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Análises de revistas

Contribuição ao estudo da via acústica (Contribución al estudio de la via acústica). N. von Subiron. Rev. Neurol. B. Aires. 8: 172-244 (setembro) 1943.

Trabalho do Laboratório de Neurobiologia do Hospital Nacional de Alienados. O A., que é docente-livre de otorrinolaringologia, relata e ilustra profusamente exaustivo estudo anátomo-clínico de um caso com focos múltiplos, de várias idades, bilaterais, de amolecimento cerebral, por obstrução de ramos arteriais. Ressalta da sintomatologia uma surdez total, distúrbios mentais com alucinações acústicas, ataques epileptiformes relativamente frequentes e, pregressamente, hemiplegia esquerda e disartria, ambas passageiras. O caso é aproveitado para a exposição do conceito da escola de Chr. Jakob sobre as vias acústicas centrais, além de outras idéias também próprias, entre as quais uma sobre a sistematização do diencéfalo, já apresentadas em publicações prévias. Nas páginas finais, em que trata propriamente das vias acústicas, o A. expõe sucintamente o conceito de Cajal e aponta contribuições de alguns outros pesquisadores, inclusive as defendidas por Chr. Jakob e sua escola. Essa exposição é acompanhada de um esquema próprio (fig. 52), muito elucidativo.

O. Aidar

Natureza da paresia consequente à cordotomia dorsolateral em macacos (Nature of paresis following lateral cortico-spinal section in monkeys). B. W. Cannon, L. E. Beaton e E. W. Ranson. J. Neurophysiol, 6: 242-430 (setembro-novembro) 1943.

Em uma série de 9 "Macaca mulatta" foi feita cordotomia dorsolateral (em 5 casos ao nível de C4 e em 4 ao nível de T9) interrompendo deste modo o feixe piramidal unilateralmente. Os resultados neurológicos foram avaliados por exames feitos periodicamente e com testes escolhidos e os respectivos protocolos foram reunidos em quadros muito demonstrativos. Os resultados anatômicos foram controlados após 4 a 9 semanas, sendo os animais sacrificados e os cortes seriados da medula estudados com técnica adequada, comprovando-se, assim, quais as vias atingidas pelo ato cirúrgico. Como resultado destes estudos concluíram os AA. que a interrupção do tracto corticospinhal na coluna lateral da medula em macacos dá lugar a uma paresia flácida, predominante no membro inferior, afetando mais as partes distais das extremidades que as proximais, em ausência de libertação dos reflexos profundos, de clono e de qualquer fenômeno de espasticidade. Estes resultados confirmam os de Tower em 1940. Decorre disto que as fibras corticospinhais, inibidoras das funções segmentares inferiores, cuja lesão dá lugar à síndrome de hipertonia, clono e reflexos exaltados, no macaco, não trafegam no tracto dorsolateral da medula, por onde passam fibras corticospinhais.

P. Pinto Pupo

Fisiologia da medula. Influência da cordotomia sobre os distúrbios motores (Physiology of the spinal cord. the influence of chordotomy on existing motor disturbances). Olan R. Hydman. J. Nerv. a. Ment. Dis. 98: 343-358 (outubro) 1943.

O A., analisando a fenomenologia neurológica apresentada por pacientes submetidos à secção de cordões medulares para a terapêutica de distúrbios motores, procura interpretar a fisiopatologia da medula. Esta é a segunda publicação de uma série iniciada em 1941 com um trabalho sobre o papel dos cordões anteriores da medula na hiperreflexia e no tono de atitude. São apresentadas quatro observações. A primeira relativa a um caso de espasmo de torção no qual a secção da coluna posterior da medula não modificou os distúrbios motores. As três restantes relativas a indivíduos com hipertonia e contratura em extensão de membros inferiores, consequentes a lesões piramidais, nos quais foi feita a cordotomia anterior. No primeiro caso havia paralisia completa e hipertonia em extensão de um membro inferior consequente a tumor da fossa anterior. O segundo era um tetraplégico por lesão congênita. O terceiro um paraplégico por compressão da medula dorsal. Como resultado da cordotomia houve diminuição acentuada da hipertonia em extensão; entretanto, nos dois últimos casos, apareceu, tardiamente, hipertonia em flexão. Em todos eles a exaltação dos reflexos profundos, o clôno e o sinal de Babinski não se modificaram. Baseado nestes elementos e os comparando aos dados existentes na literatura, o A. discute a fisiopatologia dos cordões anteriores da medula, particularmente do feixe vestibulospinhal, o feixe extrapiramidal por excelência. O A. traz mais uma prova para o fato, já de há muito conhecido, que a paraplegia em flexão é fruto de uma lesão concomitante dos sistemas piramidal e extrapiramidal na medula; evidencia, com elementos experimentais no homem, que a hiperreflexia profunda, o clôno e o sinal de Babinski são fenômenos do automatismo medular; comprova o papel importante que goza o sistema vestibulospinhal na manutenção do tono extensor nos membros inferiores, isto é, o tono da estática; a cordotomia anterior nos casos de extrema espasticidade só tem interesse para diminuir a predominância do tono de extensão, por vezes bastante incômoda. Merece destaque a contradição que faz Hydman à afirmação de Tower, secundada por Fulton, de que "contrary to clinical opinion, interruption of the pyramidal pathway does not give rise to spasticity or to other symptoms of release". Para Hydman isto só é verídico em relação ao macaco pois que, no homem, onde o sistema extrapiramidal já se telencefalizou e o feixe piramidal é uma via de projeção para fibras piramidais e extrapiramidais, o sistema do cordão anterior, isto é, o único puramente extrapiramidal, só tem papel na manutenção do tono dos músculos antigravitários. Este trabalho representa, sem dúvida, mais um passo à frente em nossos conhecimentos sobre a fisiopatologia da motricidade e deve ser colocado entre as múltiplas e inestimáveis contribuições que vêm nestes últimos tempos nos dando novos rumos ao estudo do sistema extrapiramidal.

P. Pinto Pupo

Ponto de origem das contrações fasciculares no músculo voluntário (Site of origin of fasciculation in voluntary muscle). F. M. Forster e B. J. Alpers. Arch. Neurol. a. Psychiat. 51: 264 (março) 1944.

Denny-Brown e Pennybacker, em 1938, fizeram distinção entre o tremor constante e irregular do músculo enervado exposto (fibrilações) e as contrações grosseiras e involuntárias, visíveis através da pele e produzidas por músculos com inervação íntegra (fasciculações). Estas representariam contrações de unidades motoras intermediárias entre fibrilas e feixes musculares, enquanto que as fibrilações seriam devidas à sensibilização do músculo em degeneração às pequenas taxas de acetilcolina circulante. Esses autores atribuíam as fasciculações a um processo situado nos nervos periféricos ou, mais provavelmente, nas células dos cornos anteriores. Entretanto, os estudos de outros pesquisadores pareciam infirmar o conceito de que as fasciculações tivessem uma origem medular. Em 1915 já Langley e Rato haviam demonstrado que: 1) a prostigmina e a fisostigmina produzem fasciculações porque conservam a acetilcolina na junção mioneural; 2) o curare anula as fasciculações devidas à fisostigmina. Pommé e Noel observaram a redução das placas motoras na atrofia muscular progressiva. Houve novas pesquisas de Price e Swank, e de Russel, Odom e McEachern, porém, com resultados contraditórios.

Os AA. realizaram várias experiências com o fim de esclarecer a questão. Foram estudados 4 casos: 3 de esclerose lateral anrotrófica e 1 com sequelas de poliomielite. Durante a raquianestesia, os acidentes miográficos não predominam sobre os que surgem no período de controle; a injeção de procaína no nervo peroneiro não altera a frequência das fasciculações nos músculos paralisados. A administração de prostigmina durante raquianestesia ou bloqueio do nervo periférico produz notável aumento no número de fasciculações dos músculos paralisados, igual ao que se verifica na ausência de qualquer bloqueio. A curarização, mesmo parcial, abole as fasciculações; os movimentos voluntários deflagram abalos musculares, mas estes não são seguidos por contrações fasciculares, como se observa nos períodos de controle; além disso, a prostigmina, administrada durante a curarização, não produz fasciculações. O mecolil não atua sobre essas contrações durante períodos de controle, bloqueio, ou curarização, provavelmente porque essa substância é rapidamente destruída pelas colinesterases.

No estudo feito pelos AA. foram evitados os movimentos intencionais e de postura. Por este método, pode-se supor que a impossibilidade de se reduzir ou abolir as fasciculações pela raquianestesia ou pelo bloqueio neural indica que as descargas causadoras destas contrações não provêm das células motoras da medula, das raízes ou da parte proximal do nervo bloqueado; se isto acontecesse, a interrupção da transmissão dos impulsos devia modificar a frequência das contrações fasciculares; a hipótese é reforçada pelo aumento produzido pela prostigmina durante o bloqueio. Lapicque admitia que o curare criava um heterocronismo neuromuscufar; para Kuffler, o bloqueio produzido deve-se ao fato de o curare diminuir a sensibilidade da placa motora à acetilcolina; mediante a curarização incompleta, os movimentos voluntários são possíveis, demonstrando que os impulsos podem transpor a placa motora; se as fasciculações fossem devidas a descargas dos cornos anteriores ou do nervo periférico proximal, estes impulsos também deveriam atravessar a junção mioneural. A persistência das fasciculações (espontâneas ou induzidas pela prostigmina) durante a raquianestesia e o bloqueio neural, e a abolição dessas contrações pelo curare, levaram os AA. a concluir que as fasciculações não se originam nos cornos anteriores da medula; sua sede deve corresponder à região da junção mioneural.

H. Canelas

Paralisia muscular e anormalidades eletrocardiográficas resultantes da perda de potássio na nefrite crônica (Muscular paralysis and electro-cardiografic abnormalities resulting from potassium loss tn chronic nephritis). M. R. Brown, J. H. Currens e J. F. Marchand. J. A. M. A. 124: 545-548 (26 fev.) 1944.

Têm sido observadas (Stewart, Smith, Milhorat) alterações eletrocardiográficas na paralisia periódica familial, caraterizadas pela pequena amplitude da onda T e alterações da condução auriculoventricular. São comuns as desordens do balanço eletrolítico nos processos em que a musculatura estriada está comprometida. Os AA. citam um caso publicado duas vezes (Taylor em 1898 e Edsall e Means em 1915) que apresentava alterações eletrocardiográficas desse tipo (depressão de ST, menor amplitude da onda T, onda U em Dt), em que os sais de potássio atuaram eficientemente sobre a força muscular durante um ataque de paralisia periódica familial. Os AA. estudam 3 casos de nefropatia observados no Hospital Geral de Massachusetts, nos quais havia, também uma afecção muscular classificável como paralisia periódica familial. As dosagens químicas revelaram sempre queda do teor potássico no soro durante os períodos paralíticos; não há aumento da taxa na urina, porém, a administração maciça de água provoca as crises musculares e aumenta a perda de potássio pela urina. Vários autores observaram, na insuficiência renal, aumento do potássio sérico, e outros notaram desordens eletrocardiográficas caraterizadas por aumento da amplitude da onda T, seguida por alterações da condução intraventricular e parada do coração, quando o teor no soro alcança 10 m. equ. por litro (relação entre a concentração em mgrs. por litro e o peso molecular). Os AA. acentuam que não se tem observado a associação de nefrite crônica com alterações eletrocardiográficas e outros sintomas da perda excessiva de potássio.

O primeiro caso é o de um doente que se apresentou com um quadro de nefrite crônica, sendo submetido ao tratamento usual. Retornou um mês depois, queixando-se de paralisia ascendente das extremidades; o exame neurológico revelou paralisia flácida das extremidades e incapacidade de erguer a cabeça, abolição dos reflexos cutâneo-abdominais e cremastéricos, diminuição dos osteotendinosos. O eletrocardiograma evidenciou os períodos do bloqueio auriculoventricular parcial progressivo de Wenckenbach-Tay, depressão do espaço ST em todas as derivações e onda T de pequena amplitude. O teor sérico do potássio não foi determinado, mas a paralisia regrediu prontamente com o tratamento pelo C1K. Advertem os AA., porém, que é necessário cuidado no uso deste sal nos casos de insuficiência renal, pelo perigo de haver intoxicação, capaz de produzir parada cardíaca. O segundo caso é o de uma doente que entrou no hospital em junho de 1941 queixando-se de crises de fraqueza e rigidez muscular, que duravam de 2 a 14 dias; tivera 7 crises, sendo 6 acompanhadas de paralisia cervical; uma das vezes apresentou tetraplegia flácida. Exame neurológico: moderada dor e rigidez dos membros inferiores, e hiporreflexia profunda. Enviada à secção de medicina, foi verificado que seus sintomas eram devidos a nefrite crônica com acidose. Teve alta 6 semanas após. Em janeiro de 1942 voltou, queixando-se de rigidez dos músculos dos membros e da mandíbula. Em janeiro de 1943 houve uma crise diferente: fraqueza muscular que se instalou gradualmente, provocando queda, limitando-se a paralisia às extremidades. Até então, o exame do coração revelara sempre normalidade; no entanto, o eletrocardiograma feito nessa data acusou pequena amplitude da onda T e depressão do espaço ST em todas as derivações. O teor de potássio sérico, após a volta à normalidade muscular, era de 4,5 m.equ. por litro (taxa fisiológica: 5,13). A paciente voltou duas vezes ainda, queixando-se de cãibras, atribuíveis à hipocalcemia e hipocloretemia. Em maio de 1943 a taxa de potássio no soro era de 2 m.equ. por litro. Fez-se o tratamento pelo C1K. Os AA. ainda apresentam um terceiro caso, internado por apresentar paralisia muscular; o exame neurológico revelou enfraquecimento dos membros, pescoço e tronco. Havia, também, uma nefropatia (litíase com lesão tubular). Encontrou-se baixo teor de potássio (2,5 a 2,9 m.equ. por litro). Caraterística eletrocardiográfica: pequena amplitude da onda T. Essas desordens eletrocardiográficas são comparáveis às encontradas na intoxicação pela digitalis, em que se tem observado decréscimo no teor de potássio do miocárdio; por outro lado, nessa eventualidade, os sais de potássio evitam as sístoles ventriculares prematuras.

H. Canelas

Barreiras protetoras do sistema nervoso central (Protective Barriers of the Central Nervous System). R. B. Aird e L. Strait. Arch. Neurol. a. Psychiat. 51: 54-66 (janeiro) 1944.

Valiosa contribuição para o conhecimento das barreiras encontradas ao nível do S.N.C.: hemoliquórica, hemocerebral e cortical. A segunda, entre sangue e líquido extracelular do cérebro, é constituída pelo endotélio dos capilares, e também por suas bainhas; a última, extra-intracelular, formada pela membrana da célula nervosa, controla o metabolismo cortical, tendo grande importância para a fisiologia cerebral. A permeabilidade da barreira hemoliquórica fora bem estudada, sabendo-se que aumentava quando se realizavam certas provas, como a punção raquídia, pneumencefalografia, etc. Mas não se demonstrara que houvesse alterações concomitantes da barreira hemocerebral. Não se conhecia nenhum processo de prevenir que esta barreira fosse atacada por moléstias, ou de abaixar sua permeabilidade, a não ser os possíveis efeitos da röntgenterapia (Spiegel e Quastler) e do corante supravital vermelho vital brilhante (Aird).

Os estudos dos AA. com o tripan vermelho visaram esclarecer as relações entre as duas barreiras, e o possível valor terapêutico da diminuição da permeabilidade das mesmas. Empregaram como agente convulsivante o cloridrato de cocaína. Em uma série de experiências, deram-se a camondongos brancos, em dias sucessivos, injeções intraperitoniais de tripan vermelho; o cloridrato de cocaína era dado dois dias após a última injeção do corante. Os resultados obtidos foram, em resumo: dos 233 animais não tratados, 166 (71%) apresentaram convulsões; dos 151 que receberam três ou mais injeções de tripan vermelho, apenas 21 (14%) tiveram convulsões. A seguir, os AA. estudaram a permeabilidade das barreiras líquor e cérebro-hemática, utilizando gatos em que, após narcose por cloralose e paraldeído, introduzia-se o cloridrato de cocaína, e retiravam-se amostras de líquor cisternal, sangue endocardíaco e córtex motora. Observaram, assim, dosando espectroquimicamente, que a concentração média de cocaína na córtex motora era de 0,066 mgrs. por gr. nos não tratados pelo tripan vermelho, e de 0,038 nos tratados. No sangue, as concentrações diferiam muito pouco (0,017 e 0,014). No líquor, eram de 0,0086 e 0,0051, respectivamente. Esses estudos indicam a influência do tripan vermelho sobre as barreiras líquor e cérebro-hemática. A quantidade de cocaína que atingiu a córtex foi reduzida de 31%, e a que chegou ao líquor caiu 40%, nos gatos tratados com o corante. O teor de cocaína maior na córtex que no líquor pode ser devido à diferença na permeabilidade das duas barreiras, mas também à maior solubilidade da cocaína nos constituintes do cérebro. Os estudos sobre a permeabilidade dessas barreiras mostram que ela varia com a carga elétrica da substância considerada, tratando-se aqui de membranas semipermeáveis, sendo eletiva a passagem dos metabólitos, conforme as leis do equilíbrio de Donnan; intervém a constituição dos meios e por isso, embora essencialmente idênticos os endotélios de ambas as barreiras, suas permeabilidades são diversas, pois diversos são o líquido extracelular do cérebro e o líquido cefalorraquídeo. Os AA. realçam, a propósito, a importância da barreira cortical. Sugerem que as contradições nos trabalhos sobre as barreiras líquor e cérebro-hemática podem ser atribuídas a não se ter considerado a barreira extra-intracelular. Esta explicaria a "afinidade do tecido nervoso" de King. É admissível que as barreiras líquor e cérebro-hemática sejam comparáveis, mas que, devido aos efeitos secundários da barreira cortical, possa haver diferenças nos resultados experimentais relativos a ambas.

Comentando suas experiências, os AA. ressaltam o paralelismo entre o tripan vermelho e o vermelho vital brilhante. Ambos são seletivos para os clasmatócitos do tecido conjuntivo, macrófagos das cavidades serosas, e células endoteliais. Entretanto, as meninges, o líquor, o epêndima e os tecidos corticais não se coram, com exceção dos elementos mesenquimais vasculares. Air observara, anteriormente, o efeito protetor do vermelho vital brilhante contra a ação convulsivante (precoce) e degenerativa (tardia) do trifenilfosfito. Conclui-se que esses dois corantes supravitais, além de protegerem contra os estados convulsivos, baixam grandemente a permeabilidade da barreira hemocerebral. Os AA. advertem que os resultados de suas experiências não devem levar à crença de que as formas de epilepsia sejam sempre do tipo tóxico. Embora se tenha evidenciado a importância das alterações da permeabilidade no estudo das convulsões epilépticas produzidas por drogas, deve-se considerar, na epilepsia humana, a associação de um fator desencadeante. O aumento da permeabilidade determinaria mais suscetibilidade às convulsões, pois baixa, concomitantemente, o limiar convulsivo. É evidente o valor dessas experiências para o tratamento das moléstias tóxicas (neurite retrobulbar, eclampsia, encefalopatia saturnina, envenenamento por arsênico), estados convulsivos tóxicos, e moléstias degenerativas do S.N.C, de provável origem tóxica (esclerose lateral amiotrófica, paralisia de Landry, atrofia muscular progressiva e esclerose múltipla). Os AA. finalizam por preconizar a experimentação clínica destes corantes, ou de substâncias semelhantes que venham a ser descobertas.

H. Canelas

ANATOMIA PATOLÓGICA

Alterações histopatológicas cerebrais causadas pelos tumores intracranianos (Histopathologic changes of the brain caused by intracranial tumors; so - called edema or swelling of the brain). G. Perret e J. Kernohan. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol., 2: 341-352 (outubro) 1943.

Os AA. chamam atenção para o edema cerebral em casos de tumores intracranianos, que muitas vezes pode determinar verdadeiros problemas clínicos e neurocirúrgicos difíceis de resolver. Depois de rápida revisão bibliográfica, passam a apresentar os resultados de suas pesquisas em 37 casos de tumores intracranianos vários, dois de abscessos cerebrais, um de hematoma subdural e um de edema de natureza desconhecida. Todos foram estudados exaustivamente pelas diversas técnicas histológicas e segundo um critério uniforme. Descrevem com minúcia os quadros anátomo e histopatológicos do edema cerebral e concluem, com Greenfield, que não há caracteres histológicos que diferenciem o "brain edema" do "brain swelling", para os quais chama tanta atenção grande número de neuropatologistas que seguem a diferenciação de Spatz. Se macroscopicamente aquele se apresenta mole e úmido, enquanto que este é duro e com grande aumento de volume, microscopicamente não há diferenciação possível. Na grande maioria dos casos não se pode dizer que haja entumescimento das células em si ou se o líquido intersticial (pericelular e perivascular) é o fator predominante. No que diz respeito à gênese própria do edema são de opinião que os diversos fatores inculpados habitualmente entram em jogo combinadamente conforme o caso. Assinalam, particularmente, a absorção de produtos tóxicos dos tumores necróticos, a acidose e a anoxia, assim como os diversos fatores consequentes a distúrbios circulatórios, seja por pressão sobre o sistema venoso cerebral, seja por distúrbio na regulação vasomotora em si. É interessante citar que grandes tumores, mesmo experimentais (com injeção intracraniana de parafina em animais), não provocam edema proporcional. O fator mais importante, na opinião de Perret e Kernohan, é a natureza íntima dos tumores, sendo que, quanto mais malignos, com maior frequência e intensidade provocam o edema cerebral. Tal é a explicação porque este é tão intenso nos glioblastomas e nos carcinomas metastáticos e geralmente ausente nos meningiomas, nos adenomas da hipófise e nos neurinomas do acústico. Os tumores benignos só dão edema quando por sua localização provoquem estase ou quando seu volume atinge proporções exageradas. Nestas considerações histopatológicas deve ser ressaltado o ponto interessante em que os AA. negam a existência de modificações da microglia em casos de puro edema cerebral, e pelo contrário, sua presença (corpos granulogordurosos) indicando a concomitância de distúrbios circulatórios encefálicos.

P. Pinto Pupo

Anatomia patológica e mecanismo da síndrome do disco intervertebral (Pathological anatomy and mechanism of the intervertebral disc syndrome). F. H. Lewey. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol. 2: 417 (outubro) 1943.

A experiência neurocirúrgica tem mostrado que em muitos casos de ciática consequente à hérnia do disco intervertebral, a dor desaparece após a operação, mesmo quando não se interveio no disco. Em outros casos, pelo contrário, quando o anel fibroso do disco herniado foi removido, a síndrome dolorosa não foi influenciada. A literatura e as estatísticas sugerem, pois, que vários fatores podem estar em jogo para a determinação da síndrome dolorosa. É necessário que se os estudem mais acuradamente e que se chegue a poder separar clinicalmente os casos que devam ser operados, daqueles em que a terapêutica conservadora tem de ser indicada. Lewey, para obter maiores esclarecimentos nos casos desta natureza, fez estudos anátomo-patológicos em 120 discos e ligamentos removidos pela operação e comparou estes dados com os resultados da terapêutica cirúrgica. Em 44% desses casos a raiz posterior era temporária ou permanentemente comprimida no foramen intervertebral pelo ligamento amarelo; na primeira instância por um ligamento atrófico desusando para dentro e para fora do foramen, de acordo com os movimentos da raque, e na segunda, por cicatrizes hipertróficas desse ligamento estrangulando nervos e vasos. Os processos atróficos ou hipertróficos desses ligamentos são devidos frequentemente a rupturas traumáticas ou a processos metabólicos de natureza desconhecida, ou arteriosclerótica, ou ainda a reações inflamatórias. A remoção desses ligamentos e libertação dos nervos é a operação de escolha. Em 32% dos casos, pelo contrário, as raízes estavam comprometidas pelo disco herniado ou pela sua cartilagem rota, estando os ligamentos aparentemente normais. As intervenções sobre o disco, a não ser nestes casos, dão resultados pouco animadores e ainda têm o inconveniente de criar distúrbios na estática da coluna, enfraquecendo-a.

P. Pinto Pupo

Lesões permanentes do sistema nervoso após poli-radiculoneurite (Permanent damage to the nervous system following an attack of poly-radiculoneuritis). W. D. Russel e W. L. Moore. Arch. Neurol. al Psychiat. 49: 895-903 (junho) 1943.

É escasso o conhecimento das lesões anatômicas produzidas na síndrome de Guillain e Barre, porque são relativamente raros os casos de morte, sendo também raros os doentes que ficam com reliquats permanentes, permitindo o exame anátomo-patológico ulterior. Os autores apresentam a observação detalhada de um doente no qual a cura da fase aguda da poli-radiculoneurite foi seguida de sinais neurológicos indicadores de lesão permanente e irreversível do sistema nervoso; o doente morreu vários meses depois de ter tido alta do hospital, por intercorrência intestinal. A poli-radiculoneurite, com todo o cortejo sintomático que lhe é peculiar, inclusive dissociação albumino-citológica, regrediu quase integralmente após alguns meses de internação. Permaneceram, porém, sinais indicadores da lesão do cordão posterior da medula (abolição de reflexos tendinosos nos membros inferiores, alterações da sensibilidade profunda, ataxia sensitiva e sinal de Romberg). O exame anatômico mostrou degeneração das células dos gânglios das raízes posteriores e dos cordões posteriores da medula.

O. Lange

MOLÉSTIAS E MALFORMAÇÕES CONGÊNITAS

Agiria congênita e ausência do corpo caloso (Congenital agyria and defect of the corpus calosum). H. Josephy. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol. 2: 63-68 (janeiro) 1944.

O interesse da apresentação deste trabalho está, em primeiro lugar, na raridade de casos de "agiria" (10 casos publicados na literatura mundial) e na concomitância de ausência de corpo caloso, fato este que o autor interpreta como dependente de a malformação incidir na mesma época embrionária (período teratogênico de Schwalbe). A conexão entre estes dois defeitos é somente cronológica, uma não dependendo em absoluto da outra (há vários casos de ausência do corpo caloso em cérebros com desenvolvimento completo das circunvoluções). Depois de descrever minuciosamente o aspecto anatômico e histológico do caso observado (criança de 4 meses, cérebro pesando 300 grs. e absolutamente desprovido de circunvoluções, quadro clínico de rigidez descerebrada), o A. passa a discutir a patogênese dos casos desta natureza, defendendo a teoria de que haja um defeito na migração normal dos neuroblastos para o manto cortical. Normalmente a migração total e completa dos neuroblastos e sua consequente estratificação cortical promovem a formação das circunvoluções. Nos casos desta natureza há como que uma parada (total ou parcial) do desenvolvimento cortical em período fetal, e assim sendo, encontra-se, além da falta de estratificação celular, uma camada intermediária de substância cinzenta em regiões subcorticais. Insurge-se o A. contra a denominação de "lissencefalia" dada por muitos a estes casos. A seu ver, "lissencefalia" e "girencefalia" devem ser reservadas para determinar o lugar do cérebro na escala zoológica (animais lissencefálicos e animais girencefálicos), enquanto que nos casos de malformações no homem devemos usar "agiria" ou "paquigiria", este último reservado para os defeitos parciais e localizados. Em ambos há uma parada simétrica da migração dos neuroblastos e as camadas cinzentas ectópicas são encontradas. Não devem ser classificados como tais os cérebros em que não haja este déficit de migração dos neuroblastos, assim como também inúmeros casos de microgiria, ou melhor, micropoligiria, tão frequentes entre os deficientes mentais.

P. Pinto Pupo

As disendocrinias nas neurectodermoses. Miller de Paiva e Nilton Costa. Arq. Brasil, de Med. (Rio de Janeiro) 33: 307 (setembro-outubro) 1943.

As neurectodermoses são enfermidades originárias de malformações ectodérmicas, com quadros clínicos distróficos consequentes às agressões conjuntas do sistema nervoso e do segmento externo e de caráter principalmente congênito. Têm uma comum origem em defeitos congênitos de perturbações de diferenciação ocorridas no 3.° ou 4.° mês do desenvolvimento do ectoblasto. H. Roger foi quem pela primeira vez, agrupou as enfermidades de Recklinghausen, Bourneville e Lindau, denominando-as neurectodermoses; dez anos depois, Van der Hoeve denominou-as facomatoses e, posteriormente, Van Bogaert propôs o nome de displasias neurectodérmicas. Depois de dar uma classificação geral das neurectodermoses e justificarem o agrupamento dessas enfermidades, os AA. fazem um estudo pormenorizado da neurectodermose de Recklinghausen e da neurectodermose de Bourneville-Brissaud. Apresentam a observação completa de um paciente muito bem examinado sob o ponto de vista clínico e os respectivos exames anátomo-patológico, radiográfico e laboratoriais, chegando à conclusão de tratar-se de neurofibromatose de Recklinghausen associada à esclerose tuberosa de Bourneville-Brissaud e hiperpítuitarismo; o paciente era ainda portador de lues e verminose. A seguir, os AA. descrevem os caraterísticos fundamentais das enfermidades de Lindau, Sturge-Weber-Krabbe, Laurence-Moon-Biedl, Leschke, Dercum, Sanctis-Cacchioni, Rud-van Bogaert, Meleda. Finalmente, abordam a questão do tratamento das neurectodermoses, referindo as medidas profiláticas e a orientação a ser seguida em cada uma das enfermidades acima enumeradas.

O. F. Julião

Siringomielia cervical e estados semelhantes associados com malformação de Arnold-Chiari e platibasia (Cervical syringomyelia and syringomyelia-like states associated with Arnold-Chiari deformity and platibasia). B. W. Lichtenstein. Arch. Neurol. a. Psychiat. 49: 881 (junho) 1943.

De numeroso material, o A. selecionou determinados casos, considerando o assunto de acordo com a seguinte sistematização: 1) Estados semelhantes à siringomielia, associados à malformação de Arnold-Chiari (necrose de liquefação isquêmica e hidromielia e expansão hipertensiva); 2) cavidades mielodisplásticas na região cervical; 3) platibasia e siringomielia. As conclusões a que chegou são as seguintes: 1) A compressão do neuraxe em torno ou na região do foramen magno pode condicionar a degeneração da região central da medula cervical, determinando o aparecimento de um quadro semelhante à siringomielia; 2) A incidência da malformação de Arnold-Chiari no foramen magno pode acarretar perturbações circulatórias e subsequente degeneração nos tecidos nervosos, por pressão das artérias e veias espinhais, ao nível do foramen magno; 3) Malformações da base do cérebro, do foramen magno, atlas e axis (platibasia) podem determinar constrição do neuraxe; alterações degenerativas na porção adjacente da medula podem ser produzidas seja diretamente pela pressão dos ossos sobre os tecidos nervosos, seja indiretamente por isquemia, resultante do comprometimento da circulação nas artérias e veias espinhais; 4) A platibasia, a deformidade de Klíppel-Feil e espinha bífida podem associar-se a alterações mielodisplásticas; em tais casos, o comprometimento de grupos celulares ganglionares e de fibras nervosas (degeneração e proliferação) no tecido mielodisplástico podem determinar o quadro clínico da siringomielia; 5) A verdadeira siringomielia pode coexistir com platibasia e espinha bífida, o quadro clínico dependendo antes da alteração primária medular que das modificações ósseas visíveis ao exame radiológico; 6) A platibasia, a malformação de Arnold-Chiari podem, exercendo pressão sobre a medula, artérias e veias espinhais, acentuar a síndrome siringomiélica resultante de alterações mielodisplásticas ou a siringomielia verdadeira; a falta de melhora após a descompressão da neuraxe pode resultar de perturbações medulares associadas.

O. F. Julião

NEURO-CIRURGIA

Rinorréia cerebrospinhal. Tratamento cirúrgico (Cerebrospinal Rhinorrhea - Surgical Repair). William J. German. J. Neurosurg. (Springfield) 1: 60-66 (janeiro) Í944.

Trata-se de interessante e condensado trabalho, ilustrado com dois clichês bem demonstrativos, da técnica cirúrgica original e duas radiografias elucidativas de cinco observações clínicas bem estudadas e resumidas, terminando, por atualizada bibliografia. Diz German que a rinorréia cerebrospinhal é uma complicação relativamente comum dos traumatismos da região frontal quando o local de aplicação do agente traumatizante é próximo à glabela. É comum observar-se a parada espontânea da rinorréia nos primeiros dez dias, mas Adson observou a cessação espontânea oito semanas após o traumatismo. A rinorréia cerebrospinhal crônica pode surgir após um intervalo de muitas semanas, tipo este rotulado por Gissane e Rank de rinorréia cerebrospinhal pós-traumática retardada, ocorrência essa que se observou em quatro das cinco observações relatadas por German. O interessante é notar que em duas observações do A., os pacientes sofreram a concomitância de uma meningite pneumocócica, debelada pela quimioterapia, sendo que a perda de líquido cefalorraquídio pelas fossas nasais não se alterou pela infecção das meninges. A única observação do A. que não assinala como causa da rinorréia o traumatismo craniocerebral, é a de uma pequena de 11 meses, portadora de um encefalocele com representação nasal, cuja retirada já havia sido tentada, intempestivamente, com uma alça fria aos sete meses de idade.

Afirma German que, atualmente, as opiniões são unânimes quanto ao tratamento cirúrgico da rinorréia cerebrospinhal crônica, variando consideravelmente, entretanto, os processos cirúrgicos, preconizados. Resumidamente foram experimentados os seguintes processos: inserção, no local da solução de continuidade, sob a dura, de uma mecha de gaze iodoformada (Peet); sutura direta da dura ou enxerto de faseia lata (Cairas); tamponagem da solução de continuidade óssea com cera de osso (Graham); interposição entre a fissura óssea e a dura, de um enxerto livre periostal retirado da tíbia (Gissane e Rank); sutura direta da dura, com exposição bifrontal, ligadura do seio longitudinal, elevação da dura do assoalho de ambas: as fossas anteriores, interposição de um enxerto de músculo na linha de sutura e tamponagem da fissura óssea com cera de osso a qual é recoberta com membrana animal de Luken (Adson); enxerto de tendão de faseia lata através da via intradural (Eden). German julga ser necessário, antes de escolher e executar qualquer dos processos cirúrgicos, procurar localizar o sítio exato da fístula, pois daí depende o sucesso cirúrgico, escolhendo-se então o processo mais adequado. Afirma que a fratura da lâmina cribiforme é muito comum, como aconteceu em todos seus casos, sendo que, nessas condições a abordagem extradural da fístula é dificílima devido à dura ser muito delgada e firmemente aderida ao osso, bem como a tendência que têm as fístulas de se localizarem sempre posteriormente. É óbvio, portanto, que nessa contingência, a via intradural seja a indicada; O perigo potencial que essa via poderá fornecer, a infecção da meninge, foi de muito reduzido com o advento da quimioterapia.

Passa o A., finalmente, a descrever seu interessante e original processo de reparação da rinorréia cerebrospinhal por via intradural, utilizando, para a cobertura da fístula, um retalho proveniente da dura que recobre a apófise crista galli. O ato cirúrgico é feito nos seguintes tempos: retalho osteoplástico frontal do lado correspondente à rinorréia; abertura da dura ao longo da margem anterior; retração delicada do lobo frontal até visualização do assoalho da fossa anterior; identificação da fístula, facilitada pela aderência do cérebro à dura; ressecção dessa aderência com eletrocoagulação; obtenção de retalho da dura que recobre a crista galli, tendo-se o cuidado de incluir no mesmo a porção anterior da foice se for necessária maior dimensão do retalho; recurvamento do retalho na base da crista galli, recobrindo a fístula da lâmina cribiforme e suturando-o à dura circunvizinha, com agulhas curvas, pequenas e seda fina. Aplicação tópica de pó estéril de sulfanilamida, bem como uso conjugado de sulfanilamida, em doses adequadas, antes e depois da intervenção. Todos os cinco casos do A., operados por esta técnica, evoluíram para a cura.

J. Rezende Barboza

Tratamento do membro-fantasma doloroso pela excisão da córtex pós-central (The treatment of painful phantom limb by removal of post-central córtex). Gutierrez e C. G. Mahoney. J. Neurosurg., 1: 156-162 (março) 1944.

Depois de referir a frequência com que os amputados se queixam de dores (membro-fantasma), e recordar as caraterísticas principais dessas dores, o A. põe em destaque o fracasso das várias terapêuticas tentadas. Relata um caso em que o bloqueio novocaínico dos nervos e do simpático, a secção de raízes posteriores, e mesmo a cordotomia cervical homolateral não tiveram resultado. A atenção do A. foi fixada pelo desaparecimento temporário da dor após uma crise convulsiva, sugerindo que a interrupção da função cortical pode melhorar a dor. Pensando assim, em outro caso de membro-fantasma doloroso, fez a excisão da córtex pós-central na área correspondente à dor, verificando seu imediato desaparecimento, não tendo havido recidiva durante 2 anos de observação pós-operatória. O A, conclui que o membro-fantasma doloroso tem base orgânica e o tratamento consiste na secção da corticalidade sensitiva. A secção periférica não dá resultados, em virtude da suplencia das outras vias. O trabalho é de grande interesse e merece a atenção dos neurocirurgiões por oferecer um novo tratamento neste difícil problema do membro-fantasma doloroso.

A. Matos Pimenta

Lobotomia prefrontal na esquizofrenia crônica (Prefrontal lobotomy in chronic schizophrenia). A. E. Bennett, J. J. Keegan e C. B. Wilbur. J. A. M. A. 123: 809-813 (novembro, 27) 1943.

Os AA. fazem um resumo dos muitos trabalhos já existentes na literatura sobre a lobotomia introduzida por Egas Moniz e aperfeiçoada por Freeman e Watts. Reproduzem um questionário feito por Lloyd H. Ziegler, sobre os resultados da lobotomia em 17 diferentes Clínicas nos EE. UU. e Canadá em pacientes com vários tipos de reação psicótica, principalmente esquizofrenia. Esta compilação compreende 582 casos operados. Criticam a indicação desta terapêutica nas desordens afetivas e nas psiconeuroses, para as quais consideram eficientes os métodos de choque e a psicoterapia, ao passo que a lobotomia é um processo radical, determinando modificações definidas na personalidade, que não podem ser chamadas "curas". A mortalidade dos vários grupos apresentados tem sido de 1 a 10%, sendo, em geral, a hemorragia operatória, a causa da morte. Frequentes complicações tem sido observadas: estados convulsivos (10%), afasias e hemiplegias post-operatórias. Como resultados satisfatórios, salientam a pronunciada alteração da personalidade. Livre da ansiedade e pensamentos obsessivos e aliviado dos sentimentos de inferioridade, o paciente sente-se conciente de si próprio e é capaz de voltar aos seus interesses externos. Ele responde perfeitamente às impressões externas, é geralmente eufórico, superficial e infantil. Intelectualmente, retém a memória de evocação, mas não se projeta no futuro. Perde a ambição e satisfaz-se com a vida diária. É amável, bondoso, indiferente à opinião alheia, embora emita, a sua. Perde a agressividade.

Após tecerem comentários sobre a técnica operatória, descrevendo a de Freeman e Watts, aperfeiçoada por estes próprios autores e pelos estudos de Lyerly, apresentam 5 casos de esquizofrenia crônica a fim de demonstrar os benefícios obtidos pela modificação da personalidade observada após a operação. Uma boa cura social foi obtida e um caso não melhorou. Os AA. são de opinião que a utilidade da lobotomia deve continuar a ser investigada, porém, limitada aos pacientes psicóticos desabilitados cronicamente e não melhorados por outras terapêuticas. Condenam a indicação nos estados afetivos e nas psiconeuroses, mesmo que se mostrem refratários a todos outros métodos.

Joy Arruda

Resultados desfavoráveis com a lobotomia prefrontal bilateral na esquizofrenia crônica (Disappointing results with bilateral prefrontal lobotomy in chronic schizophrenia). Gert Heilbrunn e Paul Hletko. Amer. J. Psychiat., 99: 569-570 (janeiro) 1943.

Para justificar a indicação terapêutica da lobotomia nos seus pacientes, com o fim experimental, salientam os AA., os precários sucessos obtidos pela convulsoterapia e insulinoterapia, principalmente nos esquizofrênicos crônicos, comparando tais insucessos com os milagrosos resultados obtidos por Strecker e seus associados, pela lobotomia frontal bilateral, em pacientes cuja vida psicótica era caracterisada por "instabilidade, irritabilidade, excitabilidade ruidosa, conflitos perigosos com o ambiente, recusa à alimentação, repugnância para tolerar as vestes, etc". Selecionaram 10 esquizofrênicos crônicos, entre 6 e 32 anos de doença,, e um deficiente mental com períodos de excitação, submetendo-os à operação levada a efeito seguindo as normas de Freeman e Watts. Os resultados consistiram, na morte de dois casos, cinco dias após a operação, revelando a autopsia, broncopneumonia em um e larga hemorragia no lobo frontal direito no outro. Após um período de 9 meses de observação posterior, anotam insignificantes melhoras dos sintomas em dois pacientes, um caso tornou-se decididamente pior e apresentou ataques convulsivos dois meses após a operação. Os demais não se mostraram influenciados. Desta pequena experiência, feita em casos já evidentemente impróprios para experiências terapêuticas, concluem os AA. que a lobotomia frontal não é recomendada como processo terapêutico na esquizofrenia crônica.

Joy Arruda

NEUROPSIQUIATRIA DE GUERRA

Ocorrência de psicoses em soldados durante o período de treino (Psychoses occurring in soldiers during the training period). M. Hitschman e Z. Yarrel. Amer. J. Psychiat. 100: 301-305 (novembro) 1943.

Os AA. estudaram 100 soldados admitidos na secção psiquiátrica do Bellevue Hospital, durante o período de janeiro de 1942 a janeiro de 1943.

Com exceção de um, todos os outros não haviam entrado em combate e foram desabilitados para as forças armadas. Os casos foram classificados, de acordo com o diagnóstico, como segue: 78 esquizofrênicos; 8 maníaco-depressivos, dos quais 6 na fase depressiva e 2 na fase maníaca; 6 casos de personalidade psicopática; 4 psiconeuróticos; 1 deficiente mental, 1 epiléptico e 2 casos de neurolues. Procuraram os A A. discutir os seguintes itens: 1) Correlação do tempo de serviço com o início da moléstia; 2) Fatores relacionados ao ajustamento anterior ao ingresso; 3) Papel do serviço militar na precipitação da moléstia; 4) Comparação das psicoses em soldados e civis do mesmo grupo de idade; 5) Valor psiquiátrico da seleção e critério para a rejeição. Concluem os AA. que a vida na Armada proporciona fatores precipitantes nos indivíduos predispostos e que os portadores de uma vida anterior satisfatoriamente ajustada podem, logo após o seu ingresso nas forças armadas, apresentar distúrbios psicóticos, ao contrário dos que apresentavam na história de sua vida, hospitalizações por moléstias mentais. Estes e outros com sinais de mal ajustamento anterior tendem a adoecer após um período maior de serviço militar, acarretando, além da perda do soldado como elemento útil, o prejuízo econômico durante longo tempo. Salientam os AA. a necessidade da exclusão destes últimos no exame de seleção e propõem, para facilitar esta tarefa, a utilização dos técnicos da investigação social. Mostram ainda as vantagens de exames psiquiátricos durante ou após 3 meses de serviço, que foi o período em que ocorreu o maior número de seus casos.

Joy Arruda

Enurese na marinha (Enuresis in The Navy). A. Levine. Amer. J. Psychiat. 100: 320-325 (novembro) 1943.

Este interessante trabalho mostra, aos que ainda consideram ser a enurese um simples problema da pré-adolescência, que ela encontra-se também no adulto e que não é u'a manifestação banal e sem significado. Examinando os recrutas que recebiam baixa por condições psiquiátricas na Norfolk Naval Training Station encontrou que, aproximadamente, 24% destes recrutas eram enuréticos. Em vista desta alta incidência, estudou 150 casos consecutivos, examinando-os e investigando detalhadamente a história social de cada um, obtida por assistentes sociais que entrevistaram membros da família, empregadores, amigos, professores e outros que tinham algum contacto com o indivíduo em questão. Estes recrutas foram mantidos em observação por longo tempo. A finalidade deste trabalho é expor os resultados desta investigação. O A. salienta a importância da enurese, que não constituindo entidade clínica é, entretanto, uma manifestação de um profundo distúrbio da personalidade, encontrando-a sempre acompanhada de uma variada sintomatologia neurótica como sonambulismo, terrores noturnos, intensa onicofagia, nervosismo, etc. O enurético é imaturo, desajustado e emocionalmente instável e inseguro. No estudo da etiologia, o A. chega a concluir, após rápida revisão das diversas hipóteses existentes, que ela é puramente de origem psicogenética. O estudo do terreno familiar revelou a presença de numerosas anormalidades psiquiátricas entre os outros irmãos e entre os pais. O grande número de enuréticos na mesma família, a frequência de famílias numerosas e, comumente, de lares desajustados ou rompidos ou de pais neuróticos, o desconhecimento que os pais tinham sobre a origem desse sintoma, empregando métodos violentos afim de obter a cura, as pobres condições econômicas e sociais, foram os principais fatores encontrados em relação com a enurese. Tais fatores desfavoráveis não permitem aos pais dedicarem atenção suficiente e necessária às crianças que, então, desenvolvem sentimentos de insegurança e se defendem criando traços neuróticos compensatórios. Isto fez o A. sentir que o fator etiológico mais comum da enurese nos casos estudados é a falta de segurança, que permite a persistência de traços infantis além da puberdade.

Joy Arruda

percentagem de alistamento voluntário em relação com os vários tipos de desordens neuropsiquiátricas (Ratio of voluntary enlistment to induction in the various types of neuropsychiatric disorders). F. Lemere e E. D. Greenwood. Amer. J. Psychiat. 100: 312 (novembro) 1943.

Impressionados com o grande número de pacientes psicóticos que voluntariamente se alistavam no serviço militar, procuraram os AA. comparar o número destes voluntários com desordens neuropsiquiátricas com o de outro grupo considerado controle. Num grupo de pacientes com rinofaringites (200 controles) houve 18% de alistamento voluntário enquanto na mesma organização, os com desordens neuropsiquiátricas, eram conforme o tipo mórbido em número muito maior ou menor. Os AA. apresentam um quadro em que estes pacientes se acham classificados entre os vários tipos de desordens mentais, dentre elas, a epilepsia, as psiconeuroes, o alcoolimo, as personalidades psicopáticas, demência precoce, etc, com suas respectivas percentagens de ingresso voluntário na armada e discutem as razões que levaram estes pacientes a se alistarem. O quadro mostra que certos pacientes procuram o serviço, enquanto outros o evitam. Os epilépticos, pelos seus caraterísticos bem conhecidos de religiosidade, superconsciência e devoção a um ideal ou ainda, como compensação de sua trágica moléstia, alistaram-se em número exagerado e procuraram esconder seus sofrimentos ao médico. Os psiconeuróticos com sintomas gastro-intestinais (neurastenia gástrica), igualmente, mostravam um profundo sentimento de obrigação ao seu país e procuraram a armada em número quase idêntico ao dos epilépticos. Entretanto, os portadores de outros tipos de psiconeuroses evitavam o serviço e, quando se alistavam, apresentavam piora de seus sintomas, que só aliviavam com o seu desligamento do serviço. Pacientes alcoolistas mostravam a esperança que a armada proporcionasse abrigo, proteção e talvez interesse, como um substituto para a fuga que eles procuravam na bebida. A maior percentagem de alistamento voluntário compreendia os pacientes com demência precoce, estimulados, muitas vezes, pelos parentes, que tinham a falsa idéia de que a armada melhorasse o seu ajustamento. Os portadores de deficiência mental, psiconeuroses (com exceção da neurastenia gástrica) e, principalmente, os estados psicopáticos constitucionais tinham uma tendência muito maior do que a normal em evitar- o serviço militar. Concluem os AA. que o público deve ser educado no sentido de saber que o serviço militar não proporciona solução para os problemas de neuropsiquiatria ou de desajustamento. Recomendam que nos exames de seleção devem ser pesquisados tais problemas nos ansiosos a se alistarem. Consideram como causa de rejeição para o alistamento os portadores destes distúrbios e também os que em sua história social tenham tido prévios tratamentos em hospitais psiquiátricos.

Joy Arruda

Revisão de casos de veteranos da 2.a Guerra Mundial dispensados com diagnósticos neuropsiquiátricos (A review of cases of veterans of World War II discharged with Neuropsychiatric diagnoses). C. B. Huber. Amer. J. Psychiat. 100: 306 (novembro) 1943.

De janeiro de 1942 a fevereiro de 1943, o A. teve oportunidade de examinar 100 veteranos da atual guerra, a pedido das agências da Administração dos Veteranos, a fim de atender às pretensões apresentadas por eles. O A., antes de examinar o veterano, tinha em mãos a sua história social, obtida pelo Serviço Social da Cruz Vermelha, e o seu registro clínico da Armada, contendo as suas pretensões. Na análise deste material, é focalizado o fator educacional, e transcrito trecho de um artigo de Benjamin Fine escrito para o New York Times, em que afirma haver 750.000 soldados em potencial por serem funcionalmente ignorantes. A Armada está tentando instruir cerca de 5% destes, para torná-los bons soldados. Dos veteranos examinados, a maior parte era de fraca instrução. Do ponto de vista neuropsiquiátrico, uma parte era constituída por psicóticos, entre os quais predominava o diagnóstico de esquizofrenia e 2% de casos maníacos-depressivos, dois casos de psicoses de tipo indeterminado, um de alcoolismo, um de psicose com personalidade psicopática, uma psicose devida a trauma e uma psicose com deficiência mental. Dos casos sem psicoses, um era deficiente mental do tipo moron. Outras condições neuropsiquiátricas compreendiam 9% do material e os diagnósticos eram: síndrome de Parkinson, seqüelas de meningite cerebrospinhal, fibroblastoma perineural múltiplo, atrofia da perna esquerda de etiologia indeterminada, resíduos de tumor cerebral (astrocitoma cístico) com atrofia óptica, esclerose disseminada, etc. Nenhuma alteração neuropsiquiátrica foi encontrada em 18% dos examinados. A análise destes mostra tratar-se na maioria de indivíduos de pequena instrução, que se haviam queixado de desordens somáticas várias ou apresentado quadros neuróticos ou de alcoolismo. Para a reabilitação de todos os veteranos, a Administração de Veteranos é encarregada de resolver se há possibilidades de aproveitamento vocacional ou se houve desabilidade ocorrida ou agravada pelo serviço militar, cabendo, então, o pagamento de pensão. O A. sugere que, para os ainda capazes de trabalho, a aplicação de testes e exames para determinar a habilidade mental salvará futuras despesas desnecessárias e trabalho. Lembra para os mentalmente doentes, a terapêutica ocupacional. Na opinião do A., grande número dos casos deste estudo podiam ter sido rejeitados para o ingresso na Armada, se tivessem sido excluidos os de instrução abaixo do oitavo grau, selecionados por meio de exames psicométricos apropriados e pela obtenção da história social.

Joy Arruda

Tratamento físico das neuroses agudas de Guerra. Algumas observações clínicas (Physical Treatment of Acute War Neuroses. Some Clinical Observations). W. Sargant. Brit. M. J. 2: 574-576 (novembro, 14) 1942.

A experiência adquirida na presente guerra mostrou que os métodos físicos desempenham papel importante em qualquer esquema completo de tratamento e recuperação de doentes com neuroses agudas de guerra. O fim do tratamento físico é o de fortalecer a constituição, de modo que os esforços inevitáveis sejam melhor tolerados pelo indivíduo. Mais de 3.000 doentes militares, além dos casos não militares, tiveram que passar por um número de camas limitado da Equipe Neurológica do Serviço de Urgência de que o A. é diretor e, por conseguinte, houve necessidade de encontrar um meio de acelerar os processos de restabelecimnto para que os doentes pudessem melhorar suficientemente para regressar aos serviços nas Forças Armadas ou a alguma ocupação útil na vida civil. Receberam-se diretamente doentes das praias de Dunquerque, e outros doentes de Dunquerque com doença aguda foram admitidos semanas ou meses mais tarde, depois dum intervalo durante o qual o seu estado tinha, muitas vezes, piorado gravemente. Durante a batalha aérea da Inglaterra receberam-se outros numerosos pacientes adoecidos agudamente que tinham sofrido de esgotamento nervoso quer nos Serviços, quer nas organizações de Defesa Passiva.

A descoberta mais importante nestes casos foi a necessidade dum tratamento de urgência das neuroses agudas ocorrendo em doente de boa personalidade anterior. A resposta depende não só da velocidade com que o tratamento é feito mas também das qualidades inatas da personalidade. O álcool, o paraldeído, o barbitone sódico e o amital sódico podem, todos eles, ser usados em largas doses como um tratamento de primeira urgência para combater as reações de pânico logo que elas ocorram. Algumas vezes as injeções intravenosas de barbitúricos podem ser necessárias para obter efeitos mais imediatos e podem, igualmente, ser usadas para ajudar a rápida abolição dos sintomas de conversão histérica logo que estes ocorram. A droga é injetada com o fim de produzir um estado de relaxamento mental e o doente é persuadido, enquanto sob a influência dela, a readquirir a função da parte afetada. A narcose contínua era desejável quando uma grave ansiedade ou sintomas histéricos persistiam ainda durante uma semana ou mais; ao fim deste tempo as modificações físicas tornar-se-ão mais pronunciadas e os temores condicionados estabelecer-se-ão firmemente. O fim deste tratamento deve ser a produção de 20 horas de sono diário durante 7 a 10 dias.

Uma nova forma de tratamento insulínico modificado foi usada em doentes que mostraram ansiedade e respostas histéricas numa personalidade previamente boa e que perderam 6-20 kg. como resultado de longos períodos de esforço. Tais doentes parecem responder à psicoterapia mas muitas vezes recaem sob a influência de outro esforço, a menos que a deterioração física de que padecem tenha também sido remediada. Uma dose (20-100 unidades) de insulina justamente insuficiente para produzir o coma é administrada ao doente em jejum, nas primeiras horas da manhã. Três horas mais tarde é dada uma chávena de chá contendo 56 grs. de açúcar e 340 grs. ou mais de batatas. Ao fim de 2 1/4 horas é servido um almoço completo.

O tratamento foi usado em mais de 300 doentes. O seu objetivo é produzir sonolência e fome. O apetite costuma aumentar enormemente e aconselha-se ao doente que se sirva de mais batatas por duas ou três vezes. Nos casos apropriados consegue-se grande melhoria do peso e do estado físico, vendo-se uma melhoria paralela do estado mental. O tratamento não é eficaz nos estados de grave depressão. Ao restabelecerem-se, os doentes são enviados para serviços modificados ou para um ambiente algo menos rígido, visto que continuam condicionados às suas experiências passadas e não existem provas de que o tratamento altere a sua resistência normal ao esforço.

A terapêutica convulsivante resultou útil para aqueles doentes gravemente deprimidos, que não ganham peso apesar do tratamento insulínico modificado acima descrito, e que, se não se lhes atende, terão que esperar muitos meses para que se dê a cura espontânea, mesmo que lhes tenha sido dada imediatamente a baixa do Exército ou removidos de novos esforços. O A. crê que 75% dos doentes com uma boa personalidade anterior e uma depressão grave genuína podem esperar beneficiar com o tratamento convulsivante.

Conclui o A. que os métodos de tratamento físico podem constituir valiosos auxiliares para encurtar o período de incapacidade total nos doentes com boa personalidade anterior que sofram de estados de pânico agudo, estados de ansiedade aguda, histeria ansiosa e estados de depressão. Estes métodos devem ser empregados conjuntamente com os habituais tratamentos psicoterápicos e de ambiente. A experiência clínica e a discriminação na seleção dos casos apropriados são necessárias se se pretende obter um benefício completo com o uso dos métodos físicos.

Transcrito do B. M. B. 1, 38 (1943)

PATOLOGIA CEREBRAL

Degeneração estriada espontânea num macaco (Spontaneous striatal degeneration in a monkey). R. Richter e H. Kluver. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol. 2: 48-62 (janeiro) 1944.

O presente caso de moléstia aguda com caracteres de encefalopatia grave em um "Macaca irus", tem o particular interesse de mostrar um quadro neurológico inteiramente superponível àquele descrito na literatura como "animal talâmico" (mais explicitamente, descorticado), e um quadro neuropatológico de degeneração aguda exclusiva do putamen e do núcleo caudado, bilateralmente. O estudo rigorosamente feito, mesmo em relação a toda vida anterior do animal e dos demais que com êle estiveram em contacto, não permitiu uma hipótese etiológica para esta moléstia. Questões de patogênese são discutidas. O quadro clínico era caraterizado por um estado de hipertonia generalizada da musculatura, modificável com a posição do animal. Quando deitado sobre o lado direito, os membros direitos apresentam forte hipertonia em extensão, e os da esquerda hipertonia em flexão. Invertido o decúbito, invertiam-se as disposições do tôno. Não havia qualquer possibilidade de movimentos voluntários, nem de estática na posição de pé ou marcha. Os reflexos cervicais tônicos de Magnus e Klein estavam presentes. Discutindo a fisiopatologia do caso, os AA. relembram que a excisão experimental das áreas frontais e prefrontais (áreas 4 e 6) dá lugar ao estabelecimento de um quadro clínico idêntico. Ora, no caso presente isto foi conseguido pela destruição bilateral do "striatum", em presença de corticalidade intacta; tal fato sugere que as influências corticais se fazem por intermédio destes núcleos, o que nos traz um argumento em favor da existência de ligações cortico-striadas diretas. Em face dos pontos de vista contraditórios ainda hoje existentes em relação a esta ligação, a contribuição deste trabalho é deveras interessante.

P. Pinto Pupo

Leucoencefalopatia difusa sem esclerose (Diffuse leukoencephalopathy without sclerosis. Clinicopathologic study of a new form, with comment on various types of so-called diffuse sclerosis and Schilder's disease) h. Josephy e B. W. Lichtenstein. Arch. Neurol. a. Psychiat. 50: 575-584 (novembro) 1943.

Os termos de moléstia de Schilder e esclerose difusa são usados comumente em neurologia e em pediatria para designar um estado de paralisia espástica das extremidades, com distúrbios córeo-atetóides e decadência mental, de evolução lenta e progressiva; anatomicamente se caraterizam por degeneração simétrica das bainhas de mielina e dos cilindro-eixos das vias longas de projeção no encéfalo, a qual se faz acompanhar no mais das vezes por um nítido processo de esclerose glial. O aspecto inflamatório que toma por vezes este processo lhe trouxe também a denominação, aliás original, de encefalite periaxial difusa. Os AA. descrevem neste artigo dois novos casos, com quadros clínicos semelhantes, ocorridos em irmãos cujos pais eram consanguíneos e nos quais o decurso foi progressivo até a morte. O aumento exagerado do crânio, a ponto de parecer hidrocéfalo, a aquisição tardia da marcha e da palavra articulada, a espasticidade progressiva dos quatros membros, a hipertonia dos adutores nos membros inferiores, o aparecimento posterior de movimentos córeo-atetóides, a decadência mental e sobretudo os distúrbios progressivos da palavra até a sua perda completa (incapacidade de articulação verbal), foram os dados clínicos proeminentes. O estudo anatômico de um deles revelou um aspecto gelatinoso, em liquefação, da substância branca de ambos hemisférios cerebrais, que histologicamente se mostrou como um processo desintegrativo da bainha de mielina e dos cilindros-eixos, com completa ausência de processo reativo por parte da glia em geral. Constitui este aspecto o elemento mais interessante do caso. Houve aqui uma leucoencefalopatia difusa e não uma leucoencefalosclerose como é usual. Possivelmente esses diferentets tipos clínicos e morfológicos representem simples variações de um único processo básico ou, talvez, entidades clínicas diversas. É assunto ainda não resolvido.

P. Pinto Pupo

Torticolo espasmódico (Spasmodic torticollis). R. M. Patterson e S. C. Little. J. Nerv. a. Ment. Dis. 98: 571-599 (dezembro) 1943.

Os AA. desenvolvem substancioso trabalho baseado na observação de 103 casos de torticolo espasmódico e em ampla revisão da literatura. Abordam o problema sob os mais variados pontos de vista, alguns de modo particularizado, o que torna este artigo sumamente interessante. Iniciam separando o verdadeiro torticolo espasmódico - movimentos involuntários manifestando-se por espasmos móveis, tônicos ou clônicos, da musculatura do pescoço, produzindo desvio da cabeça mais ou menos estereotipado, de modo a que o queixo seja levado para o lado, para frente (antecolo) ou para trás (retrocolo) - dos demais espasmos do pescoço, seja consequentes a processos locais (antálgicos) ou que façam parte de distúrbios gerais, como no caso do espasmo de torção. Analisam sob ponto de vista anatômico quais os músculos mais frequentemente comprometidos, concluindo ser o esternocleidomastóideo, e discutem a fisiopatologia, concluindo que os distúrbios são preferentemente do sistema extrapiramidal (englobam nesta denominação só o sistema dos núcleos optostriados) e do sistema vestibular. Defendem o papel deste último, baseados na sua grande importância em relação à manutenção do tôno e da estática própria da extremidade cefálica, por reflexos diferenciados. Passam em revista seus casos, focalizando-os em relação ao modo de início e decurso, aos achados neuro-psiquiátricos, às lesões secundárias (em músculos e vértebras), à neuropatologia e â etiologia, tecendo considerações interessantes. Particularmente em relação a este último item discutem a questão dos fatores psicógenos e dos fatores orgânicos, concluindo que estes são os verdadeiramente causais, e entre eles os pós-encefalíticos entram com o maior contingente. Os fatores psicógenos são meros fatores correlatos, e os casos da literatura tidos como melhorados ou curados por variados processos psicoterápicos são, a seu ver, devidos ao contingente de influência que a psicoterapia e os fatores psicógenos em geral têm para com as múltiplas moléstias orgânicas. Por fim estendem-se na "explanação dos processos terapêuticos, desde os de fisioterapia, de psicoterapia e psicanálise, até os neurocirúrgicos. Em relação a estes, chama a atenção a citação que fazem de Issac Minius (1641), Dupuytren (1812) e Bukalski (1834) que já faziam, respectivamente, jressecção do esternocleidomastóideo, tenotomia deste músculo e ressecção do nervo espinhal acessório, para a terapêutica do torticolo espasmódico. Vários outros processos terapêuticos neurocirúrgicos são passados em revista, entre eles o de Dandy, da ressecção do nervo espinhal e das quatro primeiras raízes cervicais, bilateralmente. Citam os resultados referidos na literatura e os seus próprios, catalogando-os como satisfatórios. É interessante que este proceder não acarreta, em geral, distúrbios na estática da cabeça suficientes para prejudicar a vida normal do indivíduo. Extensa bibliografia completa este muito bem elaborado trabalho.

P. Pinto Pupo

Desordens do comportamento relacionadas com as decomposições da atividade reflexa causadas por traumatismos cerebrais (Behavior disturbances related to decompositions of reflex activitv caused by cerebral injury. A. experimental study op the cat). O. R. Langworthy. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol. 2: 87-100 (janeiro) 1944.

O A., que trabalha nestas experimentações desde 1926, tendo já publicado vários estudos a respeito, faz uma revisão crítica muito interessante dos resultados já apresentados e daqueles da literatura. Os gatos, nos quais se extirpam as áreas corticais frontais, inclusive as motoras, apresentam francas desordens do comportamento que podem ser analisadas como dependentes da decomposição de atos reflexos mais completos e de libertação de sistemas funcionais inferiores. Chamou-lhe particularmente a atenção o fato que os animais perdem completamente sua espontaneidade de ação e sua capacidade de reação, tornando-se perfeitos autômatos. Estão permanentemente inquietos, correm de para outro lado sem qualquer finalidade, seus movimentos se tornam grosseiros, perdem os reflexos normais de mastigação, de lamber, de movimentação da língua, assim como suas reações normais frente aos alimentos e também de sexualidade. Mais interessantes são ainda as modificações nas reações de medo, que se apresentam anormalmente exageradas, acompanhadas não raro de verdadeira catalepsia: o animal fica imóvel, como que congelado, na posição em que se achava, com os segmentos nas posições mais incômodas e com aumento generalizado do tôno. Aparecem, também, reflexos primitivos como, por exemplo, o "grasp reflex", que traduzem a libertação (no sentido de Jackson) de mecanismos funcionais inferiores.

P. Pinto Pupo

Encefalopatia consequente à administração intravenosa de preparações arsenicais (Encephalopathy following intravenous administration of arsenical preparations). D. A. Boyd e L. Nie. Arch. Neurol. a. Psychiat.. 49: 863-877 (junho) 1943.

Os AA. relatam quatro casos observados no espaço de um ano, no India-nopous City Hospital, sendo dois fatais e consequentes à administração rotineira de neo-arsfenamina e dois, de evoluções favorável, ocasionados pelo tratamento intensivo em cinco dias pelo mapharsen. Nos dois primeiros casos, os acidentes encefálicos ocorreram após a segunda injeção da droga, com cefaléia, vômitos, sinais de hipertensão intracraniana, convulsões, coma e alguns sinais neurológicos focais; o exame histopatológico mostrou edema encefálico, congestão vascular, focos de necrose peri-vascular e hemorragias pericapilares em anel, algumas confluentes formando petéquias hemorrágicas; as lesões necróticas e hemorrágicas eram disseminadas em todo o encéfalo, principalmente na substância branca do cérebro, cerebelo, mesencéfalo e protutuberância. Nos dois outros casos, os acidentes encefálicos, com sintomatologia semelhante à dos doentes precedentes, ocorreram no sexto dia após o início do tratamento e regrediram mediante a administração de substâncias tendentes a eliminar o edema encefálico, a controlar os acessos convulsivos e a diminuir as hemorragias: em ambos houve cura completa. Comentando os fatos observados nestes casos e confrontando-os com os relatados na literatura, pensam os autores que os acidentes encefálicos pós-arsenicais sejam bem explicáveis pela ação direta do arsênico sobre o revestimento endotelial dos capilares e que seja esta a lesão primitiva. Secundariamente se processariam a congestão, o edema encefálico, as necroses perivasculares e, por fim, as hemorragias pericapilares. Assim, a síndrome clínica de encefalopatia arsenical seria a expressão sintomática de uma série de disturbios encefálicos, graduáveis em severidade, tendo como ponto de partida uma alteração vascular. As hemorragias capilares, ao invés de serem uma caraterística das encefalopatias arsenicais, representariam tão somente o grau mais avançado do processo. Evoluindo até o aparecimento das hemorragias, o processo seria irreversível, seguindo até o êxito letal. Nos casos mais benignos, a lesão capilar, a congestão vascular e o edema encefálico seriam possíveis de regressão mediante tratamento adequado.

O. Lange

Encefalopatia crônica hipertensiva. Estudo anátomo-clínico (Chronic hypertensive encephalopaty). L. Goodmann. Arch. Neurol. a. Psychiat. 49: 919 (junho) 1943.

A encefalopatia crônica hipertensiva é uma entidade clínica e anátomo-patológica. É uma forma da hipertensão arterial essencial na qual os sintomas e alterações patológicas cerebrais precedem ou dominam os distúrbios cardiovasculares. As arteríolas cerebrais apresentam alterações de vários tipos: arterioloesclerose hialina e fibro-celular; trombose arteriolar e capilar; hemorragias intramurais e perivasculares; infiltração perivascular de células redondas; degeneração gordurosa e dilatação aneurismática das paredes arteriolares; necrose hialina das paredes vasculares. A moléstia ocorre em pessoas relativamente jovens. Em geral, os sinais encefálicos predominam. Assim, o coração não é hipertrofiado, o que a diferencia da chamada nefrosclerose benigna na qual há hipertrofia cardíaca. Em geral, a moléstia é de longa evolução, o que a distingue da nefrosclerose maligna. Em geral, há grandes oscilações na pressão arterial e mesmo grande labilidade de hipertensão condicionada por causas múltiplas. A sintomatologia encefálica é variável (cefaléia, tonturas,, sinais de hipertensão, sinais focais).

O. Lange

Distúrbios mentais consequentes às alterações do lobo frontal (The mental chances due to frontal lobe damage). K. Goldstein. J. Psychol. 17: 187-208, 1944.

A cirurgia dos lobos frontais, principalmente a excisão de um lobo inteiro ou dos dois, pôs em foco, nestes últimos anos, o problema das alterações mentais consequentes às lesões frontais. Era admitido que, nas lesões frontais, os distúrbios incidiam sobre a atenção, sobre o interesse pelo meio ambiente, sobre as emoções e sobre a vontade do doente, modificando-lhe a personalidade de modo radical. No entanto, pesquisas experimentais e neurocirúrgicas realizadas nestes últimos anos têm abalado essas idéias antigas, chegando certos pesquisadores a afirmar que lesões frontais extensas, mesmo a lobotomia, não ocasionam alterações no estado psíquico dos pacientes. Neste trabalho, Kurt Goldstein procura demonstrar que tais lesões produzem realmente perturbações psíquicas, embora tais perturbações não possam ser consideradas sob o mesmo prisma pelo qual as viam os pesquisadores de há 10 anos atrás. Para isso êle faz cuidadosa revisão bibliográfica e reporta-se a várias de suas publicações anteriores nas quais suas idéias vinham expostas. Na seleção preliminar que faz, Kurt Goldstein tem o cuidado de só tomar em consideração os casos em que a lesão é extensa e nos quais a área pré-frontal é particularmente atingida. São afastados também os casos em que a lesão se limita ao lobo frontal direito. Nos casos que serviram para este estudo foram observados, de um lado, o comportamento dos doentes na execução dos atos da vida comum e, do outro, seu comportamento perante provas testes.

Quanto ao seu comportamento nos atos de vida comum, os portadores de lesões frontais só mostram deficiências psíquicas quando as circunstâncias os põem diante de problemas e situações que só podem ser resolvidas após reflexão; eles se mostram anormais em situações mais ou menos indefinidas ou quando têm de escolher entre uma coisa ou um modo de agir e outro. Eles não se mostram deficitários nos atos rotineiros da vida, atos nos quais eles atuam rápida e eficientemente. Desde, porém, que sejam postos diante de fatos novos, não rotineiros, o déficit mental aparece. Tais pacientes não raciocinam erradamente ou tiram conclusões falsas dos fatos que observam. No entanto, eles só podem raciocinar bem se as situações apresentadas têm caracteres que lhes sejam familiares; se as circunstâncias exigirem deles um pensamento ativo, no sentido de escolher, a deficiência aparece. A capacidade mental de tais doentes é suficiente para os trabalhos de rotina mas falta-lhes iniciativa, habilidade e interesse para fazer coisas que não lhes sejam familiares: eles são deficientes na escolha voluntária. Tudo isto corresponde à alteração da personalidade que Goldstein explica como resultante da alteração da atitude abstrata (abstract atitude). Este déficit só pode ser verificado pela observação muito cuidadosa e por pessoa estranha ao ambiente em que vive o doente. É por esta razão que, entre seus familiares, muito frequentemente, perdura a impressão que o paciente é psiquicamente normal. O emprego de testes demonstra os mesmos fatos, isto é, a falta de iniciativa do doente e a sua deficiência na escolha de coisas e fatos novos que lhe sejam apresentados. Kurt Goldstein analisa os vários testes que foram empregados por outros pesquisadores e que a alguns deles permitiram afirmar que os portadores de lesões frontais são psiquicamente sãos, chegando à conclusão que tais testes são impróprios. Para êle só tem valor o teste da escolha de objetos (object-sorting test), ou teste de Rothmann-Goldstein, mediante o qual pôde demonstrar, em seus doentes, as deficiências psíquicas já assinaladas.

O. Lange

A ocorrência do reflexo da preensão na fase pós-convulsiva dos ataques provocados eletricamente e o seu comportamento em diversas doenças mentais. (The Occurrence of the Grasping Reflex in the Post-Convulsive Stage of Electrically Induced Seizures and its Behaviour in Vartous Mental Diseases). F. F. Kino e F. T. Thorte. J. Ment. Sc, 88: 541-544 (Outubro) 1944.

As observações feitas durante as convulsões provocadas eletricamente com fins terapêuticos, proporcionam uma oportunidade única para o estudo dos estados convulsivos e dos fenômenos que os acompanham no homem. Os AA. estudaram estes fenômenos em 100 casos tratados no Hospital Mental de West Riding, Sheffield. Entre as muitas manifestações interessantes da fase pósconvulsiva observou-se o reflexo da preensão. Este reflexo foi previamente observado só em certos transtornos estruturais, tais como tumores localizados nos lobos frontais. O reflexo ocorria como um fenômeno transitório provocável de 3 a 6 minutos depois do início da convulsão, e durava de 1 a 3 minutos. "Viu-se que o estímulo ótimo para a sua aparição era 100 volts durante 0,5 segundos, aplicados na córtex pré-frontal através das fontes. Os três componentes do reflexo, tal como o descreveram Walshe e Hunt em 1936 - reflexo de preensão tônica, preensão forçada e persecussão - foram todos encontrados nestes casos, mas só puderam produzir-se durante o período de inconsciência que se seguia à convulsão. O reflexo de preensão tônica (denominado "de encerramento") foi o componente predominante estimulado pela tensão dos flexores dos dedos. Os maníaco-depressivos e as melancolias involutivas reagiam invariavelmente com um vigoroso reflexo de preensão, ao passo que o reflexo era habitualmente ausente ou irregular nos esquizofrênicos agudos. São necessárias mais observações antes de se tirar conclusões definitivas como resultado destes achados.

Transcrito do B. M. B. 1 13 (1943)

PATOLOGIA DO BULBO RAQUIDIANO

A. oliva bulbar. Sua estrutura, função e patologia (La Oliva bulbar. Su estructura, función y patologia). J. O. Trelles. Rev. de Neuro-Psiq. (Lima) 6: 432-521 (dezembro) 1943.

O A. faz magnífica síntese e traz notável contribuição ao conhecimento do complexo olivar. Inicia recordando os dados da anatomia, da ontogenese, da filogenese, da experimentação e da clínica, para, comparando-os com os mais recentes elementos adquiridos, fazer uma apreciação critica do problema em seu estado atual, Os dados clássicos da morfologia anatômica, da cito, glio e mieloarquitetura, assim como os relativos às conexões olivares, são passados em revista, para concluir que a oliva bulbar recebe impulsos do globo pálido, do núcleo denteado, do núcleo rubro e outras formações mesencefálicas, assim como influxos proprioceptivos ascendentes trazidos pela fita de Reil; envia influxos à cortiça cerebelar por intermédio da via cruzada olivo-cerebelar, ao mesmo tempo que recebe fibras do núcleo denteado pela via dento-olivar. Por intermédio do feixe de Helweg influência as células dos cornos anteriores dos segmentos cervicais da medula. Se bem que ainda não demonstrada anatomicamente, parece existir também uma ação sinergizante das olivas sobre os núcleos dos nervos cranianos que presidem os músculos velo-linguo-faringo-laringeos. Neste capitulo são discutidas particularmente, com esquemas muito elucidativos, as conexões intimas olivo-denteadas que constituem um verdadeiro circuito fechado da oliva ao cerebelo, e o sistema do feixe central da calota, sistema olivopeto trazendo influxos do núcleo denteado controlateral, do globo pálido, do núcleo rubro, assim como de outras formações mesencefálicas. No que diz respeito à fisiologia o A. a estuda em relação à filogenia e ontogenia e com os dados fornecidos pela experimentação, mostrando que as conclusões por vezes contraditórias dos estudiosos não permitem chegar a pontos de vista únicos nas teorias sobre as funções olivares. Para Schroder Van der Kolk a oliva seria centro coordenador da articulação verbal; para Bechterew, centro de coordenação da estática; Tilney e Riley ajuntam à esta função a de coordenar os movimentos de desvio conjugado dos olhos e da cabeça; N Zand a classifica como centro da regulação tônica e da atitude bípede; e finalmente os estudos mais recentes, os de Trelles entre eles, colocam-na no sistema cuja lesão é responsável pelo aparecimento das mioclonias velo-palato-laringo-esôfago-diafragmáticas. Neste capitulo, o A. faz severa crítica dos métodos experimentais - crítica esta que serve em tese para todas experimentações em neurologia - de que, em regra, os resultados levam consigo uma certa dose da idéia aprioristka dos investigadores.

O estudo das funções olivares é seguido de modo exaustivo com a análise dos dados anátomo-clínicos. Para Trelles são estes os que poderão trazer os mais importantes elementos para esclarecer os vários enigmas que ainda perduram na fisiopatologia olivar, maximé por várias particularidades do complexo olivar, com reações e alterações que lhe são próprias, que fazem até seja considerada uma verdadeira patoclíse olivar. Refere-se neste particular à capacidade de reações hipertroficas das células neuronais desta região, capacidade esta que lhe é peculiar. As olivas bulhares podem ser lesadas por processos locais, gerais ou regionais. As lesões locais excepcionais, as únicas que se conhecem dependendo de distúrbios circulatórios; como a irrigação da oliva é assaz peculiar, os casos estudados apresentam necroses de partes isoladas, ou então comprometimento das vias anatômicas de projeção que lhe são adjacentes, dificultando assim o julgamento sobre os dados clínicos. As lesões regionais são encontradas em certos tipos de inflamações que têm particular predileção para a região olivar - sarampo, tifo exantemático, varicela, encefalite de Ecónomo, tétano e neuro-sífilis - assim como a siringobulbia e em formas particulares da demência senil. Tais casos trouxeram também elementos contraditórios, ressaltando-se em meio da multiplicidade de sintomas os disturbios do tonus, os da articulação da palavra (em particular com os trabalhos de Moyano que considera as lesões do sistema olivar como responsáveis pela disartria dos paralíticos gerais), e os numerosos casos em que a alteração olivar não se traduziu por sintomas clínicos correspondentes.

Ao lado destas, as alterações degenerativas sistematizadas, com sua sintomatologia própria e com as caracteristicas abiotroficas tomando todo um sistema unitário, dá elementos dos mais importantes para o conhecimento deste complexo funcional. Neste capítulo são passados em revista a atrofia olivo-ponto-cerebelar de Dejerine e Thomas, a atrofia olivo-rubro-cerebelar de Lejonne e Lhermitte, a atrofia olivo-oerebelar de Holmes-Bogaert (epilepsia mioclônica com coreo-atetose), e, em particular, a atrofia olivar pura, com sua forma hipertrófica, estudada desde 1909 por P. Marie. Thomas. Lhermitte, Lejonne, e ultimamente, de modo inteiramente original, por Lhermitte e Trelles.

O estudo dos casos de epilepsia mioclônica familiar (enfermidade de Unverricht-Lundborg), cujo total não passa de 20 na literatura mundial, trazem elementos importantes para afirmar a correlação do sistema olivar com as mioclonias. Nos casos em que a epilepsia e os fenômenos mentais predominavam, as lesões anatomo-patologicas com alterações celulares características (inclusões esferulo-amiloideas de Lafora) predominavam no córtex cerebral, sistema palidal, cerebelo; nos casos em que havia predominancia de mioclonias ou exclusivamente mioclonias, as lesões predominavam ou eram exclusivas do complexo olivar. A relação anátomo-clínica aqui é da mais alta importância.

Finalmente, em capítulos especiais, Trelles estuda a hipertrofia olivar, alterações características consequentes a lesões dos sistemas ligados à oliva (núcleo denteado ou feixe central da calota, ou, excepcionalmente, primitiva. São estudados os caracteres histopatológicos, demonstrando a natureza particular dessa reação hipertrofiante de células nervosas, hipertrofia verdadeira como demonstraram Lhermitte e Trelles e não pseudo-hipertrofia como queriam os numerosos autores que estudaram o assunto anteriormente. No tocante à patogenia desta forma de reação Lhermitte e Trelles buscaram explicação na aproximação embriológica dos neurocítos olivares com as células dos gânglios sensitivos periféricos e gânglios simpáticos, células que têm capacidade de reação defensiva caracteristica com "proliferação dendroaxonal exuberante e desordenada" (conceito de parafitosis, de Nageotte), aptidão esta que contrasta com a impotencia de regeneração de todos elementos celulares do sistema nervoso central. Tal ponto de vista verdadeiramente interessante e original, foi muito combatido, mas perfeitamente compreendido por neurologistas da autoridade de Marinesco, Jonesco, Sisesti e Hornet. As relações entre a hipertrofia olivar e a síndrome mioclônica velo-palato-faringo-laringo-oculo-diafragmatica são revistas de modo completo, com análise retrospectiva dos 28 casos anátomo-clínicos da literatura. A respeito destas conclue que três grupos de alterações foram encontradas: 1) casos em que havia lesão da calota protuberancial e comprometimento do feixe central da calota, com consequente lesão hipertrófica da oliva bulbar; 2) lesão do núcleo denteado, acompanhada de degeneração hipertrófica da oliva bulbar controlateral, sem lesão da calota protuberancial; 3) caso único (Guillain, Bertrand e Mollaret) de degeneração hipertrófica primitiva da oliva bulbar. Ressalta daí o fator comum - lesão hipertrófica da oliva bulbar - seja consequente a lesões do feixe central da calota ou do núcleo denteado, seja primitiva. Conclue Trelles que a lesão hipertrófica da oliva desencadea a síndrome mioclônica. O problema fisiopatológico é um tanto mais complexo: não se pode afirmar se se trata de fenómeno de deficit, de libertação, de excitação ou de irritação. Em sua hipótese, paja a qual não existe ainda uma base anatómica demonstrada, a oliva bulbar seria elemento coordenador da perfeita integração motora dos núcleos bulbo-protuberânciais. Para que esta correlação se faça de maneira harmoniosa é preciso que suas relações com o núcleo denteado estejam íntegras; quando elas se perturbam por lesão deste núcleo ou do feixe central da calota (e não do pedúnculo cerebelar inferior como querem alguns), produz-se a libertação das atividades motoras desses núcleos e como consequência aparecem as mioclonias rítmicas velo-palato-faringo-oculo-diafragmaticas. Ampla referencia bibliográfica completa este trabalho que, indiscutivelmente, marcará época na literatura sobre a oliva bulbar.

P. Pinto Pupo

PATOLOGIA MEDULAR

Mielopatia arteriosclerótica com formação de cavidade. (Atherosci erotic myelopathy with syrinx formation. Diferentiation from other types of syringomyelia). Ch. Davison, S. Brocke e S. P. Goodhart. Arch. Neurol. a. Psychiat., 50: 565-574 (novembro) 1943.

Mielopatia arteriosclerótica é rara. Em trabalho anterior Davison e Keschner apresentaram dois casos em 200 necrópsias de arteriosclerose cerebral. No presente trabalho trazem mais dois encontrados em 700 necrópsias em idênticas condições, que apresentam, como particularidade interessante, a formação de cavidades intramedulares lembrando bastante o aspecto da siringomielia. Clinicamente são casos cuja história mórbida vem de longa data e cujo quadro neurológico se superpõe àquele da siringomielia. Na primeira observação relatam o caso de um homem, com 47 anos de idade, com moléstia há mais de 15 anos, iniciada por perturbações parestéticas nos membros superiores, seguidas logo de monoparesia braquial direita e, ulteriormente, de dores, de perturbações objetivas das sensibilidades superficiais e da motricidade nos membros inferiores. O diagnóstico clínico foi de siringomielia, baseado principalmente na longa duração da moléstia e nos distúrbios da sensibilidade. O estudo anatômico revelou a arteriosclerose cerebral e medular, com formação de cavidades intramedulares nos níveis cervical e dorsal. Histologicamente foi verificado que essas cavidades eram independentes do canal ependimário, não se revestiam de apêndima e sim de tecido fibroso, e havia reação esclerótica conjuntival generalizada em lugar da gliose comumente encontrável na siringomielia. Tais formações comprometiam a substância cinzenta na medula cervical e as fibras de projeção da sensibilidade e da motricidade, explicando assim o quadro clínico. Trata-se, pois, de distúrbios da arteriosclerose espinhal. A segunda observação referia-se a mulher de 67 anos de idade, com história clínica de 25 anos, com distúrbios neurológicos semelhantes aos do caso anterior, que levaram ao diagnóstico de siringomielia. Os resultados histopatológicos mostraram igualmente que se tratava de arteriosclerose espinhal, com focos malácicos e formação de cavidades histologicamente identificáveis como devidas a distúrbios circulatórios. Comentando os casos e relacionando-os com os da literatura, os autores chamam atenção para a arteriosclerose medular como fator etiológico, e discutem a questão da mielite necrótica subaguda de Foix e Alajouanine, que não passaria, a seu ver, de uma mielopatia arteriosclerótica.

P. Pinto Pupo

Síndrome da artéria espinhal anterior (Syndrome of the anterior spinal artery of the medulla oblongata). Ch. Davison. J. Neurapathol. a. Exper. Neurol. 2: 73-80 (janeiro) 1944.

O A., que chama a si a prioridade de haver em 1937 apresentado o primeiro estudo anátomo-clínico sobre distúrbios circulatórios no território bulbar da artéria espinhal anterior, apresenta agora mais três casos, encontrados em 700 necrópsias do Laboratório de Neuropatologia do Montfiore Hospital. Nos dois primeiros casos havia trombose do vaso e no terceiro ambas as artérias espinhais anteriores foram comprimidas por um meningioma da fossa posterior tomando o hemisfério cerebelar. Nestes casos, como nos de 1937, havia comprometimento do feixe piramidal, do lemnisco mediano e, em um só deles, do nervo hipoglosso, dando consequentemente uma síndrome de hemiplegia e hemianestesia profunda controlaterais com hemiatrofia homolateral da língua. Nos casos de comprometimento bilateral das artérias espinhais, estes sintomas foram também bilaterais. No caso de meningioma da fossa posterior houve concomitantemente assinergia dos membros homo-laterais.

P. Pinto Pupo

Poliomielite e gravidez. Com referência especial à não-infecção fetal. Dois casos até agora inéditos em um dos quais a medula fetal humana foi examinada para vírus. (Poliomyelitis and Pregnancy. With special reference to the failure op fetal infection. Two hitherto unreported cases in which the human fetal spinal cord was examined for the virus). P. H. Harmon e A. Hoyne, J. A. M. A., 123: 185 (setembro, 25) 1943.

Harmon e Hoyne observaram dois casos de poliomielite anterior aguda em mulheres grávidas. A primeira observação corresponde a u'a mulher de 30 anos, com uma prenhez de 6 meses, que manifestou sinais de poliomielite aguda, predominantemente de forma cervical e bulbar. Nessa ocasião, as bulhas do coração fetal eram audíveis e normais. A paciente apresentava sinais de anoxemia muito intensa e poucos dias após o início da infecção, notava-se apenas um sopro uterino, havendo desaparecido as bulhas fetais. Dias depois, eliminou um feto já morto há pelo menos 48 horas e levemente macerado. A medula fetal foi retirada e conservada em glicerina a 50%. O material foi inoculado intracerebralmente em "Macacus rhesus"; durante 26 dias o animal não apresentou hipertermia. Findo esse lapso de tempo, a necropsia resultou inteiramente negativa. Uma nova inoculação do material do primeiro para um segundo macaco, também resultou completamente negativa, Essas pesquisas permitem excluir a eventualidade de uma poliomielite fetal, parecendo mais razoável atribuir a causa de óbito do feto à intensa anoxemia resultante da localização bulbar da poliomielite no organismo materno. Após o parto, as dificuldades respiratórias diminuíram muito até desaparecer completamente e a mãe apenas apresentou algumas seqüelas da paralisia no membro superior esquerdo. A segunda observação refere-se a u'a mulher de 32 anos, grávida de 8 meses e que apresentou sinais de intensa poliomielite aguda. A infecção não modificou o decurso da gestação e, apesar das sequelas amplas e difusas, o parto foi normal e o produto conceptual não apresentava qualquer sinal de paralisia.

Ambos esses casos reforçam o conceito clássico e geralmente admitido da inexistência da poliomielite congênita. Possivelmente esse fato se explica pela raridade com que o vírus da poliomielite é encontrado no sangue circulante, havendo, conseguintemente, menores oportunidades de atravessar a barreira placentária. Fato oposto se observa com outros vírus (encefalite, influenza, coriomeningite, etc), que podem determinar infecções congênitas. Os AA. fazem uma revisão da literatura, demonstrando que a poliomielite não tem influência na gravidez e que um produto normal deve ser esperado de gestantes que apresentam a moléstia de Heine-Medin nos últimos meses da prenhez. Exceções podem ocorrer, como a primeira observação dos autores, em que o óbito fetal se deu, não pela infecção, mas por asfixia.

Roberto Melaragno Filho

Conceito de disfunção muscular na poliomielite, baseado em estudos eletromiográficos (Concepts of muscle dyspunction in poliomyelitis. Based on electromyographic studies). A. L. Watkins, M. A. B. Brazier e R. S. Schwab. J. A. M. A., 123: 188 (setembro, 25) 1943.

Como é sobejamente conhecido, o tratamento pelo sistema Kenny baseia-se em um conceito particular da disfunção muscular cujos principais elementos consistem no espasmo, na assim-chamada alienação mental do músculo e na incoordenação muscular. Com o fim de elucidar esses elementos, Watkins, Brazier e Schwab registraram a descarga elétrica de músculos em repouso, durante a movimentação passiva e durante a contração voluntária, quer nos estádios precoces, quer nos tardios da poliomielite aguda. Esses resultados foram comparados com registros semelhantes correpondentes a testemunhos normais e em pacientes portadores de lesões traumáticas de nervos periféricos. Segundo os AA., o estudo desses registros demonstra que o conceito de Elizabeth Kenny da disfunção muscular, embora seja a base de um excelente método de tratamento, é falho como explicação fisiológica da disfunção existente.

Em pessoas normais, um músculo em completo repouso não evidenciava qualquer corrente de ação. Em portadores de poliomielite foram registrados eletromiogramas de músculos em espasmo e em músculos enfraquecidos mas sem espasmo. No estádio agudo da doença, apenas se notavam descargas de baixa voltagem nos músculos enfraquecidos e não nos que se apresentavam em espasmo mas sem déficit motor. Nos estádios mais avançados da infecção, em casos com paresias consideráveis, notavam-se, nos músculos paréticos em repouso, descargas muito acentuadas. Essa atividade elétrica parecia ser mais um índice da perda da força muscular que de um espasmo. Tais descargas do músculo em repouso persistiam durante todo o período de melhoria da força de um dado músculo, cessando quando essa atingiu ao máximo. Portanto, ao que parece, essas descargas elétricas espontâneas devem ser manifestação de um processo regenerativo e tal hipótese é apoiada pela verificação de descargas semelhantes em músculos inervados por nervos traumatizados. Por outro lado, os AA. fizeram o registro eletromiográfico durante a movimentação passiva; nos músculos parcialmente paralisados, notaram descargas elétricas intensas. Nos músculos em espasmo mas sem sinal de déficit motor, tais manifestações da atividade elétrica eram mínimas. Em músculos agonistas e antagonistas igualmente enfraquecidos, a atividade elétrica era a mesma, embora um dos grupos demonstrasse espasmo. Conclui-se então pela impropriedade do conceito de "alienação mental", que atribui o enfraquecimento de um músculo ao espasmo de seu antagonista. Nos estádios tardios da doença, a movimentação passiva acentuava as descargas elétricas verificadas nos músculos em repouso. Os eletromiogramas registrados durante a contração voluntária de músculos afetados pela poliomielite, demonstraram uma relação direta entre a força muscular e a voltagem das correntes de ação. Todavia, não se verificava uma relação constante entre a voltagem das descargas espontâneas (com o músculo em repouso) e a das correntes de ação. Pela contração ativa, normalmente há uma inibição do antagonista ao se contrair o agonista. Todavia, na poliomielite foram registradas correntes de ação isócronas nos músculos agonistas e antagonistas e esse fato seria a explicação da "incoordenação" muscular. A mencionada sincronia não é patognomônica da paralisia infantil, por isso que também é encontradiça em casos de lesão de nervos periféricos, durante a regeneração dos axônios. Conclui-se que, dos 3 conceitos fundamentais de Elizabeth Kenny, o único sustentado pelo registro objetivo dos autores é o de "incoordenação", embora o termo seja inadequado.

Roberto Melaragno Filho

SISTEMA VEGETATIVO

Falência do mecanismo da sudorese no deserto. Anidrose termogênica. (Failure of the sweat mechanism in the desert. Thermogenic anhidrosis). J. Wolkin, J. I. Goodmann e W. E. Kelley. J. A. M. A., 124: 478-482 (fevereiro, 19) 1944.

Este trabalho baseia-se no estudo de oito soldados convocados para o treino militar normal no deserto norte-americano, onde a temperatura é assás elevada. Distinguem-se classicamente três síndromes clínicas ocasionadas pelo excessivo calor: a insolação, a exaustão calórica e as cãibras pelo calor. No primeiro caso, o paciente apresenta colapso, delírio, irritabilidade nervosa e distúrbios visuais. Esse quadro pode ser precedido por náuseas e vômitos ou então desencadeia-se rapidamente. A pele torna-se seca, a temperatura corporal se eleva, surge taquisfigmia (160 a 180 por minuto) e a respiração, tornando-se muito profunda, simula a respiração do tipo Kussmaul. A exaustão calórica se evidencia por cefaléia, anorexia, extrema astenia, perturbações visuais, vômitos, vertigens e impossibilidade de caminhar. Por outro lado, podem aparecer cãibras nos músculos dos membros ou nos abdominais. Em ambos os casos, a temperatura retal ou bucal é mais ou menos normal, as pupilas se tornam midriáticas e o pulso se acelera. A tensão arterial pode estar algo diminuída.

Os AA. notaram que, por vezes, soldados apresentavam, em consequência à exagerada exposição ao sol durante seus trabalhos militares, uma sintomatologia não enquadrável nas síndromes clínicas acima delineadas. Precedendo-se quase sempre de alguns dias de hipersudorese generalizada muito acentuada, os pacientes apresentavam uma completa anidrose do tronco e membros em contraposição à pronunciada sudorese da cabeça e pescoço. A pele de todo o corpo abaixo do pescoço tornava-se seca e a contração dos músculos pilomotores emprestava-lhe o aspecto de "pele de galinha". Subjetivamente, acusavam os pacientes uma sintomatologia típica: fraqueza mais ou menos súbita, tontura, mal-estar, cefaléias e calafrios. A temperatura corpórea quase sempre permanecia normal, exceto quando a temperatura ambiente fosse elevadíssima. O prognóstico era sempre benigno: os sintomas regrediam rapidamente pelo simples resfriamento do meio ambiente. Entretanto, a reexposição ao sol acarretava a volta da sintomatologia, motivo pelo qual os soldados afetados eram enviados à retaguarda até se normalizar o mecanismo da sudorese. Para comprovar os dados obtidos clinicamente, os AA. praticaram as provas de Minor: os pacientes apresentavam hiperidrose da cabeça e pescoço e anidrose abaixo desse nível, quer à prova central (exposição do corpo ao calor), quer à prova periférica (injeção de drogas colinérgicas). Após a cura, repetindo-se as mesmas provas, estas se revelaram normais. Ao que parece, o cloreto de sódio, classicamente usado no tratamento da insolação, após os estudos de Haldane, não parece influir na síndrome ora descrita. Realmente, todos os soldados afetados haviam ingerido o sal preventivamente e, após o início da doença, o exame do sangue revelava taxas normais de cloreto. Os AA. fazem o diagnóstico diferencial com os quadros da insolação e exaustão calórica. A hipertermia, o coma, a taquisfigmia e a taquipnéia do insolado distinguem a síndrome em apreço da insolação. A confusão com a exaustão calórica é mais fácil. Todavia, a pele fria e sinais de choque são componentes integrantes da exaustão e sempre ausentes na anidrose termogênica. Interessante discussão estabelecem os AA. sobre a fisiopatologia da falência do mecanismo termo-regulador. A hipótese do comprometimento central, por lesão do centro termo-regulador do hipotálamo, parece pouco sustentável, devido à persistência da sudorese no segmento cefálico e no pescoço. Realmente, nas lesões tumorais ou cirúrgicas do centro termo-regulador, a anidrose é universal. Entretanto, a hipótese de um comprometimento das próprias glândulas sudoríparas ou das terminações simpáticas é ainda discutível. De fato, as glândulas sudoríparas, mesmo quando enervadas (simpatectomia) continuam a secretar quando a respectiva área cutânea entra em contacto com outra superfície cutânea (sudorese por contacto). Por outro lado, embora a falta de resposta à injeção de drogas colinérgicas sugira o comprometimento das terminações nervosas, devemos ter em mente qué a policarpina e o mecolil também falham em seus efeitos quando uma lesão central afeta o mecanismo termo-regulador.

Roberto Melaragno Filho

TERAPÊUTICA

A histamina no tratamento da síndrome de Ménière. (Histamine in the treatment of méniere's syndrome). J. J. Ratney. J. A. M. A., 122: 850 (julho, 24) 1943.

O complexo sintomático conhecido como síndrome de Ménière reage diferentemente aos diversos meios terapêuticos. Por vezes os sintomas regridem espontaneamente sem qualquer tratamento, não se manifestando por um período de tempo mais ou menos longo. Em outras vezes, cedem por diversas formas de tratamento: sedativos, dieta acloretada, cloreto de amônio e cauterização das trompas de Eustáquio. Casos há, todavia, rebeldes a esses processos terapêuticos, que atormentam física e mentalmente. Considerando a síndrome de Ménière como alérgica, Horton tratou um paciente com histamina intravenosa. Rainey, aperfeiçoando a técnica do emprego do medicamento e observando maior número de casos, publica no presente trabalho as suas conclusões.

O A. usa uma ampola de 1 cc. com 2,5 mgrs. de fosfato de histamina, que dissolve em 250 ce. de solução isotonica de cloreto de sódio. O medicamento empregado por via endoflébica é ministrado gota a gota em um ritmo de 70 gotas por minuto, durante cerca de uma hora a uma hora e meia. Conforme a tolerância do doente, esse ritmo pode ser diminuído. Durante a administração do medicamento, os doentes sentem, no início, uma sensação de constrição no tórax, depois cefaléia, que no princípio se localiza na região occipital e mais tarde na região frontal. Um eritema se evidencia na face e posteriormente se espalha para o tórax, coxas e, às vezes, para as plantas dos pés e artelhos. Logo depois de suspensa a administração da histamina, a hiperemia desaparece. A tensão arterial deve ser tomada em cada 10 minutos. Embora Horton empregasse e preconizasse doses de manutenção subcutânea do mesmo medicamento, as experiências de Rainey não o convenceram de sua utilidade. Em alguns casos do autor, uma única aplicação do tratamento não foi suficiente, requerendo-se dois tratamentos intravenosos e, em alguns casos, três em dias alternados. Em conclusão, julga o A. que, se o diagnóstico de síndrome de Ménière for exato, o tratamento de resultados mais promissores é a histaminoterapia.

Roberto Melaragno Filho

Resultados da eletroterapia do espasmo facial e da paralisia das cordas vocais. (Results of electric therapy of facial spasm and of paralysis of the vocal cords). Ch. O. Fiertz. Arch. Neurof. a. Psychit, 50: 616 (novembro) 1943.

Fiertz faz grande elogio do método clássico da terapêutica das moléstias neurológicas pela galvanização, relembrando o efeito excitador do cátodo e sedante do ânodo. Casos há, clinicamente considerados como perdidos, em que uma terapêutica elétrica paciente e convenientemente dirigida produz ótimos resultados, em particular no espasmo facial pós-paralítico e na paralisia das cordas vocais. Apresenta quatro pacientes, portadores de espasmo do facial pós-paralítico com duração de 5 a 25 anos, nos quais obteve ótimos resultados com o tratamento elétrico, tendo desaparecido completamente o espasmo e tendo voltado a função do facial. No concernente a paralisia da corda vocal apresenta dois casos - um sobrevindo apôs tireoidectomia, outro de origem desconhecida - nos quais, com galvanização e excitação elétrica da corda através a cartilagem tireóide, obteve integral" restituição da voz.

P. Pinto Pupo

Resultados imediatos e evolutivos da eletrochoqueterapia. (Immediate and follow up results of Electroshock Therapy). L. H. Smith, D. W. Hastings e J. Hughes. Amer. J. Psychiat. 100: 351 (novembro) 1943.

Os AA. expõem os resultados obtidos com o tratamento pelo eletrochoque em 279 pacientes internados no Pennsylvania Hospital. Os choques eram dados 3 vezes por semana e o tratamento consistia em 9 ou 10 crises convulsivas. Em um grupo destes doentes, usaram a técnica do curare de Bennett, utilizando-se do preparado Intocostrin (Squibb) intravenosamente. Analisam as complicações consequentes ao tratamento; descrevendo um caso de morte, imediatamente após o primeiro tratamento. Este paciente tinha sido parcialmente curarizado e havia apresentado apenas uma leve reação convulsiva. O papel do curare nesta fatalidade, é para os AA. uma questão de opinião, e deixam de tecer qualquer comentário a respeito. Comparam os resultados imediatos com os avaliados um ano depois. Consideram o tratamento muito eficiente na melancolia de involução e psicose maníaco-depressiva. A percentagem de curas, um ano depois, embora menos elevada, é comparável com a registrada ao término do tratamento. Na esquizofrenia o método mostrou-se ineficiente e nas psiconeuroses de valor duvidoso. O uso do curare diminui as injúrias traumáticas no esqueleto. Na série de complicações observadas, os AA. salientam os distúrbios permanentes da memória.

Joy Arruda

Vitamina B1 por via intra-raquídia. (Vitamina B1 por via intraraquídea). R. Stern. Arch. de Neurol. y Psiquiat. de México, 6: 317-334 (setembro-outubro), 1943.

O A. emprega a vitaminoterapia por via intra-raquídia há 5 anos, com excelentes resultados. As injeções são feitas semanalmente, por via lombar,, injetando de cada vez 16,6 a 33,3 mgrs. de vitamina B1, sendo essencial a mistura do preparado com o líquido cefalorraquídio antes da injeção. Às vezes, em geral só depois da primeira injeção, surgem reações com hipertermia (38 a 39°) e mal-estar; somente em um caso foram observadas reações de tipo meningítico com forte cefaléia, vômitos e hipertermia. Os 20 doentes em que tal terapêutica foi empregada de modo intensivo foram divididos em 9 grupos: só no primeiro - dipsomania, alcoolismo crônico e suas complicações - é que foi empregada exclusivamente a vitaminoterapia intra-raquídia. Em todos os outros - epilepsia, neurossífilis, paraplegias espásticas espinhais, parkinsonismo pós-encefalítico, poliomielite anterior, meningite cerebrospinhal epidêmica, estados depressivos endógenos, edema cerebral - a vitaminoterapia foi associada a medicações outras, específicas ou não. No primeiro grupo, os resultados foram excelentes. Nos restantes, a terapêutica pela vitamina B1 por via intra-raquídia ou foi de efeitos nulos, ou pareceu facilitar grandemente a regressão dos sintomas, não sendo possível, porém, uma afirmativa segura, já que foram associados, nestes doentes, outros recursos terapêuticos. Sendo praticamente inócua a injeção intra-raquídia de vitamina B1, o autor preconiza que ela seja empregada com maior freqüência, admitindo que essa medicação tenha, quando menos, um efeito tônico geral, atuando especialmente nas afecções neuromusculares e sendo, portanto, indicada nas moléstias inflamatórias e degenerativas do sistema nervoso.

O. Lange

Casos limítrofes tratados pelo eletrochoque. (Bordeline cases treated by Electric Shock). A. Myerson. Amer. J. Psychiat. 100: 355 (novembro) 1943.

O A., após fazer uma breve exposição sobre a evolução da terapêutica psiquiátrica, explica a denominação que deu ao grupo de doentes por êle tratado - casos limítrofes - criticando os termos neuroses e psicoses, que a seu ver são infelizes e sem significação real. Considera como casos limítrofes os que ainda não atingiram o estágio de perda de conhecimento e conduta irresponsável, ou ainda os em que não se pôde fazer um diagnóstico positivo sobre o tipo da doença mental. Tais casos podem evoluir para qualquer tipo de psicose ou não. Todos seus pacientes são casos de consultório e tratados pelo método de ambulatório, muitos deles, por longo tempo. O trabalho é ilustrado com 10 observações brilhantemente descritas de estados depressivos, estados compulsivo-obsessivos e outros que habitualmente são considerados como estados psiconeuróticos. O A., entretanto, enquadra estes casos numa síndrome que êle denomina de "síndrome da irrealidade anedônica". O termo anedonia refere-se ao fato de haver um completo desaparecimento dos impulsos e desejos nas principais direções da vida, principalmente para com os alimentos, água, sexo, trabalho, relações sociais e desaparecimento do sentimento de fadiga normal e a capacidade de sono. Todos os afetos, exceto a ansiedade, parecem desaparecer e, com este déficit, desenvolve-se nos casos mais graves um sentimento de irrealidade e de perda de conhecimento. Todos esses casos de estado mental limítrofe, foram tratados pela terapêutica de choque sem resultados satisfatórios duradouros, porém, o A, considera essa terapêutica de uma maneira bastante favorável. Poucos tratamentos pelo eletrochoque, aplicados sem a necessidade da internação dos pacientes e sem sobrecarga econômica, determinam melhoras rápidas, não obtidas por todas as outras formas terapêuticas. O A. resume suas idéias sobre o mecanismo de ação deste método, que a seu ver age determinando um golpe cerebral a fim de provocar uma redução das atividades mais elevadas, prejudicando a memória e, portanto, trazendo o esquecimento do estado patológico. Termina afirmando não existir em todos estes casos, uma profunda patologia e que parece incontestável ser a terapêutica física pelo tratamento de choque, muito superior a qualquer psicoterapia ou qualquer outra forma de tratamento, tal como o uso de drogas e produtos hormonais.

Joy Arruda

O uso de prostigmina no tratamento da poliomielite. (The use of prostigmine in the treatement of poliomyelitis). H. Kabat e M. e. Knapp. J. A. M. A., 122: 989-995 (agosto, 7) 1943.

Se bem que o processo Kenny tenha sido universalmente considerado como excelente, as bases fisiopatológicas com que a enfermeira australiana fundamenta seu método para o tratamento da poliomielite aguda, tem encontrado opositores numerosos. O presente artigo é mais um trabalho da escola de Minneapolis, que nos Estados Unidos tem racionalizado o processo Kenny. O "espasmo muscular" da paralisia infantil consiste em prelo menos dois fenômenos: a) hipertonia ou rigidez muscular que resulta em deformidades - pé caído, por exemplo - e na limitação da movimentação passiva; b) exaltação do reflexo de distensão, que, por sua vez, também determina uma diminuição da amplitude do movimento passivo ao nível do segmento comprometido. Se um tratamento adequado não for instituído oportunamente, essas alterações persistem por um tempo mais ou menos longo. Estudos experimentais têm demonstrado a origem neurogéníca desses mecanismos: o espasmo muscular e os reflexos de distensão desaparecem temporariamente durante raquianestesia nos poliomielíticos. Por outro lado, a anestesia pelo pentotal intravenoso produzia efeitos mínimos sobre o espasmo muscular. Esses fatos sugerem que essas alterações musculares sejam consequência de comprometimento da substância cinzenta pela invasão de vírus. O estudo histopatológico de secções de medula de 78 pacientes mortos por poliomielite revelaram lesões principalmente dos neurônios internunciais, lesões essas mais freqüentes que as das células dos cornos anteriores. Ora, experimentalmente foi demonstrado que lesões dos neurônios internunciais em cães produziam uma hipertonia muscular muito semelhante à verificável na poliomielite humana. Justifica-se, portanto, o atribuir a hipertonia muscular da paralisia infantil a lesões dos neurônios internunciais tanto mais que, através desses neurônios chegam às células dos cornos anteriores os influxos de centros superiores, inclusive do sistema piramidal.

Esse preâmbulo serve como justificativa para o emprego da prostigmina na paralisia infantil, ao lado do tratamento pelo sistema Kenny. Como é sabido, o efeito fundamental da fisostigmina ou da prostigmina consiste na inibição da função da colinesterase, a qual por sua vez é uma inativadora da acetilcolina. Inibindo a colinesterase, a prostigmina permite um acúmulo de acetilcolina ao nível das junções mioneurais, nas terminações nervosas parassimpáticas e no sangue. Aparentemente, diante da presença de espasmo muscular, a acetilcolina deveria ser contra-indicada pois, pelo seu acúmulo ao nível da junção mioneural, deveria agravá-lo. Os autores empregaram, associadamente à prostigmina, a atropina, por isso que a prostigmina administrada em altas doses, como se fazia mister, acarretava fenômenos parassimpáticos assas desagradáveis. O uso da atropina provava que os efeitos da prostigmina sobre o músculo não eram secundários à ação da droga sobre o parassimpático. Por outro lado, o fato da prostigmina provocar diminuição e não aumento do tono muscular nos poliomielíticos prova que a ação da droga não se faz na junção mioneural. O conjunto desses dados leva à suposição que a ação inibitória da colinesterase afeta a função simpática na medula espinhal.

Kabat e Knapp estudaram 24 poliomielíticos com idades e tempo de moléstia diferentes. Em 20 pacientes, os efeitos da administração da injeção subcutânea de 0,5 a 2,5 mgrs. de metilsulfato de prostigmina, se evidenciavam dentro da primeira hora. O sulfato de atropina, administrado concomitantemente, eliminava os fenômenos parassimpáticos provocados por aquelas doses de prostigmina. O efeito da prostigmina mais significativo consistia, nos doentes poliomielíticos, no relaxamento do espasmo muscular e no alívio da dor. U'a mais ampla movimentação passiva era permitida e vários tipos de deformidade eram reduzidos ou mesmo desapareciam pela diminuição do espasmo muscular, A própria motricidade ativa era melhorada após a administração da prostigmina, aparentemente relacionada com a diminuição do espasmo nos músculos antagonistas. Em 4 pacientes observaram-se fasciculações espontâneas após o emprego da acetilcolina; não persistiam por mais de meia a uma hora e não apresentavam qualquer consequência prejudicial. Quanto ao modo de ação da droga na medula espinhal humana parece ser muito complexo. Os autores que se ocuparam do assunto julgam que a fisostigmina age sobre as conexões sinápticas das células do corno anterior através da influência sobre a função dos neurônios internunciais.

Em uma série de 20 pacientes, dos quais a maioria em estado subagudo, os autores empregaram a prostigmina com fins terapêuticos, em geral associadamente com as compressas quentes preconizadas por Kenny. Na maioria dos casos a droga parecia acelerar a cura. Kabat e Knapp usaram as doses seguintes: para os adultos: 1,5 a 2,0 mgrs. de metilsulfato de prostigmina e injeção hipodérmica de 0,6 mgr. de sulfato de atropina; para crianças de 8 a 13 anos: 1 mgr. de prostigmina e 0,3 mgr. de atropina; para crianças de 2 a 6 anos, 0,5 mgr. de prostigmina sem atropina. Por vezes usaram também a prostigmina por via oral nas seguintes doses: para adultos, brometo de prostigmina 45 mgrs. e 0,6 mgr. de atropina, 3 vezes ao dia; para meninos de 12 a 14 anos: 30 mgrs. de prostigmina e 0,3 mgr. de atropina, 3 vezes ao dia; para crianças menores: 15 mgrs. de prostigmina, 2 a 5 vezes ao dia, sem atropina.

Roberto Melaragno Filho

TRAUMATISMOS CRANIANOS

Cefaléia pós-contusional. (Post-contusional Headache). e. Gutmann. Lancet, 1, 10-12 (janeiro) 1943.

O autor, que é um investigador neuropsiquiátrico no Departamento Nuffield de Cirurgia de Oxford, apresenta neste trabalho um estudo da incidência da cefaléia pós-concussional em 179 casos admitidos no serviço de acidentes da Radcliffe Infirmary e diagnosticados como traumatismos cranianos. A ocorrência da cefaléia foi notada em 6 fases, e com fins estatísticos não se estabeleceu distinção entre cefaléia média e grave. Incluíram-se todas as cefaléias, mesmo as devidas a doença inrercurrente. Como indicador da gravidade do traumatismo utilizou-se a duração da amnésia pós-traumática, determinada na ocasião da alta, segundo a sugestão de Russell (1932). Os resultados foram, quanto à duração da amnésia:

Grupo O - 33 casos - 5 minutos

Grupo A - 85 casos - 1 hora

Grupo B - 39 casos - 24 horas

Grupo C - 19 casos - 7 dias

Grupo D - 3 casos - mais de 7 dias

A presença ou ausência de cefaléias foi registrada nas 6 seguintes fases: fase 1 - na admissão ou logo que o doente se encontrava capaz de responder às perguntas; fase 2 - durante a permanência no hospital; fase 3 - ao ser dada a alta; fase 4 - quando se julgava estar em condições de trabalhar; fase 5 - três meses depois do acidente (só aqueles doentes que retomaram o trabalho); fase 6 - seis meses depois do acidente.

Da análise do quadro poder-se-á ver que 46% dos doentes se queixaram de cefaléia na ocasião da admissão ou logo que se encontravam em condições de responder às perguntas. Durante a permanência no hospital, a cefaléia apresentava-se de vez em quando na mesma percentagem. 21% dos doentes queixavam-se de cefaléia no momento da alta do hospital. No primeiro exame depois de ter sido dada a alta (isto é, quando se supunha que o doente estava em condições de voltar ao trabalho), 38% deles referiam dores de cabeça. Três meses após o acidente, sofriam de cefaléias 21% e 6 meses depois, apenas 18%.

Ao classificar os casos de acordo com a gravidade do traumatismo - indicada pela duração da amnésia pós-traumática - verificou-se que nos exames feitos até a primeira consulta inclusive depois da alta, a percentagem das cefaléias nos casos médios era persistente e significativamente mais alta do que nos casos graves. Esta diferença desapareceu ao fim de 3 a 6 meses após o acidente. A análise clínica dos casos com uma história de cefaléia mostrou que a idade do doente não era um fator importante. Uma proporção considerável de doentes sofriam já de cefaléias periódicas em toda a sua vida. Na maioria dos restantes casos existia uma psicogênese evidente.

A impressão do A., à luz dos seus achados, é que o traumatismo craniano produz provavelmente cefaléias, mas só metade dos traumatizados é que as referem ou se recordam delas. 80% dos casos podem ter alta do hospital livres de todo o mal-estar. Conservam certa propensão para as cefaléias cerca de menos da metade dos doentes que tiveram alta. A predisposição é psicossomática - isto é, os fatores psicológicos são tão importantes para precipitar as cefaléias como os fatores físicos (abaixar-se, calor, exercício). A impressão do A. é a de que eles são mesmo mais importantes; seis meses depois do traumatismo esta predisposição ainda se manifesta em menos de 20% dos casos e nalguns déles a propensão à cefaléia pode descobrir-se na história anterior ao acidente. Na maior parte dos restantes casos, os fatores sociais ou psicológicos precipitam as cefaléias ou determinam a atitude do doente para elas.

Transcrito do B. M. B. 1, 40 (1943)

Alterações emocionais e do conhecimento no estado confusional pós-traumático. (Emotional and Cognitive Changes in the Post-Traumatic Confusional State). A. Paterson. Lancet, 2: 717-720 (dezembro, 19) 1942.

Este trabalho procede da Equipe de Lesões Cerebrais do Serviço Médico de Urgência (Ministério de Saúde) de Edimburgo. O A. faz notar que a atividade consciente no homem compreende muitas funções diferentes que podem ser eliminadas seletivamente pelos diversos tipos de lesão cerebral. Esta desintegração seletiva da atividade mental e da conduta consciente depende da sede e natureza da lesão. Na fala normal existe um fundo geral de sintaxe e gramática que é grosseiramente alterado pelas lesões na área temporoparietal da córtex, e este fundo torna-se inacessível para o doente afásico. As lesões da área occipitoparietal dão origem à acalculia, sendo inacessível o sistema dos princípios aritméticos. As lesões em qualquer ponto da região do 3.° ventrículo tendem a alterar o fundo mais amplo das relações de espaço e tempo. A mesma regra de transtorno e recuperação após lesões cerebrais aplica-se a outras funções cerebrais mais altas, memória e orientação, percepção e imaginação e conservação das atitudes emocionais e padrões de conduta estável.

Na presente investigação, estudaram-se detalhadamente casos de grande confusão que apresentam o transtorno mais completo da atividade consciente ordinária causados por graves lesões cerebrais concussionais. Os estádios na recuperação da confusão indicam o modo de se restabelecerem os complexos processos mentais. Mediante o estudo psiquiátrico destes casos, desde as primeiras fases, vão sendo adquiridas informações acerca do seu curso, modo de tratamento e ulterior distribuição dos doentes. Esta colaboração psiquiátrica e a sua aplicação aos estudos dos transtornos da função cerebral baseia-se nos. conceitos ideados por Hughlings Jackson, Henry Head e seus sucessores.

Goldstein explica os fenômenos de desintegração mental aplicando os princípios de imagem e fundo da Escola Gestalt de Psicologia. Êle considera a confusão como o borrão da imagem com o fundo. O A. sugere que a restrição do processo de reconhecimento aos aspectos soltos da situação percebida é de importância primordial nos estados confusionais. Ao mesmo tempo, o fundo torna-se inacessível. A recuperação consiste numa ampliação gradual do campo consciente, com crescente acessibilidade do fundo. A percepção ordinária consiste num objeto de atenção com, pelo menos, dois tipos de fundo que lhe dão sentido, isto é, o lugar no espaço que o circunda e a passada experiência desse objeto. Esta última sustenta o processo de reconhecimento, O A. cita quatro casos ilustrativos, nos quais houve um alargamento gradual do campo da atenção a partir de grandes estados confusionais, até a uma residual distração, que pode ser considerada como uma forma leve de confusão. Também podem restringir o campo consciente um forte interesse e a emoção, permitindo, assim, a concentração sobre detalhes apropriados da situação que cobrem o interesse ou a emoção.

As alterações afetivas encontradas nos estados confusionais tiveram tendência a passar inadvertidas no passado. O A. demonstra que estas alterações emocionais são análogas às alterações do reconhecimento. As atitudes emocionais são isoladas e muitas vezes excessivas, e o equilíbrio normal entre as tendências emocionais sofre um transtorno. No estado confusional a restrição das atitudes de reconhecimento e o isolamento das tendências emocionais reforçam-se mutuamente.

Na pessoa normal, o álcool tende a restringir a capacidade de reconhecimento e aumenta certas atitudes emocionais. Quando o funcionamento mental está já alterado pelo traumatismo craniano, este efeito exagera-se notavelmente, mesmo com pequenas quantidades de álcool. A fadiga e o esforço emotivo também exageram a alteração mental, causando fenômenos amnésticos ou estados de fuga. A restrição e a fixação das atitudes de reconhecimento e emocionais podem também ser demonstradas nas menores alterações da personalidade encontradas tantas vezes depois de graves concussões. O fundo convencional, social e outros standards, fica interrompido e os traços emocionais basilares, tais como a agressão ou timidez, não sofrem modificação e por conseguinte exageram-se. Citam-se dois de tais casos, nos quais um grave traumatismo craniano concussional produziu uma mudança da personalidade que, como se sugere no trabalho, poderia ser descrita como um "efeito caricatural".

O A. termina pondo em relevo a importância e o valor prático do estudo do curso completo do estado confusional pós-traumático, especialmente no que se refere à distinção entre a verdadeira mudança da personalidade pós-traumática e os estados de neurose ansiosa.

Transcrito do B. M. B. 1, 39 (1943)

Observações sôbre o líqüido cefalorraquídio nos traumas cranianos fechados (Some observations on the cerebrospinal fluid in closedhead injuries). J. H. Paterson. J. Neurol. a. Psychiat. (Londres) 6: 87 (junho-outubro) 1943.

Os AA. abordam rapidamente, sem discuti-la, a questão da indicação ou contra-indicação da punção lombar nos traumas agudos do crânio. O trabalho destina-se a estudar as alterações liquóricas observadas logo após os traumas, bem como as relações entre essas alterações, a gravidade do trauma, e as modificações do estado mental. Foram utilizados 300 doentes; praticou-se a punção lombar em decúbito lateral, alguns dias após o acidente; excluíram-se os casos de lesões abertas com penetração da dura, e os complicados por hematomas extra ou intradurais e por meningite infecciosa.

Entre 235 casos, 27 apresentaram pressão inicial igual ou maior que 25 cms., (só em 11 a pressão era superior a 30). Em 150 casos (63,8%) a pressão era normal (0 a 18). Para relacionar a pressão com a severidade do dano, levou-se em conta o grau de amnésia pós-traumática. O A. encontrou maior proporção de casos de hipertensão nos traumas mais graves (amnésia durante mais de sete dias: Pi maior que 25, 42%). Em 70% dos casos em que a amnésia durou menos de 24 horas, a pressão era de 0 a 18. Estudando o retorno da pressão liquórica à normalidade, verificou que isto ocorria após o sétimo dia, não sendo influenciado pela gravidade do trauma.

Em 120 casos (40%) encontraram-se 100 ou mais hemácias por mm3; os números mais baixos não foram considerados, devido à possibilidade de se tratar de um acidente de punção. O desaparecimento das hemácias se faz rapidamente, não sendo afetada pela realização de punções repetidas. As hemorragias subaracnóideas tardias (7 ou mais dias) eram acompanhadas por rigidez de nuca, cefaléia e por marcada elevação da tensão liquórica. Entretanto, podem-se dar hemorragias menores, assintomáticas, só reveláveis pela repetição das punções; em 16 casos dos 42 em que a punção foi repetida havia um aumento de hemácias, geralmente na primeira semana após o trauma. Mas o A. julga que não deve ser dada excessiva importância ao teor eritrocitário do líquido lombar, pois pode haver sedimentação no fundo-de-saco lombar, ou oclusão parcial da fenda tentória por coágulo, impedindo a passagem do líquor intracraniano para o canal raquídio. Segundo consenso geral, a repetição das punções não é capaz de provocar recrudescimento de uma hemorragia subaracnóidea. Raramente (8%) foi encontrado líquor sem hemácias, nos casos em que a amnésia durou mais de 24 horas. Não há relação entre a quantidade de glóbulos vermelhos e a Pi nos sete primeiros dias, a não ser quando a hemorragia é muito intensa (mais de 100.000 por mm3).

Relacionando o estado mental com a pressão liquórica, em 192 casos, o A. encontrou: em 48% dos casos de pressão superior a 18, os doentes conservavam a consciência. Mas mesmo quando a pressão erà de 0-18, havia perturbações da consciência em 21,6%; não é lícito, pois, concluir por uma interrelação entre esses sinais. Por outro lado, o estado mental parece estar prejudicado nos casos de elevado número de hemácias no líquor. Assim, a percentagem de pacientes em plena consciência com mais de 100.000 por mm3 era. de 8% (1 em 13). Este fato parece concordar com a asserção de Ritchie Russel (1932) de que em todo o caso em que houver mais de 100.000 hemácias por mm3 existe torpor ou coma. Turner (1941) não concorda com esse modo de ver, achando que o estado da consciência deve ser antes relacionado com o lugar de origem do sangue.

Discutindo os dados encontrados, o A. chama a atenção para o fato de a pressão ser, em geral, normal ou levemente aumentada na primeira punção após o trauma, assinalando porém que não foram considerados os casos com hematomas que, comprimindo o cérebro, produzem frequentemente hipertensão. Parece, pois, que o aumento da pressão intracraniana não tem papel importante na produção da sintomatologia pós-traumática. Explicando teoricamente a hipertensão liquórica nos casos de trauma craniano, o A. admite dois mecanismos: 1) mudança no ritmo de formação e absorção do líquor; 2) alteração no tamanho do cérebro, seja por edema ou por infiltração hemática. A hiperprodução de líquor poderia ser devida a modificações locais nos plexos coróideos e epêndima ou secundária a aumento da pressão intraventricular. Além disso, a reabsorção pode ficar transtornada pela presença de sangue nos espaços subaracnóideos. O estado da consciência, em lugar de se relacionar com a quantidade de sangue, deve depender, antes, da laceração ou contusão cortical. Jefferson (1942) acha que a inconsciência é devida à interferência com as funções mesencefálicas, quer originada por lesão neurônica primária na ocasião do trauma, ou posteriormente, pela formação de um cone tentório de pressão.

H. Canelas

  • Análises de revistas

    ANATOMIA E FISIOLOGIA
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2015
    • Data do Fascículo
      Set 1944
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