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Sobre a psicogênese do "mal de engasgo"

O A. ressalta o aspecto psicológico da etiologia do cardiospasmo ou mal de engasgo, assunto até agora não abordado nos meios científicos brasileiros. Sem pretender afastar outros elementos causais que tenham sido, porventura, verificados e que poderão, talvez, agir concomitantemente, o A. é de opinião que o mal de engasgo é um disturbio funcional condicionado psìquicamente, cujas conseqüências se tornam irreversíveis depois de certo tempo. As conclusões apresentadas baseiam-se no material fornecido por pacientes em tratamento psicanalítico que apresentam fenômenos disfágicos, e por vários casos das clínicas de orientação infantil entre cujos problemas se incluem, além da dificuldade de engulir, a anorexia e a bulimia. Com respeito às atividades emocionais típicas que formam o substrato psicológico do mal de engasgo, o ponto fundamental está em que êste representa um compromisso, expresso ao nível oral, entre tendências passivo-receptivas e ativo-expulsivas. A essa situação psíquica correspondem condições de ambiente, atuais ou pretéritas, que, de modo contraditório, favorecem uma atitude de dependência infantil, ao mesmo tempo que acarretam repetidas frustrações. Trata-se, em geral, de mães dominadoras que, enquanto superprotegem a criança, agem para com ela com demasiado rigor. A superproteção centraliza-se sobretudo no que se refere aos alimentos, que se investem, assim, de grande significado emocional. O A. apresenta o resumo de uma observação clínica que apoia seu ponto de vista. Também a anorexia e a bulimia, em seu substrato psicodinâmico, estão relacionadas com o problema do apego e da emancipação e giram em torno da pessoa da mãe e da função alimentar. A solução do conflito faz-se, porém, num dos casos, pela rejeição do alimento e, noutro, pela avidez. O mal de engasgo constitui o meio têrmo entre os dois extremos. Existem, igualmente, nas neuroses gástricas e em sua conseqüência direta, a úlcera péptica, desejos oral-receptivos que são fortemente rejeitados, por incompatíveis com as aspirações de independência do indivíduo; a solução escolhida é, porém, uma reação caracterológica que consiste numa atitude de empreendimento e de responsabilidade ante os demais. O tipo gástrico é, pois, mais complexo e menos primitivo: enquanto que os outros tipos mencionados buscam resolver seus problemas no plano digestivo, ele tenta fazê-lo no plano social; não o consegue, entretanto, integralmente, e a expressão de seu fracasso está nos distúrbios corporais que apresenta. Importante questão fica fora do âmbito do material do A.: a da freqüente associação entre megaesôfago e megacólon. Acredita, porém, que ambos correspondem a fases diversas da evolução libídica, em que entram, em diferentes doses, elementos orais e anais. Refere-se, a seguir, à componente anal que existe, até certo ponto, na estruturação afetiva do cardiospasmo e que falta, na mesma proporção, em outras afecções das vias digestivas superiores. O material utilizado nada esclarece quanto aos distúrbios cardíacos e demais manifestações descritas em outros órgãos e aparelhos. O A. acredita não haver qualquer contra-senso em encarar as alterações his-topatológicas como fenômenos meramente secundários. Muitos dos atuais pontos obscuros desse capítulo da patologia serão, sem dúvida, afastados quando, junto aos demais estudiosos do assunto, estejam psiquiatras e assistentes sociais orientados psicanalìticamente.


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