Open-access Manejo não farmacológico da febre e hipertermia da criança: revisão integrativa

Manejo no farmacológico de la fiebre e hipertermia en niños: revisión integradora

Resumo

Objetivo:  Identificar as intervenções não farmacológicos para febre e hipertermia em crianças indicados na literatura científica.

Métodos:  Trata-se de uma revisão integrativa da literatura realizada nas bases de dados Lilacs, PubMed e CINAHL e as bibliotecas COCHRANE e SciELO. Foram incluídos artigos que abordassem as intervenções não farmacológicas para febre e hipertermia, publicados em português e inglês, no período de 2000 a 2019.

Resultados:  A amostra foi constituída por 27 artigos, que foram agrupados, conforme suas similaridades, em sete categorias. As intervenções utilizadas foram: banhos; compressas mornas; sponging ; incentivo à ingestão de líquidos; bolsas de gelo e cobertores refrigerados; e, por último, a categoria ventilação do ambiente. Observaram-se diferentes intervenções no manejo não farmacológico de febre e hipertermia.

Conclusão:  A prática de medidas não farmacológicas isoladamente não é recomendada para o tratamento de febre em crianças, exceto as intervenções que auxiliem nas respostas fisiológicas do corpo. Os resultados ressaltam a recomendação da realização de novas pesquisas que redundem em evidências para fundamentar o melhor cuidado do enfermeiro pediatra à criança com febre.

Descritores Criança; Febre; Enfermagem pediátrica; Cuidados de enfermagem

Resumen

Objetivo:  Identificar las intervenciones no farmacológicas para la fiebre e hipertermia en niños recomendadas en la literatura científica.

Métodos:  Se trata de una revisión integradora de la literatura realizada en las bases de datos Lilacs, PubMed y CINAHL y las bibliotecas COCHRANE y SciELO. Se incluyeron artículos que abordaran las intervenciones no farmacológicas para la fiebre e hipertermia, publicados en portugués e inglés, en el período de 2000 a 2019.

Resultados:  La muestra estuvo compuesta por 27 artículos, que fueron agrupados en siete categorías según sus similitudes. Las intervenciones utilizadas fueron: baños, compresas tibias, sponging , incentivo a la ingesta de líquidos, bolsas de hielo y mantas refrigeradas y, por último, la categoría ventilación del ambiente. Se observaron diferentes intervenciones en el manejo no farmacológico de la fiebre e hipertermia.

Conclusión:  No se recomienda la práctica de medidas no farmacológicas de forma aislada para tratar la fiebre en niños, excepto las intervenciones que ayuden a las respuestas fisiológicas del cuerpo. Los resultados resaltan la recomendación de realizar nuevos estudios que tengan como resultado evidencias para fundamentar un mejor cuidado del enfermero pediatra a niños con fiebre.

Descriptores Niño; Fiebre; Enfermería pediátrica; Atención de enfermería

Abstract

Objective:  To identify non-pharmacological interventions for fever and hyperthermia in children indicated in the scientific literature.

Methods:  an integrative literature review carried out in the LILACS, PubMed and CINAHL databases and in the COCHRANE and SciELO libraries. Articles that addressed non-pharmacological interventions for fever and hyperthermia, published in Portuguese and English, from 2000 to 2019, have been included.

Results:  The sample consisted of 27 articles, which were grouped, according to their similarities, into seven categories. The interventions used were baths, warm compresses, sponging, encouraging fluid intake, ice packs, cooled blankets, and room ventilation. Different interventions were observed in non-pharmacological fever and hyperthermia management.

Conclusion:  Practicing non-pharmacological measures alone is not recommended for fever treatment in children, except for interventions that assist in the physiological responses of the body. The results highlight the recommendation of conducting further research that results in evidence to support the best care provided by pediatric nurses to children with fever.

Keywords Child; Fever; Pediatric nursing; Nursing care

Introdução

Na prática clínica, observa-se que a febre é responsável por grande parte da procura aos serviços de saúde pelos pais de crianças.(1) A febre, por sua vez, é uma entidade clínica comum na infância,(1) sendo definida como a elevação da temperatura corpórea acima do normal, desencadeada pelo hipotálamo, em resposta à liberação de proteínas reguladoras denominadas citocinas, produzidas durante as respostas inflamatórias e imunológicas à infecção.(2)

Os valores da temperatura axilar considerados como febre são variáveis na literatura, em geral de 37°C a 38°C, mas, na prática clínica, comumente se considera febre quando a temperatura da criança estiver igual ou superior a 37,8°C e subfebril as temperaturas entre 37°C e 37,7°C.(2,3) Entretanto, o conceito fisiopatológico de febre é universal,(2,3) assim como sua classificação. Segundo a etiologia, a febre é categorizada em: a) bacteriana, que geralmente se associa a casos de maior gravidade, levando ao deterioramento do quadro clínico da criança, e b) viral, que frequentemente tem uma resolução mais rápida, sem maiores riscos para a criança.(4)

Muitos pais e profissionais da saúde consideram que a febre é um sinal perigoso e nocivo para as crianças, como uma doença e não um sinal de anormalidade.(5,6) Existe similarmente o medo de que a febre poderia provocar convulsões e/ou danos no cérebro em desenvolvimento da criança, porém o risco apenas pode ser observado em crianças da faixa etária abaixo de cinco anos geneticamente predispostas, ou com história familiar, ou em crianças de qualquer idade com diagnóstico de epilepsia.(4,5) Sabe-se que a febre é autolimitada e tem a função de estimular o sistema imunológico e as reações inflamatórias no combate à infecção.(4) Desse modo, praticamente inexiste o risco de convulsões devido a febre alta em crianças previamente hígidas, sem sinais clínicos associados, com ausência de comorbidades e histórico familiar, bem como quando a causa da febre é conhecida e a criança tem suas perdas hídricas repostas. Nos casos de crianças com condições crônicas preexistentes e/ou muito debilitadas, a febre deverá ser tratada rapidamente, a fim de não sobrecarregar o organismo da criança com o aumento da taxa metabólica e demanda do sistema cardiopulmonar.(4)

Outra questão a ser pensada e igualmente controversa em relação ao aumento da temperatura em crianças é a hipertermia. Considera-se hipertermia o aumento da temperatura corpórea resultante de condições corporais ou externas que produzem mais calor do que o corpo pode eliminar, geralmente a temperatura se eleva acima de 40 °C e não responde ao uso de medicamentos antitérmicos.(7) Alguns sinais e sintomas caracterizam o quadro de hipertermia, tais como: elevação da temperatura corporal, extremidades quentes, aumento da sudorese, sensação de calor e ausência de tremores.(8) O excesso da produção de calor, o excesso de calor do ambiente ou quando a perda de calor está prejudicada podem sobrecarregar os mecanismos regulatórios do organismo, resultando na hipertermia.(8) Entre os tipos de hipertermia, destaca-se a hipertermia maligna, com maior risco de complicações, que pode ser considerada um distúrbio genético incomum e potencialmente fatal. Em geral, ocorre em indivíduos susceptíveis à exposição a anestésicos inalatórios halogenados e/ou relaxante muscular despolarizante, a succinilcolina por exemplo.(9,10) O organismo humano não se adapta à hipertermia, sendo assim, deve ser tratada como uma emergência clínica.(7)

Embora exista uma representativa literatura científica sobre o tema, o manejo clínico do aumento de temperatura em crianças ainda é muito diversificado, sobretudo no manejo não farmacológico utilizado pelos enfermeiros na prática assistencial. Observa-se, contudo, que os enfermeiros adotam práticas inconsistentes no manejo não farmacológico de febre e hipertermia, em geral, a partir de suas experiências prévias.(7)

Diante do exposto e da falta de padronização de intervenções não farmacológicas na prática clínica do enfermeiro, emergiu a necessidade de buscar as melhores evidências disponíveis na literatura científica sobre a temática, a fim de instrumentalizar o enfermeiro a gerenciar o cuidado não farmacológico de crianças com febre ou hipertermia, visando à aplicação das melhores práticas e à diminuição do sofrimento da criança hospitalizada e de sua família. Conhecer a efetividade das práticas tradicionalmente realizadas, isto é, saber o que funciona de fato nos cuidados de saúde é muito importante para pacientes e principalmente para os profissionais da saúde na sua tomada de decisão.

É preciso pensar que, para que se tenha inovação nos tratamentos de febre e hipertermia, é necessário testar o que se reconhece atualmente como prática efetiva e, só assim, modificar o que não é útil, propondo mudanças ou novos tratamentos e práticas de controle de temperatura. A revisão integrativa, por sua vez, é uma maneira mais confiável de identificar benefícios e malefícios das várias práticas existentes no manejo não farmacológico de febre.(11) Assim, o objetivo do estudo foi identificar as evidências disponíveis na literatura científica sobre as intervenções de enfermagem utilizadas no manejo não farmacológico de febre e hipertermia.

Métodos

Utilizou-se como método a revisão integrativa, que consiste na construção de uma análise ampla da literatura, contribuindo para discussões sobre métodos e resultados de pesquisas, assim como reflexões sobre a realização de futuros estudos.(11) Foram percorridas seis etapas: identificação do tema e seleção da hipótese ou questão de pesquisa para a elaboração da revisão integrativa; estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos/amostragem ou busca na literatura; definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados/categorização dos estudos; avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; interpretação dos resultados e apresentação da revisão/síntese do conhecimento.(11)

A elaboração da questão norteadora foi estruturada a partir da estratégia PICO, que surge como um elemento fundamental proposto pela Prática Baseada em Evidências – PBE para formulação da questão de pesquisa e da construção da pergunta para a busca bibliográfica de evidências.(12) PICO corresponde à abreviatura para Paciente, Intervenção, Comparação e “Outcomes” (desfecho).(12) Atribuiu-se P para pacientes pediátricos com febre ou hipertermia, I para as intervenções de enfermagem, C para as medidas não farmacológicas utilizadas para febre e hipertermia e O para a redução da temperatura corporal. Dessa forma, constituiu-se a seguinte questão norteadora: “Quais são as intervenções de enfermagem utilizadas no manejo não farmacológico de febre e hipertermia?”.

Por meio dos descritores procedeu-se à busca nas bases eletrônicas PubMed, Lilacs e CINAHL, e nas bibliotecas SciELO e COCHRANE. Considerou-se como critérios de inclusão das publicações: idiomas português e inglês; artigos que abordassem a faixa etária de 29 dias a 18 anos, incluindo crianças e adolescentes; pesquisas publicadas no período de 2000 a 2019, de acesso livre. A busca compreendeu o período de 2000 a 2019 e foi realizada no período de setembro de 2019 a março de 2020, utilizando-se os seguintes descritores e/ou palavras-chave: fever, child and nursing, sendo acrescentado o operador booleano AND entre eles.

Na base de dados PubMed, foram adicionados os filtros (filters applied): “Free full text, Humans, English, Portuguese, Child: birth-18 years, Infant: birth-23 months, Infant: 1-23 months, Preschool Child: 2-5 years, Child: 6-12 years, Adolescent: 13-18 years”. A operacionalização na base de dados CINAHL ocorreu por meio da seleção “MW Word in Subject Heading”, inserindo as palavras: Child, Fever and Nursing, sendo complementadas pelo filtro: “full text e idade”.

A busca na base de dados Lilacs, inicialmente, utilizando-se o filtro “descritor de assunto”, não resultou em nenhum artigo. Porém, após ter se repetido a busca utilizando o filtro “palavras”, obteve-se sucesso. Enquanto, na biblioteca SciELO, a busca foi simplificada, selecionando apenas o campo “todos os índices”. E, por fim, na biblioteca COCHRANE, utilizaram-se as palavras-chave (Keywords): Child, Fever and Nursing, obtendo-se 421 artigos no total.

Além disso, realizou-se uma busca ativa e manual a partir dos “artigos similares” aos artigos encontrados, segundo indicado por cada base de dados, tendo sido encontrados mais 13 artigos, totalizando 434 artigos. De modo preliminar, 40 artigos foram removidos por serem duplicados e 348 foram excluídos após leitura do título e resumo, pois não continham a temática febre e hipertermia em crianças e adolescentes, restando 46 artigos. Realizou-se a leitura dos textos na íntegra, tendo sido excluídos 19 estudos, que não relatavam as intervenções não farmacológicas para febre e hipertermia em crianças e adolescentes, totalizando 27 artigos, os quais foram analisados.

A coleta das informações foi realizada por meio de instrumento próprio, construído pela pesquisadora, no qual eram registradas as informações sobre as publicações, tais como: ano de realização e de publicação; idioma; data de acesso; país de origem; tipo de estudo; resultados principais; tamanho da amostra; aspectos éticos descritos; nível de evidência; base de dados, objetivos, resultados e recomendações dos estudos. A classificação utilizada para o nível de evidência das publicações foi a preconizada pelo Oxford Centre of Evidence-Based Medicine .(13) A análise das publicações se deu por meio de leitura exaustiva e separação das informações relevantes e interpretação das mesmas. As publicações foram comparadas em suas semelhanças e diferenças, tendo emergido as categorias em resposta à pergunta de pesquisa.(11) O planejamento de todo o estudo seguiu orientações do instrumento PRISMA, que traz os quesitos para a redação dos manuscritos sobre revisões sistemáticas ( Figura 1 ).(14)

Figura 1
Fluxograma Prisma do processo de busca na literatura

Resultados

A caracterização dos estudos foi realizada destacando os principais atributos dos artigos selecionados para a presente revisão integrativa e respectiva classificação de acordo com o nível de evidência de Oxford, conforme mostra o quadro 1 .

Quadro 1
Estudos incluídos na revisão integrativa

As publicações sobre o manejo não farmacológico de febre e hipertermia ainda são em número reduzido. Quanto ao ano de publicação, não houve homogeneidade na distribuição dos artigos. Entre os países onde foram realizadas as pesquisas, destacaram-se Inglaterra e EUA ao serem responsáveis pela autoria de seis publicações/país. A Austrália alcançou o segundo lugar, sendo responsável pela autoria de cinco publicações. Enquanto os demais países (Brasil, Índia, Itália, Irlanda, Nigéria, Nova Zelândia e Suíça) foram responsáveis por dez publicações.

Em relação ao desenho metodológico, considerando-se os 27 estudos analisados, obtiveram-se: quatro ensaios clínicos randomizados (ECR), três revisões sistemáticas, três guias de boas práticas, oito revisões de literatura, cinco estudos de reflexão, três estudos quantitativos, um estudo qualitativo.

Os artigos obtidos na revisão foram agrupados com base nas medidas não farmacológicas utilizadas no manejo de febre e hipertermia em crianças, tendo sido elaboradas sete categorias: banhos; compressas mornas; sponging ; incentivo à ingestão de líquidos, bolsas de gelo e cobertores refrigerados; remoção do excesso de roupas e ventilação do ambiente.

Categoria 1. Banhos

Nesta categoria, cinco estudos mencionaram a aplicação de banho de imersão para redução da temperatura corpórea em crianças febris, a intervenção foi utilizada com água morna, fria e com álcool.(7,1519) Entretanto, a eficácia do banho com água morna ou fria foi contestada devido à ineficiência na redução das prostaglandinas e por desencadear desconforto na criança, ao apresentar calafrios e tremores.(16) Além disso, a drástica redução da temperatura promovida pelo banho com água fria pode ocasionar um choque térmico.(17)

No manejo de febre e hipertermia em pacientes com injúrias neurológicas, o banho foi a medida não farmacológica escolhida em terceiro lugar por enfermeiros.(16)

Categoria 2. Compressas mornas

A medida não farmacológica compressa morna, assim como outros métodos físicos, apresenta similar mecanismo de perda de calor por condução e convecção.(20) Na literatura, foi encontrado estudo que descreve o uso de compressas mornas, embebidas em água à temperatura entre 29 e 30°C, aplicadas em região axilar e inguinal durante 30 minutos.(2)

Enquanto há escassez de pesquisas em território nacional abordando o uso de compressas mornas, observa-se um número elevado de publicações internacionais sobre sponging na literatura em relação às compressas mornas.(7,1734) Observa-se, na literatura nacional, que os autores muitas vezes traduzem o termo sponging como compressa morna. Nesse sentido, parecem considerar as técnicas sponging e de aplicação de compressas mornas como procedimentos análogos, entretanto elas diferem entre si, embora envolvam o mesmo mecanismo de perda de calor.(7)

Os melhores desfechos encontrados foram relacionados à intervenção compressa morna em associação ao antitérmico, estudos comparativos entre pacientes medicados apenas com antitérmico versus aqueles que receberam antitérmico em uso combinado com compressa morna obtiveram resfriamento corpóreo mais rápido nos primeiros 15 minutos na intervenção combinada.(24) Entretanto, deve-se manter constante observação nos pacientes submetidos ao “uso da compressa morna”, pois pode haver o desencadeamento de algumas reações adversas, tais como: tremores e vasoconstrição.(7,28)

Categoria 3. “ Sponging1

O uso de sponging tem sido amplamente empregado para redução da temperatura corpórea em crianças. Os mecanismos envolvidos na perda de calor são a condução, convecção e evaporação.(20) Nas pesquisas, a intervenção com sponging foi utilizada com a adição de água fria, morna e com álcool.(1,7,1539) Os pais e os enfermeiros no ambiente hospitalar também praticam a aplicação de sponging fria.(36) A técnica sofre algumas variações, mas, em geral, a criança é mantida sem roupas e seu corpo, do pescoço aos pés, é gentilmente friccionado com a compressa embebida em água morna.(19) Outra técnica também realizada é a fricção com a compressa morna somente nos membros superiores e inferiores, mantendo-se coberto o tronco da criança.

A principal recomendação para o tratamento de febre por meio de sponging consiste na utilização de água morna e tempo médio de 15 minutos.(1,24,28) A temperatura da água pode variar desde o valor abaixo da temperatura corpórea da criança até o limite de 33°C.(24,28,37) Em diversas pesquisas, a sponging morna tem sido utilizada em conjunto com um antitérmico.(1,7,14,1619,2329) A intervenção conjugada, sponging morna e antitérmico, obtém parecer favorável apenas quando o uso tem como objetivo principal oferecer conforto à criança.(19,24)

Em um ensaio clínico randomizado sobre sponging morna versus antitérmico, verificou-se que a sponging morna foi responsável pela redução mais rápida da temperatura nos primeiros 30 minutos, mas, após esse período, o antitérmico foi eficaz em longo prazo.(7) Em outra pesquisa, também um ensaio clínico randomizado, comparou-se a administração de dipirona com a administração de dipirona + sponging morna. Observou-se que a sponging morna não oferece efeitos adicionais em longo prazo, mesmo quando administrada juntamente com o antipirético.(24)

Ainda que alguns artigos recomendem a utilização de sponging morna no tratamento de crianças febris, outras pesquisas questionam seu uso, destacando uma forte oposição ao método em razão dos efeitos adversos: toxicidade (banho e sponging com álcool), desconforto na criança, vasoconstrição, elevação da temperatura corpórea, rápida redução da temperatura, eficiência restrita aos primeiros 30 minutos após aplicação e falta de sinergismo no uso conjugado com antitérmico.(1,15,1720,22,23,2628,32,33,37,39)

As pesquisas indicam que não há evidências que comprovem que antitérmicos ou sponging morna impeçam convulsões febris ou as suas recorrências.(24) Contudo crianças com hipertermia podem se beneficiar do uso da intervenção.(38)

Categoria 4. Incentivo à ingestão de líquidos

A febre, em geral, causa importante perda hídrica na criança. Assim, quando o estado febril é prolongado, há o risco de a criança apresentar desidratação. Por isso as crianças devem ser estimuladas a aumentar a ingestão de líquidos.(7,18,19,21,22,25,30,32,34,35,39) Sobretudo as crianças em aleitamento materno exclusivo, torna-se imprescindível a oferta de leite materno com maior frequência.(7,26,32) Estudos apontam que o aumento na ingesta de bebidas frias produz uma refrigeração interna na criança e auxilia as respostas fisiológicas do corpo diante da febre.(39)

Categoria 5. Bolsas de gelo e cobertores refrigerados

Bolsas de gelo e/ou cobertores refrigerados são utilizados para redução da temperatura corpórea em caso de febre e hipertermia.(7,16,36,38) Os enfermeiros especialistas em Neurologia têm adotado essas intervenções como primeira escolha, por considerarem que essas medidas são efetivas no tratamento de pacientes com lesão neurológica.(16)

Os mecanismos de evaporação e convecção proporcionam a perda de calor e conferem ao cobertor refrigerado a efetividade no tratamento da hipertermia.(15,16) O uso de bolsas de gelo, aplicadas nas regiões de axilas, pescoço e virilha, obteve resultado negativo, mostrando-se inefetivo.(27)

Para o tratamento de febre, o uso de bolsas de gelo em associação ao antitérmico obteve sucesso.(16) Em estudo realizado com um grupo de pacientes febris com comprometimento neurológico, estes foram submetidos à utilização de cobertores refrigerados e antitérmico, tendo sido observada uma redução rápida da temperatura corpórea, além da diminuição significativa do gasto energético diário.(15) Entretanto, a aplicação dessas intervenções não farmacológicas em pacientes febris pode desencadear vasoconstrição cutânea, tremores, ativação do sistema simpático e desconforto.(15,16,38) Pode-se observar que essas medidas não farmacológicas foram vistas como úteis por alguns e consideradas problemáticas por outros pesquisadores, não havendo um consenso entre eles.(15,16,36,38)

Categoria 6. Remoção do excesso de roupas

A remoção do excesso de roupas, lençóis e cobertores proporcionou conforto às crianças febris por permitir a perda de calor por irradiação.(21,25,27,32,36,39) É fundamental que se mantenham os bebês febris com suas cabeças descobertas, pois, dessa forma, ocorre a perda do excesso de calor.(39) Os enfermeiros mencionaram adotar essa medida como primeira opção no manejo de pacientes febris.(21,25,27)

Categoria 7. Ventilação do ambiente

Nessa categoria, as técnicas utilizadas para ventilação do ambiente foram: abertura de janelas e uso de ventiladores.(1820,25,27,33,36,38) O uso do ventilador no resfriamento do ambiente foi visto como benéfico, desde que o paciente não apresentasse tremores e resultasse na elevação da temperatura central.(30) Ainda que o uso do ventilador tenha sido recomendado por alguns, pesquisas recentes questionaram sua eficácia na redução da temperatura corpórea.(19,20,26)

Discussão

Os resultados indicaram que existem diversas intervenções não farmacológicas descritas na literatura sendo implementadas na prática clínica. Destaca-se ainda que a maior oferta de produção científica se concentra nos países desenvolvidos, e os países em desenvolvimento, como Brasil, Índia e Nigéria, foram responsáveis por uma pequena contribuição.

Em relação aos níveis de evidência dos estudos selecionados, apenas oito das 27 pesquisas atingiram o nível de evidência 1, segundo a Classificação de Oxford Centre for Evidence Based Medicine , três revisões sistemáticas, 1 guia de boas práticas baseado em uma revisão sistemática e quatro ensaios clínicos randomizados.(13) Os achados ressaltam a ausência de um maior número de pesquisas com evidências consistentes, que permitam elaborar protocolos que visem às melhores práticas.

As intervenções não farmacológicas com o intuito de tratar a febre foram foco do maior número de estudos. Apesar de serem bastante utilizadas também em nosso meio, tais intervenções podem desencadear uma rápida redução da temperatura corpórea associada à presença de angústia, desconforto e tremores, sem resolução efetiva do estado febril da criança.(15,1719,21,23,27,28,32,33,3739) De um modo geral, observa-se que não há um consenso absoluto sobre o uso dessas intervenções no tratamento de febre, os estudos evidenciam a necessidade de pesquisas adicionais com intuito de explorar os benefícios e efeitos adversos associadas às práticas vigentes.(15,20,28)

Sabe-se que os enfermeiros pediatras são responsáveis pelo manejo de febre em crianças diariamente, entretanto vários estudos têm demonstrado que eles não fundamentam suas intervenções nas melhores evidências, pautando suas ações em convicções individuais e na experiência clínica. O cuidado resultante pode ser considerado inefetivo, pois não traz benefícios para a criança ou pode até mesmo ser iatrogênico, ao se considerar o desconforto causado pela utilização de medidas não farmacológicas inconsistentes.(36) Nesse sentido, é necessário o investimento na educação permanente de enfermeiros, a fim de que o cuidado prestado ao paciente seja mais científico e qualificado.(36)

O principal objetivo de qualquer intervenção não farmacológica em crianças é lhes oferecer conforto. Assim, a conduta no manejo da febre deve ser individualizada e baseada no conhecimento da eficácia das medidas utilizadas. Sendo indicadas apenas as intervenções que auxiliem nas respostas fisiológicas do corpo, tais como o incentivo à ingestão de líquidos e a remoção do excesso de roupas.(7,18,19,21,22,25,30,32,35,39)

Não foram encontrados estudos específicos sobre crianças com hipertermia, entretanto há pesquisas voltadas para o paciente adulto com hipertermia causada por ambiente superaquecido, insolação, uso de medicamentos ou atividade física sob altas temperaturas.(9,10,35) As medidas não farmacológicas utilizadas foram o resfriamento corporal com imersão em água gelada e/ou soroterapia endovenosa gelada com bons resultados, porém parecem intervenções muito agressivas para serem aplicadas em crianças.(35,40)

Conclusão

O cuidado deve ser individualizado e direcionado ao comprometimento apresentado pela criança, seja febre ou hipertermia. A implementação de medidas não farmacológicas no tratamento de crianças febris não é recomendada, segundo a literatura pesquisada, exceto as intervenções que auxiliem nas respostas fisiológicas do corpo, tais como o incentivo à ingestão de líquidos e a remoção do excesso de roupas. Diante da falta de estudos que sustentem as intervenções não farmacológicas em crianças com febre, recomenda-se a realização de novas pesquisas que redundem em evidências para fundamentar o melhor cuidado do enfermeiro pediatra à criança com febre.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    06 Abr 2020
  • Aceito
    20 Ago 2020
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