espécies dos gêneros Ancylostoma, Skrjabinagia, e Paracooperia, sempre observando a existência de peculiaridades relacionadas às diferentes espécies.

Em estudo sobre a helmintofauna de capivaras, Hydrochaeris hydrochaeris Linnaeus, 1766, COSTA & CATTO (1994) observaram a dificuldade em se diferenciar duas espécies de tricostrongilídeos: Hydrochoerisnema anomalobursata Arantes e Artigas, 1980 e Vianella hydrochoeri (Travassos, 1914) Travassos, 1918. Nas descrições destas espécies não constam informações sobre os componentes do cone genital. TRAVASSOS (1937) descreveu com detalhes a bolsa copuladora e os espículos de V. hydrochoeri, e citou o cone genital como sendo "muito desenvolvido e com armadura quitinosa..." . Porém, não há descrição do par de papilas "7" e demais estruturas que compõem o cone genital.

O presente trabalho tem como propósito a descrição do cone genital de V. hydrochoeri aprimorando seu estudo taxonômico.

MATERIAL E MÉTODOS

Os nematódeos estudados foram coletados do intestino delgado de um grupo de 27 capivaras, H. hydrochaeris, criadas em cativeiro na fazenda Rincão da Palmeira, localidade de Vila Palmeira, Santo Antônio da Patrulha, RS (29º51'30" sul e 50º35'16" oeste), e abatidas no frigorífico Líder, Viamão, RS, entre os meses de março e setembro de 2000. As vísceras dos hospedeiros foram levadas ao Laboratório de Helmintologia do Departamento de Zoologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, onde foram examinadas. Após a coleta, os nematódeos foram fixados em A.F.A. e conservados em etanol 70 ºGL. Posteriormente, foram clarificados em lactofenol de Amann (HUMASON, 1971). As medidas estão indicadas em micrometros. As ilustrações foram feitas com um fotomicroscópio Leitz Dialux 20EB, acoplado com tubo para desenho, enquanto que as fotomicrografias foram obtidas com um microscópio Zeiss Axiolab equipado para a observação em contraste de fase.

RESULTADOS

A bolsa copuladora apresenta os lobos laterais simétricos e o lobo dorsal assimétrico (Fig. 1), o cone genital apresenta-se em forma de funil, com armadura esclerotinizada e um par de papilas "7" (Fig. 2), e os raios inserem-se, dorsalmente, à cloaca e, ventralmente, ao lobo dorsal. Estes raios são longos, simétricos e na extremidade distal de cada raio encontra-se a papila que apresenta uma peculiar forma de grão de feijão.

Fig. 1
Desenho da bolsa copuladora de Vianella hydrochoeri, em vista ventral, mostrando: A - lobos laterais, B - lobo dorsal, C - cone genital, C¹ - base do cone genital, C² proconus, C³ - raio da papila "7", C⁴ - papila "7" e D espículos. Barra = 200 µm.

A Tabela 1 mostra as medidas das estruturas que constituem o cone genital de V. hydrochoeri.

Tabela 1
Morfometria do cone genital de Vianella hydrochoeri, amostra constituída por 10 espécimes.

Estruturas	Medida (X) µm	Amplitude de variação µm
Comprimento (da base ao proconus)	104,65	65 - 124
Largura da base	97,46	64 - 114,08
Largura do proconus	21,82	17,36 - 34,72
Comprimento do raio da papila "7"	48,44	47,12 - 49,95
Comprimento da papila "7" (diâmetro maior)	19,22	17,36 - 22,32
Largura da papila "7" (diâmetro menor)	13,02	9,92 - 14,88

DISCUSSÃO

No trabalho de TRAVASSOS (1937) tanto na descrição da bolsa copuladora, de V. hydrochoeri, como na ilustração da espécie, não há referência ao par de papilas “7”. YAMAGUTI (1961) utiliza a mesma estampa de TRAVASSOS (1937) e VICENTE et al. (1997) utilizam a mesma descrição de TRAVASSOS (1937) para esta espécie inclusive utilizam a estampa 267-2 de TRAVASSOS (1937) que é de Tricholinstowia linstowi e não de V. hydrochoeri. Todas as ilustrações encontradas na literatura não apresentam a bolsa copuladora completamente aberta, como está documentado na Figura 1 do presente trabalho, e os dados apresentados na Tabela 1 também são inéditos.

Fig. 2
Fotomicrografia da bolsa copuladora de Vianella hydrochoeri, em vista ventral, mostrando: A -detalhe do cone genital e B -detalhe da papila "7". Barra = 50 µm.

O par de espículos em V. hydrochoeri é assimétrico, apresentam tamanhos diferentes e sobrepõem-se nas suas extremidades distais, razão pela qual não puderam ser medidos.

Julgamos que estas informações, aliadas às já existentes na literatura, facilitarão os futuros trabalhos taxonômicos, principalmente, na diferenciação de vianaídeos parasitos de intestino delgado de Hydrochaeris hydrochaeris.

AGRADECIMENTOS

Ao Professor José F. Amato, pelo material fotográfico e à Malu, pelo desenho da figura.

• 1
  Este artigo faz parte da dissertação de mestrado do primeiro autor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• COSTA, A.F.C. & C ATTO, J.B. Helmintos parasitos de capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris) na sub-região da Nhecolândia, Pantanal Sul-Mato-Grossense. Rev. Bras. Biol., v.54, n.1, p.39-48, 1994.
• GIBBONS, L.M. & KHALIL, L.F. Morphology of the genital cone in the nematode family Trichostrongylidae and its value as a taxonomic character. In: STONE, A.R.; PLATT, H.M.; KHALIL, L.F. (Eds.) Concepts in nematode systematics London: Academic Press, 1983. p.261-271.
• HUMASON, G.L. Animal tissue techniques San Francisco: W.H. Freeman and Company, 1971. 641p.
• TRAVASSOS, L. Revisão da família Trichostrongylidae Leiper, 1912. Monogr. Inst. Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 1937. 512p. 297 estampas.
• VICENTE, J.J.; RODRIGUES, H.O.; GOMES, D.C.; PINTO, R.M. Nematóides do Brasil. Parte V: Nematóides de mamíferos. Rev. Bras. Zool., v.14, n.1, p.1-452, 1997.
• YAMAGUTI, S. Systema Helminthum Vol. III. The Nematodes of Vertebrates. New York: Interscience Publisher, 1961. 1261p.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Jul 2024
• Data do Fascículo
  Apr-Jun 2003

Histórico

• Recebido
  18 Dez 2002
• Aceito
  16 Maio 2003