Resiliência e o significado do trabalho de enfermeiros na pandemia de COVID-19

Resiliencia y el significado del trabajo de los enfermeros durante la pandemia de COVID-19

Resumo

Objetivo

Verificar e correlacionar a resiliência e o significado do trabalho em enfermeiros hospitalares no contexto da pandemia de COVID-19.

Método

Estudo descritivo e correlacional, realizado entre junho e novembro de 2021, com 164 enfermeiros de dois hospitais de São Paulo com os instrumentos a Escala de Resiliência Connor-Davidson e o Inventário do Significado do trabalho. Os dados foram analisados por meio da estatística descritiva e inferencial sendo adotados os seguintes testes: Teste de correlação de Pearson; Teste de Kruskal-Wallis; Teste t de Student; Teste de Dunn; Teste de correlação de Spearman; Análise de Variância Univariada; Teste de normalidade de Shapiro-Wilk; Teste de Levene. O valor de significância estatística adotado foi de 5% (p ≤ 0,05).

Resultados

Média de idade 37,54 anos (DP = 8,52), sendo 81,1% (133) do sexo feminino, média da resiliência 76,98 (DP=11,32). Correlações significativas positivas foram encontradas entre: escolaridade, idade e a resiliência com os atributos “Fonte de realização e independência econômica”, “Expressão de respeito e de acolhimento”, “Fonte de desafio, responsabilidade e sustento”, “Desafiar-se”, “Crescer economicamente”, “Sentir prazer e proteção”, “Contribuir socialmente e ser assistido” e “Ser reconhecido”;

Conclusão

Houve correlação da resiliência com o significado do trabalho, colaborando com o enfrentamento das adversidades encontradas na pandemia de COVID-19.

Resiliência psicológica; Cuidados de enfermagem; COVID-19; Hospitais; Engajamento no trabalho; Pandemias; Inquéritos e questionários

Resumen

Objetivo

Verificar y correlacionar la resiliencia y el significado del trabajo de enfermeros hospitalarios en el contexto de la pandemia de COVID-19.

Método

Estudio descriptivo y correlacional, realizado entre junio y noviembre de 2021, con 164 enfermeros de dos hospitales de São Paulo, con dos instrumentos: la Escala de Resiliencia Connor-Davidson y el Inventario del Significado del Trabajo. Los datos fueron analizados por medio de la estadística descriptiva e inferencial y se adoptaron las siguientes pruebas: Prueba de correlación de Pearson, Prueba de Kruskal-Wallis, Test-T de Student, Prueba de Dunn, Prueba de correlación de Spearman, Análisis de Varianza Univariada, Prueba de normalidad de Shapiro-Wilk y Prueba de Levene. El valor de significación estadística adoptado fue del 5 % (p ≤ 0,05).

Resultados

Promedio de edad 37,54 años (DP = 8,52), el 81,1 % (133) de sexo femenino, promedio de resiliencia 76,98 (DP = 11,32). Se encontraron correlaciones significativas entre: escolaridad, edad y resiliencia con los atributos “fuente de realización e independencia económica”, “expresión de respeto y de acogida”, “fuente de desafío, responsabilidad y sustento”, “desafiarse”, “crecer económicamente”, “sentir placer y protección”, “contribuir socialmente y ser asistido” y “ser reconocido”.

Conclusión

Hubo correlación de la resiliencia con el significado del trabajo, lo que ayudó a enfrentar las adversidades encontradas en la pandemia de COVID-19.

Resiliencia psicológica; Atención de enfermería; COVID-19; Hospitales; Compromiso laboral; Pandemias; Encuestas y cuestionarios

Abstract

Objective

To verify and correlate resilience and meaning of work in hospital nurses during the COVID-19 pandemic.

Method

This is a descriptive and correlational study, carried out between June and November 2021, with 164 nurses from two hospitals in São Paulo using the Connor-Davidson Resilience Scale and the Inventário do Significado do Trabalho (Meaning of Work Inventory). The data were analyzed using descriptive and inferential statistics, Pearson’s correlation test, Kruskal-Wallis test, Student’s t test, Dunn’s test, Spearman’s correlation test, Univariate Analysis of Variance, Shapiro-Wilk normality test, Levene’s test. The statistical significance value adopted was 5% (p ≤ 0.05).

Results

Mean age 37.54 years (SD = 8.52), with 81.1% (133) female and mean resilience of 76.98 (SD = 11.32). Significant positive correlations were found between education, age and resilience with the attributes “Source of achievement and economic independence”, “Expression of respect and acceptance”, “Source of challenge, responsibility and livelihood”, “Challenging”, “Economic growth”, “Feeling pleasure and protection”, “Contributing socially and be assisted” and “Being recognized”;

Conclusion

There was a correlation between resilience and the meaning of work, helping to face the adversities encountered in the COVID-19 pandemic.

Psychological resilience; Nursing care; COVID-19; Hospitals; Work engagement; Pandemics; Surveys and questionnaires

Introdução

O SARS-CoV-2 (Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2) representou um dos problemas de saúde mais agudos e graves das últimas décadas, pois colocou todos os países sob condições médicas extremas, ocasionando ao profissional de saúde um alto nível de estresse e a necessidade de desenvolver sua resiliência.(¹)

Momentos de crise, por definição, tendem a gerar reações e comportamentos pautados pela sensação de caos e pânico nas populações afetadas. O estabelecimento de um ambiente de trabalho acolhedor e seguro é crucial para diminuir os impactos sociais e psicológicos provenientes da incerteza e da insegurança presentes no cotidiano de diferentes instituições e trabalhadores.(¹)

Nesse sentido, estudos demonstram que os surtos afetam o estado psicológico dos membros de uma sociedade. As ondas iniciais da pandemia da coronavirus disease 2019 (COVID-19) na China fizeram com que mais da metade da população experimentasse impacto na saúde mental.(¹-⁵)

No pico da crise causada pelo coronavírus, indicativos apresentaram que os enfermeiros que tinham níveis adequados de resiliência lidaram melhor com o impacto da pandemia de COVID-19, resultando em redução da ansiedade, do estresse pós-traumático, da exaustão emocional e da depressão, consequentemente prestando uma assistência mais segura.(⁶,⁷)

A resiliência é uma condição psicológica pessoal, definida como o processo de ajustes, gerenciamento e adaptação a fontes significativas de alterações emocionais ou experiências traumáticas. Os recursos dentro do indivíduo, em sua vida e no ambiente de trabalho, facilitam a capacidade de adaptação e de recuperação diante da adversidade.(²-⁵)

O trabalho é uma condição fundamental para a humanidade. De acordo com a teoria marxista que reconhece que o trabalho é a modificação do elemento pela ação do trabalhador. Podemos sintetizar que a cada momento, a sociedade e o trabalho, incluindo a pandemia de COVID-19, apresentam uma imensidão de sinergias. Desse modo, o trabalhador realiza, propositadamente, o seu labor de forma que gere valor para si próprio, modificando o elemento de acordo com sua necessidade. Em contrapartida, Durkheim introduz a ideia de que o trabalho moderno geraria perdas das identidades coletivas, causando individualização das relações sociais; além disso, a sociedade sofreria apenas eventuais ajustes. No entanto, o trabalho não é apenas um elemento, mas suas ideias, crenças e valores, tal como as razões humanas, são potências motivadoras para o trabalho e, realizar um trabalho de boa qualidade, não depende apenas de instruções e procedimentos rigorosos, mas conta com o zelo e o engajamento do trabalhador em suas atividades.(³-⁶)

Esse cenário faz com que os enfermeiros, necessitem cada vez mais, desenvolver capacidade de adaptação às mudanças com o propósito de sobreviver e crescer progressivamente, e, ao mesmo tempo, têm como papel fundamental nortear as pessoas.(⁸)

Há poucos estudos sobre a temática do significado do trabalho e resiliência psicológica em enfermeiros(as), porem há grande necessidade de avanços no conhecimento teórico, aplicado ao tema resiliência e o significado no contexto laboral, assim como sobre a importância de se conhecer os aspectos dos ambientes de trabalho, que venham promover condições protetoras aos profissionais em seus espaços de atuação. Assim, este estudo tem como objetivo verificar e correlacionar a resiliência e o significado do trabalho em enfermeiros hospitalares no contexto da pandemia de COVID-19.(²-⁴,⁶)

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo, correlacional e quantitativo, desenvolvido com enfermeiros em dois hospitais privados do município de São Paulo, Brasil, acreditados com excelência pela Organização Nacional de Acreditação e designados durante a pandemia de COVID-19 para atendimento exclusivo dos casos de COVID-19. O desenvolvimento deste estudo foi realizado de acordo com o esquema metodológico STROBE (The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology). A população de estudo foi intencional e não-probabilística, composta por 164 enfermeiros.

Para o cálculo da amostra foi utilizada fórmula estatística na qual N= tamanho da amostra, com 310 enfermeiros ativos no quadro de trabalhadores dos hospitais, E₀= erro amostral tolerável = 4%, n₀= primeira aproximação do tamanho da amostra = 310, chegando ao tamanho, mínimo amostral, de 155 sujeitos.

A coleta de dados ocorreu entre junho e novembro de 2021, período que correspondeu à segunda onda da pandemia de COVID-19. Definiram-se como critérios de inclusão: enfermeiro com no mínimo três meses de trabalho na instituição; ter trabalhado durante a pandemia de COVID-19; possuir e-mail e responder completamente o instrumento de coleta de dados eletronicamente. Foram excluídos 40 enfermeiros que responderam de maneira incompleta aos instrumentos de coleta de dados, 164 enfermeiros responderam, completamente, aos instrumentos de coleta de dados e os 106 restantes que completariam a amostra de 310 não responderam a pesquisa.

A coleta de dados foi realizada por meio da aplicação individual e eletronicamente de três instrumentos, seguindo os critérios do CHERRIES (The Checklist for Reporting Results of Internet E-Surveys). O participante só respondeu após o aceite eletronicamente do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo: um bloco de perguntas sociodemográficas, a Escala de Resiliência Connor-Davidson (CD-RISC-25BRASIL) e o Inventário do Significado do trabalho, ambos traduzidos e validados no Brasil. A avaliação das variáveis independentes foi elaborada pelo autor, com base na experiência profissional e literatura e inclui a coleta dos dados: idade, gênero, estado civil, escolaridade, cargo exercido, tempo de trabalho no local da pesquisa, se possui outro vínculo empregatício e se pratica exercícios físicos.(⁷-¹⁰)

A CD-RISC-25BRASIL é uma medida de resiliência de autorrelato de 25 itens, que avalia uma escala de 5 pontos de 0 (“não é verdade”) a 4 (“verdadeiro quase o tempo todo”), desenvolvida para fornecer uma medida válida e confiável de resiliência e estabelecer valores de referência para estar ou não resiliente. Seu resultado se dá pela somatória dos 25 itens e quanto maior a pontuação maior o estado de resiliência, a confiabilidade da escala foi calculada pelo alfa de Cronbach, revelando um índice de 0,82.(⁷-⁹)

O Inventário do Significado do trabalho é composto por 68 frases afirmativas acerca do trabalho, a cada item, o participante apresenta suas respostas do tipo Likert de cinco pontos, variando de 0 (Nem um pouco verdadeiro), 1 (Raramente verdadeiro), 2 (Às vezes verdadeiro), 3 (Frequentemente verdadeiro) a 4 (Quase sempre verdadeiro), para ambos atributos valorativos e descritivos. A pontuação é uma média das questões compostas em cada atributo e quanto maior for a média, maior significado o atributo faz para o pesquisado. Atributos valorativos, são aqueles que definem como o trabalho deveria ser e, os atributos descritivos são os que definem como o trabalho é concretamente. A confiabilidade da escala foi calculada pelo alfa de Cronbach, revelando índice de 0,83.(¹⁰-¹⁴)

Os instrumentos foram transcritos para o software RedCap, onde foi realizado teste dos formulários antes da liberação para a amostra e não foram necessários ajustes após o teste realizado.

Os dados foram analisados por meio da estatística descritiva e inferencial, sendo adotados os seguintes testes: Teste de correlação de Pearson; Teste de Kruskal-Wallis; Teste t de Student para amostras independentes; Análise post hoc; Teste de Dunn com correção de Bonferroni para múltiplas comparações; Teste de correlação de Spearman; Análise de Variância Univariada (ANOVA); Teste de normalidade de Shapiro-Wilk; Teste de Levene. O valor de significância estatística adotado foi de 5% (p ≤ 0,05). Utilizou-se o software SPSS Statistics, versão 28.0.

O presente estudo foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética e Comissão Científica do Hospital São Luiz Itaim, São Paulo, sob número do parecer 4.487.876 (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética: 40158720.9.0000.0087) e a participação da população após o aceite, do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aplicado eletronicamente com o registro e arquivo de todos.

Resultados

Um total de 164 enfermeiros responderam aos instrumentos de coleta de dados, revelando média da faixa etária de 37,54 anos (DP=8,52). A maioria era do sexo feminino (81,1%, n=133), casada (53,66%, n=88), com especialização (73,78%, n=121), e entre um e cinco anos de experiência na instituição (43,29%, n=71). Nota-se que a grande maioria dos enfermeiros são novos na instituição. A função predominante foi a de enfermeiro assistencial (84,7%, n=139), enquanto 80,49% (n=132) não possuíam outro vínculo empregatício. Adicionalmente, 61,59% (n=101) não realizavam atividades físicas, conforme indicado na tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da amostra quanto às variáveis sociodemográficas categóricas

Variáveis	Categorias	n(%)
Gênero	Masculino	31(18,90)
	Feminino	133(81,10)
Estado civil	Solteiro (a)	47(28,66)
	Casado (a)	88(53,66)
	Viúvo (a)	5(3,05)
	Divorciado (a) ou Desquitado (a)	13(7,93)
	Outros	11(6,71)
Escolaridade	Superior completo	42(25,61)
	Especialização	121(73,78)
	Mestrado	1(0,61)
Há quanto tempo trabalha na instituição	Menos de 1 ano	14(8,54)
	De 1 a 5 anos	71(43,29)
	De 6 a 10 anos	50(30,49)
	De 11 a 15 anos	19(11,59)
	De 16 a 20 anos	1(0,61)
	Mais de 20 anos	9(5,49)
Cargo	Enfermeiro	139(84,76)
	Enfermeiro referência	13(7,93)
	Supervisor de enfermagem	12(7,32)
Possui outro vínculo/trabalho	Sim	32(19,51)
	Não	132(80,49)
Realiza exercícios físicos	Sim	63(38,41)
	Não	101(61,59)

• O nível de resiliência foi de 76,98 (DP=11,32) com mediana de 76,00.

Verifica-se na tabela 2 que, no tipo valorativo, dois subdomínios tiveram a maior pontuação, sendo “Expressão de respeito e de acolhimento” com 3,24 e a “Fonte de realização e independência econômica” com 3,23. No tipo descritivo, os dois mais pontuados foram “Crescer economicamente”, com 3,35, e “Desafiar-se”, com 3,28.

Tabela 2
Caracterização da amostra do estudo em relação à pontuação para cada tipo valorativo e para cada tipo descritivo do Inventário do Significado do Trabalho

Categoria	Subdomínio	n	Média	DP	Mediana	Mín.	Máx.
Tipo valorativo	Fonte de realização e independência econômica	164	3,23	0,44	3,20	2,27	4,00
	Expressão de respeito e de acolhimento	164	3,24	0,48	3,19	2,00	4,00
	Autoafirmação	164	2,86	0,48	2,89	1,33	3,89
	Desumanizante e desgastante	164	1,97	0,64	2,00	0,50	3,38
	Representante de dureza	164	2,46	0,63	2,50	0,67	4,00
	Fonte de desafio, responsabilidade e sustento	164	3,08	0,48	3,00	1,70	4,00
Tipo descritivo	Ser desumanizado	164	0,84	0,87	0,50	0,00	3,50
	Sentir-se esgotado e pressionado	164	2,17	0,75	2,25	0,50	4,00
	Enfrentar as demandas e dureza	164	2,64	0,60	2,75	1,00	4,00
	Ser responsável (gente)	164	3,06	0,50	3,00	1,63	4,00
	Desafiar-se	164	3,28	0,46	3,28	2,11	4,00
	Crescer economicamente	164	3,35	0,49	3,44	1,89	4,00
	Sentir prazer e proteção	164	3,24	0,53	3,20	1,00	4,00
	Contribuir socialmente e ser assistido	164	3,19	0,48	3,13	2,00	4,00
	Ser reconhecido	164	2,98	0,56	3,00	1,13	4,00
	Ser retribuído equitativamente	164	2,68	0,65	2,83	1,00	4,00

• DP - Desvio padrão; Mín. - Mínimo; Máx. - Máximo

Nos quadros 1 e 2 observa-se o resumo das correlações encontradas entre as variáveis sociodemográficas, resiliência e significado do trabalho. Vale ressaltar, no quadro 1, que apenas a variável escolaridade apresentou correlação significante e positiva com a grande parte dos atributos valorativos e descritivos do Significado do trabalho. Observa-se no quadro 2 correlação significante e negativa com a variável idade. Todas as demais variáveis sociodemográficas estudadas não apresentaram correlações significantes.

Quadro 1
Correlação estatisticamente significante e positiva encontradas

Correlação estatisticamente significante e positiva	Teste utilizado	Valor encontrado		Variável sociodemográfica que obteve correlação
		Coef.	p-value
Tipo valorativo do IST
“Fonte de realização e independência econômica”	Teste de Spearman	0,187	0,016	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,657	< 0,001	Resiliência
“Expressão de respeito e de acolhimento”	Teste de Spearman	0,198	0,011	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,626	< 0,001	Resiliência
“Fonte de desafio, responsabilidade e sustento	Teste de Spearman	0,159	0,042	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,591	< 0,001	Resiliência
“Autoafirmação”		0,185	0.018	Resiliência
“Representante de dureza”		0,488	< 0,001	Resiliência
Tipo descritivo do IST
“Sentir-se esgotado e pressionado”	Teste de Pearson	0,213	0,006	Resiliência
“Enfrentar as demandas e dureza”		0,183	0,019	Resiliência
“Ser responsável (gente)”	Teste de Pearson	0,478	< 0,001	Resiliência
“Desafiar-se”	Teste de Spearman	0,158	0,043	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,505	< 0,001	Resiliência
“Crescer economicamente”	Teste de Spearman	0,205	0,009	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,524	< 0,001	Resiliência
“Sentir prazer e proteção”	Teste de Spearman	0,176	0,024	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,618	< 0,001	Resiliência
“Contribuir socialmente e ser assistido”	Teste de Spearman	0,223	0,004	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,648	< 0,001	Resiliência
“Ser reconhecido”	Teste de Spearman	0,184	0,018	Escolaridade
	Teste de Pearson	0,602	< 0,001	Resiliência
“Ser retribuído equitativamente”	Teste de Pearson	0,477	< 0,001	Resiliência
Resiliência	Teste de Spearman	0,196	0,012	Escolaridade

Quadro 2
Correlação estatisticamente significante e negativa encontradas

Correlação estatisticamente significante e negativa	Teste utilizado	Valor encontrado		Variável sociodemográfica que obteve correlação
		Coef.	p-value
Tipo valorativo do IST
“Fonte de realização e independência econômica”	Teste de Pearson	-0,164	0,036	Idade
“Expressão de respeito e de acolhimento”		-0,168	0,031
“Autoafirmação”		-0,186	0,017
˜Desumanizante e desgastante˜		-0,224	0,004
“Fonte de desafio, responsabilidade e sustento”		-0,288	<0,001
Tipo descritivo do IST
“Sentir-se esgotado e pressionado”	Teste de Pearson	-0,264	<0,001	idade
“Enfrentar as demandas e dureza”		-0,179	0.022
“Ser responsável (gente)”		-0,233	0.003
“Desafiar-se”		-0,253	0.001
“Crescer economicamente”		-0,164	0.036
“Ser retribuído equitativamente”		-0,196	0.012

Discussão

Este estudo demonstrou que há correlação significante e positiva dos atributos valorativos e descritivos com a resiliência. A escolaridade tem se configurado com a única variável que apresentou correlação positiva e significante com os atributos do Significado do Trabalho. Por outro lado, a idade apresentou correlação significante negativa com os atributos do Inventario do Significado do Trabalho.

Os resultados do presente estudo mostraram que o escore médio de resiliência dos enfermeiros durante a pandemia de COVID-19 foi de 76,98 (± 11,32), superior ao relatado por Huang et al. entre o corpo clínico dos Departamentos de Radiologia: 65,76 (± 17,26) para Afshari et al.; 61,18 (± 14,8) entre enfermeiros iranianos; 69,00 (± 15.82) entre profissionais de saúde indianos; e 64,28 (±15,99) entre enfermeiros turcos.(¹⁵-²⁰)

A relação entre idade e resiliência não foi significativa, porém a média de idade do presente estudo foi de 37,54, com DP = 8,52, superior à média dos enfermeiros das Filipinas, que foi de 30,94 anos, com DP = 6,67. O aumento da idade e a maior experiência vivida têm relação positiva com a resiliência.(¹⁵-¹⁷)

As mulheres não apresentaram diferença estatística no escore de resiliência, 76.84 (± 11,37) em relação aos homens 77.58 (± 11,29), ao contrário do relatado por Afshari et al. e por Dai et al., que demonstraram que há uma diferença significativa entre a equipe médica masculina e feminina, possivelmente porque a equipe feminina tinha níveis mais elevados de preocupação.(¹⁴-²⁰)

Uma comparação, antes da pandemia de COVID-19, foi feita com estudantes universitários, entre maio de 2012 a maio de 2016. Foram selecionados 244 estudantes do Hospital Universitário Attikon e do Hospital Naval de Atenas, na Grécia. O escore médio de resiliência desse grupo foi de 60,97 (±18,59), menor que o escore encontrado neste estudo. Outro ponto importante de se destacar, foi a correlação negativa com a idade e correlação positiva com os anos de escolaridade do grupo.(²¹)

No presente estudo, não foram observados coeficientes de correlação significantes entre estado civil e resiliência com o IST, mesmo resultado relatado por Afshari et al.(¹⁴-¹⁶)

A escolaridade é um fator contribuinte para maior escore de resiliência. No modelo proposto, foram observados coeficientes de relação significantes nos diferentes níveis de ensino, de modo que o aumento do nível de escolaridade levou ao maior escore da CD-RISC-25BRASIL. De fato, pode-se apontar que com o aumento da idade, a experiência de trabalho e a formação dos enfermeiros, além de sua exposição ao estresse, suas habilidades pessoais para lidar com situações críticas e estressantes se desenvolvem.

O progresso de tais habilidades auxilia na criação de diversas estratégias de enfrentamento, que podem facilitar sua adaptação e atuação de forma efetiva, além de favorecer a resiliência em tais situações.(¹⁹-²²)

Quando o tema é aprendizado, fica claro que o treinamento prévio e experiências anteriores contribuem para melhor adaptabilidade e tem papel protetor no contexto hospitalar, dado esse apresentado em diversos estudos, com 201 enfermeiros turcos, 370 enfermeiros turcos, 128 enfermeiros coreanos e 281 enfermeiros sauditas. Ademais, o suporte que a instituição fornece é fundamental para a promoção da resiliência, principalmente aos novos trabalhadores, que apresentam menor resiliência quando comparados aos mais antigos. Na mesma linha, o presente estudo demonstrou coeficientes de correlação significantes e positiva com a escolaridade, a idade e a realização de atividade física.(¹⁹-²⁵)

O aumento da atividade física promove melhora na circulação sanguínea e do metabolismo, reduzindo efetivamente os fatores indutores de fadiga, fortalecendo o equilíbrio mental e emocional, o que, por sua vez, melhora a qualidade da resiliência.(²¹,²⁶,²⁷) No presente estudo, a prática de exercício apresentou relação positiva com a resiliência, ratificando o trabalho realizado com 54 enfermeiros da Coreia, que demonstrou melhorias estatisticamente significativas na saúde física e psicológica do grupo intervenção com a prática do exercício físico.(¹⁵,¹⁶)

À medida que os níveis de atividade física aumentam, emoções negativas, como o estresse, diminuem e as emoções construtivas e o pensamento positivo aumentam, gerando maior resiliência ao enfermeiro.(¹⁴,¹⁶,¹⁹,²³,²⁴)

A resiliência é uma habilidade que pode melhorar a satisfação no trabalho.(²⁵-²⁹) No presente estudo, observou-se correlação estatisticamente positiva da resiliência com ambos os tipos valorativos e descritivos, como “Fonte de realização e independência econômica”, “Sentir prazer e proteção”, “Ser reconhecido”.

A estrutura do trabalho tem por roteiro transformar as atitudes de tal forma que os colaboradores sejam coordenados a desenvolver comportamentos positivos com relação às tarefas executadas, na instituição em que atua e a si próprio. O resultado dessas práticas no trabalho revela importante indicador de uma organização eficaz.(²⁷-³¹)

Para que o trabalho possua significado, as características do trabalho devem estar associadas aos motivos que estimulam os profissionais ao próprio desenvolvimento, como condições satisfatórias de trabalho, salário aceitável, reconhecimento, preservação da saúde, trabalho estimulante, variado, autonomia e oportunidade de realização das tarefas de maneira adequada.(²³,²⁴,²⁹)Esse dado foi observado neste estudo, que evidenciou a maior frequência absoluta nos tipos “Fonte de realização e independência econômica”, “Expressão de respeito e de acolhimento”, “Crescer economicamente” e “Sentir prazer e proteção”.

Ainda sobre essa temática, observa-se nesta pesquisa que houve coeficientes de correlação significante e positiva da resiliência com os tipos descritivos “Sentir-se esgotado e pressionado”, “Enfrentar as demandas e dureza” e “Ser responsável”. Os tipos descritivos demonstram como o trabalho acontece mesmo que a assistência traga um esgotamento e pressão devido à dureza das demandas diárias. A resiliência do enfermeiro faz com que ele se sinta seguro, psicologicamente, e tenha prazer pela assistência ao paciente, contribuindo socialmente e gerando significado de responsabilidade com o outro, porém ele espera que a organização retribua equitativamente e que seja reconhecido.(²⁵-²⁹)

Quando a organização cuida do trabalhador, ele muda sua autopercepção e o significado que atribui ao trabalho. Entretanto, os enfermeiros que atuam na assistência hospitalar e convivem com alto índice de mortalidade ou com pacientes sequelados, acabam pressionados e sentem-se esgotados. A resiliência e a escolaridade aparecem como fatores de proteção e apresentam correlação estatisticamente positiva com os tipos descritivos, como “Desafiar-se”; “Crescer economicamente”, “Sentir prazer e proteção”, “Contribuir socialmente e ser assistido” e “Ser reconhecido”, o que oferece novos significados ao trabalho e até mesmo à vida. Porém, se a instituição não propiciar a oportunidade de evolução ao profissional, o mesmo não se considera recompensado, provocando insatisfação, desmotivação e conflitos no ambiente de trabalho.(²⁴-²⁹)

O fato de os enfermeiros participantes afirmarem que o significado do trabalho real está nos atributos “Sentir-se esgotado e pressionado”, “Enfrentar as demandas e dureza”, “Ser responsável (gente)”, “Desafiar-se”, “Crescer economicamente”, “Sentir prazer e proteção”, “Contribuir socialmente e ser assistido”, “Ser reconhecido” e “Ser retribuído equitativamente”, mesmo em condições intensas, estressantes e num cenário pandêmico, pode ser considerado indicador da grande importância que atribuíram à sua profissão.(²⁴-²⁹)

Os níveis de resiliência psicológica e o significado do trabalho dos enfermeiros representam atribuição essencial na resposta eficaz de todos esses problemas, pois a resiliência possibilita lidar com as dificuldades que enfrentam no local de trabalho e também é um escudo forte que protege das adversidades da profissão.(²⁴-³¹)

Sentimentos de estar adequadamente preparado e confiante para tarefas completas foram associados à resiliência, da mesma forma, estudo realizado na Coreia evidenciou que enfermeiros que sentiram prazer em seu trabalho apresentaram maior nível de resiliência. A este respeito, nossos resultados são consistentes com os resultados de Han et al. (2020) e Jung et al. (2021), evidenciando o fato de os enfermeiros participantes do estudo afirmarem que realizam seu trabalho com prazer, reconhecimento e contribuição social.(²⁵,²⁷-³¹)

Uma consideração para os resultados deste estudo em relação a outros estudos durante a pandemia de COVID-19 é a correlação positiva com o impacto significativo e negativo da COVID-19 no bem-estar dos trabalhadores da saúde, como relatado por outros pesquisadores.(³¹-³³) Compreender o que é mais envolvente e as intervenções eficazes para aumentar a resiliência é crucial para o bem-estar dos enfermeiros, o que afeta a qualidade do atendimento ao paciente.

Dadas as evidências recentes, no qual demostra que a resiliência pode diminuir o impacto negativo dos eventos estressores do ambiente do trabalho que atinge os profissionais de saúde e identificar os fatores que contribuem para aumentar a resiliência, bem como o reconhecimento de fatores intervenientes que permeiam os sentimentos e emoções vivenciados no contexto laboral e interferem no significado. A resiliência e o significado do trabalho pessoal e, consequentemente, a profissional tem o potencial de ajudar os enfermeiros a se adaptarem com sucesso aos desafios da vida e do trabalho, além de manter o bem-estar, faz com que seja entregue, pelos enfermeiros mais resilientes, maior qualidade no cuidado, concretizando melhores resultados para a instituição.

As principais limitações deste estudo foram o seu momento, pois não foi realizado durante a primeira onda da pandemia de COVID-19, e o contexto geográfico do estudo, quando a maioria dos profissionais de saúde recebeu a vacinação, diluindo o efeito do surto de COVID-19. Além disso, durante a primeira onda, foram intensificados os treinamentos e desenvolvimento de habilidades, podendo trazer um viés nos resultados.

Contribuições, como a resiliência e o significado do trabalho, devem ser estudadas de forma longitudinal. Ainda, deve ser realizado em outros ambientes laborais, de maneira a impulsionar novas discussões e investigações sobre o tema, tanto no contexto hospitalar quanto em diferentes cenários na área da saúde, permitindo aprofundamento e refinamento do conhecimento na área.

Conclusão

Durante a segunda onda da pandemia de COVID-19 as enfermeiras apresentaram alto nível de resiliência com correlação significativa e positiva na maioria dos atributos do Inventário do Significado do Trabalho. Enquanto, nas variáveis sociodemográficas estudadas, apenas a escolaridade demonstrou correlação positiva com a resiliência e os atributos do significado. A outra variável demográfica, a idade apresentou correlação negativa com os atributos do Inventario do Significado do Trabalho. Vale ressaltar que os participantes da pesquisa demonstraram alto nível de resiliência psicológica e, atribuíram as maiores notas nos atributos descritivos que representam o trabalho deles atualmente como: responsáveis, se desafiam, podem crescer economicamente e sentem prazer e proteção com seu trabalho.

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Editado por

Editor Associado: Thiago da Silva Domingos (https://orcid.org/0000-0002-1421-7468) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  13 Set 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  25 Out 2023
• Aceito
  20 Mar 2024