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Análises de revistas

Análises de revistas

Uma abordagem psicogênica à epilepsia (A psychogenic approach to epilepsy) L. L. Fuchs. J. Child. Psychiat, 1:5890 (julho) 1947.

O A. estudou 25 crianças portadoras de convulsões. O assunto foi encarado sob vários aspectos: escola, inteligência, personalidade, fatores psicológicos e interferências terapêuticas. Os exames psicométricos autorizaram o A. a crer que o fator de inteligência não entra na incidência da epilepsia; o QI médio deste grupo de crianças foi 101. Analisando os possíveis fatores que conduzem a melhora ou deterioração do nível intelectual, considera que os fatores ambientais exercem importante papel; assim, se a criança melhora em suas atitudes, em seu comportamento e em seus ataques, poucas serão as possibilidades de deterioração mental; de outro lado, se piora no número de ataques, na conduta e nas relações com o mundo exterior, um decréscimo no QI pode ser previsto. O A. comprova tais fatos com várias descrições de casos, demonstrando ainda a interrelação com o ambiente. Uma criança num ambiente infeliz mostra declínio dos traços da personalidade e na eficiência mental e aumento no número de ataques, enquanto uma criança com QI de 77 e um diagnóstico anterior de deficiência mental, mostra notáveis melhoras quando permanece em um campo, acompanhando livre e igualmente outras crianças, sem os traumatismos do ambiente. Considera as crianças epilépticas portadoras de grande atividade emocional, revelada nas respostas aos testes de Rorschach. Em relação à escola, salienta a necessidade desta para a criança epiléptica. A seu ver, a criança epiléptica necessita de educação regular, não somente para equipá-la para uma vida adequada, mas porque "não há melhor tratamento de seu problema total do que expô-la a todas as experiências da criança comum".

O A. conclui pela não existência da personalidade epiléptica, embora a criança epiléptica seja geralmente de tipo nervoso e muito combativa aos estímulos ambientais. Os epilépticos classificados como problemas apresentam tipos comuns de problemas de comportamento. Cita como exemplo uma criança que foi rejeitada desde o nascimento pelos pais, mas melhorou evidentemente com um professor bondoso e compreensivo: deteriorou novamente quando perdeu seu professor no fim do termo escolar. Estudando a dinâmica da epilepsia, o A. discute a origem histérica e orgânica. Baseado no fato de que o psiquismo pode interferir no funcionamento dos órgãos viscerais, admite igualmente a influência no sistema nervoso central; assim, um ataque epiléptico pode ser considerado somente o sintoma primário de um conflito profundamente estabelecido num indivíduo emocionalmente perturbado. Conflitos desta ordem foram observados pelo A. em todos os casos do grupo em estudo. Os ataques da maioria destas crianças cessaram quando estiveram fora do lar, indicando uma causa psicológica. Resumindo, conforme o próprio A. relata, "este estudo não é suficientemente completo para confirmar o ponto de vista de que... um mecanismo histérico esteja associado a cada epilepsia" e, portanto, "sob esta nova luz, a epilepsia deve ser classificada como moléstia psicogênica", mas esse estudo fornece suficiente evidência para levar-nos a aceitar a opinião de Freud e Stekel, de que "uma grande porcentagem dos pacientes que são agora diagnosticados como epilépticos são neuróticos".

Joy Arruda

As formas experimentais da epilepsia humana. I: A epilepsia induzida pela excitação luminosa intermitente e rítmica, ou epilepsia fotógena (Les formes expérimentales de l'épilepsie humaine. I: L'épilepsie induite par la stimulation lumineuse intermittente rythmée ou épilepsie photogénique). H. Gastaut, J. Roger e Y. Gastaut. Rev. Neurol. 80:161-183 (março) 1948.

As crises epilépticas podem ser desencadeadas por perturbações humorais, fisicoquímicas ou excitações nervosas; as epilepsias provocadas por este último processo são denominadas reflexas. Obtidas facilmente em animais, no homem são raríssimas; por outro lado, na fisiopatologia humana, não se concede ao mecanismo reflexo o mesmo valor que se atribui aos processos humorais e fisicoquímicos. Os AA. denominam reflexa a epilepsia desencadeada por uma excitação periférica recolhida e transmitida ao encéfalo por um condutor relacionado com a sensibilidade geral, especial ou visceral. Desta distinção de vias decorre a classificação patogênica; sã o mais frequentes, entre as epilepsias reflexas, aquelas determinadas por estímulos sensitivos somáticos (cotos dolorosos, áreas cutâneas anormais); seguem-se as de mecanismo interoceptive, especialmente as desencadeadas pela excitação pleural; as sensoriais são excepcionais.

Entre as epilepsias reflexas sensoriais, foram estudadas as musicógenas (Critchley) e foram descritos, também, alguns casos de epilepsia vestibular. Quanto às epilepsias fotógenas, os AA. só encontraram 12 casos na literatura. A eletrencefalografia permitiu melhor estudo das epilepsias fotógenas; Grey Walter e outros descreveram casos em que o EEG acusava disritmias eletivas das áreas occipitais quando o paciente cerrava os olhos, e que eram impedidas pela abertura das pálpebras; tratava-se de picnolépticos, cujas ausências, espontâneas ou induzidas pela oclusão ocular, consistiam em perda fugaz da visão com maior persistência das outras funções conscientes do que no verdadeiro pequeno mal. Como assinalam os AA., estes casos são opostos aos de epilepsia fotógena, pois a crise é provocada pela supressão das aferências ópticas.

O primeiro caso de epilepsia fotógena induzida experimentalmente pela excitação luminosa intermitente, e comprovada pelo EEG, foi descrito por Grey Walter e col. em 1946. Os AA. utilizaram método semelhante em 100 doentes portadores de alguns dos caracteres clínicos próprios à epilepsia fotógena: empregaram aparelho de 4 inscritores, sendo que dois canais registravam as duas àreas occipitais, um recolhia o potencial de uma célula fotoelétrica colocada adiante do paciente e o quarto estava em conexão com uma área cortical variável (frontal, geralmente); os doentes eram submetidos a excitações luminosas de intensidade e duração constante, cujas frequências variavam entre 3 e 60 lampejos por segundo. Os AA. relatam 13 casos muito instrutivos de epilepsia fotógena, nas quais as crises tinham relação com fenômenos luminosos; em geral, os EEG revelavam, em repouso, predomínio de disritmias occipitais, que se acentuavam pela abertura das pálpebras e, após excitações luminosas repetidas e controladas, surgiam ondas lentas ou, mesmo, spike-waves, às vezes com tradução clínica. As frequências mais favoráveis estavam compreendidas entre 12 e 16 lampejos por segundo. Sintetizando suas observações, os AA. assinalam que a epilepsia reflexa fotógena típica foi encontrada em 4% de todos os epilépticos examinados (317), sendo que, entre os portadores de disritmias spike-wave, a proporção de epilepsia fotógena foi de 26%; esta prepondera entre indivíduos menores de 30 anos; a hereditariedade tem papel relevante.

Fazendo o estudo fisiológico do assunto, os AA. citam os trabalhos de Amantéa que, em 1921, obteve crises epilépticas generalizadas mediante excitações da zona reflexógena cutânea correspondente à área cortical estricnizada. Clementi obteve abalos clônicos epileptiformes de músculos relacionados com o receptor sensorial estimulado (orbicular das pálpebras, no caso de excitação retiniana), após estricninização da área cortical correspondente. Foi ainda verificado eletrencefalograficamente que a estricninização intensa de uma área cortical origina ondas lentas (hipersincronias paroxísticas) na frequência de 3 c/s. Fazendo a correlação entre as epilepsias fotógenas humana e animal, os AA. acentuam que, em ambos os casos, foram observadas: 1) anomalias espontâneas predominantes ou localizadas nas áreas occipitais e caracterizadas por ondas hipersincronas agrupadas ou isoladas; 2) ondas hipersíncronas agrupadas nas regiões occipitais e às vezes irradiadas para todo o córtex, induzidas por breve excitação luminosa (rápida abertura das pálpebras ou jacto de luz); 3) inibição das ondas induzidas ou espontâneas por meio da excitação luminosa contínua; 4) clinicamente, pode não haver reações somáticas acompanhando os surtos de ondas hipersíncronas occipitais induzidas, mas, quando aquelas ocorrem, consistem em desvios oculares, contrações do orbicular das pálpebras ou mioclonias generalizadas sincrônicas às ondas corticais ou, ainda, crises epilépticas generalizadas; no homem, em geral, sempre há desordens da consciência.

Quanto à patogenia, os AA. admitem a interferência, na região metatalâmica, dos estímulos retinianos e dos potenciais espontâneos descarregados pelos circuitos occípito-pulvinarianos; haveria, então, um fenômeno de ressonância, traduzida seja por simples hipersincronia das ondas espontâneas, seja nela associação de spikes (que, segundo Walter, representam a superposição, às frequências fundamentais, de harmônicos superiores). Em certas eventualidades, a partir do pulvinar, a hipersincronia pode-se propagar a outros núcleos talâmicos que, por sua vez, estão ligados à maioria das formações cinzentas do encéfalo; é possível, assim, a extensão da disritmia occipital a outras áreas corticais (sistemas talamocorticais), perda da consciência, do tono, aparecimento de fenômenos neurovegetativos e emocionais (sistemas tálamohipotalâmicos), mioclonias ou convulsões (sistemas tálamo-parapiramidais ou tálamo-extrapiramidais); os movimentos do olhar devem-se, provavelmente, à propagação aos centros oculógiros occipitoparietais (área 19). Os AA. não encontraram explicação para dois fatos: 1) como se tornam epileptógenas as áreas occipitais ou os circuitos conexos; 2) a diferença de ação entre os estímulos luminosos com frequência idêntica à fundamental da hipersincronia (que apenas aumentam o ritmo espontâneo) e aqueles com frequências iguais aos harmônicos superiores do ritmo fundamental (que determinam os paroxismos epilépticos).

H. Canelas

Síndrome cerebelar de origem frontal. Observação anátomo-clínica (Syndrome cérébelleux d'origine frontale. Observation anatomo-clinique). C. Ferrero. Encéphale, 37:147-161, 1948.

O A. registra um caso anátomo-clínico, ao qual se seguem considerações sobre a fisiopatologia das síndromes cerebelares por lesão frontal. Tratava-se de um homem de 40 anos que, há 3 meses, se queixava de cefaléias intensas, vertigens, zumbidos nos ouvidos e distúrbios do equilíbrio. A sintomatologia objetiva, no início revelável apenas durante as crises, se estabilizou progressivamente. Tratava-se essencialmente de uma hemissíndrome cerebelar direita, combinada a distúrbios vestibulares de caráter discordante: hiper ou hipoexcitabilidade vestibular esquerda, conforme as provas utilizadas. Nos 3 últimos dias de vida, surgiram discretos sinais de hipoestesia sensitiva à direita, além de ligeira síndrome piramidal, mais nítida à esquerda. No decurso de toda a evolução, jamais houve sinais de hipertensão liquórica. Imagens ventriculográficas assimétricas: co rno frontal alargado à direita e de aspecto normal à esquerda. À necrópsia, evidenciou-se um astrocitoma cístico, em pleno lobo frontal direito. Clinicamente, o A. havia feito o diagnóstico de um neoplasma da fossa posterior.

Merece especial destaque, nesta observação, o fato da ausência de qualquer hipertensão intracraniana e a normalidade anatômica do cerebelo, salvo mínimas hemorragias subcorticais recentes. Assim, fica contrariada a explicação aventada por Pierre Marie e outros, para a ataxia frontal, como uma repercussão, sobre o cerebelo, da hipertensão intracraniana. sobre o encontro de sintomatologia vestibular em casos de tumores frontais, Ferrero estuda a opinião expendida por diversos AA. Assim, alguns a consideravam como repercussão funcional da hipertensão intracraniana sobre os núcleos vestibulares. Apesar dessas e outras opiniões discordantes, estudos anatômicos e fisiológicos comprovam a existência autêntica de síndrome cerebelar de origem frontal. Deste modo, as pesquisas anatômicas de Minkowski e outros demonstraram certas vias unindo entre si o polo frontal, núcleos vestibulares, cerebelo, tálamo e núcleos da protuberância. Referências especiais merecem também os trabalhos experimentais de Delmas-Marsalet, em cães, nos quais era feita a secção das fibras calosas anteriores, frontopontinas e occipito-frontais, ao nível da "encruzilhada frontal anterior". Delmas-Marsalet, nesses animais, comprovou que o desvio da marcha, após a prova giratória, é muito mais nítido quando a rotação se faz para o lado lesado; entretanto, a rotação inversa não provoca apreciáveis desvios da marcha, mas os desvios da indicação se processam conforme a regra. Tal discordância entre a marcha e a resposta de indicação, desarmonia central, não se encontra nos comprometimentos do cerebelo. Por outro lado, em desacordo com os fatos verificados no paciente registrado pelo A., a lesão frontal determinara distúrbios labirínticos do mesmo lado, enquanto que as desordens cerebelares se processavam do lado oposto. Como foi dito, no caso do A., a hemissíndrome cerebelar era ipsilateral ao tumor e os distúrbios cerebelares, contralaterais, o que está de acordo com os resultados experimentais de Austregésilo e Borges-Fortes. Ferrero explica a discordância com os dados comprovados por Delmas-Marsalet, pelo fato de que este último lesava as fibras do entrecruzamento frontal anterior, cuja sede é sensivelmente mais baixa que a destruição provocada pelo astrocitoma do caso do A.

R. Melaragno Filho

Meningoencefalomielite por sarampo (Meningo-encefalomielitis sarampionsa). M. L. Quiroga. Dia Med., 20:2175 (16 setembro) 1948.

O A. descreve o caso de uma jovem de 20 anos de idade que, estando no período eruptivo do sarampo, apresentou mialgias e modificação do caráter, seguidas, no dia seguinte, de delírio, obnubilação e hipotermia. Em seguida, apareceram movimentos coréicos, retenção de urina e sinais meníngeos. O exame do líquido cefalorraquidiano mostrou hipercitose de 237 elementos (14% de granulócitos neutrófilos), hiperproteinorraquia de 0,98 grs. por litro e hiperclororraquia de 8,60 grs. por litro. Taxas de glicose e uréia normais, assim como o exame bacteriológico. No quinto dia de moléstia, a paciente entrou em hipertemia e coma, vindo a falecer. Não foi feita a necrópsia. O A. chama a atenção sobre a raridade da complicação meningoencefálica no sarampo e sobre as particularidades deste caso: idade adulta, início na fase eruptiva e lesão de todo o sistema nervoso central - encéfalo e medula - e também da meninge, acompanhados de evolução progressivamente fatal.

J. M. Taques Bittencourt

Etiologia da aracnoidite optoquiasmática (Etiology of optochiasmatic aracnotditis). W. L. Bruetsch. Arch. Neurol, a. Psychiat., 59:215-228 (fevereiro) 1948.

Apesar do número cada vez maior de aracnoidites optoquiasmáticas relatados na literatura, e da geral comprovação cirúrgica dessa condição, o agente etiológico permanece em muitos casos obscuro. O A. procurou, baseado no estudo de 400 necrópsias consecutivas, determinar quais os fatores que provocam o espessamento da aracnóide da base do cérebro e que, em última análise, levam ao que se denomina aracnoidite optoquiasmática. Do material examinado constavam casos de traumatismos do cérebro, encefalite, vários tipos de neurossífilis, febre reumática, tumores intracranianos, esclerose múltipla, doença de Schilder, de Pick, hidrocefalia, arteriosclerose, cérebros de pessoas idosas. Segundo o A., a não ser o fato de que a sífilis é a causa mais frequente da aracnodite optoquiasmática (ocorrendo geralmente de forma assintomática) muito pouco foi possível esclarecer quanto à etiologia da afecção. O trauma do cérebro ou da medula provoca aracnoidite, particularmente nos casos de aderências localizadas logo abaixo da fratura do crânio ou da vértebra. Entretanto, a patogenia exata da aracnoidite circunscrita a tão pequena região como o quiasma óptico nã o é clara.

A síndrome quiasmática, que tem sido atribuída somente à constricção exercida pelas aderências aracnóideas, parece ser devida, em muitos casos, a lesões concomitantes no quiasma e noutras porções das vias ópticas. Isto explicaria os resultados precários obtidos em alguns casos pela remoção operatória das aderências. A atrofia do nervo óptico, explicada mecanicamente, é de difícil avaliação. A tendência a atribuir as atrofias do nervo óptico à aracnodite optoquiasmática está aumentando, porém o diagnóstico clínico dessa afecção é muito difícil, pois, nem os campos visuais, nem as papilas ópticas, apresentam quadro característico. Outra causa bem estabelecida da aracnoidite optoquiasmática é a otite média. A falta de exame microscópico do quiasma e dos nervos ópticos nos casos de aracnodites optoquiasmáticas impossibilita uma avaliação completa do problema.

C. de Luccia

Malformações e moléstias congênitas

Siringomielia de início e sintomatologia predominantemente dolorosa (Siringomielta de comienzo y sintomatología predominantemente dolorosa). J. O. Trelles e J. Bebin. Rev. Neuro-Psiquiat.,10:560-567 (dezembro) 1947.

Os AA. chamam a atenção sobre a sintomatologia predominantemente dolorosa que a siningomielia pode revestir, discutindo interessante observação clínica.

A paciente, com 50 anos de idade, apresentava, desde o nascimento, um nevus ("nevus maligno atípico"), ao nível da linha axilar esquerda. Em março de 1946, começaram a manifestar-se dores no ombro e região retroauricular esquerdos, irradiando-se, tempos depois, à mão do mesmo lado. Mais tarde, prejudicaram-se os movimentos do membro superior esquerdo e as dores se tornaram mais pronunciadas, desenvolvendo-se, ainda, edema e cianose na mão. O exame neurológico revelou, ao lado de distúrbios tróficos e motores no membro superior esquerdo, dissociação siringomiélica da sensibilidade. Resultados normais demonstrou o exame de líquido cefalorraqueano.

Em face dessa sintomatologia, várias hipóteses diagnósticas foram consideradas pelos AA.: metástase medular do angioma cutâneo, tumor medular, mielodisplasia e siringomielia de forma dolorosa. O início doloroso da afecção, a ausência de bloqueio do canal raqueano e a evolução, orientaram o diagnóstico para siringomielia. Lembram os AA. observações semelhantes registradas na literatura, descrevendo, a propósito, a sintomatologia dolorosa da siringomielia. As dores aparecem geralmente no início da afecção, assumindo intensidade variável e localizando-se, de preferência, nos membros superiores; geralmente unilaterais, lembram, às vezes, as dores lancinantes ou fulgurantes da tabes; em outras vezes, manifestam-se como neuralgia. Acentuam-se por ocasião das modificações da temperatura e podem acompanhar-se de hiperestesias, "over-reaction", etc.

Os AA. terminam a sua valiosa contribuição para o estudo das formas dolorosas da siringomielia, referindo as opiniões existentes sobre a origem desses distúrbios: leptomeningite (Schlesinger), irritação celular (Jonesco e Sisesti), lesão dos cornos posteriores e cordonais (Forster), lesões do simpático. Em favor destas, falam os distúrbios vasculares e secretórios da moléstia, assim como as melhoras obtidas pelas intervenções sobre o simpático cervical. As infiltrações de novocaína no gânglio estrelado têm proporcionado, nalguns casos, resultados surpreendentes.

O. F. Julião

Sobre um caso de impressão basilar com perturbações neurológicas (Sur un cas dimpression basilaire avec troubes neurologiques). R. Garcin e M. Kipfer. Rev. Neurol., 79:767-770 (dezembro) 1947.

Os AA. referem a observação de um paciente portador da rara afecção descrita por Virchow, com o nome de impressão basilar e caracterizada pela elevação da lâmina basilar e do contorno do orifício occipital. O caso corresponde a um homem de 47 anos, cuja queixa consistia em distúrbios da marcha; desde idade muito jovem já percebia dificuldades na elocução e, aos 20 anos, apresentava atordoamentos quando espirrava ou ria. Apesar de sentir, de tempos em tempos, sensações ebriosas, conseguiu fazer o serviço militar. Aos 38 anos, tendência a desviar durante a marcha. No ano de 1940, após um espirro, caiu ao solo, perdendo a consciência por alguns instantes e emitindo, involuntariamente, urina; acidente semelhante jamais havia sucedido e nunca mais se repetiu. Na mesma época, apresentou nistagmo horizontal espontâneo e diplopia intermitente. Os distúrbios da marcha progrediram, sobretudo nos últimos 3 ou 4 anos; queixava-se de sensações ebriosas permanentes durante a marcha e certa dificuldade em eliminar urina. Ao exame, notavam-se: sinal de Romberg, com desvio espontâneo do index, principalmente para a esquerda; marcha do tipo ebrioso, principalmente à provas de Fournier; nistagmo horizontal para ambos os olhares laterais e nistagmo espontâneo vertical, aos olhares para cima e para baixo; audição normal; às provas calórica e rotatória, ausência do nistagmo rotatório provocado, com normalidade do nistagmo horizontal provocado; além disso, sí ndrome de Parinaud frusta e musculatura ocular normal; discreta síndrome cerebelar e piramidal; sensibilidade normal. O exame dos nervos cranianos demonstrou grandes alterações para o lado dos últimos pares: lingua atrófica, principalmente à direita, com fibrilações; voz anasalada; frequentes refluxos de alimentos pelo nariz, fibrilações musculares na musculatura do mento e do temporal direito; não havia assimetria do véu, nem sinal de cortina. O exame do liquido cefalorraquidiano não contribuiu para esclarecimento do diagnóstico. Em presença dessa síndrome bulbar, muito lentamente evolutiva, foi no princípio aventado o diagnóstico de siringobulbia; entretanto, tal possibilidade foi eliminada na ausência de distúrbios sensitivos. Embora os movimentos passivos da cabeça estivessem algo limitados em sua excursão, não havia qualquer contratura, de modo a afastar a possibilidade de mal de Pott. As radiografias do crânio e da região cervical afastaram o diagnóstico de moléstia de Klippel-Feil, pela ausência de redução numérica de vértebras cervicais e, por outro lado, esclareceram a natureza da afecção. Tratava-se de uma impressão basilar associada à assimilação do atlas; na radiografia de perfil, a apófise odontóide como que penetrava no interior do crânio; nas chapas de frente, observava-se ascenção das pirâmides. As deformações do bulbo entre o dente do áxis e o rebordo posterior do orifício occipital, provavelmente responsáveis pelos distúrbios apresentados, contra-indicavam, no momento, qualquer tentativa cirúrgica.

R. Melaragno Filho

Malformação congênita das primeiras vértebras cervicais com occipitalização do atlas e distúrbios neurológicos associados - 3.ª observação (Malformation congenitale des premieres vertebres cervicales avec occipitalisatton de l'atlas et troubles neurologiques associés - 3ème observation). R. Garcin, M. Kipfer e D. Economos. Rev. Neurol., 80:228-231 (março) 1948.

Os AA. demonstram o interesse de um estudo radiológico sistematizado da transição craniovertebral em certos casos complexos, que tendem a ser classificados entre as formas atípicas da esclerose em placas. Na observação relatada, correspondente a um homem de 19 anos, havia uma anormalidade da estática cervical mas, como o primeiro sintoma foi uma diplopia que se seguiu uma síndrome cerebelo-espasmódica, o diagnóstico inicial foi orientado para encefalomielite. Os AA. chamam justamente a atenção para o fato de que, nesses casos, à sintomatologia medular cervical, acrescem-se sinais de repercussão no tronco do encéfalo, quer devido a reação serosa na fossa posterior, quer por anomalias outras associadas (malformação de Arnold-Chiari, p. ex.). No caso em questão, o paciente apresentava, há muitos anos, atitude viciosa da cabeça (inclinação constante para o lado direito); entretanto, todos os movimentos eram possíveis, salvo a rotação para a esquerda, que era limitada. Doze dias após receber socos sobre a região cervical, surgiram diplopia, distúrbios da marcha e do equilíbrio. O exame neurológico demonstrou uma síndrome cerebelo-piramidal, paralisia parcial do oculomotor esquerdo e disfagia. As provas labirínticas evidenciaram nistagmo horizontal e vertical, desaparecimento do nistagmo rotatório provocado direito e ausência de nistagmo rotatório em posição III, à prova calórica. A punção lombar só demonstrou hiperproteinorraquia. O diagnóstico tendia para encefalomielite ou para esclerose múltipla. Entretanto, as radiografias vieram esclarecer a natureza da afecção: havia occipitalização do atlas, fusão dos corpos e lâminas de Ca e Ca. Essas verificações sugeriam fortemente sua participação na gênese dos distúrbios neurológicos, embora causasse espécie a diplopia inicial. O paciente foi revisto quase dois anos após: o quadro se achava muito mais grave, com francos sinais piramidais e cerebelares, havendo ainda perda da sensibilidade profunda nos membros superiores; o quadro labiríntico igualmente se achava mais intensificado. O lipiodol, nessa ocasião, encontrava livre trânsito. Nova consulta depois de mais dois anos: o complexo sintomatológico estava praticamente inalterado; apenas se havia acrescido de paralisia do VI par à esquerda.

Para os AA., no caso em estudo, o livre trânsito do lipiodol tornava pouco provável a existência de malformação de Arnold-Chiari associada.

R. Melaragno Filho

Anomalia congênita das duas primeiras vértebras cervicais com quadriparesia e distúrbios bulbares. Intervenção. Meningite serosa cística da fossa posterior. Melhora (Anomalie congenitale des deux premières vèrtebres cervicales avec quadriparésie et troubles bulbaires. Intervention. Méningite séreuse kystique de la fosse postérieure. Amélioration). R. Garcin, J Guillaume, M. Kipfer e R. Lesobre. Rev. Neurol., 80:223-228 (marco) 1948.

Os AA. relatam um caso de longa evolução, em que o diagnóstico se prestava à confusão com a esclerose em placas. Tratava-se de mulher de 32 anos, cuja queixa inicial consistia em distúrbios da marcha. Ao exame neurológico verificaram-se, nos membros inferiores, apenas esboço de Babinski à direita e ligeiros distúrbios da sensibilidade profunda, nos membros superiores, nítida astereognosia e uma síndrome cerebelar bilateral; ausência de sinais labirínticos. O líquor lombar revelou, apenas, hiperproteinorraquia. Com o diagnóstico de esclerose em placas, a paciente foi submetida a tratamento anti-infeccioso; uma nítida melhora reforçou essa suposição diagnóstica. Entretanto, com o tempo, a mesma sintomatologia reapareceu e se agravou: apresentava formigamento por todo o corpo, à tosse ou espirro, e acessos de sufocação. Novo exame neurológico demonstrava, essencialmente, o mesmo quadro, acrescido de disfagia; fundo de ôlho normal. Ainda com o diagnóstico de esclerose em placas, em vista dos distúrbios bulbares, a paciente foi submetida a radiografia lipiodolada: o trânsito foi perfeito. Em março de 1946, queixava-se de dores neuríticas cervicais e de repuxamentos do pescoço. O exame demonstrou hipoestesia corneana à esquerda e nítido nistagmo horizontal bilateral, os fenômenos bulbares ainda persistiam. Em novembro de 1946, a síndrome cerebelo-piramidal e os sinais bulbares mostravam-se agravados. Assim, o diagnóstico de esclerose em placas foi afastado e os AA. procederam a cuidadoso exame das radiografias da região cervical. Constataram então um basculamento do atlas, de modo que o seu arco anterior entrava em contacto com o occipital, enquanto que o arco posterior, abaixado, se confundia com o bordo superior da apófise espinhosa do áxis. Por outro lado, a apófise odontóide do áxis apenas entrava em contacto com o atlas por seu ápice, não estando incluída no atlas, como habitualmente. Por fim, as apófises espinhosas do áxis, de C3 e de C4 estavam anormalmente aproximadas entre si.

Diante do agravamento da sintomatologia medular e bulbar, foi decidida a intervenção cirúrgica. No ato operatório, foi constatada, entre o bordo superior do atlas e o bordo do orifício occipital, uma larga bolsa cística da aracnóide, contendo, sob pressão, líquido cefalorraquidiano. Essa meningite cística recalcava muito para a frente os lobos e verme cerebelares, deixando aberto o 4.° ventrículo. O cisto meníngeo foi largamento aberto e o líquido drenado. A evolução decorreu favoravelmente: desapareceram os fenômenos bulbares e a paciente recuperou o uso dos membros superiores e, também, aos poucos, a marcha começou a se tornar possível. Os AA. frisam o detalhe muito importante de que nenhuma anomalia morfológica do pescoço (encurtamento, em especial) sugeria a existência de anomalias das primeiras vértebras cervicais. Quanto à formação do cisto meníngeo, os AA. não decidem se se tratava de malformação congênita de evolução paralela ou de complicação secundária a uma anomalia vertebral.

R. Melaragno Filho

Malformação de Arnold-Chiari. Estudo morfogenético (The Arnold-Chiart malformation. A morphogenettc study). Olof Ask. Upsala läkaref. för., 51:259-275 (abril) 1946.

O autor começa com um ligeiro histórico sobre a malformação de Arnold-Chiari e dá a opinião de Gräftdijks sobre a gênese dessa malformação: "a ascensão medular é impedida pela fixação da medula na espinha bifida. Com o desenvolvimento desigual da medula e da coluna vertebral, o rombencéfalo é puxado para o canal vertebral". sobre a gênese da hidrocefalia, que geralmente acompanha essa malformação, o A. cita a opinião de Grãftdijks, que coincide com as de Russel e Donald: "o rombencéfalo, por uma questão valvular ao nível do buraco occipital, dificulta a passagem do liquor". O A. passa, em seguida, a estudar 3 embriões normais de 47, 70 e 82 mms., focalizando principalmente o rombencéfalo. Embrião de 47 mms. - A ascensão medular começou; a ponta do cone medular está em nível com a vértebra Co1. O cerebelo desenvolve-se em parte e situa-se alto na cavidade posterior do crânio. O aqueduto de Sílvio, em formação, é grande e largo, estreitando-se ao atingir o IV ventrículo. Embrião de 70 mms. - Ponta do cone medular em nível com o disco intervertebral S3-S4. Cerebelo mais desenvolvido; não difere, em posição, ao da preparação anterior. Embrião de 82 mms. - Ponta do cone medular ao nível da parte superior de Ss. O cerebelo não difere em posição.

Embrião de 63 mms. - Espinha bifida, com diastematomielia, parte na região torácica superior e parte inferiormente a Tv6. Na região torácica inferior e lombar superior existe mielocele. Há retardo no crescimento dos gânglios e meninges espinhais. Ponta do cone medular ao nível de S3. O segmento medular C2 está ao nível do gânglio espinhal C2, situado no forame intervertebral C1-C2, como nas preparações normais. O tamanho da cabeça e a espessura das vesículas telencefálicas parecem comparáveis aos do embrião normal nessa fase. No rombencéfalo, a ponta está empurrada no sentido craniocaudal; o vérmis do cerebelo é grande e irregular e seu bordo inferior está ao nível do buraco occipital. A luz do aqueduto, na parte inferior, está muito estreitada.

Embrião de 115 mms. - Existe grande deformação do esqueleto com redução no número de vértebras (8 ou 9 T e 2 L). Ponta do cone medular a 1 ou 2 segmentos acima da última vértebra (há, pois, retardo na ascensão da medula). O segmento medular C2 está ao nível do gânglio espinal C2. A cabeça é grande e as paredes das vesículas telencefálicas estão em alguns pontos extremamente finas. O cerebelo está deslocado para baixo, como no caso anterior. O aqueduto está ligeiramente estreitado na parte inferior.

Como o A. considera esses 2 casos como malformação de Arnold-Chiari num estádio primitivo (com desenvolvimento ulterior do embrião transformar-se-iam em casos típicos), a hipótese de Gräftdijks nã o pode ser invocada nesses casos para explicar a gênese da malformação. A falta de ascensão, que parece estar presente no embrião de 115 mms., não influenciou as circunstâncias topográficas nos segmentos cervicais superiores (situação normal do segmento cervical C2) e, portanto, não foi a causa da malformação do rombencéfalo. A deformação da medula e a malformação do rombencéfalo são considerados como fenômenos paralelos, como diferentes expressões de uma tendência geral ao desenvolvimento patológico.

Quanto ao mecanismo da hidrocefalia, embora no primeiro caso não haja aumento da cabeça nem diminuição da espessura da parede das vesículas telencefálicas, parece, no entanto, haver aumento da pressão, que estaria deformando e empurrando para baixo o rombencéfalo, assim como provocando estenose do aqueduto. O aumento de pressão e estenose teriam ação recíproca e intensificadora e não se pode dizer qual seria a primitiva (a estenose parece ser primitiva no primeiro exemplo). O A. termina advertindo contra as medidas neurocirúrgicas propostas para facilitar a passagem do liquor, seja por uma descompressiva, seja por uma amputação do polo caudal do cerebelo. Obviamente, tais operações não podem ser eficientes quando há estenose do aqueduto.

A. Conde

Nova forma de distrofia muscular hereditária: o mioedema familiar (Une forme nouvelle de dystrophie musculaire héréditatre: le myoedème familial). H. M. Sallow J. Scherrer e A. Bourguignon. Rev. Neurol., 80:257-267 (abril) 1948.

Os AA. observaram 3 doentes, na mesma família, em gerações sucessivas, portadores de uma distrofia muscular por eles denominada mioedema familiar e que, segundo os AA., não foi ainda descrita. O sintoma clínico característico e constante desta afecção é o mioedema, que pode ser provocado, seja pela percussão dos músculos, seja pela tração exercida sobre eles, estando os músculos em relaxamento. Este mioedema aparece precocemente e é bem mais intenso e nítido do que o observado em casos de miotonia. Outro sintoma é a hipertrofia muscular, também constante, embora variável na intensidade de um caso para outro. Existe um desnível grande entre a força muscular e a massa muscular hipertrofiada. Isto nos leva a crer que a hipertrofia muscular não se deve a fibras musculares normais. A consistência é mais dura do que a das massas musculares hipertrofiadas de um atleta. Sob o ponto de vista elétrico, não há qualquer distúrbio. Não há miotonia. Cronaxias normais. Sob o ponto de vista genético, parece ser relacionado com um fator dominante. É estudado, em seguida, o diagnóstico diferencial com a miotonia de Thomsen, a paramiotonia congênita de Eulenburg, a hipertrofia muscular vera e a distrofia miotônica de Steinert.

A. Lefèvre

Síndromes dolorosas

Neuralgia braquial (Brachial neuralgia). W. Russel Brain. Lancet 254: 393-395 (13 março) 1948.

Iniciando por chamar a atenção para a necessidade do diagnóstico anatômico e etiológico em cada caso, o A. verbera a denominação clássica de "neurite braquial", a qual tem levado inúmeros casos a extrações dentárias, amigdalectomias, etc, à procura de um suposto foco de infecção. A seguir, analisa os detalhes do diagnóstico clínico da raiz afetada, os elementos para o diagnóstico da neuralgia secundária à espondilartrites, aos tumores intraraqueanos, à hérnia do disco intervertebral, para depois abordar o capítulo interessantíssimo da síndrome costoclavicular. Lembra, na etiologia desta síndrome, as anomalias da apófise da 7.ª cervical, as da 1ª costela, as do ligamento costo-pleuro-vertebral (entre 7.ª cervical e 1.a costela), a compressão costoclavicular e, finalmente, as várias anomalias dos escalenos. A propósito, chama a atenção para as manobras semióticas tão difundidas na literatura e que procuram as variações de pulso secundárias a mudanças de posição da cabeça e pescoço em relação ao ombro. Lembrando que Falcone e Wedeel (1943) com elas encontraram resultados positivos em 50% de indivíduos normais, e Telford e Mottershead (1947), em 68% deles, ressaltam que a hiperextensão do pescoço e a flexão da cabeça para o lado oposto, estirando os escalenos e comprimindo vasos, servem de manobras semióticas somente para os casos em que anomalias desses músculos são as responsáveis pela síndrome neurálgica. Discutindo o tratamento, lembram que a simples mecanoterapia resolve os casos frustos de distúrbios subjetivos, enquanto que a cirurgia (particularmente intervenções sobre os escalenos) deve ser adstrita aos casos mais avançados, com distúrbios sensitivos e motores.

Descreve, ao lado desta, uma síndrome muito observada na Inglaterra nos anos de guerra, a das "braquialgias das senhoras idosas", particularmente submetidas a serviços pesados; consistia ela principalmente em acroparestesia, em geral pela manhã ao acordar ou persistente por mais tempo. O simples repouso ou exercícios visando diretamente fortalecer os músculos elevadores dos membros, são os recursos terapêuticos indicados.

Por fim, discorre sobre a síndrome da neurite de mediano por compressão na goteira do carpo, de recente conhecimento. Lembra as fraturas da extremidade distal do rádio e dos ossos proximais do carpo, como causas mecânicas desse estreitamento da goteira do carpo. Casos há, de indivíduos sujeitos a trabalhos manuais pesados, em que a neuralgia do mediano aparece independente do estreitamento mecânico da goteira. O repouso, nestes últimos e a intervenção cirúrgica, nos primeiros, constituem terapêuticas de escolha. Se o tratamento é precoce, uma recuperação completa deve ser esperada. Nos casos antigos há sequelas várias e, entre elas, as mais frequentes são os distúrbios circulatórios da mão, do tipo Reynaud, por mecanismos de irritação simpática.

P. Pinto Pupo

Amiotrofia neurálgica. Síndrome da cintura escapular (Neuralgic amyotrophy. The shoulder-girdle syndrome). J. Parsonage e J. W. Aldren Turner. Lancet, 254:973-978 (26 junho) 1948.

Uma síndrome caracterizada por dor e paralisia flácida dos músculos da cintura escapular, relativamente frequente nos anos de guerra, e observada pelos autores em 136 pacientes, quando serviram como neurologistas no exército inglês na Europa e no comando da Índia, constitui o motivo da presente publicação. A análise comparativa de seus casos com os da literatura anterior ao período de guerra, a discriminação cuidadosa que fazem deles quanto ao local em que ocorreram, às relações com os fatores precipitantes (operações em 12 casos, traumas em 10, infecções em 71), as descrições minuciosas dos sintomas e de sua sucessão cronológica, assim como a discussão relativa à etiologia, ao prognóstico e ao tratamento, tornam este trabalho completo em face do assunto que focaliza.

A síndrome acima assinalada depende, na opinião dos AA., de processo patológico envolvendo nervos periféricos, raízes e, por vezes, a própria medula. É uma condição mó rbida distinta e que teve sua incidência muito acrescida durante os anos de guerra, na grande maioria das vezes em relação com fatores outros desencadeantes ou predisponentes, entre eles os estados infecciosos e, destes, em particular os estados descritos como "influenza" na Europa. Uma síndrome similar pode ocorrer alguns dias após injeções de soro; estas duas condições mórbidas são provavelmente idênticas, se bem que sua verdadeira etiologia nos seja ainda desconhecida. Discordando das diversas outras denominações sob as quais têm sido descritas afecções similares (neurites infecciosas, neurites localizadas na cintura escapular, neurites braquiais, radiculites braquiais) os autores propõem a de amiotrofia neurálgica, até que sua etiologia e patologia sejam mais bem conhecidas.

É particularmente interessante o adendo que R. N. Herson fez a este trabalho [Lancet, 255:80 (10 julho) 1948], lembrando que Kernohan e Woltman encontraram êste tipo de neurite em 20% de seus casos de periarterite nodosa, tendo também demonstrado que arterites dos vasa nervorum, acarretando isquemia do nervo, eram responsáveis pela síndrome. Acresce ainda o fato que os próprios AA. deste trabalho chamam a atenção para sua semelhança com o que acontece em casos de neurites após injeções de soro; decorre disso a conclusão de que arterites necrotizantes de tipo alérgico estejam em causa na gênese destas neurites.

P. Pinto Pupo

Sobre a dor referida e as zonas de Head (On refered pain and Head's zones). Chr. van Gelderen. Monatschr. f. Psychiat. u. Neurol., 115:295-307 (maio-junho) 1948.

A grande importância clínica das chamadas dores referidas (referred pain, segundo a concepção inglesa) tem motivado numerosos trabalhos, experimentais e clínico-cirúrgicos, tendentes a resolver os problemas etiopatogênicos de tais fenômenos, que constituem a repercussão cutânea de afecções viscerais. São bem conhecidas as áreas de projeção dolorosa cutânea - zonas de Head -. das afecções viscerais; estas provocam dores viscerais e dores referidas; a patogenia das dores referidas não é, até agora, conhecida. Entre as várias teorias aventadas pare explicá-la, a de Mackenzie teve maior aceitação: os estímulos dolorosos viscerais gerariam, na medula espinhal, um foco irritável que atuaria sobre o tálamo e sobre o córtex como se viessem da superfície cutânea, produzindo dor cutânea por meio de um mecanismo da medula, dando origem aos reflexos pilo e vasomotores e sudoríparos que, projeção. O foco irritável se difundiria, também, às células da coluna lateral comumente se processam na zona onde se localizam as dores referidas.

Van Gelderen se preocupou exclusivamente, neste trabalho, com o mecanismo fisiopatológico da dor referida. Seu raciocínio partiu das experiências de Davis, que conseguiu a abolição da dor referida pela anestesia local da zona parietal onde ela se manifestava; isto demonstrava que alguma coisa devia acontecer nessa zona cutânea e que essa coisa era a responsável pela dor referida. Davis tomou para seus estudos a dor referida localizada no ombro, nos casos de afecções supra ou infradiafragmáticas; ele mostrou, em animais, que essa reação dolorosa cessa, não só pela novocainização da região do ombro, como pela transecção da medula espinhal entre C5 e T2, ou pela resecção das raízes cervicotorácicas anteriores e, também, pela resecção bilateral da cadeia simpática cervical ou dos gânglios estrelados. Por essas experiências parece provado que os impulsos dolorosos do diafragma trafegam ao longo dos nervos frênicos até os segmentos medulares C3 e C4 e, depois, descem - provavelmente por vias curtas - até o nível de T2, onde ocorre sinapse com a coluna lateral e os impulsos passam, pelas raízes anteriores, para a cadeia simpática cervicotorácica e, pelos troncos nervosos somáticos, para a pele e outras estruturas parietais segmentares; ulteriormente, da periferia, os impulsos retornam pelos nervos somáticos até a medula e, daí, para o cérebro. Quando a área da pele em que há dor referida é tornada analgésica, embora todas as outras estruturas estejam intactas, nenhuma dor é determinada, seja pela excitação do nervo frênico, seja por afecção diafragmática.

Êstes fatos já foram confirmados no homem. Em pacientes sofredores de dores no ombro em consequência de afecções viscerais supra ou infradiafragmáticas (pleurites, úlceras do estômago perfuradas), a infiltração novocaínica do gânglio estrelado ipsilateral elimina a dor, ao mesmo passo que provoca o aparecimento da síndrome de Claude Bernard-Horner. O mesmo efeito pode ser conseguido pela anestesia epidural segmentária dos nervos torácicos superiores. Assim, fica provada a relação entre dor referida e fenômenos vegetativos; parece mesmo provável que a dor referida seja produzida por isquemia vasoconstritiva local.

Todos êstes fatos demonstram que a dor referida localizada no ombro é devida a mecanismo reflexo víscero-parietal neurovegetative Assim, pelo menos neste caso particular, não pode ser mais admitida a antiga concepção de Mackenzie, atribuindo a dor referida a uma irradiação parietal da dor visceral. Deve-se considerar a dor referida como a consequência de um reflexo vegetativo víscero-parietal.

Van Gelderen atribui a aceitação quase unânime da teoria de Mackenzie ao fato de que os estudos em geral se basearam nas dores referidas nos casos de vísceras tendo, metamericamente, um setor periférico localizado na mesma altura, de sorte a ser mais admissível a existência de projeção parietal da dor: no caso do coração, por exemplo, a inervação víscero-sensorial do órgão corresponde, aproximadamente, à área de inervação vegetativa referente da região onde se manifestam as dores referidas por afecção cardíaca. Tanto uma como outra dessas inervações passam pelos segmentos da cadeia cervicotorácica e não é possível bloquear pela novocaína esta última (via eferente vegetativa da área cutânea) sem bloquear, ao mesmo tempo, as fibras centrípetas sensitivas que conduzem os impulsos dolorosos.

Van Gelderen procurou reproduzir as experiências de Davis nas vísceras pélvicas, nas quais a inervação simpática do órgão e, conseq&uumlentemente, a das áreas onde se localizam as dores referidas, se faz por intermédio do sistema ortossimpático (cadeia simpática toracolombar, nervos pré-sacros e plexos hipogástricos), ao passo que as fibras sensitivas do órgão trafegam pelas raízes sacras (S1 a S4). Assim, a questão se reduz a saber se a interrupção da inervação eferente ortossimpática derivada dos segmentos toracolombares, é capaz de abolir a dor referida que se localiza nos dermatomas sacros.

Utilizando doentes com tuberculose vesical, nos quais fora seccionado o nervo pré-sacro para diminuir as dores espasmódicas vesicais, e, nos quais permaneciam a dor visceral e a dor referida, localizando-se esta última na região sacra e perineal, Van Gelderen obteve o desaparecimento da dor referida pela novocainização das raízes torácicas inferiores (T11 e T12) e primeiras lombares (L1 e L2). Este resultado só pode ser explicado admitindo o seguinte trajeto: os influxos vesicais dolorosos trafegam pelos nervos pélvicos, penetram na medula sacra (S2, S3 e S4), sobem pela medula até T11 e T12, articulam-se com as células da coluna vegetativa lateral, saem da medula pelas raízes eferentes de T11 a L2, passam para a cadeia simpática paravertebral pelos ramos comunicantes, descem pelos filetes simpáticos dos plexos celíaco, mesentérico e hipogástrico, incluem-se nas raízes eferentes sacras e com elas vão-se distribuir ao dermatoma sacroperineal. Nessa região se processam, então, os fenômenos vegetativos responsáveis pela hiperalgia e dolorosidade, fenômenos êstes que, recebidos pelos receptores snsitivos periféricos, retornam à medula sacra e, daí, pelos condutores sômato-sensitivos comuns, vão ao tálamo e córtex parietal, onde se processam a integração, reconhecimento e localização dos fenômenos dolorosos.

A dor referida seria, pois, atribuível a modificações neurovegetativas globais (isquemia?) ocorridas nas zonas de Head correspondentes à víscera acometida; estas reações neurovegetativas se passariam num circuito reflexo mixto - sômato-vegetativo - incluído no circuito da dor exteroceptiva objetiva. A dor referida seria produzida, em última análise, por um reflexo ortossimpático, como o são todas as outras manifestações que ocorrem nas zonas de Head. A dor referida não é uma simples projeção periférico-parietal dos estímulos viscerais; são erradas, também, as hipóteses que a procuram explicar pela condução antidrômica ou como indução de um foco irritável.

O. Lange

As algias craniofaciais. Cefaléias e neuralgias. Ensaio de síntese fisiopatológica. Deduções terapêuticas (Les algies craniovfactales. Céphalées et névralgies. Essai de synthèse physio-pathologique. Deduction thérapeutiques). J. N. Taptas. Encéphale, 37:109-131, 1948.

"As algias craniofaciais são múltiplas e de tipos bem diversos; daí a necessidade de uma análise prévia rigorosa de todos os elementos sensitivos e das vias eferentes da sensibilidade dolorosa na cabeça". Assim inicia êste artigo Jean Taptas. Segue-se um estudo detalhado sobre as principais algias craniofaciais, no qual o autor discute a fisiopatologia dos diversos tipos e, em particular, o problema da localização das lesões ao longo do trigêmeo, responsáveis pela neuralgia facial dita essencial. Nova patogenia é proposta: a da irritação dos neurônios sensitivos do trigêmeo no gânglio de Gasser, por uma neurite pericarotídea resultante da dilatação permanente ou não da carótida interna, ou de arterite trombosante arteriosclerótica. Estuda ainda o A. as principais síndromes dolorosas craniofaciais não puramente neurálgicas, às quais atribui, também, etiologia vascular. Seguem-se considerações sobre as terapêuticas clínica e cirúrgica que, segundo o A., podem ser dirigidas aos próprios vasos, ao sistema simpático ou diretamente aos nervos cerebrospinais sensitivos, pela interrupção das principais vias aferentes da dor.

S. Forjaz

Moléstias vasculares do sistema nervoso

A arteriografia. A. Asenjo e R. Perino. Rev. Med. d. Rio Grande do Sul, 3:116-133 (janeiro-fevereiro) 1948.

Inicialmente, os AA. relatam a técnica da arteriografia, aconselhando a secção da aponeurose cervical superior na sua linha de união com o músculo esternoclidomastóideo, a fim de atingir diretamente o feixe vásculonervoso cervical, aconselhando também que se faça ligadura parcial e transitória da carótida primitiva, a fim de verificar se surgem fenômenos sensitivos e motores centralaterais traduzindo irrigação deficiente pela outra carótida, e impedir a diluição excessivamente rápida do torotrast. Êste contraste é preferido pela sua inocuidade, se bem que possa provocar, quando em doses altas, bloqueio do SRE., pelo qual é seletivamente fixado, sendo que sua provável ação cancerígena, assim como a possibilidade de produzir focos de amolecimento, não foram comprovadas. A arteriografia é indicada, para fins de diagnóstico topográfico e etiológico, nas afecções vasculares cirúrgicas do encéfalo, como nos aneurismas das artérias cerebrais e nos aneurismas arteriovenosos, indicando com exatidão a localização, tamanho e número deles , assim como se houve rotura, que é indicada pela presença de torotrast nos espaços subaracnóideos vizinhos; a arteriografia é indicada, ainda, em outras afecções vasculares do cérebro, como angiomas arteriais ou venosos, enfermidade de Sturge-Weber-Dimitri, oclusões vasculares, e nos tumores sensu latu dos lobos frontal e parietal, tais como glioblastoma multiforme, meningioma, hematoma, abscesso e tuberculoma. Os AA. descrevem, em seguida, a semiologia normal do arteriograma e as alterações encontráveis nas diferentes afecções intracranianas, capazes de revelar, não só a topografia, como também a etiologia da afecção. São apresentadas 9 observações de aneurismas e tumores intracranianos acompanhadas de radiografias nítidas e bastante ilustrativas.

W. Brotto

Patogenia da enfermidade de Sturge-Weber-Krabbe (Pathogénie de la maladie de Surge-Weber-Krabbe). D. Furtado e Miranda Rodrigues. Ann. Méd-Psychol., 4 (novembro) 1947.

As sombras calcificadas intracranianas em casos de enfermidade de Sturge-Weber-Dimitri-Krabbe são interpretadas de modo diverso pelos estudiosos do assunto, querendo uns que sejam devidas a deposições calcáreas nos próprios vasos angiomatosos, outros, nas circunvoluções cerebrais subjacentes, mortificadas por crônica deficiência circulatória. A escola portuguesa de Egas Moniz já havia demonstrado a independência das calcificações radiográficas, dos vasos angiomatosos, visualizados pela arteriografia. Posteriormente (1936), Diogo Furtado, estudando com esse método pacientes de tenra idade, pôde demonstrar que os vasos penetram na zona calcificada, e teve elementos para firmar a doutrina de que a lesão da enfermidade em apreço é primitivamente vascular, angiomatosa. Entretanto, êstes vasos se calcificando e se trombosando, perdem precocemente suas relações com a circulação, de tal forma que, em idade mais avançada, a arteriografia vem a demonstrar uma aparente independência entre a circulação arterial cortical e as zonas calcificadas. A própria lesão, em período posterior, quando o processo regressivo calcificante se torna mais intenso, perde por completo sua estrutura vascular e se transforma em conglomerado de granulações calcificadas, que não mais possuem a disposição topográfica dos primitivos vasos.

No presente trabalho tal doutrina recebe novo apoio com o estudo de um caso de menina com 8 anos de idade. Os exames radiográfico, planigráfico e arteriográfico demonstram que a lesão calcificada, que quase perdeu suas relações com a circulação arterial cerebral, mantém-na ainda nítida em dois pontos: um superior, onde a calcificação é menos intensa, provavelmente mais jovem, e outro inferior, onde um ramo importante da cerebral posterior (anômalo, pois que emerge da carótida) se mostra subitamente adelgaçado, apresentando um aspecto de vaso em trombose. Êste talvez seja um sinal objetivo muito interessante, de processo evolutivo que terminará por obstruir o vaso e, então, interceptará suas relações diretas com a sombra calcificada bem objetivada nas radiografias.

P. Pinto Pupo

As tromboses da carótida interna e de seus ramos (Les thromboses de la carotide interne et de ses branches). J. N. Taptas e J. Pecker. Rev. Neurol., 80:3-16 (janeiro) 1948.

A noção de tromboses cerebrais localizadas, sobrevindo em indivíduos jovens, é aquisição recente e, só após a sistematização da arteriografia cerebral é que o diagnóstico das tromboses não traumáticas da carótida interna ou de seus ramos tornou-se possível. Além das causas locais (traumatismos vários e sobretudo traumatismos cervicais diretos e indiretos, particularmente os golpes sobre a mandíbula, que comprimem a carótida contra o plano vertebral, abscessos retrofaríngeos e tumores malignos do cavum), as causas das tromboses carotídeas parecem ser as mesmas das arterites trombosantes somáticas e, além da sífilis, podem ser invocadas outras infecções (febre tifóide, pneumonia), causas tóxicas (monóxido de carbono, alcoolismo), a forma cerebral da moléstia de B&uumlrger, que pode ser pura ou associada a distúrbios arteríticos dos membros, ou ainda a arteriosclerose precoce. A localização e intensidade da trombose e a possibilidade de suplências arteriais condicionam o quadro clínico, que se caracteriza por: 1) Manifestações cerebrais - na trombose da carótida interna, os pródromos são representados por paresias e parestesias transitórias dos membros, convulsões generalizadas ou do tipo bravais-jacksoniano, crises de ausência ou cefaléia, seguindo-se hemiplegia, que predomina no membro superior, geralmente acompanhada de perturbações da fala (lesão à esquerda), perturbações mentais e, mesmo, hemianopsia homônima; as tromboses dos ramos carotídeos se traduzem por manifestações cerebrais mais localizadas, que podem levar, em jovens, à suspeita de tumor cerebral, ao invés de lesão vascular; também são frequentes as cefalalgias decorrentes de hemorragia meníngea verificáveis pela punção liquórica. 2) Nas tromboses da carótida interna, podem ocorrer lesões do oculomotor, do nervo óptico (produzindo atrofia óptica e, por vezes, edema papilar) ou, ainda, do troclear.

Tais manifestações, indicando sofrimento localizado de um hemisfério cerebral, sobrevindo em jovens, podem levar ao diagnóstico de tumor cerebral.

A constatação da assimetria das pulsações carotídeas (a carótida interna do lado lesado pulsa menos ou não pulsa) constitui elemento valioso para o diagnóstico diferencial; a ventriculografia, demonstrando dilatação ventricular correspondente ao hemisfério atingido, traduzindo atrofia cortical, permite afastar a hipótese de tumor. Todavia, é a arteriografia cerebral, mostrando obstrução parcial ou completa da carótida interna ou de seus ramos, e a sua localização, que constitui o elemento mais valioso para o diagnóstico.

São apresentadas cinco observações de pacientes portadores de sinais semelhantes aos citados, em quatro dos quais a arteriografia demonstrou trombose da carótida interna ou de seus ramos, sendo que, na quinta, em que fora feito o diagnóstico de tumor cerebral da zona rolândica direita, foi encontrado, pela intervenção cirúrgica, um dos ramos da artéria silviana completamente vazio de sangue e sob a forma de delgado filamento. Seis excelentes radiografias são apresentadas, demonstrando-se, em quatro delas, nitidamente, a trombose da artéria carótida interna ou de seus ramos.

W. Brotto

Psiquiatria

Oligofrenia infantil. Provável papel da febre ondulante durante a gestação (Oligophrénie infantile. Rôle probable de la fièvre ondulante durant la gestation). M. Schachter. Méd. Infantile, 54:152-154 (outubro) 1947.

Relembrando que a encefalopatia com oligofrenia pode reconhecer como etiologia a sífilis, álcool, tuberculose, infecções, intoxicações, etc, durante a gestação, o A. acrescenta, neste trabalho, a observação de um caso cujo único elemento etiológico digno de menção foi uma febre ondulante durante a gestação. Tratava-se de um menino cuja progenitora no quarto mês de gestação, sofreu grave febre de Malta e foi levada à provocação de parto prematuro aos 7 meses. O desenvolvimento psicomotor foi atrasado e, quase aos 12 anos de idade, mostrava-se de compreensão limitada, ideação pobre, com frases incompletas e rudimentares, enurese, escolaridade nula, podendo ser classificado como imbecil. O A. discute as eventualidades etiológicas cabíveis neste caso e conclui pela suposição da influência da febre ondulante durante a gestação.

Joy Arruda

Etiologia problemática de grave oligofrenia (Étiologie problémarique d'une oligophrénie grave). M. Schachter. Rev. Méd. de Liège, 3, n.° 10, 1948.

O A. estuda, do ponto de vista etiológico, o caso de um oligofrênico de 30 meses de idade. Discute os possíveis fatores etiológicos, principalmente, o etilismo paterno e as perturbações endócrinas maternas (hipófiso-tíreo-ovarianas). Focaliza, também, o fato interessante de ter sido a avó materna, em sua juventude, submetida durante muitos meses a pesquisas experimentais radiológicas feitas por seu pai, que era médico radiologista interessado no estudo da morfologia da cintura pélvica. Admite o A. a possibilidade das alterações endócrinas na avó serem devidas à irradiação röntgeniana, a qual igualmente determinou perturbações endócrinas na mãe, fatores êstes que, coadjuvados pelo etilismo paterno, poderiam constituir a etiologia da oligofrenia apresentada pelo paciente.

Joy Arruda

Neurocirurgia

Topectomia (Topectomy). Resumo do Relatório da Columbia-Greystone Associates, apresentado na New York Academy of Medicine, em 18-19 março 1948. Digest Neurol, a. Psychiat, 16 (maio) 1948.

Novo progresso no tratamento cirúrgico da moléstia mental foi descrito na Academia de Medicina de New York e patrocinado pela Sociedade Neurocirúrgia de New York. Os autores do novo processo cirúrgico preferem permanecer anônimos até a publicação de uma monografia contendo todas as fases do tratamento, para que os resultados possam ser interpretados do ponto de vista científico e quanto ao valor clínico para a psiquiatria e neurologia.

A operação foi feita em 24 pacientes, em maio de 1947. O processo denominou-se topectomia (do grego topos, zona, e ectome, cortar ou remover), compreendendo ressecção simétrica, bilateral, de várias áreas do córtex frontal, baseada nos mapas citoarquitetônicos, atualmente em uso. Uma ou mais áreas de Brodmann são envolvidas em cada operação, tomando cuidado em poupar a substância branca. Os pacientes selecionados para êste tratamento eram considerados de prognóstico grave. O efeito da operação foi verificado com o estudo simultâneo de 24 pacientes semelhantes colocados nas mesmas situações ambientais e de trabalho nos períodos pré e pós-operatório. Dezessete dos operados eram esquizofrênicos de vários tipos, quatro eram maníaco-depressivos, três eram portadores de psicose maníaco-depressiva e três eram portadores de psicose de involução. Quatro meses depois da operação, 20 estavam com alta sob controle das autoridades do hospital e, na época da apresentação do trabalho, 10 estavam em casa com capacidade total de trabalho e um com capacidade reduzida.

Exames clínicos indicaram que as operações corticais nos lobos frontais não interferem com os aspectos social, moral ou intelectual, o que foi confirmado pelos testes psicológicos. Não houve mortes operatórias e a incidência de complicações foi pequena. O efeito terapêutico da operação consistiu, principalmente, no alívio da tensão e ansiedade. O trabalho foi concebido como uma aplicação dos conhecimentos fisiológicos dos lobos frontas e não foi procedido exclusivamente como um esforço terapêutico.

Joy Arruda

A dor intratável devida a câncer. Tratamento neurocirúrgico (Intractable pain due to cancer. Treatment by neurosurgical methods). O. R. Kyndman. Am. J. Surg., 75:187-199 (janeiro) 1948.

A dor encontrada em casos de câncer é devida a efeitos secundários ou de vizinhança. Em geral, esses pacientes raramente são vistos pelo neurocirurgião antes que metástases ou infiltrações extensas tenham ocorrido. As diversas possibilidades de localizações metastáticas são rapidamente revistas, mostrando qual a sintomatologia dolorosa por elas apresentadas, salientando o a. que a maioria das indicações neurocirúrgicas se deve a casos avançados de carcinomas do útero e colo, mama e cavidade bucal (90% das cordotomias feitas pelo a. tiveram como indicação dor produzida por carcinoma no colo uterino com infiltração pé lvica). No restante, alguns pacientes com carcinoma do reto e metástases espinhais.

Alguns métodos de tratamento medicamentoso são mencionados, com a finalidade de orientação. A morfina é altamente preconizada, especialmente em casos inoperáveis. É mencionada nova droga (dolophine) que ainda se acha em estudos, parecendo não ter certos inconvenientes da morfina, como o hábito. O A. dá grande valor à radioterapia, mostrando que, quando bem orientada, em muitos casos pode aliviar a dor e atenuar o crescimento do neoplasma, levando, em casos mais raros, a curas notáveis. Os casos inoperáveis devem ser levados ao radioterapeuta. Menciona o A. a importância da hormonoterapia, apesar de se encontrar na sua infância, indicando que, em muitos casos, há alívio da dor.

Quanto à orientação neurocirúrgica, o A. realça a importância da seleção e preparo dos pacientes, pois, muitas vezes, as intervenções são de grande monta. A primeira indicação para a neurocirurgia deve ser a existência de dor intratável, sendo a intervenção considerada como um último recurso, não devendo, entretanto, ser demasiadamente adiada. O diagnóstico deve estar bem firmado quanto ao neoplasma, não estando indicadas para a neurocirurgia as formas altamente indiferenciadas, de crescimento rapidíssimo. Outro fator importante é o grau da dor que realmente sente o paciente, e se compensa o tratamento, não se devendo esquecer que a cirurgia da dor frequentemente leva a sequelas desagradáveis.

Presentemente, segundo o A., com exceção da dor da face e faringe, o único tratamento de escolha é a secção da via espinotalâmica em nível apropriado. Os outros processos (injeções subaracnóideas de álcool, simpatectomia e rizotomias) têm uso muito limitado.

De um modo geral, o neurocirurgião, ao encarar um problema de dor, deve considerar três territórios: 1) a face, a boca, a língua, a faringe e o pescoço 2) o ombro e extremidade superior; 3) restante do corpo situado em nível abaixo de T5. No primeiro caso, a dor se limitando à distribuição do nervo trigêmeo, indica-se a secção da raiz desse nervo pela via subtemporal ou occipital; o método de Sjöqvist, assim como a modificação de Grant, dá bons resultados, segundo êstes autores. O autor preconiza a secção da raiz do trigêmeo, parcialmente, por via subtemporal e extradural, de modo a evitar a paralisia facial que pode ocorrer talvez por lesão do sétimo par através do nervo grande petroso superficial, quando se descola a dura. Além disso, a via intradural é praticamente exangue. Nos casos de dores da face e faringe a raiz do nono par deve ser cortada, além da do trigêmeo. As dores do ombro e extremidade superior, na maior parte das vezes, são devidas a câncer inoperável da mama; infelizmente, esse território dificilmente se alivia pelas cordotomias, pois há necessidade de um nível de secção muito alto, o que não é factível. A secção de um plexo braquial ou de raízes sensitivas do plexo dificilmente se aconselha, devido à perspectiva de paralisias do membro. As possibilidades das cordotomias nos diversos níveis da região cervical são consideradas, assim como suas consequências. O A. conclui que, por sua experiência, e pela de outros autores, de um modo geral o nÍvel ótimo para a tractotomia espinotalâmica está no segmento medular T1 (entre as raízes C8 e T1). As várias consequências da tractotomia são mencionadas, pesando-se suas vantagens e desvantagens.

O A., apesar de não ter experiência no assunto, acredita nos méritos da leucotomia pré-frontal, julgando-a lógica e promissora. Acredita que talvez êste método suplante todos os outros já preconizados. Se a dor, incluindo angústia mental e agonia, puder ser reduzida a uma projeção subconsciente ou inconsciente, a cirurgia terá alcançado o máximo de possibilidades nesse campo. Esta é a finalidade da leucotomia, sendo encorajadoras as comunicações apresentadas.

Roberto P. de Araujo

Diagnóstico e tratamento dos aneurismas arteriovenosos do cérebro (Diagnóstico y tratamiento de los aneurismas arteriovenosos del cérebro). H. Olivecrona e J. Riives. Arch. Neurocir., 4:129-147, 1947.

Os AA. mostram qual a orientação diagnóstica e terapêutica que seguem no concernente aos aneurismas anteriovenosos do cérebro, apoiando-se em apreciável estatística.

Inicialmente, os A A. discutem a classificação das malformações angiomatosas do cérebro, apresentada em 1936 por Bergstrand e que considera dois grupos principais: angiomas cavernosos e racemosos; diferenciam-se pelo parênquima, que separa os vasos nos angiomas racemosos, tal não se dando nos cavernosos. Não estão claramente caracterizados os angiomas racemosos arteriais, em que os vasos aferentes deveriam ser artérias, não havendo, entretanto, até hoje, nenhum caso demonstrativo publicado. Acham os AA. que todos casos descritos consistem, na realidade, em aneurismas arteriovenosos. Os angiomas racemosos venosos são muito raros, havendo, entretanto, casos descritos e bem documentados no cérebro e medula espinhal. Entre estes últimos e os aneurismas arteriovenosos existe estreita relação já indicada por Cushing, sendo que Bergstrand acha impossível diferenciá-los do ponto-de-vista anatômico; apenas fisiologicamente e pelo afluxo arterial pode-se fazê-lo. A maioria dos achados de autópsia de angiomas racemosos venosos pertenceria, portanto, ao grupo dos aneurismas arteriovenosos.

Os aneurismas arteriovenosos representam, segundo os AA., o grupo mais importante de malformações racemosas dos vasos cerebrais. Existe uma falta da rede capilar entre artéria e veia. Pouco frequentemente a artéria se une diretamente à veia; em geral, entre o sistema arterial e o venoso se interpõe verdadeiro novelo de vasos de calibre anormal; as veias daí saindo contêm sangue arterial e pulsam. Em 3203 tumores cerebrais do serviço de Olivecrona foram encontrados 60 aneurismas arteriovenosos (1,8%); são duas vezes mais frequentes nos homens que nas mulheres. A sintomatologia cardinal consiste em epilepsia (em quase metade dos casos), hemorragias subaracnóideas (20% dos casos) e hemorragia cerebral com hemiplegia (50% dos casos); o murmúrio sistólico só foi percebido em 8 casos; calcificações típicas em 8 casos. Os sintomas surgem, em geral, durante a segunda e terceira décadas. É pouco frequente o aumento da pressão intracraniana, a não ser em casos de grandes aneurismas da fossa posterior ou logo após uma hemorragia. O diagnóstico deve, em todos os casos, ser confirmado pela arteriografia; de preferência por via percutânea.

Após citar experiência própria e de outros autores, Olivecrona e Riives interpretam a ligadura da carótida como muito mais perigosa que a extirpação da malformação vascular. Pela ligadura da carótida estabelece-se um curto circuito muito reduzido do sangue através da comunicação do aneurisma, com a consequente anemia do hemisfério afetado. O autor considera inútil o tratamento pelo raio X.

Segundo o autor, ou se extirpa o aneurisma ou nada se faz. De um grupo de 42 pacientes portadores de aneurismas, diagnosticados inclusive por arteriografias, 24 sofreram extirpação do aneurisma. Nos 18 casos restantes, fez-se o seguinte: em 3, foi feita ligadura das artérias accessíveis. com resultado fatal; em 6, foi feita a ligadura da carótida, com hemiplegia permanente em 2 e sem nada de favorável nos outros; 2 aneurismas situados na fossa posterior foram considerados inoperáveis; e assim por diante, sempre com resultados desfavoráveis. No grupo dos 24 em que foi extirpado o aneurisma houve 3 resultados fatais (hemorragia na mesa operatória; coágulo pós-operatório; meningite causada por abertura acidental do seio frontal). Dos sobreviventes, 8 se encontram perfeitamente bem, com satisfatória capacidade para o trabalho. Outros 5 ficaram completamente inválidos.

Finalmente, consideram que a maior parte, ou mesmo todos os casos não operados terminam por hemorragia ou ficam incapacitados completamente. Alguns casos evoluem por alguns anos, somente com alguns ataques epilépticos; se não se apresentarem hemorragias, por mais intensa que seja a epilepsia, não se deve aconselhar a extirpação da lesão, especialmente se se matar de grande aneurisma e no território da artéria cerebral média.

Roberto P. de Araujo

Secção das fibras da cápsula interna no parkinsonismo (Section of the fibers of the internal capsular in parkinsonism). Jefferson Browder. Am. J. Surg., 75:264-268 (janeiro) 1948.

O A. apresenta uma comunicação sobre algumas intervenções de caráter experimental, que consistem na secção de fibras da porção anterior da cápsula interna com a finalidade de se eliminar tremores, especialmente em casos de parkinsonismo.

O A. dá os detalhes da técnica operatória e assinala os cuidados a se observar no pós-operatório. Comentando os resultados obtidos, o A. salienta o fato do processo não curar a moléstia, tendo apenas a finalidade de permitir que o paciente retorne às atividades anteriores à moléstia. As indicações incluem aqueles pacientes com menos de cinquenta anos e fisicamente mais ou menos bem conservados e, dentre esses, em especial, os casos de hemitremor ou hemiparkinsonismo. O paciente, após a operação, pode caminhar perfeitamente dentro de 2 e meia semanas de pós-operatório, apresentando apenas leve claudicação. Os movimentos mais grosseiros no membro superior retornam dentro de 10 a 15 dias, voltando aos poucos os movimentos mais delicados, em cerca de um mês. Outro fato observado é uma certa redução da amimia característica do parkinsoniano.

Quinze pacientes com parkinsonismo foram operados com esta técnica, sendo que, destes, nove tinham tremor praticamente limitado a metade do corpo. Dos operados, em 6 houve abolição do tremor; num, grande diminuição; em 2, diminuição parcial durante seis semanas e dois meses; o dos restantes 6 que apresentavam tremor de todas as extremidades, 3 após a intervenção faleceram sem que a necrópsia revelasse a causa mortis; nos outros 3, que apresentavam tremores bilaterais intensos, ocorreu cessação dos tremores unilateralmente, pois a operação também fora unilateral. Um dos pacientes do grupo dos 15 operados, depois de cinco anos apresentou quatro convulsões generalizadas sem que, entretanto, o tivessem incapacitado para o trabalho (conserto de relógios). Outros dois pacientes, após cinco anos de observação, apresentavam-se perfeitamente normais, não tendo surgidotremores do lado são. A operação bilateral não foi tentada pelo A., referindo, entretanto, a experiência de Hamby com três casos em que foi feita secção capsular em ambos os lados, parecendo que os resultados não foram favoráveis. Concluindo, o A. mostra que a operação o não está suficientemente aperfeiçoada para ser aplicada em todos os casos de tremor, indicando que se deve limitar aos casos bem selecionados. Os resultados obtidos são suficientemente encorajadores para estimular as futuras pesquisas nesse novo campo.

Roberto P. de Araujo

Sirincomielia aliviada temporariamente após escalenotomia (Syringomyelia temporarily relleved after scalenotomy). J. Petter. Lancet, 255:98-99 (17 julho) 1948.

O A. apresenta um caso de siringomielia, no qual os sintomas iniciais foram aliviados durante dois anos e quatro meses pela escalenotomia. Tratava-se de um jovem de 23 anos, sem passado de importância e sem outra moléstia, que, paulatinamente, começou a apresentar, no território de C8 e T1 à esquerda, sensações dolorosas persistentes agravadas por exercícios com esse membro, mas não com tosse ou espirro, acompanhadas de ligeira hipertrofia muscular na região hipotênar. Após cuidadoso diagnóstico diferencial, foi tido como síndrome do scalenus anticus e a intervenção foi efetuada, com alívio completo de todo sintoma sensitivo, restando inalterada a hipotrofia muscular. Após dois anos, em seguida a um traumatismo, as dores reapareceram lentamente, e o exame neurológico demonstrou um quadro de hipoestesia termodolorosa no território de C8 e T1 à esquerda e à direita, de modo intenso, além de C1-C7 e T2-T4, como distúrbios iniciais, em contraposição à conservação do tacto, discriminação táctil, e artrestesia. Com essa síndrome sensitiva, ao lado da hiperrefletividade estilo-radial bilateral, hiperrefletividade bicipital à esquerda e abolirão desse reflexo à direita, sem qualquer distúrbio trófico ou vasomotor, o autor conclui não haver dúvida tratar-se de um caso de siringomielia.

Na discussão que faz do caso interpreta a compressão ligeira exercida pelo escaleno, à esquerda, como um cofator que desencadeou precocemente a ação de um agente nocivo sobre essas raízes dentro da própria medula, no caso o processo siringomélico. Assim, foi possível à escalenotomia, suprimindo um dos fatores, aliviar a sintomatologia por tão largo espaço de tempo, sintomatologia essa que recrudesceu com maior intensidade à medida que o processo intramedular evoluiu. Conclui pela possível utilidade dessa medida terapêutica quando houver a particular coincidência de segmentos medulares afetados (quando o processo medular não possa ser extirpado) com raízes comprometidas ao nível dos escalenos (hipertrofia do músculo, vícios de implantação, etc).

P. Pinto Pupo

Terapêutica

As variações da pressão arterial no decurso do eletrochoque associado ao curare (Les variations de la pression arterielle au cours de l'életrochoc sous curare). L. Massion-Verniory, E. Dumont, R. Nicaise e H. Reinhod. J. Belge de Neurol, et de Psychiat., 47:624-631 (outubro) 1947.

Está atualmente demonstrado que a crise desencadeada pelo eletrochoque simples se acompanha de hipertensão arterial. Os números variam conforme os autores: para Kalinovsky e Hoch o aumento médio da pressão sistólica é de 50-60 mm. de Hg. A pressão se eleva durante a fase tônica e cai rapidamente na fase clônica, até o normal ou pouco abaixo deste; a pressão venosa sobe até 109 mm. na prega cubital do cotovelo; a pressão intratorácica aumenta de 80 a 110 mm.Hg se o tórax estiver em inspiração no momento do choque e será negativa, se estiver em expiração. Apesar deste aumento de pressão, parece que o trabalho cardíaco aumenta pouco (controle cinerradiográfico do coração), o que permite explicar a ausência de acidentes cardíacos. A ausência de acidentes cerebrais se explicaria em parte pelo aumento simultâneo da pressão do líquido cefalorraquidiano. Na eletroausência, a tendência é de haver diminuição da pressão arterial, de 20 a 70 mm. de Hg, e bradicardia. Admite-se que haja, então, excitação vagal através do bulbo, que é excitado direta ou indiretamente. Admite-se que o curare tenha pouca ação sobre a pressão arterial. Jones e Pleasants verificaram que a elevação da pressão persiste no eletrochoque com curare.

Na eletrocrise dos casos relatados pelos AA., havia, às vezes, aumento discreto e, outras vezes, maior, da pressão. Não observaram modificações na pressão arterial dependendo diretamente do aumento da intensidade da corrente ou da intensidade da crise. Na eletro-ausência, às vezes, a pressão arterial era estacionária, às vezes, elevada ou diminuída. Em geral, as alterações foram atenuadas.

Em conclusão, admitem os AA. que, no choque sob a aço do curare, onde a presennça desse espasmo tônico não pode ser invocada e onde a pressão abdominal parece não estar aumentada, parece predominar a excitação elétrica dos centros vasopressores cerebrais. A elevação da pressão arterial não é modificada praticamente no eletrochoque sob a ação do curare. Grande importância no mecanismo de elevação da pressão arterial também deve ser atribuída ao hipotálamo.

H. P. Vallada

Eletrochoqueterapia. Revisão de mais de 23.000 tratamentos usando correntes de direção única (Electroshock therapy. A review of over 23.000 treatment using unidirectional currents). P. H. Wilcox. Am. J. Psy-chiat., 104:100-112 (agosto) 1947.

Inúmeras tê m sido as modificações propostas para a eletroconvulsoterapia nos últimos tempos. Novos aparelhos têm sido propostos com aperfeiçoamentos diversos. Novas técnicas, constituindo já novos tratamentos, como a eletronarcose, têm sido publicadas. O presente trabalho trata da divulgação dos resultados obtidos com novo tipo de aparelho de eletrochoque, que utiliza estímulos convulsionantes mínimos à custa de correntes de intensidade relativamente baixa e de direção única. A aplicação de estímulos elétricos de duração abaixo de um milésimo de segundo, permitindo redução na energia elétrica necessária, foi iniciada por Friedman, Reiter e o A., usando corrente direta, de intensidade relativamente baixa, 60 ciclos, obtida através do chamado Reiter Electrostimulator. O A. tem usado êste processo há 5 anos e considera os resultados superiores aos obtidos pela técnica Cerletti-Bini. As vantagens notadas foram: menor possibilidade do uso concomitante de psicoterapia, porque o paciente não se torna desorientado ou confuso e sua memória permanece clara; possibilidades de continuar o tratamento por longos períodos nos casos resistentes, com menor perigo de lesões cerebrais. O referido método foi usado desde maio de 1948, em 2.050 pacientes, perfazendo um total de 23.191 tratamentos.

Uma análise estatística minuciosa dos resultados obtidos com o novo método é feita pelo A., que conclui: 40% dos pacientes crônicos mostraram evidentes melhoras no comportamento hospitalar; pelo menos 60% dos casos precoces de 60 anos ou menos de idade, eram reabilitados dentro de um ano, quando adequadamente tratados. Considera tratamento adequado a terapêutica intensiva até obter a melhora esperada, assim como o tratamento intensivo de recidivas ocorridas. Êste processo pode ser usado repetidamente por anos, se necessário, sem causar lesões cerebrais.

Joy Arruda

Estreptomicinoterapia; o fundamento patológico dos distúrbios vestibulares (Streptomycin therapy; the pathologic basis of vestibular disturbances). J. M. Nielsen e C. Narsh. Bull. Los Angeles Neurol. Soc., 13:99-103 (junho) 1948.

Os AA. estudaram clinicamente quatro indivíduos tuberculosos tratados intensamente pela estreptomicina, e um caso anátomo-patológico de meningite tuberculosa, e que também fora tratado pela estreptomicina. Os 4 enfermos estudados clinicamente, no fim de um tempo variável de estreptomicinoterapia, nunca inferior a 2 semanas, apresentaram distúrbios vestibulares e cocleares representados por sensações vertiginosas, sinal de Romberg e hipoacusia bilateral moderada, além de perda da associação entre os músculos extra-oculares e os do pescoço, que intervêm nos reflexos tônicos. Os achados histopatológicos do caso autopsiado consistiram em degenerações celulares de vários graus, nos núcleos cocleares, e principalmente nos vestibulares, no fascículo longitudinal medial, no lemnisco medial, núcleo olivar inferior, e em zonas próximas, abaixo e acima dos núcleos cocleovestibulares. As lesões mais intensas se assestavam nos núcleos vestibulares. Julgam os AA. que a falta de alterações específicas, de tipo inflamatório, permite supor que tais lesões tenham sido devidas à estreptomicina e não às toxinas do bacilo de Koch.

J. Lamartine de Assis

Bloqueio subaracnóideo pelo álcool nas paraplegias. Seus efeitos benéficos nos reflexos de massa e na disfunção vesical (Subarachnoid alcohol block in paraplegia. Its beneficial effect on mass reflexes and bladder dysfunctions). C. Hunter She den e E. Bors. J. Neurosurg., 4:383-391 (julho) 1948.

Uma das maiores dificuldades no tratamento e reeducação dos paraplégicos reside nas contraturas, principalmente em flexão, constituindo reflexo de massa que se agrava a qualquer excitação praticada na parte paralisada. A rizotomia anterior, empregada em alguns casos, é útil para fazer desaparecer o reflexo de massa em flexão, que dificulta sobremodo a enfermagem de tais doentes; entretanto, esta intervenção, além das dificuldades técnicas, tem o inconveniente de tirar todas as possibilidades de recuperação motora: para que ela tenha ação eficiente sobre o automatismo espinhal é preciso seccionar todas as raízes anteriores desde T12 até S1, operação extensa, difícil e que, afastando toda a possibilidade de recuperação motora não deixa de ter ação prejudicial sobre o psiquismo do doente.

Visando os mesmos efeitos, os autores propõem o emprego de injeções intraraquidianas de álcool absoluto, em grandes quantidades - de 10 a 15 cc. A técnica é simples; o doente é posto em decúbito lateral, estando a cama elevada de 50 cm. na sua parte podal; praticada a punção lombar, são retirados 5 a 10 cc. de líquor e injetado, lentamente, o álcool absoluto. Imediatamente após, o doente é revirado para o decúbito dorsal, permanecendo assim, sempre com o leito em declive para a cabeça, durante 24 horas. Os efeitos gerais da injeção de álcool são insignificantes; além de certo ardor local, os doentes ficam, às vezes, em leve estado de embriaguez durante algumas horas. Meningismo e cefaléia foram assinalados em alguns doentes, como fenômenos passageiros, algumas horas após a injeção.

O processo foi empregado em 24 pacientes, todos paraplégicos em flexão, todos com mais de um ano de doença sem qualquer sinal de melhora nas funções motoras. Todos foram submetidos, previamente, a exame neurológico e neurovesical (cistoscopia, cistometria, esfincterometria e cistografia) completos, com e sem raquianestesia. Tais exames visam, especialmente, verificar as condições do funcionamento da bexiga e estabelecer certas contraindicações, tais como as devidas à existência de dilatação do tracto urinário superior. Interessante que os estudos cistométricos destes 24 pacientes mostraram, em 16, bexiga de tipo atônico e, apenas em 8, bexiga de tipo hipertônico.

Os resultados foram amplamente compensadores e alguns, até, surpreendentes. Em todos os pacientes desapareceu, logo, o automatismo em flexão, permitindo melhores cuidados de enfermagem na prevenção e tratamento das escaras e aplicações de fisioterapia intensiva. Por outro lado, em todos os pacientes - tanto aqueles que apresentavam bexiga hipertônica automáticoreflexa, como os que apresentavam bexiga atônica - houve melhora do funcionamento vesical, permitindo estabelecer um funcionamento automático compatível com a higiene pessoal. Notável é que, em alguns doentes, houve, ulteriormente, recuperação motora funcional parcial dos membros inferiores, a ponto de permitir a deambulação com auxílio de muletas e aparelhagem ortopédica.

O. Lange

O ácido nicotínico na terapêutica neurológica (L'acide nicotinique dans la thérapeutique neurologique). D. Furtado e O. Carvalho. Schweiz. Arch, f. Neurol, u. Psychiat, 57:290-294, 1946.

O ácido nicotínico, além de sua conhecida ação vitamínica, tem ação vasodilatadora bastante intensa. É esta sua propriedade, tã o discutida, que os autores estudam no presente trabalho e dela lançam mão para fins terapêuticos. Inicialmente, passam em revista os resultados experimentais assinalados na literatura, os quais são controvertidos na afirmativa ou na negativa dessa ação vasodilatadora do ácido nicotínico. A seguir, explanam os seus próprios resultados experimentais sobre a vasodilatação cerebral nítida provocada em coelhos anestesiados pelo somnifene, aos quais se administra ácido nicotínico. A observação desses vasos através de janelas de trepanação craniana e a sua fotografia micrométrica demonstram inequivocamente a vasodilatação. Do mesmo modo, as observações dos vasos da retina, no coelho e no homem, conduziram os observadores a conclusões idênticas. Baseados nisto empregam, desde 1941, o ácido nicotínico na terapêutica da paralisia facial a frigore, nas neuralgias do trigêmeo e nos espasmos arteriais cerebrais. Salvo para as paralisias do facial, seus resultados têm sido bastante encorajadores. É uma terapêutica que deve ser tentada, feito naturalmente com cuidado o diagnóstico diferencial de cada caso antes de seu emprego.

D. Giorgi

Sulfamidas, penicilina e estreptomicina no tratamento da meningite por Haemophilus Influenzae. M. M. Gama. Gaz. Méd. Portuguesa, 1:335, 1948.

O A. relata 4 casos de meningite a Haemophilus influenzae tratados por métodos diversos. O primeiro caso foi medicado com sulfamidas e pequena quantidade de soro específico, sem resultado. O segundo, com penicilina, também sem resultado, não tendo sido feita a prova da susceptibilidade do germe ao antibiótico. O terceiro caso foi medicado pela associação penicilina-sulfamida em doses elevadas; o resultado foi bom, se bem tenha havido recaída, por suspensão precoce da medicação. O quarto caso, medicado pela associação sulfamida-penicilina-estreptomicina, foi o de melhor evolução. O A. tece comentários sobre o valor de cada um destes medicamentos e sobre os cuidados necessários nesta grave enfermidade.

J. M. Taques Bittencourt

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Fev 2015
  • Data do Fascículo
    Mar 1949
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