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Estigma na percepção de médicas e enfermeiras sobre o pré-natal de homens transexuais

Estigma en la percepción de médicas y enfermeras sobre el control prenatal de hombres transexuales

Resumo

Objetivo

Analisar o estigma evidenciado nas percepções de médicas e enfermeiras sobre o pré-natal de homens transexuais.

Métodos

Estudo qualitativo desenvolvido com nove profissionais de saúde (seis enfermeiras e três médicas) atuantes em Unidades de Saúde da Família em um município na Bahia. Foram realizadas entrevistas em profundidade, submetidas à Análise Temática Reflexiva e interpretação baseada na teoria do estigma e do conceito de cisheteronormatividade.

Resultados

Foram derivados dois temas que explicitaram o estabelecimento de rótulos e estereótipos ao corpo, mente e identidade de gênero do homem trans grávido: (des)preparo profissional e distanciamento das demandas e perspectivas cisheteronormativas para o cuidado pré-natal de homens trans. Elementos do estigma evidenciados: afastamento, rótulos, estereótipo, descrédito e discriminação. Tais elementos (percepções estigmatizantes) se manifestaram dentro da lógica da normalidade e equiparação cisgênero das necessidades de saúde dos homens trans no contexto pré-natal.

Conclusão

Há estigma na percepção de médicas e enfermeiras sobre o pré-natal de homens trans. A estigmatização pode impactar negativamente a qualidade do pré-natal e da saúde e segurança de homens trans no ciclo gravídico puerperal, antecipando pensamentos, atitudes e práticas que contribuem para a deteriorar a identidade transmasculina na gestação.

Pessoas transgênero; Masculinidade; Minorias sexuais e de gênero; Normas de gênero; Estigma social; Cuidado pré-natal; Atenção primária à saúde

Resumen

Objetivo

Analizar el estigma constatado en las percepciones de médicas y enfermeras sobre el control prenatal de hombres transexuales.

Métodos

Estudio cualitativo llevado a cabo con nueve profesionales de la salud (seis enfermeras y tres médicas) que trabajan en Unidades de Salud de la familia en un municipio del estado de Bahia. Se realizaron entrevistas en profundidad, que fueron sometidas al análisis temático reflexivo e interpretación con base en la teoría del estigma y del concepto de cisheteronormatividad.

Resultados

Se derivaron dos temas que explicitaron el establecimiento de rótulos y estereotipos del cuerpo, mente e identidad de género de hombres trans embarazados: (falta de) preparación profesional y distanciamiento de las demandas y perspectivas cisheteronormativas para el cuidado prenatal de hombres trans. Se constataron los siguientes elementos del estigma: distanciamiento, rótulos, estereotipos, descrédito y discriminación. Tales elementos (las percepciones estigmatizantes) se manifestaron dentro de la lógica de la normalidad y equivalencia cisgénero de las necesidades de salud de los hombres trans en el contexto del control prenatal.

Conclusión

Existe un estigma en la percepción de médicas y enfermeras sobre el control prenatal de hombres trans. La estigmatización puede impactar negativamente en la calidad del control prenatal y de la salud y seguridad de hombres trans durante el embarazo y el puerperio, y puede anticipar pensamientos, actitudes y prácticas que contribuyen al deterioro de la identidad transmasculina en el embarazo.

Personas transgénero; Masculinidad; Minorías sexuales y de género; Normas de género; Estigma social; Atención prenatal; Apoyo social; Atención primaria de salud

Abstract

Objective

To analyze the stigma evidenced in doctors’ and nurses’ perception regarding prenatal care for transgender men.

Methods

A qualitative study developed with nine health professionals (six nurses and three doctors) working in Family Health Units in a municipality in Bahia. In-depth interviews were carried out, subjected to reflective thematic analysis and interpretation based on the theory of social stigma and the concept of cisheteronormativity.

Results

Two topics were derived that explained the establishment of labels and stereotypes on the body, mind and gender identity of pregnant trans men: professional (un)preparedness and distancing from cisheteronormative demands and perspectives for prenatal care for trans men. Elements of stigma observed were distance, labels, stereotype, discredit and discrimination. Such elements (stigmatizing perceptions) manifested themselves within the logic of normality and cisgender equality of trans men’s health needs in the prenatal context.

Conclusion

There is stigma in doctors’ and nurses’ perception regarding prenatal care for trans men. Stigmatization can negatively impact the quality of prenatal care and trans men’s health and safety in the pregnancy and puerperal cycle, anticipating thoughts, attitudes and practices that contribute to the deterioration of transmasculine identity during pregnancy.

Transgender persons; Masculinity; Sexual and gender minorities; Gender norms; Social stigma; Prenatal care; Social support; Primary health care

Introdução

A transgeneridade é um conceito amplo que abarca diversas identidades de gênero. Entre elas estão as pessoas trans, que buscam os reconhecimentos social e legal de sua identidade de gênero.(11. Silva FC, Souza EM, Bezerra MA. (Dis)ordering the cisgender norm and its derivatives. Rev Estud Fem. 2019;27(2):e54397.) O estigma relacionado à construção da identidade transgênero tem se revelado como um agravo público à dignidade e a manutenção dos direitos humanos essenciais de pessoas trans (ou transgênero e/ou transexuais) em todo o mundo.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.) De acordo com o estudo realizado por Instituição de Ensino Superior brasileira, foram estimadas quatro milhões de pessoas trans e não-binárias no Brasil, embora a categoria de identidade de gênero ainda não tenha sido incorporada ao censo demográfico brasileiro.(33. Spizzirri G, Eufrásio R, Lima MC, Nunes HR, Kreukels BP, Steensma TD, et al. Proportion of people identified as transgender and non-binary gender in Brazil. Sci Rep. 2021;11(1):2240.)

A exemplo da promulgação da Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (implantada em 2023), há iniciativas brasileiras que se destacam na América Latina; elas deverão destinar esforços de promoção da saúde, incluindo prevenção e tratamento de agravos, proteção e redução de vulnerabilidades e riscos bem como a reabilitação necessária a esta população.(44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2013. 32 p.)

A exemplo da estratégia de pré-natal do pai e/ou parceiro e demais ações implementadas pela Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (que também contempla a cisgeneridade), ações governamentais em saúde ainda carecem de avanços.(55. Medeiros RM, Coutinho SP, Maia AM, Sousa AR, Oliveira MT, Rosário CR, et al. Pré-natal masculino: desafios na prática de enfermagem na atenção básica à saúde. Revisa. 2019;8(4):394-405.) Neste sentido, ações globais devem ser desenvolvidas e propagadas para assegurar a justiça social e equidade e promover a saúde desse grupo em todos ciclos vitais, inclusive na saúde sexual e reprodutiva.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.)

O estigma é uma forma de depreciação de pessoas que apresentam uma ou mais características consideradas como desvio da norma social. Dada uma categoria de atributos considerados comuns ou naturais a uma determinada sociedade, as pessoas que se enquadram na norma são classificadas em “normais”; as que não se enquadram na norma são classificadas como “outros” ou “estranhos”, sendo alvo de rotulação, estereotipagem, descrédito, perda de status e/ou discriminação e afastamento.(66. Reisner SL, Poteat T, Keatley J, Cabral M, Mothopeng T, Dunham E, et al. Global health burden and needs of transgender populations: a review. Lancet. 2016;388(10042):412-36. Review.,77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) No caso de pessoas trans, o estigma ocorre pois elas contrariam a expectativa heteronormativa em todos contextos persistindo na pós-transição, quando as experiências de inferiorização se tornam mais frequentes e notórias à medida que as mudanças físicas se evidenciam.(66. Reisner SL, Poteat T, Keatley J, Cabral M, Mothopeng T, Dunham E, et al. Global health burden and needs of transgender populations: a review. Lancet. 2016;388(10042):412-36. Review.)

A experiência de estigmatização de pessoas trans tem sido investigada especialmente entre mulheres trans, embora a literatura ressalte que homens trans vivenciam situações estigmatizantes criadas principalmente por homens cisgênero como uma resposta negativa à expressão transgênero.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.) No entanto, a estigmatização que ocorre a essas pessoas no contexto dos serviços de saúde tem recebido pouca atenção dos pesquisadores. Assim, este estudo visou avançar no conhecimento científico e na prática profissional em Enfermagem e Saúde sobre as percepções, atitudes e práticas relacionadas à transgeneridade e saúde no contexto da gestação.

Homens transgênero e pessoas trans masculinas podem gestar, com direito a uma assistência à saúde qualificada para atender suas demandas e necessidades. Para tanto, é necessário revisar o paradigma cisgênero e heterossexual (cisheteronormatividade) que ainda regula as ações, comportamentos e práticas no trabalho em saúde.(88. Verbeek MJ, Hommes MA, Stutterheim SE, van Lankveld JJ, Bos AE. Experiences with stigmatization among transgender individuals after transition: a qualitative study in the Netherlands. Int J Transgender Health. 2020;21(2):220-33.,99. Pereira DM, Araújo EC, Silva AT, Abreu PD, Calazans JC, Silva LL. Evidência científicas sobre experiências de homens transeuxais grávidos. Texto Contexto Enferm. 2022;31:e20210347.) Fragilidades ainda são notadas nas tomadas de decisão e condutas clínico-assistenciais em saúde no Brasil quanto ao processo gravídico-puerperal de homens trans (assistência pré-natal), especialmente nas unidades de saúde não especializadas como as Unidades Básicas de Saúde e Unidades de Saúde da Família. Segundo o dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA),(1010. Benevides BG. Dossiê: assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2022. Brasília (DF): Distrito Drag, ANTRA; 2023. 109 p.) 131 pessoas trans foram assassinadas no Brasil em 2022. O Brasil acumula uma expressiva taxa de transfobia, inclusive nos espaços dos serviços de saúde, e um elevado número de homicídios de pessoas trans.(1111. Nascimento RB, Carvalho JL, Silva DC. Autonomia reprodutiva da população trans: Discursos de Direitos Humanos, cisnormatividade e biopolítica. Rev Direito Práx. 2021;12(4):2658-88.,1212. Stroumsa D, Shires DA, Richardson CR, Jaffee KD, Woodford MR. Transphobia rather than education predicts provider knowledge of transgender health care. Med Educ. 2019;53(4):398-407.)

A cisheteronormatividade(1313. Westafer LM, Freiermuth CE, Lall MD, Muder SJ, Ragone EL, Jarman AF. Experiences of Transgender and Gender Expansive Physicians. JAMA Netw Open. 2022;5(6):e2219791.,1414. Rosa EB. Cisheteronormatividade como instituição total. Pet Filosofia UFPR. 2020;18(2):59-103.) deve ser revisada nas instituições de saúde e na prática dos profissionais para reconhecer e valorizar as demandas e necessidades de saúde de pessoas trans no contexto da terapêutica. A cisheteronormatividade é um fenômeno social em que o sistema de relações de poder é baseado na heterossexualidade dos corpos pressupondo a cisgeneridade (corpos cisgêneros como norma).(1515. Vergueiro V. Pensando a cisgeneridade como crítica decolonial. In: Messeder S, Castro MG, Moutinho L. (orgs). Enlaçando sexualidades: uma tessitura interdisciplinar no reino das sexualidades e das relações de gênero. Salvador: EDUFBA; 2016. pp. 249-70.)Assim, normatizar as condutas profissionais a partir de um único prisma pode gerar exclusões e o apagamento de outras possíveis identidades de gênero, como a de homens trans e pessoas trans masculinas.(1313. Westafer LM, Freiermuth CE, Lall MD, Muder SJ, Ragone EL, Jarman AF. Experiences of Transgender and Gender Expansive Physicians. JAMA Netw Open. 2022;5(6):e2219791.)

Este estudo foi guiado pela seguinte questão: Qual a percepção de médicas e enfermeiras sobre a assistência pré-natal de homens trans? Portanto, o objetivo foi analisar o estigma evidenciado nas percepções de médicas e enfermeiras sobre o pré-natal de homens trans.

Métodos

Tratou-se de um estudo qualitativo, ancorado no paradigma interpretativo e conduzido em uma perspectiva socioantropológica.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.,1616. Minayo MC. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Cien Saude Colet. 2012;17(3):621-6.)Foi desenvolvido em Unidades de Saúde da Família (USF) de um município da Bahia, Brasil. Município este de grande porte com a organização da Atenção Básica representada por: chefia de Divisão da Atenção Básica, assessoria da gestão da Divisão da Atenção Básica, chefia da Divisão de Enfermagem, monitorias institucionais das USF e Referências Técnicas da Atenção Básica. Além disso, o município conta com 96 USF, sete Unidades Básicas de Saúde (UBS tradicionais), 133 Equipes de Saúde da Família (eSF), compostas por Agentes Comunitários de Saúde, assistentes administrativos, enfermeiras, médicas, serventes gerais e técnicas de enfermagem. Além disso, o município tem cinco Unidades de Saúde na Hora, 25 médicos (Programa Mais Médicos), 44 Equipes de Saúde Bucal (eSB) e 22 Equipes do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (eNASF).

Para compreender o fenômeno em profundidade, obter a transferência dos dados a partir dos resultados(1717. Bosi ML, Gastaldo D. Tópicos avançados em pesquisa qualitativa em saúde: Fundamentos teórico-metodológicos. Petrópolis: Vozes; 2021.) e atender aos critérios de inclusão (aceitar participar da pesquisa, realizar atividades de pré-natal e ter pelo menos seis meses de experiência na função ocupada), três médicas e seis enfermeiras foram selecionadas por amostragem propositiva para participar do estudo. Profissionais que estavam em licença saúde, paternidade e/ou maternidade e/ou férias não participaram do estudo. Ressaltamos que outros profissionais de saúde foram convidados, mas 21 recusaram por diferentes razões. Ressaltamos que o número elevado de recusas foi justificado por transfobia, falta de afinidade com o tema e insegurança para responder as perguntas. Logo, não foram incluídos na coleta de dados.

Como este foi um estudo qualitativo, não se buscou generalização ou representatividade para fins analíticos. Neste sentido, foi considerado o critério de saturação teórica enquanto um modelo a ser adotado.(1717. Bosi ML, Gastaldo D. Tópicos avançados em pesquisa qualitativa em saúde: Fundamentos teórico-metodológicos. Petrópolis: Vozes; 2021.) Assim, foi considerada sua densidade teórico-empírica, incluindo a coocorrência, convergência e complementariedades dos dados obtidos.(1818. Fontanella BJ, Magdaleno Júnior R. Saturação teórica em pesquisas qualitativas: contribuições psicanalíticas. Psicol Estud. 2012;17(1):63-71.)

A aproximação inicial às participantes foi possível após contato prévio com a Secretaria Municipal de Saúde que forneceu as informações necessárias. O anonimato foi preservado, considerando a autonomia e o direito de recusa das participantes respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018).

A produção de dados ocorreu com agendamento prévio, no período novembro-dezembro de 2021, em sala virtual privativa via plataforma Google Meet®, devido ao curso da pandemia da COVID-19. As entrevistas agendadas em horários opostos aos turnos de trabalho, como definidos com cada participante. Só o conteúdo de áudio foi considerado para análise e a imagem das participantes foi preservada. Durante a entrevista, as profissionais se encontravam em ambiente privado. A equipe de pesquisa envolveu estudantes de graduação, mestrado e doutorado em Enfermagem e Saúde, com experiência na área investigada e no método empregado. Ressaltamos que durante a realização da pesquisa a equipe de entrevistadores não tinha vínculo direto com as participantes.

Um formulário semiestruturado, confeccionado pelos autores, foi usado para obter os dados sociodemográficos e laborais bem como para orientar a entrevista individual em profundidade.(1919. Muylaert CJ, Sarubbi Jr. V, Gallo PR, Neto MLR, Reis AO. Entrevistas narrativas: um importante recurso em pesquisa qualitativa. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(Esp 2):193-9.) A entrevista foi guiada por roteiro previamente avaliado e ajustado no grupo de pesquisa da equipe executora, após um teste piloto com cinco participantes. Neste roteiro, havia quatro perguntas para analisar a percepção das participantes sobre o tema abordado na pesquisa. As entrevistas tiveram duração média de 30 min. Para manter o sigilo, todas as participantes foram identificadas pela letra “P” e a ordem numérica foi definida conforme as entrevistas foram sendo realizadas.

O material empírico decorrente das entrevistas foi gravado com a autorização das participantes, transcrito na íntegra e submetido a Análise de Conteúdo Temática Reflexiva proposta por Braun e Clarke,(2020. Braun V, Clarke V. Reflecting on reflexive thematic analysis. Qual Res Sport Exerc Health. 2019;11(4):589-97.) estruturada a partir dos passos seguintes: a) leitura linha a linha; b) localização das ocorrências, convergências, divergências e complementaridades dos dados; c) localização de códigos e/ou rótulos temáticos; d) ajuste da homogeneidade dos dados (aglutinação); e) abstração, nomeação e/ou formulação de temas, subcategorias e categorias na perspectiva de espiral buscando a reflexividade; f) síntese, apresentação das categorias e representação da imagem por meio de um modelo explicativo.(2020. Braun V, Clarke V. Reflecting on reflexive thematic analysis. Qual Res Sport Exerc Health. 2019;11(4):589-97.)

Os dados foram interpretados com base na teoria do estigma de Erving Goffman(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) e no conceito teórico de cisheteronormatividade conforme a perspectiva de Rosa e Vergueiro.(1414. Rosa EB. Cisheteronormatividade como instituição total. Pet Filosofia UFPR. 2020;18(2):59-103.,1515. Vergueiro V. Pensando a cisgeneridade como crítica decolonial. In: Messeder S, Castro MG, Moutinho L. (orgs). Enlaçando sexualidades: uma tessitura interdisciplinar no reino das sexualidades e das relações de gênero. Salvador: EDUFBA; 2016. pp. 249-70.) O estigma foi compreendido como um tipo especial de relação entre atributo e estereótipo em que um indivíduo é distanciado das relações sociais cotidianas por ter características diferentes da expectativa daqueles considerados normais.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) Na organização dos dados, foram seguidas as recomendações do Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ). Os dados foram organizados e então avaliados pelos integrantes do grupo de pesquisa para obter qualidade e rigor analítico,(1515. Vergueiro V. Pensando a cisgeneridade como crítica decolonial. In: Messeder S, Castro MG, Moutinho L. (orgs). Enlaçando sexualidades: uma tessitura interdisciplinar no reino das sexualidades e das relações de gênero. Salvador: EDUFBA; 2016. pp. 249-70.) mas não foram devolvidas às participantes.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (31/10/2021; CAAE 50575421.4.0000.0053; Parecer 5.073.655/2021) do Conselho Nacional de Saúde (Resolução nº 466 /2012 e 512/2016) que dispõe sobre pesquisas envolvendo seres humanos.

Resultados

Os resultados apresentam as características das participantes e os temas foram elaborados a partir de suas narrativas sobre o estigma evidenciado nas percepções de medicas e enfermeiras sobre pré-natal de homens trans.

Caracterização dos participantes

A figura 1 resume as características das participantes.

Figura 1
Caracterização das participantes do estudo

A seguir, os achados foram estruturados em temas analíticos que explicitam o estigma direcionado aos homens trans no pré-natal considerando os conteúdos de profissionais nos campos de enfermagem e medicina envolvidos no cotidiano assistencial na APS. Assim, surgiram dois temas reflexivos que foram enquadrados na teoria do estigma a partir de seus elementos componentes: rótulo, estereótipo, descrédito, afastamento e perda do status e/ou discriminação (Tema 1).

Tema 1. Rótulos e estereótipos atribuídos ao corpo, mente e identidade de gênero de homens trans grávidos

Este tema explica como a pessoa do homem trans é percebida pelos profissionais. Ao pedir às participantes para pensar no homem trans grávido, elas buscaram enquadrar a identidade trans na norma social, adotando um discurso biologicista sobre o corpo e o sexo designado ao nascer. Ao fazê-lo, elas tentaram ancorar a imagem do homem trans na imagem da mulher, atribuindo à identidade trans uma condição subjetiva e às vezes metafísica como a alma. Assim, foi observada uma heterogeneidade de percepções sobre o homem trans: uma das participantes se mostrou confusa e disse não compreender a sigla LGBTQIAPN+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transsexuais, Queers, Intersexo, Assexuais, Pansexuais, pessoas Não-Binárias e mais); uma outra buscou explicar a diferença existente entre a biologia, a identidade sexual e de gênero:

[...] uma pessoa trans é aquela que tem uma “identidade sexual biológica”. É um homem, mas não se vê como um homem, apresentando características femininas, se vestindo e se caracterizando de forma feminina (P2);

[...] um homem trans na realidade é uma “mulher de corpo”, tem uma fisiologia de mulher, mas uma “alma e aparência de homem” (P5);

[...] um homem trans nasceu em um “corpo de mulher”, mas se identifica como um homem (P6).

[...] meu Deus..., transgênero, transexual, trans e agora? São muitas denominações. Transexual seria uma pessoa que “muda de sexo”, que, p.ex., nasce homem e se identifica como mulher. Quer dizer, acho que não tenha necessariamente que mudar o órgão sexual, mas se identifica como uma mulher [...], a pessoa “acha” que se identifica (P7);

[...] o psicológico “dela” é de um homem, então “ela” vai se vestir e se “caracterizar como homem’’. Vai ter sentimentos e gostos masculinizados, mas vai ter “órgão sexual de mulher” (P8).

Os conteúdos narrativos acima também evidenciam os estereótipos em torno do homem trans (“mulher de corpo” e “corpo de mulher”) expressados pelas profissionais entrevistadas. Ao usar a expressão “igual a uma mulher normal”, o “outro” é posicionado na condição de anormal, denotando uma classificação básica do estigma, pois foi atribuída uma condição deteriorada e desviante de sujeito, marcada por ter características distintas daquilo que se concebe como aceitável ou normal. Além disso, o conteúdo mostrou desconhecimento de que mulheres trans não podem gestar, as pessoas trans foram colocadas em igual condição reprodutiva.

Tema 2. O (des)preparo profissional, distanciamento das demandas e perspectivas cisheteronormativas para o cuidado pré-natal de homens trans

Este tema indica o despreparo percebido pelas profissionais ao constatar que elas não têm experiência e conhecimento para prestar o cuidado pré-natal e atender às necessidades de saúde dos homens trans. Isto causa insegurança sobre a atuação delas enquanto cuidadoras de uma população vulnerável que busca romper com a discriminação e reivindicar seus direitos sexuais e reprodutivos. Os conteúdos refletem sobre a falta de interesse e motivações para buscar conhecimento, realizar cursos de atualização profissional e se vincular a ações de educação permanente e formação técnico-científica para o manejo clínico da saúde de homens trans. Isso acarreta um sentimento de incapacidade para cuidar e estabelecer iniciativas para a assistência de homens trans gestantes no pré-natal, relacionado à ausência de iniciativas de educação em saúde dirigidas à população de LGBTQIAPN+:

[...] nunca parei para buscar informação sobre o pré-natal de homens trans. Nunca estudei sobre os direitos reprodutivos desse público [...], nunca me deparei com nenhum homem trans para acompanhar no pré-natal; por isso, nunca busquei informação na literatura sobre isso (P3);

[...] não tenho conhecimento sobre o pré-natal de homens transgênero. É um tema muito específico que eu nunca tive interesse em pesquisar (P4);

[...] nunca li nada na literatura sobre gestação de homem trans. Já participei de capacitações instruindo como atender essas pessoas sem preconceito. Eu desconhecia o direito reprodutivo dessa população (P6);

[...] o conhecimento que tenho sobre a gestação de homens trans é vago. É um direito sexual e reprodutivo? Não tenho conhecimento (P7);

[...] eu não me aproximo muito desse público. Não me sinto preparada para assistir no pré-natal; não me sinto capacitada, embora eu já tenha participado de capacitações sobre saúde LGBT, de como conduzir e tratar os pacientes (P9).

As participantes reconhecem a insuficiência ou ausência de conhecimento para prestar cuidado pré-natal a homens trans, mesmo aquelas que já foram capacitadas. Consideram a gestação de pessoa trans uma situação de saúde muito específica, destacam o desinteresse e distanciamento em buscar capacitação técnica e usam o mesmo protocolo de cuidados destinados as mulheres gestantes, igualando assim as necessidades de mulheres cis às dos homens trans.

Neste contexto, as profissionais revelaram que ofereceriam os cuidados previstos no pré-natal de mulheres cis, pois este atendimento decorre de sua aprendizagem já institucionalizada na formação universitária básica e consiste em sua prática nos serviços. Este tema mostra que as participantes não reconhecem as subjetividades e especificidades que estão arroladas a saúde de homens trans, sobretudo durante o período gravídico puerperal. As mudanças corporais, os aspectos emocionais e sociais que envolvem esse grupo serão negligenciados se as particularidades forem desconsideradas.

[...] um homem trans gestante é igual a uma mulher normal que é cis. Não há diferença; é tudo igual. [...] se eu atendesse um homem gestante seria um atendimento igual ao das gestantes, com a mesma rotina de pré-natal da mulher. Seria tudo igual. Iria prestar a mesma orientação, as avaliações clínicas e exame físico (P1);

[...] vou atender normalmente, sem saber da questão se é trans ou não (P3);

[...] cuidar do homem trans será o mesmo da mulher trans e da mulher que não é trans (P5);

[...] a consulta de pré-natal seria normal, igual à de qualquer gestante. Os exames específicos também serão avaliados e terão condutas de tratamentos iguais. O protocolo do pré-natal seria o mesmo. Ser homem trans não traz mudança no exame pré-natal (P6).

[...] eu atendo sem preconceito, como se fosse um paciente normal, com os mesmos direitos reprodutivos (P8);

[...] se chegar um homem trans para realizar o pré-natal eu irei realizá-lo como se fosse uma gestante normal, uma mulher gestante hetero normal (P9).

A partir dos achados categorizados, foi possível compreender o fenômeno e explicá-lo imageticamente. Foi observado que o estigma se manifestou a partir da lembrança de estruturas sociais arraigadas como a cisgeneridade e a heterossexualidade. A expressão da cisheteronormatividade apreendida, que é projetada no cotidiano da profissional médica e de Enfermagem no atendimento pré-natal a partir das percepções sobre a possibilidade de homens trans gestarem. Esta relação cíclica dos elementos de rotulação, estereótipo, descrédito, afastamento e discriminação poderá afetar diretamente os homens trans na assistência pré-natal se eles forem atendidos e expostos à estigmatização (Figura 2).

Figura 2
Modelo explicativo do estigma sob a expressão da cisheteronormatividade direcionado por enfermeiras e médicas a homens trans grávidos na assistência pré-natal

Discussão

Este estudo analisou as percepções e o estigma surge sob a forma de manifestação da cisheteronormatividade na prática profissional de médicas e enfermeiras que atuam na Atenção Primária à Saúde no contexto do pré-natal de homens transgênero.

Os achados deste estudo permitiram elucidar os elementos estruturais que configuram o estigma como uma expressão da cisheteronormatividade, a saber: rotulação do homem trans em processo gestacional, formulação de estereótipos sobre esta pessoa e sua assistência pré-natal, instituição do descrédito à identidade transgênero na gestação, não implicação com o cuidado dispensado a essa população pelo afastamento do contexto e apagamento do status de “ser um homem trans e poder gestar”. Tais elementos configuram a discriminação, que se ancora na cisgeneridade e heterossexualidade compulsória e naturalizada no cotidiano do trabalho em saúde.

Há uma marca sócio-histórica de estigmatização da população transgênero em vários países do mundo, com expressivas situações de violência e impacto diário em sua vida e saúde (incluindo seus familiares). Isto pode indicar as razões do início da formulação de estereótipos sobre a concepção de corpo, mente e identidade transmasculina durante a gestação, conforme observado no cotidiano da prática médica e em Enfermagem.(2121. Fernandes H, Bertini PV, Hino P, Taminato M, Silva LC, Adriani PA, et al. Violência interpessoal contra homossexuais, bissexuais e transgêneros. Acta Paul Enferm. 2022;35:eAPE01486.,2222. Braz DG, Reis MB, Horta AL, Fernandes H. Vivências familiares no processo de transição de gênero. Acta Paul Enferm. 2020;33:eAPE20190251.) Alguns países, tais como Canadá e Reino Unido, estabeleceram medidas para enfrentar este problema de saúde pública com debates sobre a dimensão de saúde reprodutiva de homens transgênero.(2323. United Nations Economic Commission for Europe (UNECE). Measurement of gender identity: review paper by Canada and the United Kingdom. Paris: UNECE; 2019 [cited 2023 Dec 8]. Available from: https://unece.org/statistics/ces/measurement-gender-identity
https://unece.org/statistics/ces/measure...
) Porém, este cenário ainda é pouco conhecido no Brasil, principalmente em termos numéricos, pois há falta de dados oficiais para caracterizar o perfil sociodemográfico da população transgênero no país e dados da literatura científica relacionados ao pré-natal, saúde gestacional, parto e puerpério vivenciados por homens trans.(2424. Canavese D, Polidoro M, Signorelli MC, Moretti-Pires RO, Parker R, Terto V Jr. Pela urgente e definitiva inclusão dos campos de identidade de gênero e orientação sexual nos sistemas de informação em saúde do SUS: o que podemos aprender com o surto de monkeypox? Cien Saude Colet. 2022;27(11):4191-4.)

Acreditamos que as razões da percepção estereotipada de profissionais médicas e de enfermagem (p.ex., não compreendendo as diferenças biológicas e comportamentais relacionadas à construção social de gênero) seja um reflexo do atraso nos debates e investimentos nacionais qualificados sobre transgeneridades e saúde, resultando em baixa alfabetização e letramento dos profissionais de saúde nesse tema. Neste sentido, o Ministério da Saúde publicou um documento técnico sobre transexualidade e travestilidade em 2015, para reunir o conteúdo produzido pelos movimento sociais organizados e apresentar conceitos e estratégias a serem formuladas no âmbito de formação dos serviços de saúde e gestão.(2525. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Transexualidade e Travestilidade na saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015. 194 p.)

Avanços na literatura têm apontado que o estigma direcionado à população trans se converte em um grave “estresse de minoria”,(2626. Hoy-Ellis CP. Minority stress and mental health: a review of the literature. J Homosex. 2021;23:1-25. Review.) com impacto psicossocial expressivo, pois ele opera no nível micro quanto à subjetividade individual (tal como a dimensão psicoemocional do sujeito), restringindo o bem-estar psicológico e social das pessoas submetidas à estigmatização, especialmente quando isso ocorre frequentemente.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.,77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) Porém, o estigma também abrange o nível macro na dimensão social (envolvendo coletividades promotoras e perpetuadoras da estigmatização como uma prática de deterioração da identidade humana), pois está envolvido em causas estruturais decorrentes de respostas coletivas relacionadas a fenômenos de interação social,(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.,77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) (p.ex., o modo de olhar para a transgeneridade usando os referenciais da cisgeneridade). Isto explica porque a percepção de médicas e enfermeiras está pautada na genitália, dificultando a compreensão de gênero como uma construção social, diferenciando também da relação de orientação sexual.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.,99. Pereira DM, Araújo EC, Silva AT, Abreu PD, Calazans JC, Silva LL. Evidência científicas sobre experiências de homens transeuxais grávidos. Texto Contexto Enferm. 2022;31:e20210347.,2727. Gomes MS, York SW, Colling L. Sistema ou CIS-tema de justiça: Quando a ideia de unicidade dos corpos trans dita as regras para o acesso aos direitos fundamentais. Rev Direito Práx. 2022;13(2):1097-135.)

Além disso, estigmas interferem diretamente na qualidade, sentido e propósito de vida (inclusive, nos processos gestacionais dessas pessoas). Nossos resultados ilustram a não compreensão das necessidades de saúde de homens trans que vivenciam o contexto de uma gestação, que se materializa na falta de interesse e busca por conhecimento e qualificação profissional sobre o tema. Dadas as necessidades de saúde dos homens transgênero durante o ciclo gravídico puerperal, estigma foi evidenciado em uma revisão integrativa da literatura que sintetizou a falta de competência profissional, ausência de orientação profissional adequada e escassez de produção científica embasando a produção do cuidado.(2828. Souza LB, Fernandes RM, Sousa LM, Fernandes MI. Assistência à saúde do homem transgênero durante o ciclo gravídico puerperal: uma revisão integrativa. Nursing. 2022;25(292):8566-71. Review.)

A rotulação constante dos homens trans (também presente nos serviços de saúde) pode implicar em despersonalização e desconfiguração de sua identidade detentora de especificidades e singularidades, inclusive no âmbito da gestação. Especificidades do cuidado que precisam ser implementados são desconsiderados. A equiparação da gestação trans com aquela cisgênero é um problema que deve ser revertido e ressignificado no âmbito do trabalho em saúde.(2727. Gomes MS, York SW, Colling L. Sistema ou CIS-tema de justiça: Quando a ideia de unicidade dos corpos trans dita as regras para o acesso aos direitos fundamentais. Rev Direito Práx. 2022;13(2):1097-135.,2929. Rocon PC, Sodré F, Zamboni J, Rodrigues A, Roseiro MC. What trans people expect of the Brazilian National Health System? Interface (Botucatu). 2018;22(64):43-53.) O mesmo ocorre com a equiparação de homem trans com “paciente normal” (i.é, mulher cisgênero), que aparentemente concorda com a ideia de que os protocolos assistenciais a serem aplicados não diferem em relação à transgeneridade. Isto é uma realidade ainda vigente no Brasil, onde ainda não há um documento público oficial normatizador das práticas profissionais em saúde.

Ao considerar que os atendimentos pré-natal são iguais para todas pessoas gestantes, a singularidade do homem trans e suas necessidades desaparecem, incluindo alterações corporais, autoimagem, supressão de hormônios e características modificadas durante a gravidez. Quando os profissionais de saúde constroem esse pensamento, eles podem impor aos homens trans assistência e terapêutica destinadas às mulheres cis, o que desvaloriza a identidade e o autoconceito dos homens trans, implicando em sofrimento psicológico.

Assim, é relevante pontuar que o uso da expressão “normal”, que remete à dicotomia normal-patológico,(2727. Gomes MS, York SW, Colling L. Sistema ou CIS-tema de justiça: Quando a ideia de unicidade dos corpos trans dita as regras para o acesso aos direitos fundamentais. Rev Direito Práx. 2022;13(2):1097-135.,3030. Cano-Prais HA, Costa-Val A, Souza ER. Classificatory incongruities: an analysis of the discourses on ICD11 proposals in relation to trans experiences. Cad Pagu. 2021;(62):e216219.) deve despertar para a reflexão de que uma reanálise do processo saúde-doença é necessária para muitos trabalhadores da saúde. Nossos achados apontam para a possibilidade de enquadrar os pacientes trans em contexto pré-natal como “patológicos”. Isto coaduna com a ideia de transexualidade que estava até 2019 inserida na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10) como transtorno mental (ou até mesmo a noção de corpos “dissidentes” adotada pela psiquiatria) e rotulou pessoas que fugiam ao padrão cisheteronormativo como “doentes” e passíveis de tratamento.(3131. Besse M, Lampe NM, Mann ES. Experiences with achieving pregnancy and giving birth among transgender men: a narrative literature review. Yale J Biol Med. 2020;93(4):517-28. Review.)

Homens trans que desejam gestar apresentarão demandas e necessidades de saúde, comportamentos, atitudes e práticas distintas daquelas observadas em mulheres cisgênero, não devendo ser compreendidos a partir da óptica da cisgeneridade e do conjunto de normatizações socialmente estabelecidas a partir de uma ideia fixa sobre masculinidade e feminilidade. Tal conduta evidencia essencialmente uma postura de invisibilização que leva à perda do status social da identidade trans masculina.(3232. Sousa D, Iriart J. "Viver dignamente": necessidades e demandas de saúde de homens trans em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00036318.) Além disso, o não reconhecimento desta identidade certamente causa implicações no cuidado e evidencia a regulação de ações, comportamentos e práticas no trabalho em saúde com base na perspectiva da cisheteronormatividade.

Ressaltamos ainda que os resultados do presente estudo apontaram que os estereótipos refletem a influência da perspectiva cisheteronormativa quanto à diversidade de gênero, condicionando-a ao sexo de nascimento, determinado biologicamente em uma percepção orgânica voltada exclusivamente ao corpo, ignorando a percepção individual e subjetiva de um indivíduo. Tal compreensão produz e reproduz discursos transfóbicos, configurando-se em uma barreira de acesso ao sistema de saúde.

Socialmente, a identidade transgênero ainda é invisível. Essa invisibilidade está atrelada ao padrão cisheteronormativo, acarretando ações e reações que repercutem nos diversos níveis da assistência, mediante burocratização dos sistemas, os quais não incorporam o nome social, não leem homens trans como pessoas que necessitam de atenção ginecológica e obstétrica e não aparecem nas bases de dados dos sistemas de saúde.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.,1111. Nascimento RB, Carvalho JL, Silva DC. Autonomia reprodutiva da população trans: Discursos de Direitos Humanos, cisnormatividade e biopolítica. Rev Direito Práx. 2021;12(4):2658-88.,3030. Cano-Prais HA, Costa-Val A, Souza ER. Classificatory incongruities: an analysis of the discourses on ICD11 proposals in relation to trans experiences. Cad Pagu. 2021;(62):e216219.

31. Besse M, Lampe NM, Mann ES. Experiences with achieving pregnancy and giving birth among transgender men: a narrative literature review. Yale J Biol Med. 2020;93(4):517-28. Review.
-3232. Sousa D, Iriart J. "Viver dignamente": necessidades e demandas de saúde de homens trans em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00036318.) Assim, é necessário expandir o conhecimento sobre transgeneridade, descortinar a cisgeneridade, a heteronormatividade compulsória e sua articulação com as relações de poder. Na perspectiva da teoria queer, transgeneridade pode ser melhor entendida por sua posição contrária à normalização de gênero, possibilitando deslocar posições que podem ser úteis para guiar o trabalho de Agentes Comunitárias(os) de Saúde, enfermeiras(os), técnicas(os) de enfermagem, médicas(os) e demais profissionais que estejam envolvidos na assistência pré-natal.(2828. Souza LB, Fernandes RM, Sousa LM, Fernandes MI. Assistência à saúde do homem transgênero durante o ciclo gravídico puerperal: uma revisão integrativa. Nursing. 2022;25(292):8566-71. Review.,3030. Cano-Prais HA, Costa-Val A, Souza ER. Classificatory incongruities: an analysis of the discourses on ICD11 proposals in relation to trans experiences. Cad Pagu. 2021;(62):e216219.)

Em nossos achados, o uso de rótulos descaracteriza a gestação do homem trans e caminha em direção à lógica do normal e do patológico (patologização dos corpos e experiências trans masculinas no pré-natal). Na prática, a patologização pode ocorrer quando a narrativa clínico-assistencial é feita só por pessoas cisgênero, sem escuta, presença e protagonismo de pessoas trans, causando degeneração moral, desvio da verdadeira natureza humana, redução da pessoa ao órgão genital, que é visto como incongruente ou corpo “abjeto”.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.) Este modelo perpassa a formação profissional na área da saúde que ainda está restrita aos cuidados cisheteronormativos, podendo não encontrar espaço para contemplar as discussões sobre as especificidades no cuidado à saúde de homens trans.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.,66. Reisner SL, Poteat T, Keatley J, Cabral M, Mothopeng T, Dunham E, et al. Global health burden and needs of transgender populations: a review. Lancet. 2016;388(10042):412-36. Review.,88. Verbeek MJ, Hommes MA, Stutterheim SE, van Lankveld JJ, Bos AE. Experiences with stigmatization among transgender individuals after transition: a qualitative study in the Netherlands. Int J Transgender Health. 2020;21(2):220-33.

9. Pereira DM, Araújo EC, Silva AT, Abreu PD, Calazans JC, Silva LL. Evidência científicas sobre experiências de homens transeuxais grávidos. Texto Contexto Enferm. 2022;31:e20210347.
-1010. Benevides BG. Dossiê: assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2022. Brasília (DF): Distrito Drag, ANTRA; 2023. 109 p.)

Neste contexto, a despatologização é urgente e necessária, pela possibilidade de compreensão, respeito e legitimação das pessoas trans, visando atenção integral durante o processo transexualizador e revisão do conceito de transexualidade nos termos do CID.(2828. Souza LB, Fernandes RM, Sousa LM, Fernandes MI. Assistência à saúde do homem transgênero durante o ciclo gravídico puerperal: uma revisão integrativa. Nursing. 2022;25(292):8566-71. Review.) Este foi revisado em 2023 a partir de um amplo debate entre o movimento social organizado e o Ministério dos Direitos Humanos brasileiro. Sua ampliação está prevista a partir da habilitação no âmbito do componente Atenção Especializada(3333. Oberhelman-Eaton S, Chang A, Gonzalez C, Braith A, Singh RJ, Lteif A. Initiation of gender-affirming testosterone therapy in a lactating transgender man. J Hum Lact. 2022;38(2):339-43.)de modalidade ambulatorial, assim como de questões de saúde tais como hormonização e garantia do direito à fecundação.(3030. Cano-Prais HA, Costa-Val A, Souza ER. Classificatory incongruities: an analysis of the discourses on ICD11 proposals in relation to trans experiences. Cad Pagu. 2021;(62):e216219.

31. Besse M, Lampe NM, Mann ES. Experiences with achieving pregnancy and giving birth among transgender men: a narrative literature review. Yale J Biol Med. 2020;93(4):517-28. Review.
-3232. Sousa D, Iriart J. "Viver dignamente": necessidades e demandas de saúde de homens trans em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00036318.) Assim, é importante o comprometimento para superar o apagamento da população trans nos serviços de saúde e alcançar melhores cenários onde as demandas dos homens trans sejam priorizadas no pré-natal, parto e puerpério. Isso deve partir de um processo de emancipação em saúde, afirmação das identidades de gênero em relação à gravidez e reconhecimento da figura do “homem trans grávido” bem como do “leite paterno” nos espaços assistenciais.(3434. Hoffkling A, Obedin-Maliver J, Sevelius J. From erasure to opportunity: a qualitative study of the experiences of transgender men around pregnancy and recommendations for providers. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(S2 Suppl 2):332.,3535. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS N° 404, de 28 de março de 2023. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2023 [citado 2023 Dez 7]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2023/prt0404_31_03_2023.html
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)

A falta de atualização dos profissionais de saúde, bem como a fragilidade na aquisição de conhecimento sobre a gestação de homens trans (encontrada em nosso estudo sob a forma de distanciamento dessas profissionais em relação à pauta da transgeneridade na saúde) pode ajudar a explicar um problema evidenciado na literatura, que revela uma assistência à saúde limitada quanto à reprodução transgênero. As experiências de gravidez e parto de homens trans ainda é desconhecida pela maioria dos profissionais que atuam nesse contexto. Isto pode implicar em empobrecimento das práticas assistenciais, ausência da produção do cuidado singularizado, negligência e iatrogenia. Pode implicar também no comprometimento da segurança do paciente e da advocacia dos pacientes, em termos de negação de direitos, muitas vezes motivadas pela cisheteronormatividade institucionalizada incorporada às normas assistenciais em saúde.(3232. Sousa D, Iriart J. "Viver dignamente": necessidades e demandas de saúde de homens trans em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00036318.)

Destacamos que no âmbito clínico há conhecimentos a serem apreendidos sobre riscos e complicações periparto de homens trans, hormonização (uso de testosterona) e gestação, que frequentemente são desconhecidos e condicionados ao enquadramento de um pré-natal de risco.(3636. Lima F, Cruz K. Os processos de hormonização e a produção do cuidado em saúde na transexualidade masculina. Sex Salud Soc (Rio J). 2016;23(23):162-86.)

Evidências científicas têm apontado que a gestação de homens trans é marcada por medo da parturição e da assistência a ser prestada pelos profissionais da saúde no parto e nascimento. O medo está relacionado com o parto cesáreo daqueles em uso de testosterona e amamentação pós-parto, especialmente daqueles que realizaram a cirurgia de mamoplastia masculinizadora antes da gravidez.(44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2013. 32 p.,99. Pereira DM, Araújo EC, Silva AT, Abreu PD, Calazans JC, Silva LL. Evidência científicas sobre experiências de homens transeuxais grávidos. Texto Contexto Enferm. 2022;31:e20210347.) Assim, chamamos atenção para a necessidade de aconselhamento pré-concepcional, incluindo questionamento sobre terapia hormonal com testosterona e gestação, incentivo dos homens trans na adoção de cuidados cotidianos sobre saúde sexual e reprodutiva (fertilidade). Além disso, ressaltamos que o apoio psicossocial é essencial na produção do cuidado no contexto da gravidez de homens transgênero.(3232. Sousa D, Iriart J. "Viver dignamente": necessidades e demandas de saúde de homens trans em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00036318.)

Com a configuração do estigma instalado, o estereótipo emerge como um atributo de desvalorização aparente, que pode contribuir para deteriorar a autoimagem, autopercepção e autoconceito dos homens trans como evidenciado por um estudo qualitativo realizado no Brasil durante a pandemia da COVID-19. Este estudo mostrou rupturas biográficas decorrentes da transfobia estrutural entre adolescentes e jovens trans masculinos, reforçando o aparecimento de narrativas sobre a estigmatização sofrida nos serviços de saúde, tais como a problemática relação experienciada junto aos profissionais de saúde.(3737. Sousa AR, Machuca-Contreras FA, Morais AV, Araújo RD, Silva GW, Camargo CL, et al. Biographical ruptures by the COVID-19 pandemic on adolescent and young trans men and transmasculine people: demands for nursing. Rev Lat Am Enfermagem. 2022;30(Spe):e3753.) Tal cenário pode implicar em danos ainda maiores ao bem-estar e à qualidade de vida de homens trans à medida que eles são impactados pelo descrédito e expostos à perda do status social de ser quem eles desejam ser (e têm o direito de ser e existir), pois o estigma reproduz a desigualdade social a partir da hierarquização de grupos sociais.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.)

No presente estudo, o descrédito e a discriminação emergiram como uma marca da transfobia estrutural, já introjetada, naturalizada, e frequentemente imperceptível no imaginário dos profissionais da saúde.(88. Verbeek MJ, Hommes MA, Stutterheim SE, van Lankveld JJ, Bos AE. Experiences with stigmatization among transgender individuals after transition: a qualitative study in the Netherlands. Int J Transgender Health. 2020;21(2):220-33.) Isto pode implicar em uma redução na autonomia reprodutiva em termos de direitos humanos dos homens trans, decorrente da cisheteronormatividade e da estrutura biopolítica.(22. Grade C, Gross C, Ubessi L. Patologização da transexualidade a partir de uma revisão integrativa. Psicol Saúde Doença. 2019;27(2):435-51.,33. Spizzirri G, Eufrásio R, Lima MC, Nunes HR, Kreukels BP, Steensma TD, et al. Proportion of people identified as transgender and non-binary gender in Brazil. Sci Rep. 2021;11(1):2240.)

É neste contexto, exposto a situações de vulnerabilidade e influenciado pelo contexto social, cultural e econômico, que as identidades trans são colocadas em constante questionamento por parte da cisgeneridade. Este é um movimento em que se observa um posicionamento de proteção da cisheteronormatividade para manter esse “status quo”, pois a transgeneridade rompe com esta lógica nos diversos contextos. Assim, nem mesmo a afirmação do “outro” sobre ele mesmo pode se tornar uma informação válida e valorizada durante o processo de cuidado em saúde, tendo reflexos negativos na prática profissional. Ao contrariar o que é socialmente esperado, pessoas transgênero são frequentemente “desacreditadas”, desumanizadas e colocadas à disposição da “aceitação social”.(77. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: LTC; 2019.)Além disso, chamamos a atenção para a necessidade de valorizar plenamente a parentalidade trans masculina,(3838. Pfeil CL, Pfeil BL. Em defesa de parentalidades transmasculinas: uma crítica transviada ao [cis]feminismo. Rev Bras Estudos Homocultura. 2023;6(19):49-63.) assim como das várias dimensões de reprodução e parentesco entre homens trans que engravidam.(3939. Monteiro AA. O nome dele é Gustavo, e ele é a minha mãe: reprodução e parentesco entre homens trans que engravidaram. Synthesis. 2021;14(2):28-39.)

A dificuldade na captação de participantes dispostos a tratar do tema e homens trans em contexto de gestação bem como o uso de uma técnica única de coleta de dados pode ter dificultado a obtenção de dados sendo então limitações metodológicas do estudo. Contudo, os dados apontam algumas potencialidades. O reconhecimento dos elementos estruturais do estigma a partir da expressão da cisheteronormatividade por profissionais de medicina e enfermagem na assistência pré-natal ao homem trans, a abertura de um espaço para localizar os possíveis impactos da formação e prática profissional e a reflexão sobre possíveis prejuízos para a saúde dos homens trans durante a gestação convoca os profissionais, trabalhadores e gestores públicos da saúde a pensar sobre a necessidade de enfrentar a transfobia e fornecer os subsídios necessários ao emprego de esforços para desestigmatização.

Portanto, este estudo apresentou contribuições reforçando a necessidade de inserir disciplinas nos currículos de formação em saúde para superar a heteronorma e a forma essencialista centrada na biologia. Ele também preencheu lacunas sobre a gravidez na perspectiva transgênero, aponta caminhos para a prática em Enfermagem e Saúde em termos clínicos e sociais e indicou pontos problemáticos no atendimento dos princípios da universalidade, equidade, territorialização na Estratégia de Saúde da Família. Além disso, ele convoca gestores a revisar e avançar na implementação de políticas públicas de saúde direcionadas à população transgênero, especialmente diante do avanço de uma agenda conservadora no cenário brasileiro que tem prejudicado o atendimento de homens trans grávidos na APS, desviando-os aos serviços especializados.

Conclusão

O estabelecimento de rótulos relacionados à gestação e ao corpo trans grávido; a criação de estereótipos sobre a identidade transgênero e o pré-natal; a instituição do descrédito de que é possível um homem trans engravidar, o afastamento da busca e implicação sobre as demandas de homens trans no cuidado pré-natal e a reprodução da perda de status e discriminação retratam percepções estigmatizantes, manifestadas mediante a lógica da normalidade e equiparação cisgênero das necessidades de saúde dos homens trans no contexto do pré-natal. O estigma direcionado aos homens trans no contexto da assistência pré-natal é manifestado sob a expressão da cisheteronormatividade, na assistência médica e de enfermagem. Os elementos que constituem o estigma podem impactar a qualidade do pré-natal e da saúde e segurança de homens trans no ciclo gravídico-puerperal, antecipando pensamentos, atitudes e práticas que contribuem para deteriorar a identidade transmasculina na gestação.

Agradecimentos

Ao Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva (PPGSC) da Universidade Estadual de Feira de Santana - BA pelo auxílio financeiro concedido para a publicação do estudo através do Programa de Apoio à Pós-graduação da CAPES.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Thiago da Silva Domingos (https://orcid.org/0000-0002-1421-7468) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2023
  • Aceito
    24 Jan 2024
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